A monotonia devia ser algo contagiante, ela andava muito presente nestes dias meus, mas eu tentava fugir dela. Ouvia-se o trem, que logo chegaria na estação; misturado a ele, o som dos veículos que passavam lá perto também era notado. O céu manchava-se de azul escuro, causando o que eu gostava de chamar de "espetáculo", olhando para o alto, ao anoitecer, sempre era possível contemplar uma obra-prima, as luzes artificiais já tomavam lugar na noite, e as folhas das árvores balançavam com a brisa, meus cabelos escuros e longos juntavam-se a elas. Creio eu que as pessoas são feitas de histórias, por isso, eu tentava imaginar uma para cada desconhecido a minha volta, era interessante. O trem logo chegaria, mas eu estava distante, distante como sempre, naquele mundo imaginário que eu criei há muito, e que se tornou meu refúgio da realidade. Ainda era possível ouvir os carros passando. O trem chegou e se foi, mas eu não embarquei.

"Vou-me com a música no coração

E uma caneta na mão,

Ainda escreverei uma canção."

Caro(a) leitor(a), andei pensando, antes mesmo de finalizar esse registro, em como seria interessante, até mesmo curioso, passar por você na rua, ou cruzar contigo em algum lugar, eu, obviamente, não saberia quem é, nem acredito que você vá me reconhecer, mas imagino como será andar na rua pensando: " esta pessoa pode estar com o caderno da Peregrina" . Oh, não! Não peço um encontro com sua pessoa, nem um modo de me avisar que você está com o caderno, ele é propriedade sua agora, e poder me dar o prazer de imaginar o que acontecerá sem nunca saber se é a verdade, é, ao mesmo tempo, uma tortura e uma dádiva. Você não me encontrará por aí, nem recomendaria isso; mas se algum dia se pegar pensando na Peregrina, e em como ela devia ser, dou-te a liberdade de fantasia-la por si só, a Peregrina é mistério até pra mim, e depende de você desvendá-lo.