Finais quase felizes escrita por Jay Wolf


Capítulo 4
Capitulo 3 - Inconsciência




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/623537/chapter/4

– Senhor?

Dominique apareceu à margem da clareira, ainda escondida pelo capuz e segurando a cesta. Tentava controlar os tremores que afligiam seu corpo devido á proximidade ao seu príncipe, a descoberta de que ele realmente existia, ou talvez por ele estar olhando encabulado para ela.

Ela deu mais um passo à frente, e o silêncio recaiu sobre todos. Os garotos saíram da formação, e os Madra olharam aturdidos para ela. Lentamente, Dominique baixou o capuz. Ela ouviu um silvo vindo do líder dos Madra, mas não deu importância. Tudo o que conseguiu ouvir foi o arfar baixinho de seu príncipe de olhos negros.

– Você... – Ele murmurou numa voz grave e impossivelmente sensual. Ela olhou em seus olhos e sentiu que começava a perder o chão. Dominique desviou o rosto. Precisava se concentrar se quisesse salvar a vida de seu príncipe e de seus amigos.

Cuidadosamente, andou até o líder Madra.

– Oooo queee fazzzz aquiiiiii criançaaaa? – A hiena rosnou enquanto se punha em pé. Apesar dos forasteiros terem inúmeros motivos para temerem o bando de Madra que guardava a Floresta, aos filhos da floresta as hienas ofereciam respeito. Afinal, tecnicamente todos eram irmãos ali.

– Levando algumas ervas para Mama. – Ela soltou um risinho inocente e olhou docemente para ele. Tinha que ser o mais meiga possível se quisesse afastá-los do seu príncipe sem ter que lutar. É claro que poderia lutar, e até ganharia dos quatro, mas não do líder. Ele já estava na liderança à muito tempo, e por um bom motivo. E Dominique já tinha razões de sobra para não enfurecer a floresta.

– Aquelaaaaa velhaaaaa contiiiiinua fazeeendo miiiiiisturassss estrrrrrranhaaasss? – Ele a analisou com um olhar esperto. Seria difícil enganá-lo e Dominique precisava agir rápido. Discretamente, meteu a mão na cesta e começou a procurar pelo pequeno pote.

– Ela gosta. – Dominique deu de ombros. – Quem são eles? – Apontou levemente com a cabeça para os rapazes.

– Intrusoooooooos. – Silvou o Madra.

– O que vai fazer com eles?

– Saiiiiiaaaaaaa daquiiiiiiii.

– Espere... – Mas ela já estava sendo flanqueada por dois Madras. – Espere.

Ela botou a cesta no chão e tirou algo de dentro. Sorriu para o Madra á sua frente e abriu a mão.

– Durma bem. – Sussurrou e depois soprou o pó de sonhos nele. A hiena espirrou uma vez e depois caiu inconsciente no chão. Dominique rodopiou rapidamente, espalhando um pouco de pó no ar e também soprou nos outros dois atrás de si. Enquanto os observava cair, ela se curvou sobre si mesma ao mesmo tempo em que ouvia seu príncipe gritar de dor. Achava que tinha sido seu o grito, mas aquilo era apenas o eco da sua dor em seu príncipe. Ela olhou para si, mas não havia nada nem ninguém que pudesse ter causado isso. Nenhum ferimento estava à vista

Ela correu, e viu que um Madra havia atacado ele e se preparava para pular de novo. Seu príncipe tinha os punhos à frente, pronto para a briga, mas saia muito sangue de um corte na lateral de seu corpo.

Ela arquejou ao ver e sem pensar, se jogou na frente dele, colocando os braços para trás para mantê-lo afastado. Um segundo mais tarde, sentiu as mãos dele em sua cintura.

– Quando eu falar pra você virar, vire, tudo bem? – Ele sussurrou em seu ouvido, a fala entrecortada pela dor. Ela assimilava que os outros estavam gritando contra o último dos Madra, mas Dominique só conseguia sentir a presença dele e a dor que aparentemente os dois compartilhavam juntos. Ela olhou para frente trincando os dentes, e viu que a hiena se preparava para atacar.

– Um...

O animal se retesou para trás.

– Dois...

Ele rosnou e mostrou os dentes afiados para os dois.

– Três. Vire!

Dominique se virou e escondeu a cabeça em seu peito. Jogou os braços a sua volta e inspirou o cheiro másculo dele, sem se importar que um Madra estivesse para atacar os dois. Nunca se sentira tão próxima de um Civilizado e queria aproveitar aquela sensação por mais tempo.

Quando ouviu o retumbar da suave risada dele, e os braços dele afagando suas costas, ela levantou a cabeça para olhá-lo.

– O que... – Ela se virou para ver o animal inconsciente no chão. Os braços do estranho continuavam à sua volta.

– Tinha um pouquinho de pó nos seus cabelos. – Ele respondeu tocando-os. – Então eu soprei nele.

Ela abriu a boca para falar, mas não saiu som nenhum. Ele riu suavemente para ela novamente, e ela percebeu que aquele era o sorriso mais lindo que já vira. Não o cruel, dos seus sonhos. Era o feliz, que ela sempre imaginou.

– Quem é... – Ele começou.

– Ei! Uma ajudinha cairia bem aqui!

O príncipe virou a cabeça e franziu a testa.

– Uma garota 10 centímetros menor do que eu conseguiu derrotar quatro deles, e vocês dois precisam de minha ajuda para derrotar um?

Dominique ouviu alguém bufar. O príncipe não se mexeu e começou a mexer distraidamente na trança dela.

– Nós não temos um pó magico – Uma pausa, um baque surdo. – Nem a beleza dela para encantar esse bicho. – Um grito de dor, outro de guerra.

– Quatro? –Dominique sussurrou para o príncipe. – Mas foram só três. E eu nem derrotei nem nada. Só pus eles pra dormir.

– Shhhhh. – Ele virou para ela com uma piscadela. – Deixe eles pensarem que você é a heroína.

Ela revirou os olhos e tentou acalmar suas pernas e a sensação de enjoo em seu estômago. Com pesar se afastou dele e murmurou:

– Eu cuido disso.

Ela olhou o Madra de longe. Ele rosnava e atacava, ferido e com sede de vingança pelos companheiros, mesmo que não entendesse que eles estavam apenas inconscientes.

Dominique foi até sua cesta e pegou um unguento. Caminhou até o Madra, mas antes de chegar, o príncipe a segurou firmemente.

– Não. – Disse simplesmente.

– Sim. – ela retrucou gentilmente. – O Madra e eu somos filhos da floresta. Somos irmãos. Se ele se fere, eu sinto. A Floresta sente.

Então caminhou decidida para ele. O animal rosnou para ela e recuou. Dominique sentou no chão e começou a entoar uma velha canção da floresta, para que ele a reconhecesse. Abriu o pote e o mostrou ao Madra.

– Não vou machucá-lo. – Ele parou de rosnar para ela e farejou o pote, cauteloso. – Prometo que vou levá-los até o limite, e que vou avisá-los do perigo de voltar – Depois ela pôs o dedo indicador no peito, nos lábios e a na testa. – Eu prometo, irmão.

O animal andou lentamente até ela e esperou que Dominique tivesse aplicado o unguento curativo em suas feridas. Depois, mancou até onde a mata encontrava a clareira, para ir embora. Num último segundo de hesitação, virou para Dominique e falou:

– Obrigadooooooo irmaaaaaaa. – Ele olhou com ferocidade para os outros. – Cuidaddoooooo. Tireeeeee-ooooooss daquiiiiii rapidoooooooo.

E foi embora.

Passou-se um segundo de silêncio, em que Dominique se levantou e limpou o manto. Olhou para os rapazes assustados:

– Ele tem razão. Temos que sair daqui rápido, ou outros virão atrás de vocês. – Ela arquejou de dor quando uma nova pontada atingiu suas costelas. – E não podem contar nada do que aconteceu aqui a ninguém, tudo bem?

Eles estenderam os braços para ajudá-la, mas ela levantou a mão para impedi-los. Olhou firmemente para os dois, trincando os dentes por causa da dor.

– Entenderam?

Eles assentiram e Dominique correu para seu príncipe. Ele havia se arrastado e sentado em um tronco caído, apoiando as costas em outro em pé, e agora respirava com dificuldade, a mão levemente em cima do ferimento. Ela segurou seu rosto suavemente e o obrigou a olhar para ela.

– Não sei quem é você – Ela arquejou de dor – Ou porque tudo isso está acontecendo conosco, mas você precisa confiar em mim. Você confia em mim?

Ele acalmou a respiração e olhou intensamente para ela. Depois, virou o rosto e beijou a palma de sua mão.

– Mais do que você imagina. – Sussurrou.

Ela se virou para os amigos dele, e assoviou para chamar seu pássaro negro. Quando ele chegou e pousou em seu dedo, arrancando murmúrios de surpresa dos dois garotos à sua frente, ela murmurou para a ave:

– Leve-os para o limite da floresta, Blind. – Então se virou para eles. – Sigam o pássaro. Ele vai levá-los. Não voltem aqui; eu mesma vou levar seu amigo para fora. – Eles começaram a protestar e ela os interrompeu. – Não vão conseguir carregá-lo até saírem da Floresta, não com ele sangrando tanto. E não podem ficar, porque eu não posso proteger três da fúria da Floresta. Só um. Vão.

Ela os enxotou sob uma chuva de protestos, e lançou o pássaro no ar. Logo, já haviam sumido e restava só ela e seu príncipe.

Ela voltou depressa para onde ele estava, ignorando as pontadas de dor.

– Posso? – Perguntou, apontando para a camisa dele. Ele assentiu com a testa franzida e ela não duvidava em nada que a dor dele fosse muito maior que a sua. Ela rasgou sua camisa e ele a ajudou a tirar, expondo o peito musculoso e firme.

Dominique arquejou quando viu quão grave estava o corte. As garras do Madra deixaram sulcos profundos na carne branca do príncipe, e estava escorrendo muito sangue.

– Consegue andar? – Ela murmurou enquanto fazia uma compressa improvida e vasculhava em sua cesta. O príncipe segurou sua mão, impedindo-a de continuar.

– Asa. – Ele murmurou e sorriu fracamente para ela.

– O quê? – Ela falou distraída enquanto tentava fazer algo para salvar a vida dele.

– Meu nome é Asa. – Ele repetiu e pegou o rosto dela nas mãos, puxando-a para si. Agora ela prestava atenção nele.

– Dominique. – Ela respondeu no mesmo tom sôfrego dele.

– Dominique. – Ele repetiu e com um esforço supremo se inclinou até estar com os lábios a centímetros do dela. – Não vai dar tempo. Você sabe, não sabe? Você sente.

Ela assentiu. A dor estava piorando, e ela não achava que podia fazer alguma coisa pelos dois. Eles iam morrer e, numa atitude egoísta, Dominique quis passar os últimos minutos com ele, esperando. Aproveitando o que o destino estava lhe tirando, antes mesmo dela ter.

O príncipe sorriu, e naquela hora, mesmo com os olhos apáticos, a pele suada e o cabelo negro caindo sobre a testa, Dominique não achou que já tivesse visto criatura mais bonita.

– Então... – Ele falou passando os dedos nos lábios dela. – Só pro caso de não dar tempo... – Brincou.

– A gente se beija. – Ela sussurrou também chegando perto.

– A gente se beija. – Ele assentiu, e encostou delicadamente os lábios no dela. Foi um beijo suave, carregado da dor que os dois sentiam, e daquilo que não entendiam. Quando se separaram, o príncipe, num último esforço hercúleo a puxou para seu colo. Ela se sentou cuidadosamente e apoiou a cabeça em seu peito.

Estranhamente ela se sentia feliz, e aquilo era diferente de tudo o eu já sentira na vida, mesmo estando ali, esperando pacientemente o seu fim e do homem dos seus sonhos.

Fechou os olhos, sentindo a dor se alastrar pelo seu corpo e inspirou o cheiro incrível da pele dele.

Ele apertou os braços de forma protetora em volta dela.

Ele foi primeiro.

Ela depois.

E ali, na Floresta Sombria, dois estranhos, que não eram mais estranhos, mergulharam juntos para a inconsciência.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Finais quase felizes" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.