A Beautiful Winter Day escrita por Summertime Sadness


Capítulo 14
Nada mais que a verdade


Notas iniciais do capítulo

Depois de tanto tempo, estou de volta com mais um capítulo dessa história tão feliz (há). Sério, desculpem pelo Hiato, ele não deveria ter sido tão longo, mas acabei viajando, participando de seleções para Beta e quando as aulas voltaram, bem, ficou complicado. E apesar de tentar trabalhar com a escrita todos os dias, não estava exatamente inspirada para essa história. Eu poderia sim ter me obrigado a escrever pra ela e a postar, mas ficaria forçado, e não gostaria que isso acontecesse aqui, uma história que pegou tanto no meu emocional quando à criei. Por isso, escrevo quando me sinto mais naturalmente inclinada para a história, sem que fique forçada. Nessas férias espero que melhore meu padrão de postagens. E não se preocupem, a história não foi e não será abandonada :)

Boa leitura! Qualquer dúvida, me perguntem.



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.......

 Seu quase estado de torpor foi substituído por uma onda quente. Girou a maçaneta e entrou dois passos no flat, trazendo consigo um pesado silêncio que mortificou a discussão das duas figuras, que olhavam mais ou menos com a mesma cara de choque.

 Holmes e Morstan.

 — John – começou Mary, exasperada – o que voc...-

 — Sherlock – sussurrou ainda olhando para ela – Você o vê.

 Quase pode ver algo se quebrando dentro dela.

 — Você sabia – ele continuou.

 Mary não fez questão de negar. 

(...)

 — O que aconteceu, John?

 Não era a primeira vez que Greg lhe perguntava isso, mas sua mente propositalmente enublada impedia que soubesse o número das perguntas. Talvez estivesse abusando da gentileza dele, e provavelmente estivesse mesmo; invadir a casa de alguém e pedir moradia provisória, enquanto a explicação dada é um “algo aconteceu” entrecortado por extensos períodos de silencio, era no mínimo desconcertante. Parecia com aqueles caras que traíam as esposas e, descobertos, se refugiavam nas casas dos amigos solteiros. Exceto que, neste caso, não fora ele quem errou. Só não conseguira voltar para casa — a casa de Mary — depois do que ouvira. Depois do que soubera. Olhava a superfície negra do café a sua frente, e somente via os olhos dela, destemidos, culpados pelas palavras erradas que havia dito.

 — John, se não me disser, vou ser obrigado a ligar pra Mar...-

 — Não – se rendeu – Não fale onde eu estou. Nós estamos separados.

 Era estranho dizer em volta. Mas sua vida nunca fora nada além de ser estranha.

 — Separados? Mas... Como assim!? John, aquela mulher é uma das melhores coisas que te aconteceu, chega cansar o tanto que Mr. Hudson fala...-

 — Sempre pensam assim, Greg – tomou um gole da xícara e depositou lentamente na mesa – mas éramos um casal de porcelana. Só para ser visto.

 As sobrancelhas cinzentas se levantam.

 — Você a amava.

 — Sim.

 — Você a ama.

 Depois de uns segundos de raciocínio, respondeu:

 — Sim.

 — Eu não entendo.

 John suspirou. Abriu a boca para dizer mais alguma coisa, muitas e muitas coisas que repousavam sobre seu peito, que coloriam o café e todos os outros objetos, que nadavam por sua cabeça enquanto assistia os flocos de neve cair pela janela.

 Porém, manteve-se calado. Pediu desculpas e seguiu em direção ao quarto de visitas que passaria a noite — talvez a primeira de terríveis noites. Jogou água no rosto, secou com uma toalha e viu as horas no relógio de parede. 17h45min. Muito cedo para dormir. Podia sair, mas não via nenhum lugar que valeria a viagem friorenta.

 John, você precisa me ouvir.

 Rapidamente, John pegou o livro que estava na cabeceira e abriu-o, lendo as linhas que se insinuavam, tentando retê-las para se livrar das vozes em sua cabeça. Talvez fosse sobre jardinagem ou música, as palavras se misturavam sem precisão em seu cérebro.

 Nunca quis que aquilo tivesse acontecido.

 Fechou o livro com uma força desnecessária. Lestrade não foi ao quarto para perguntar se estava bem, o que alguns teriam feito, e Watson sentia-se extremamente grato por isso. Depois de uma respiração profunda, pegou seu casaco na cabeceira da cama e saiu, dizendo que tomaria um ar. O ar seria de 5 graus negativos, mas Greg não comentou.

 Levou o celular por precaução, sem realmente planejando atender a qualquer um que ligasse.

 John, se eu pudesse voltar, eu faria tudo diferente.

O vento soprava em seu rosto.

 Eu sinto muito.

 — Você o vê – havia dito – você o enxerga... Você o enxerga também.

 — Acho que já estabelecemos isso.

 A voz de Holmes havia soado tão apática quanto na maioria das vezes em que o ouvira, mas naquele momento era sua existência quase concreta que tinha importância, tanto quanto o fato de Mary também ouvi-la. Havia sido confuso. Havia ficado chocado.

 Havia se sentido traído.

 — John, você precisa me ouvir – falara cuidadosamente, como alguém querendo evitar maiores tragédias - todos os dias que você passava aqui, eles foram uma válvula de escape que você não pode manter pra sempre.

 — Quer dizer que você o via o tempo todo!?

 — Não! – se apressou em dizer, com uma inquietante honestidade – eu não sabia, John.

 Watson havia virado as costas a eles, as mãos no rosto.

 — Sherlock – era estranho dizer o nome depois de tanto tempo –, há quanto tempo ela sabia?

 Passara alguns segundos até a resposta ser formulada.

 — Desde a morte de Magnussen.

Virara-se para eles. A morte – assassinato – do crápula havia ocorrido há uns dois meses. Mary havia escondido ter consciência de Sherlock perambulando pelo 221B por todo aquele tempo?

 — Quando nós fomos visitar a Mrs. Hudson – Mary tomou a palavra – eu deixei vocês sozinhos no flat dela, enquanto cuidava de outros assuntos.

 — Disse que dormiria na casa de uma amiga sua – lembrou-se.

 — Eu... – fechou momentaneamente os olhos, e os abriu com vigor renovado – Não fui imediatamente embora. Pode achar que não me importo, mas apesar dos seus comportamentos, eu senti vontade de ver o apartamento pela última vez. Mas eu não esperava subir aqui e... – parecia buscar alguma descrição enquanto era observada pelo espírito – me encontrar com ele.

 — Exigiu paciência e concentração de minha parte. Céticos precisam disso.

 — Era por isso que você quase sumiu aquela noite. Usou energia pra... Se mostrar a ela – não conseguiu retirar a raiva da voz.

 — Eu posso ter me esforçado, John, mas eu não fui o único a ter contribuído. Mary Watson queria me ver também, e isso facilitou o processo.

 — Eu não queria ver você – ela falara com energia – eu nem sabia que você existia!

 — Subconscientemente você queria – explicara friamente – É o que a culpa faz.

 Os punhos dela havia se fechado, brancos e apertados. Olhos ao chão.

 — Culpa – refletira John – Por que você se sentiria culpada naquela época?

 Sempre havia se perguntado quando olhava o brilho estranho nos olhos dela. O brilho estranho que usava para encarar a lápide de Holmes durante as visitas ao cemitério.

 — Eu matei Magnussen – os olhos haviam se erguido e a postura corporal voltou à reta normalidade, como se aquilo fosse a única certeza que tinha naquela situação.

 A pilha de revelações em John o pesava cada vez mais.

 — Mas... Mary... Você – olhava dela para Sherlock, de Sherlock para ela – Como...

 Longe, distante dali, Watson ainda caminhava por uma Londres nevada. Esperou o sinal e um ônibus passava levando consigo uma nuvem esbranquiçada. Afundou ainda mais as mãos nos bolsos. Era uma pena que o pior dia de sua vida não pudesse ser esquecido numa caminhada. Seria um presente.

 A voz de Mary ecoava entre os carros que passavam a sua frente. Uma voz que lhe contara a vida de uma mulher que ele não conheceu. Alguém que matava. Espionava por dinheiro. E era procurada por pessoas tão terríveis quanto. Uma mulher letal que ele não conhecera. Alguém que sua Mary não era.

 Porque ela não era Mary no fins das contas.

 Lembrava-se de escutá-la sem dizer nada, incapaz de conciliar aquilo com a vida que eles tiveram, ou ao menos a vida que poderiam ter.

 — Nunca me contou nada disso.

 — Duvidaria que tivesse me amado se contasse.

 John não pode contradizê-la. Naquele instante, duvidava até se a amava ali.

 — Magnussen está morto – dissera – Se você tentou matá-lo da primeira vez e não conseguiu...-

 Não havia tido coragem de formular sua intima dedução.

 Ainda tinha dificuldade de pensar nela.

 “Meu irmão foi só uma queima de arquivo”

 — Não. Não... – seus sussurros foram abafados por sua mão sobre a boca.

 Os olhos de Mary haviam brilhado, lacrimosos. Seu tom tivera um desespero quase incontrolado.

 — Sherlock não deveria ter morrido! – as lágrimas eram visíveis, mas não caíam.

 — Como pode dizer isso na frente dele? Como... Pode fazer isso? – olhou para Holmes, inexpressivo, interessado no piso – Por que nunca me contou?

 — Foi um acidente. Tecnicamente. – as palavras de Holmes eram sem vida – Você queria permanecer na sua vida doméstica, e não valia à pena destruí-la por nada.

 — Ela matou você! – praticamente gritara – Viver com a assassina do seu melhor amigo é a sua ideia de uma vida doméstica!?

 Mary baixava a cabeça, a expressão dura de alguém que segurava as lágrimas. Sherlock, alguns passos à frente, parecera ser o único ali que não estava caindo aos pedaços.

 — Se Mary Morstan quisesse ter me assassinado, um tiro na cabeça teria sido mais inteligente ao invés de um estratégico tiro mal sucedido. Depois que me incapacitou, ela poderia ter matado Magnussen, mas você poderia ter levado a culpa, o que atrasou um pouquinho a execução dele. Minha morte não foi exatamente planejada.

 — Eu chamei a ambulância. Antes de você. – contara ela – Não queria que isso tivesse acontecido.

 Doía a honestidade em que ela dizia.

 John olhara a janela quebrada do flat com mesma amargura que agora olhava a livraria do outro lado da rua.

 — Tiro estratégico – murmurara, as mãos em punho. Olhos fechados.

 — Mal estratégico – corrigira Holmes, como se a gramática resolvesse a situação.

 Sem dizer nada, John partira. Virou as costas e se foi pela porta, sem se dar ao trabalho de fechá-la. Andaria sem rumo até acabar na casa de Greg, sujo pela neve e incapaz de explicar sua situação, com a imagem de Mary o seguindo pelas escadas na cabeça, dizendo que sentia muito.

 John também sentira.

 — Nunca quis que aquilo tivesse acontecido.

 Ele também não queria.

 — John, se eu pudesse voltar, eu faria tudo diferente.  

 Sem responder, ele voltara-se para os degraus e abriu a porta, novamente, sem se dar ao trabalho de fechar. 

 — Sinto muito.

 A voz dela fora abafada pelo som do vento em seus ouvidos.

 Havia remoído tudo sentado na mesa de Greg em silêncio. E percebeu que remoia novamente enquanto olhava para aquela livraria do outro lado da rua. Estava parado com olhos fixos, as pessoas ao redor se desviando dele e seguindo caminho com seus agasalhos e rostos vermelhos. Havia ido algumas vezes com Sherlock naquela livraria, antes e depois do que acontecera. Ingênuo como achava na época que tudo se resolveria com alguns livros espíritas.  

 Deu alguns passos para atravessar a rua, mas parou. O sinal ficou vermelho. Esperou com as outras pessoas, e seus olhos vaguearam ao redor, sem realmente ver alguma coisa. Quando o sinal abriu, as pessoas se foram, abrindo seu campo de visão. Parado, sabia que elas o contornavam como antes, e seguiam. Parado, seus olhos se fixavam numa pequena praça ali perto, com esqueletos de árvores e gramado cobertos de branco. Num dos bancos, seu amigo estava de pernas cruzadas como uma criança, sem o casaco ou o cachecol, olhando para o chão gelado. Estava longe, mas John sabia que o detetive não havia o visto.

 As pessoas ainda passavam por ele, e ainda estava parado lá, sem atravessar.

 Era a primeira vez que o encontrava e não o contrário. E era a primeira vez que escolheu deixá-lo.

 Atravessou a rua, e caminhou pela calçada, ficando mais e mais distante do homem na praça.

 

 

(...)


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Notas finais do capítulo

Sintam-se livres para dizer o que acharam, seja bom ou ruim. Estou um pouco incerta com esse capítulo.

Well, há algumas semanas criei uma conta no Twitter, me sigam lá, ficarei feliz em seguir todos os leitores de volta. Lá virou meu cantinho de desabafo sobre meus escritos, e postarei atualizações da fic por lá.
Até o próximo!



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