Diga Adeus à Inocência escrita por Mahfics


Capítulo 8
Capítulo 7




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Estamos deitados, jogo minha perna em cima de sua cintura e deito a cabeça em seu ombro. Descubro que ele tem uma tatuagem de diamante no pescoço.

– Quando começa as suas aulas? – ele murmura.

– Junto com a sua. – falo, óbvia.

Posso senti-lo revirar os olhos.

Continuamos em silêncio. Ele acaricia levemente minha coxa e suspira, aproximo-me mais de seu pescoço e beijo a tatuagem de diamante, sua pele se arrepia e ele sorri de lado.

– Que tipo de relação nós temos? – ele sussurra.

Sinto um aperto no peito.

– Não temos. – sussurro.

– Por que não?

– Porque ela será efêmera. –murmuro.

– O que quer insinuar com isso? – ele ajeita o corpo sob o meu.

– Que não teríamos algo concreto e saudável – explico -, você não sabe o que é ter algo comigo, será trocado pelos estudos, não vou sair com você e tampouco te ligar, não terei ciúmes de você e não vou te atender quando você me ligar bêbado e chorando, serei fria e indiferente, vou começar a te esquecer até o dia que apagarei seu número do meu telefone, você vai aparecer na minha casa e não vou te atender, irá insistir, então ligarei para a polícia falando que há um louco me perseguindo, você irá se tocar que não existe mais “nós” e sim “eu e você”, em mundos diferentes, vidas distintas e sem amor, porque nunca houve amor.

– Primeiro namorado? – ele ergue uma sobrancelha.

– O quê? – franzo o cenho.

– Você explicou como se estivesse relembrando uma relação passada. – ele deduz.

Suspiro.

– Não importa – dou de ombros -, acontece que é assim que os relacionamentos são.

– Só se for os seus – ele rebate -, o meu tem muito mais vida, amor e claro, sexo.

– Não podemos só continuar o que estamos fazendo? – tento cortar o assunto – Ficamos e pronto, sem nada sério.

Ele não diz nada.

– Diga alguma coisa. – peço.

– Não sei o que achar de você. – ele murmura.

– Como assim?

– Existem dois tipos de meninas: virgens e putas – ele se mexe, parece até desconfortável -, sempre que conheço uma menina, sei de qual dos grupos ela pertence, mas você, é como se fosse uma exceção, não sei de qual grupo você é.

Sorrio.

– Sempre existe uma exceção. – sussurro perto de seu ouvido.

Posso sentir seu sorriso.

– Que bela exceção. – ele fala e posso até arriscar que ele foi irônico.

Viro o seu rosto, fazendo-o me encarar.

– Chega de falar besteira. – murmuro e beijo-o.

Sim, gosto de Malic, porém, o momento não é favorável para a construção de um relacionamento, não sou o tipo de pessoa apta para isso e muito menos ele. É muito melhor manter no ritmo que estamos do que forçar algo a mais. É muito cedo, não faz nem um mês que eu o conheço.

***

As semanas passaram rápido e os encontros de minha vó com o seu namoradinho se tornaram mais frequentes do que eu esperava, ele está praticamente roubando a minha avó. Cada dia que passa o início da faculdade fica mais perto do que desejo, faço os últimos ajustes que preciso e compro os materiais necessário para o curso; um caderno e uma caneta. A única coisa que desejo é ser mais sociável na faculdade do que fui no colégio, ampliar os horizontes das amizades.

Não conversei mais com o Malic depois eu ele veio aqui, acho que acabei o afastando quando falei que não queria nada com ele, sempre achei que era isso que um cara sempre quis ouvir de uma menina. Respiro fundo. Por que ele fica fazendo isso comigo? Me deixa tão confusa e frustrada. Por um lado acho que foi bom ter falado a verdade logo, assim evitei brigas e decepções futuras, mas sinto que doeu do mesmo jeito.

– Estou saindo. – vovó avisa.

– Não estou gostando disso. – resmungo – Você sai todo dia, não tem mais tempo pra mim, não faz mais nada aqui. Você nem fez almoço! Sabe o que é isso?! Me deixou com fome! Que tipo de vó você é?!

– Sou uma vó moderna, curtindo o tempo perdido. – ela sorri – Você tem carro e dinheiro, vá comer na cidade.

Reviro os olhos. Resposta pra tudo...

– Vai logo, não te quero aqui. – expulso-a de casa.

Pego a chave de meu carro e saio, tranco a casa e entro no carro. Vai ser bom sair um pouco de casa.

Vou para cidade. Como era de se esperar, ela está bem movimentada por jovens, as casas que estavam para alugar agora estão todas ocupadas por estudantes, assim como as republicas lotadas. Finalmente isso aqui está ganhando vida.

Para enfrente a uma lanchonete e pego minha carteira. Sento nas mesas do lado de fora e leio o cardápio. Acho que vou pedir um x-salada sem queijo, os queijos que as lanchonetes usam são enjoativos e sempre vem em maior quantidade que o resto dos ingredientes. Ergo a mão para chamar um garçom.

Distraidamente olho para frente e sou surpreendida quando noto quem está sentado na mesa à frente da minha: aquele tal de Matthew. Sinto um aperto no peito e quase caio da cadeira. Ele me encara. Arregalo os olhos e pego o cardápio novamente, desviando o olhar.

Vá embora, vá embora.

Uma sombra escurece minha vista em relação ao cardápio, ergo o olhar e encontro os olhos verdes. Suprimo um grito e forço um sorrio.

– Queria pedir desculpa. – ele fala, de um jeito mecânico.

– Pelo o que? – limpo a garganta.

– Pela trilha, acho que te assustei. – ele senta.

– Não foi nada. – sorrio amarelo – Primeiras impressões nem sempre são boas.

Nem segundas...

– De qualquer forma, desculpe. – ele me encara, de uma forma vidrada e penetrante.

– Está desculpado. – minhas mãos soam frio. Você já pode ir embora, vai logo, sai daqui!

– Vai estudar na federal? – ele puxa assunto.

– Sim e você?

– Não estudo. – ele dá um sorriso tímido – Vou fazer um curso lá.

– Qual curso? – inclino a cabeça.

– Anatomia. – ele fala – Adoro o corpo humano, mais especificamente por dentro.

– É fascinante. – concordo.

– É nova na cidade? – ele olha rapidamente para rua quando passa um carro com o som alto.

– Depende – observo o carro passar -, sempre vim aqui quando era pequena. E você?

– Mais ou menos, cheguei faz uns três meses. – ele volta a me encarar – Quando consegui vaga para o curso, eu morava com a minha mãe na cidade e sempre odiei cidades pequenas.

– É muita diferença – comento-, pra quem estava acostumado com a cidade, mas não difícil de se adaptar.

– Não é nem por causa disso – ele dá um sorrio fraco -, aqui as pessoas ficam sabendo de tudo muito rápido, todos conhecem todos, você fica falado e notado do dia para a noite.

– Sim, mas se você não fizer nada errado, não tem com o que se preocupar.

– Ah, por favor, estamos na idade de fazer tudo errado. – ele sorri.

É estranho reparar nisso, mas sou assim desde pequena, sempre reparo no sorriso das pessoas e Matthew tem um sorriso lindo.

Sorrio.

– Exato, mas sempre com moderação. – olho para o cardápio e lembro que tenho que pedir o lanche, ergo a mão mais uma vez.

– Deixou algum namorado na cidade? – ele apoia a cabeça na mão.

– Não deixei ninguém especial e você? – olho para dentro do estabelecimento, procurando por um garçom.

– Nunca namorei. – ele confessa.

Acho um garçom, aceno e encaro Matthew. Nunca namorou?

– Mas já ficou, certo? – abaixo a mão.

– Ah sim, mas nunca quis ter nada sério. – ele dá de ombros – Relacionamentos são... São... Bom, não sei o que falar, são relacionamentos.

Rio.

O garçom finalmente chega, peço o meu lanche e Matthew pede um suco de laranja.

– Você não pretende fazer faculdade? – pergunto.

– Meu pai tem uma serralheria, pretendo assumir o negócio. – ele fala indiferente – Além do mais, não sei o que quero fazer.

– A maioria dos adolescentes não sabem o que fazer. – complemento.

– É que não acreditamos que ficamos velhos, sempre achei que seria criança para sempre e meus pais seriam meus pais para sempre. – ele sorri – Mas eles iram morrer um dia e eu iriei virar pai.

– Esse é o ciclo. – desenho um círculo mentalmente na mesa.

– Onde estão os seus pais? Digo, você tem pais?

Sorrio.

– É claro que tenho pais. – encaro-o – Estão na cidade, eles não mudariam suas vidas para vir morar em uma cidade pequena por causa da minha faculdade e tenho minha avó aqui, não preciso deles.

– Uma menina independente. – ele comenta – Que coisa mais comum.

Franzo o cenho.

– Todas as mulheres são independentes. – ele explica.

– Claro que não! – me exalto – Ainda existem mulheres que dependem dos maridos para viver e eu acho isso um absurdo, viver na submissão.

– Não – ele levanta -, estamos no século XXI, poucas mulheres são dependentes dos maridos. Aceite, você é só mais uma.

Ele sai, caminha tranquilamente pela calçada e dobra a esquina. Franzo o cenho e sou surpreendida pelo garçom com os pedidos. Matthew esqueceu o suco...

Pego o meu lanche e dou uma mordida, olho distraidamente para a rua e observo o movimento. Um mustang vermelho passa e chama a atenção de todos que estão por perto. Aposto que é um velho que está dirigindo, só eles têm o dinheiro necessário para comprar um carro nesse porte depois de uma vida de trabalho – em um bom emprego. Os vidros estão abertos.

O banco do carona está ocupado por uma garota e do motorista está ocupado por Malic. Um bolo se forma em meu estômago, subitamente perco a vontade de comer. A cena parece passar em câmera lenta diante de mim, só para eu ter o privilégio de aprecia-la ainda mais.

Só mais uma.

Pego o copo do suco de laranja, dou um longo gole e engasgo com o gosto azedo. Meus olhos lacrimejam e não sei diferenciar as lagrimas do engasgo das lagrimas de decepção. Ergo a mão novamente e peço para o garçom embrulhar o meu lanche, termino de tomar o suco, pago e volto para o carro.

Encaro a direção entorpecida. Acho que eu me mataria agora se tivesse perdido minha virgindade com ele, já estaria me jogando da ponte. Não sei porque estão tão surpreendida, não queria nada com ele, nunca quis nada com ele, ninguém quer que eu tenha algo com ele. Mas a verdade é que eu não queria nada com ele para não me decepcionar depois e isso acabou acontecendo e doeu do mesmo jeito. Ligo o carro e volto para casa.

Minha vó parece não ter chego ainda, talvez ela chegue só a noite. Largo a comida na geladeira e vou para o quarto, deito na cama e abraço minha almofada de flor. Suspiro. Preciso sofrer um pouco para melhorar.

Durmo.

Acordo com algo gelado tocando meu ombro, levo um sobressalto e olho para o lado, vejo uma silhueta negra. Meu corpo fica mole e não consigo gritar.

– Sou eu. – minha vó sussurra.

Coloco a mão no peito.

– Quantas vezes tenho que pedir para não me assustar? – ofego.

– Desculpa – ela parece sorrir -, o jantar está na mesa.

Passo a mão no rosto e faço um coque no meu cabelo. Saio da cama e desço a escada logo atrás dela. A televisão está ligada na novela e posso sentir o cheiro da comida.

Sento à mesa e sirvo-me, ela pega os copos e o refrigerante.

– Como foi? – pergunto e depois dou uma garfada na comida.

– Foi normal. – ela dá de ombros – Almoçamos e depois fomos assistir um filme no cinema, e não me pergunte o nome porque eu não sei e também não gostei muito da história. Depois paramos em um café e comemos bolo, passeamos na praça e observamos o show de luzes da fonte, a cidade está cheia! Então pedi para ele me trazer, quando fui desce do carro me dei a ousadia de lhe dar um selinho.

– Hm... – continuo encarando meu prato.

Minha vó deve estar falando mais alguma coisa, mas não adianta em começar a prestar atenção agora, vou me perder e não vou entender nada, é melhor continuar onde estou. No que eu estava pensando? Suspiro. Estou muito distraída, tenho que começar a prestar atenção. Prestar atenção... Isso me lembra o almoço, Matthew pareceu ser a pessoa mais estranha do mundo, mas ele só é sincero... Só mais uma. Aperto o garfo e trinco o maxilar. Sinceridade é tudo – como eu gostaria de não ser nada no momento.

– .... Então o velho quase atropelou a velha na frente dele. – vovó ri.

– Hm.

A suposta graça some e ela fica séria.

– Aconteceu alguma coisa com você? – ela pergunta.

– O que? – desperto e encaro-a – Claro que não! Estou bem.

– Não minta pra mim. – ela insisti.

– Não estou mentindo. – minto – Só estou ansiosa pra amanhã.

Ela não diz nada, apenas volta a comer. Terminamos o jantar em silêncio.

Coloco minha louça na pia e invento qualquer coisa para ir pro quarto. Assim que entro, tranco a porta e abro a janela da frente. Deito na cama e encaro o teto.

Não, não, não, não, não Bianca! Você não está gostando dele!


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