Observou-a surgir em meio aos lençóis, quente, as mãos percorrem lentamente a nuca, os pêlos saltam em um arrepio que perdura, as unhas negras arranham os ombros, êxtase. A palma recobre os seios, a renda acaricia a pele, os dedos descem pela cintura, abrem-se no quadril e se fecham instintivamente, ansiedade.

Os olhos brilham com malicia, semicerrados, procuram ao que se apegar. Morde os lábios, tão loucamente apaixonada. Os cabelos ondulados modelam seu rosto, bagunçado, cai sobre as costas, fios invadem sua boca, selvagens.

Ajoelhada sobre sua dignidade, os pés se retraem e os músculos enrijecem, gotas de suor percorrem seu corpo e deságuam em suas curvas. O rímel borrado, o batom já sem cor. Respiração ofegante, suspiros provocativos, exalação feminina, Pompéia.

Pupilas dilatadas. A reflexão da perversão emitida pelo espelho, a representação dos mais íntimos sentimentos. O quarto irreconhecível, não importa. Os travesseiros ao chão, os tapetes transbordam de roupas jogadas ao acaso,os lençóis vermelhos transparecem luxúria e pecado, a maçã de Eva.

As cortinas brancas imóveis descem do céu ao chão, nuvens santificadas de algodão que presenciam o indevido.

De pé em frente a cama está ele. As mãos perpendiculares aos quadris. As pernas distanciadas. Os músculos fadigados, reluzentes devido ao suor. Os cabelos molhados. O maxilar definido pela barba por fazer, o pomo de adão evidente pela inclinação de sua cabeça, caracteriza sua virilidade. O olhar fixo naquela que o admira.

Sobre a cama está ela, conquistada, conquistando-o. Impulsiona seu corpo para frente, apoiando-se também sobre as mãos, contrastando o calor da pele com a frieza presente, porém jamais notada.

Com movimentos lentos, dirigi-se a ele. Os cabelos movem-se junto ao corpo, os olhos virados para cima, fitando-o. Os dentes a mostra. O movimento do quadril. A nebulosidade moral.

Aproxima-se dele e com o movimento do tronco e impulsão dos braços, atinge uma posição ereta. Os olhos na altura de seu peitoral. O rosto tomado pelo enlevo por quem espera que a salve agora, por que seu amor levou o que o que ela tinha de melhor.

Ele retribui o olhar, dominador. A cabeça se move para baixo e o contato visual se torna direto. O breve momento que se deu foi gigantesco, o silêncio tornara-se gritante. A chama ardeu, a porcelana quebrou ao cair no chão, o batom abriu-se, a fumaça turvou a realidade.

As pálpebras dela se movem enquanto os dedos dele acariciavam seus lábios, as mãos encontram seu queixo e ele se debruça de encontro a seu beijo. Seu toque.

As mãos dele massageiam seu cabelo enquanto seus lábios a completam, sua pele a faz querer mais, seu cheiro a faz mais dependente, seu eu a faz mulher.

Lábios distanciam-se. Ela abre lentamente os olhos, encantada. As mãos dele deixam sua cabeça. Os últimos olhares são trocados. Os primeiros feixes de luz invadem o quarto, iluminando o âmbito dos prazeres carnais. Ela permanece imóvel, vivenciando os momentos anteriores em suas lembranças recentes. Ele abotoa a camisa, os sapatos estão junto à porta.

Ela se joga sobre a cama. Cabelos voam inertes, em seu rosto a expressão de deleite, desejo. Abdômen contraído, o corpo leve. Olhar perdido, mente desligada. Os braços para trás, em queda livre. As mãos dormentes, pés gelados. Encontra seu leito. A queda parece profunda e sufocante. Reflexiva, tempestuosa. Libertadora. O prazer permanece nos poros de sua pele, na obscuridade da alma, narcótico

Ouve-se o abrir da porta, os passos de quem agora a deixa, de quem a salva por breves momentos os quais ela anseia por eternidades. De quem a cobra para levá-la a plenitude do sexo. De quem a deixou tão loucamente apaixonada.