Três vidas inteiras escrita por Blue Butterfly


Capítulo 6
Seis


Notas iniciais do capítulo

Por causa de um problema no site, na hora de atualizar, o capítulo foi postado várias vezes. Peço desculpa pelo transtorno, principalmente porque vocês devem ter recebido vários e-mails. Espero que isso não tenha, também, atrapalhado a leitura de vocês.

Sete mil palavras? =O Presente de domingo, espero que vocês gostem. ^^



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'Você tá parecendo péssima.' Jane disse sem medir as palavras. Elas estavam no apartamento de Frankie. O irmão estava orgulhoso da nova conquista e sempre que tinham tempo livre depois do trabalho, ele convidava as duas para passar um tempo lá. Nas reuniões eles assistiam jogos e na maior parte do tempo jogavam conversa fora.

Maura fez uma careta fingindo estar ofendida. Ela realmente estaria se não conhecesse Jane o suficiente. 'Você também não está no seu melhor look, Jane.' Ela passou as mãos no vestido, desamassando as rugas que só existiam em sua imaginação.

'Não... O que eu quero dizer é que nós não deveríamos ter ido naquele restaurante ontem a noite. Agora você tá, o que, gripada?'

Maura parecia extremamente cansada e o seu nariz não parava de escorrer. Ela revirou os olhos e fez um som de reprovação. 'Isso não é sério, você sabe. E eu duvido que tomar um ar gelado tenha sido a razão de um resfriado. Já moro em Boston há tempos, caso tenha se esquecido, e nunca fiquei doente por conta do frio antes.' Ela rebateu e encostou as costas no sofá, a conversa sendo suspensa por um instante enquanto ela espirrava.

Jane arqueou as sobrancelhas e devolveu. 'Vai ver é que você está ficando velha, então.' Ela provocou e sorriu com o canto da boca, e Maura sem perder tempo chutou sua canela.

'Eu sou um ano mais nova que você, Jane Clementine Rizzoli!' Ela se defendeu.

Jane, derrotada, deixou a discussão de lado e esticou o braço para o irmão, que estava agora lhe oferecendo uma cerveja. 'Obrigada, Frankie.'

'Não se acostuma, você não é nenhuma visita, Jane. Da próxima vez pode levantar tua bunda e pegar sua própria bebida.' Ele sorriu em provocação e depois se virou para a médica. 'Menos você. Eu faço questão de te servir, Maura.' Ele esticou a taça de vinho em sua direção.

Ela hesitou por um minuto e lançou um olhar para Jane, um que não passou despercebido.

'Há algo de errado?' Frankie franziu o cenho e a estudou.

Ela não tinha certeza se vinho era uma boa escolha. Ela lera sobre mulheres que mesmo grávidas continuavam a ingerir a bebida, ainda que em pouca quantidade. Ainda assim, ela não achava sábio. Não é como se ela estivesse pensando no bebê, afinal ela ainda não se decidira, mas... Sim, ela também tinha que considerá-lo. Ela suspirou e olhou para Frankie de novo.

'Eu não sei se eu devo.' Ela abaixou os olhos e depois olhou para Jane, pedindo ajuda.

'Você sabe, Frankie. Ela está gripada, tomando remédios, dizem que não é bom misturar álcool com eles.' Jane disse sem hesitar na mentira.

'Oh. Certo. Não se preocupa, Maura. Você não precisa beber.' Ele sorriu e depositou a taça na mesa, sem insistir muito.

A médica sorriu agradecida e se ajeitou no sofá, ainda incomodada.

'Ok... E então, Frankie? Como foi seu encontro do final de semana?' A morena mudou logo de assunto e ergueu uma sobrancelha para o irmão. Ele não perdeu o tom de malícia na voz.

'O quê? Como é que você sabe disso?' Ele tentou desviar o assunto.

'Ah qual é! Não é como se a sua mãe não fosse a minha também!' Jane disse irritada e Maura riu levemente.

'Por que tanto mistério?' A médica perguntou para ele.

'Não é nada demais. Quer dizer... Ela é bonita e legal... Mas não sei, não.' E o sorriso bobo nos lábios dele fez Jane revirar os olhos.

'Argh... Você sai apenas uma vez com ela e já se apaixona? Qual é!' E ela riu enquanto levava a cerveja na boca.

'Hey, pelo menos eu estou saindo com alguém. E você?' Ele tacou uma almofada nela, e ela precisou se desviar para que não fosse acertada no rosto.

'Eu saio todas as noites.' Ela rebateu.

Ele ergueu as sobrancelhas em desafio.

'Com a Maura!' E Jane riu, não percebendo a implicância do que tinha acabado de dizer.

'Ah, tá. Muito justo.' Ele respondeu sarcasticamente e depois lançou um olhar de Jane para Maura que a morena não soube decifrar.

A detetive então lançou um olhar para a médica que estava excepcionalmente quieta. Ela tinha encostado a cabeça no sofá e estava com um sorriso leve nos lábios, os olhos pequenos por causa do sono.

'Olha como ele é invejoso, Maura.' Ela bateu carinhosamente o cotovelo no braço da loira e ela riu suavemente.

'Quer saber? Eu não vou comprar essa briga.' Ele apontou um dedo para ela no mesmo tempo em que ligava a televisão. Um jogo de baseball estava no ar e embora nenhum deles fossem realmente assistir, ele deixou o aparelho ligado. 'Por que mesmo Korsak não pôde vir?' Ele se virou para Jane de novo e tomou mais um gole de cerveja.

'Kiki.' Ela respondeu naturalmente, dando de ombros. O homem tinha um encontro com a mulher de que há tanto tempo vinha falando. Jane se virou novamente para conferir Maura. Elas trocaram um sorriso singelo, e a julgar pela situação da loira, Jane sabia que ela não aguentaria ficar mais outra hora acordada. Ela teria tempo para terminar mais uma cerveja, duas no máximo. Ela pousou a mão no joelho da outra, que não se incomodou com o toque, e acariciou levemente.

Frankie observou as duas e tomou outro gole. 'Aparentemente eu não sou o único envolvido com alguém aqui.'

Jane riu baixinho. 'Você sabe, Frankie, você não é o único permitido a namorar alguém.' Jane sorriu e tomou um gole da própria cerveja.

'É claro que não.' Ele concordou e de Jane olhou para Maura, e depois de novo para a irmã. 'As pessoas são livres para se relacionarem com quem elas quiserem.' Ele disse em simpatia.

Jane franziu o rosto. 'Ok. O que há de errado com você hoje?' Ela perguntou, estranhando a atitude do irmão que passara a ser muito séria.

'Nada!' Ele se defendeu e ergue as mãos. 'Nada de errado, eu só estou falando.'

'Jane, deixa de ser implicante.' Maura murmurou do seu lado.

Ela se virou, de queixo caído, e dramaticamente perguntou, 'De que lado você está?'

'Do seu.' A loira respondeu, desanimada, sem forças para comprar uma pequena discussão que fosse.

As provocações entre os irmãos continuaram por volta de trinta minutos, e quando Jane finalizou a última cerveja, ela depositou a garrafa vazia em cima da mesa e se levantou.

'Frankie, nós precisamos ir.'

Maura tomou a deixa e se levantou também. 'Obrigada pelo convite, foi uma noite agradável.' Ela sorriu educadamente e pegou o casaco.

'Vocês podem aparecer aqui amanhã de novo, isso é, se a Jane trazer a própria cerveja, porque ela acabou com a minha.'

'Cala a boca, idiota.' A morena rebateu enquanto ajudava Maura a colocar o casaco. 'Eu nunca reclamo quando você bebe as minhas em casa.' Ela acrescentou, colocando a mão nas costas da loira.

'Se cuida, Maura, e melhoras.' O moreno disse enquanto segurava a porta.

'Você também, Frankie. E obrigada.' A médica sorriu e olhou para Jane, aguardando-a.

'Te vejo amanhã. Babaca.' Ela provocou e escapou do alcance dele antes que um soco atingisse seu braço.

E antes que sumisse pelo corredor, Jane virou a cabeça para trás e sorriu para o irmão. Era o seu jeito de dizer que apreciava a companhia dele, e que apesar das provocações, estava tudo bem entre os dois. Ele sorriu de volta e acenou uma última vez com a mão. A morena imitou o gesto e logo se virou para frente novamente, devolvendo a mão nas costas da loira, acariciando delicadamente. Elas sumiram ao dobrarem o corredor. Frankie encostou a porta refletindo sobre o que aquele singelo gesto entre elas significava.

...

Depois do dia em que Maura pedira para Jane ficar com ela no quarto, no mesmo dia em que dormiram abraçadas, a morena passara todas as noites na casa da médica. Aquele dia sendo a única exceção, ela estava dormindo no quarto de hóspedes. Nenhuma delas tinham tocado no assunto no dia anterior. Nenhuma delas, tão pouco, tinha ficado constrangida com o acontecido. Parecia natural, necessário... mas não comum. Foi por isso que Jane, na noite seguinte, tinha decidido por se deitar no outro quarto. Nada havia mudado entre elas, pelo contrário. Jane se sentia mais inclinada a prestar-lhe atenção, cuidados. Na parte da manhã era ela quem levantava mais cedo e preparava o café. Maura estava agora levantando mais tarde, talvez por causa da fatiga causada pela gestação. Nessa manhã, como em todas as outras, ela estava sozinha na cozinha, encarando Bass enquanto esperava a água para o café e chá ferver. Ela escutou movimento vindo do corredor e logo encontrou a figura de Maura fazendo a aparição na cozinha.

Se no dia anterior a médica parecia cansada, nessa manhã ela parecia miserável. Jane tinha certeza de que nunca vira a mulher tão abatida, parecendo ainda menor em seu pijama de seda dourado. Em alerta, ela corrigiu a postura e se aproximou da mulher.

'Maur, você tá bem?'

'É só esse resfriado inconveniente.' Ela reclamou e fungou. 'Já é hora de levantar? Eu estou com sede.' Ela disse e se desviou de Jane, pegando um copo e enchendo-o com água.

'Bem... Não exatamente.' A morena observou enquanto a outra bebia o líquido. Maura era estranha às vezes. 'Você tem certeza de que quer ir trabalhar? Você parece doente.'

'Eu não estou doente, Jane.' A loira disse com certa irritação na voz. Ela se virou e lançou um olhar para Jane, desafiando a morena a contradizer-lhe.

'Certo...' Jane estudou as bochechas rosadas da mulher, os olhos cansados e a respiração que parecia pesada demais. 'O café ainda não está pronto, então... Talvez você queria tomar um banho e se trocar enquanto eu termino aqui?'

'Vou fazer isso.' Ela disse sem muita convicção e deixou a cozinha.

Jane observou silenciosamente enquanto a médica partia. Ela nunca vira Maura doente, nem mesmo com a mais fraca gripe. Tê-la nesse estado era algo completamente novo, e embora ela alegasse não estar doente, a detetive tinha esse título por merecimento. Os sintomas estavam todos ali, se mostrando, e ela achava que Maura estava prestes a se mostrar uma péssima paciente. Chacoalhando a cabeça para dispensar os pensamentos, ela se virou e desligou o fogo. Depois de preparar o café, ela serviu-se uma xícara e tomou sem pressa. Decidindo que já era hora de se trocar, ela serviu uma caneca de chá para Maura e subiu com ela no andar de cima. Ela bateu na porta da loira e entrou quando escutou a voz da outra dando-lhe permissão.

Maura estava sentada na cama. Ela havia tomado um banho mas estava vestindo outro pijama. Jane estreitou os olhos enquanto lhe entregava a caneca.

A loira abaixou os olhos, interessa demais no líquido ali dentro. 'Eu resolvi que vou trabalhar em casa hoje.' Ela disse, quase envergonhada.

'Tudo bem, Maur. Você tá doente, não tem problema tirar um ou dois dias de folga.' Jane tentou tranquilizá-la.

'Eu não estou doente, só um pouco indisposta.' Ela teimou e lançou um olhar que esperou ser afiado.

Jane sorriu. Maura era teimosa, e fofa. 'Certo, indisposta.' Ela trocou o peso de um pé para outro. 'Nesse caso... Vou avisar que não vou também. Não é como se eu tivesse muita coisa para fazer lá hoje. Só papelada que pode esperar.'

'Não.' Maura disse com firmeza. 'Você não precisa ficar por minha causa.'

Jane abriu um sorriso carregado de sarcasmo. 'Quem disse que é por sua causa? É por causa da gripe que você me passou.'

Maura arregalou os olhos, se sentindo culpada. Tardiamente ela percebeu a mentira. 'Não é engraçado, Jane.'

'Não, não é.' A morena concordou e sorriu para ela. 'Me deixa eu te fazer companhia?'

'A não ser que você queira ficar nesse estado, eu aconselho manter uma distância.' Ela disse e se deitou na cama, puxando a coberta para cima de si.

Jane revirou os olhos. 'Ok. Eu vou arrumar algo para fazer também. Venho te checar mais tarde. Dormir vai te fazer bem, de qualquer forma. Minha mãe diz que a forma mais rápida do corpo se curar é o descanso.'

'Eu não estou doente!' Maura insistiu e se encolheu na cama.

'Certo, só indisposta.' Jane economizou no sarcasmo porque provocar uma Maura doente não parecia seguro. 'Descanse.' Ela disse antes de sair e encostar a porta do quarto.

Jane fez a ligação para a delegacia dizendo que não iriam trabalhar ela, nem Maura. Depois de conversar com Cavanaugh, ela se acomodou no sofá e abriu o laptop, leu um email recente sobre o caso que estava fechando, e terminou de digitar o relatório referente à ele. Com a papelada do dia feita - o que nem era muita coisa - ela fechou o aparelho e ligou a tv. Era cedo demais e ela poderia aproveitar enquanto Maura estava dormindo para passar no mercado e comprar algo para o almoço. Ela mandou uma mensagem de texto para a mãe, perguntando sobre o melhor prato para oferecer para a loira. Sopa era a resposta esperada, óbvia. Tão logo a mãe lhe enviou a lista com os ingredientes, Jane saiu com o carro para o mercado mais próximo.

Ela comprou cada item com atenção, escolhendo os vegetais com exigência. Apenas os mais bonitos iriam para a cesta. Quando terminou de pegar o que precisava, pagou pelos produtos e voltou para casa. Uma hora e meia depois, alguns palavrões e um corte no dedo, aquilo que esperava ser uma sopa deliciosa o suficiente para Maura, estava fumaçando de dentro da panela. Cheirava bem, ela tinha que reconhecer, e quando provou, precisou colocar a modéstia de lado e classificar a sopa como a melhor refeição que já preparara. Na vida inteira.

Sorrindo, ela serviu um prato e pegou uma colher, decidida a acordar Maura caso ainda estivesse dormindo, para fazê-la experimentar sua nova receita. Ela jamais contaria que fora instruída pela mãe. Ela entrou silenciosamente no quarto da mulher, e descansou o prato sobre a mesa de cabeceira. Maura ainda dormia tranquilamente. Jane relou em seu braço para chacoalhá-la gentilmente, e sentiu que a temperatura de seu corpo estava ligeiramente mais quente do que o normal. Ela estava com febre. Uma febre baixa, mas Jane não gostou disso. Ela suspirou e chamou pela loira.

Maura se remexeu e se virou para ela, depois abriu os olhos preguiçosamente.

'Oi.' Jane disse enquanto acariciava seu ombro. 'Eu fiz uma sopa para você, Maur. Você precisa comer.'

'É muito cedo.' Ela resmungou e fechou os olhos novamente.

'Não, não é. É quase meio dia.'

'Não, não é.' Ela teimou, imitando Jane no mesmo tom.

A morena revirou os olhos mas não estava realmente irritada. Ela pressionou levemente o dorso da mão na bochecha rosada da outra. Suspirando ao sentir o rosto tão quente quanto o braço, ela insistiu.

'Apenas algumas colheradas?'

'E você me deixa dormir de novo?' Ela perguntou a contragosto.

'O quanto você quiser.' Jane tentou o acordo. Para seu alívio, a loira se sentou sozinha na cama e esperou enquanto ela depositava o prato em seu colo, por cima das cobertas.

Maura segurou a colher e experimentou a sopa. A princípio ela nada comentou, mas conforme ia mastigando o conteúdo, franzia a testa.

'Qual é, eu experimentei. Tá uma delícia!' Jane se defendeu. Ela tinha certeza que tinha ficado bom, ela não comeria aquilo caso contrário.

'Meu nariz está congestionado e eu não consigo sentir o gosto direito.' A mulher explicou sem muita convicção.

'Oh, ok.' Jane achou melhor não discutir. Ela esperou calmamente enquanto Maura comia, e quando a mulher balançou a cabeça e lhe entregou o prato ainda pela metade, ela sabia melhor do que insistir. 'Você tá com febre.' Ela disse baixinho.

'Eu sei.' Maura respondeu e abaixou o olhar.

'Você quer que eu te leve no médico?' Jane se remexeu na cama, ansiosa por causa do estado da loira.

Maura inclinou a cabeça para o lado e apertou os lábios numa linha fina. 'Eu sou médica, Jane. Além disso, isso é só uma febre. Tudo o que eu preciso é de um Paracetamol.'

'Você tá grávida.' Ela disparou sem pensar, e embora os olhos de Maura se abriram ligeiramente, ela continuou. 'Você deveria tomar remédios? Quer dizer... Isso não pode, não sei... Fazer mal? E, eu não sei... Seria melhor se outro médico checasse você, você não acha? Só para ter certeza?' As mãos esfregavam uma na outra em nervosismo, e ela parecia constrangida por causa do seu excesso de preocupação.

'Jane...' Maura se inclinou para frente e segurou uma de suas mãos entre a sua. 'É só um resfriado. Paracetamol é um remédio que pode ser ingerido mesmo na gravidez, desde que seja por poucas doses.' Ela abriu um sorriso e segurou o olhar de Jane. Ela já se sentia culpada demais por Jane ter passado a manhã em casa por conta dela, ter cozinhado para ela... E agora se sentia mal por Jane estar ali, toda preocupada com sua saúde... e o feto que estava crescendo dentro de si. Ela suspirou e apertou a mão de Jane antes de soltar. 'Prometo que se eu não melhorar até a noite, eu deixo você me levar no hospital.'

'Certo.' Jane esfregou as mãos abertas lentamente uma na outra, agora em pensamento. 'Você quer dormir, certo? Eu vou... Bem, vou deixar você descansar.'

Jane estava prestes a se levantar quando Maura disse, 'Não.'

A morena lançou a cabeça em sua direção. 'Achei que você queria...'

'Bem...' Ela queria, mas ao mesmo tempo ela queria estar com Jane, queria arrancar a aflição que visivelmente estava abatendo a morena. Não era justo que ela ficasse o dia inteiro na cama dormindo, inconsciente de qualquer evento e manifestações de sentimentos, enquanto Jane estaria acordada, provavelmente se contorcendo de preocupação por causa dela. 'Eu já dormi o suficiente. Que tal se assistirmos um filme lá em baixo?'

O rosto da morena pareceu se iluminar um pouco mais. 'Nós podemos ver O lobo de Wall Street.' Ela disse animada.

Maura, ao contrário, não pareceu comprar a idéia.

'Ah, qual é! É um filme ótimo, sem contar as partes engraçadas.' Ela motivou a loira.

'Ok. Ok.' Maura se rendeu e jogou as cobertas para o lado, e em seguida seus pés calçados de meia encontraram o chão.

Jane se certificou de que Maura tinha tomado o remédio - porque a loira fechou a cara quando o comprimido lhe foi oferecido - e só então ela se acomodaram no sofá. Elas se sentaram lado a lado e Jane jogou uma coberta em cima das duas. A morena tinha comprado o filme algum tempo atrás, mas elas nunca tiveram a oportunidade - ou vontade, no caso de Maura - de vê-lo. Entretanto, esse dia parecia ser apropriado para isso. Maura não estava no melhor estado de argumentação, o que fez com que Jane ganhasse em sua escolha logo. A primeira hora pareceu passar rápido, arrancando risada das duas. Maura acrescentava fatos curiosos que foram diminuindo com a passagem do tempo. Na metade do filme, a loira estava em completo silêncio, e por um olhar furtivo Jane notou que ela ainda parecia cansada. Decidindo não dizer nada, a morena voltou a atenção para a TV, esperando que o remédio fizesse efeito logo. Alguns minutos depois ela sentiu a cabeça da loira pousar delicadamente no seu ombro. Ela apenas abriu um sorriso, sabendo que Maura tinha mais uma vez cedido ao sono. Ela esperou até que a respiração da outra estivesse calma o suficiente para só então se mover. Passando o mesmo braço por trás das costas da loira, ela tinha intenção de deitar Maura no sofá. O gesto mal pensado, porém, fez apenas com que a cabeça da mulher descansasse contra seu peito.

O que ela iria fazer agora? Ela não queria acordar a mulher, que parecia estar precisando do descanso. Ela se debateu em pensamento... Por que não só deixá-la ali, em seus braços? Era uma opção razoável. Ela se encostou novamente no sofá e abraçou a cintura da loira, que suspirou em seu sono e encostou a testa no seu pescoço. Maura ainda estava quente, e Jane precisou se livrar da coberta sobre si para não ficar com calor. Por mais de uma hora a morena manteve seu braço em volta dela, guardando seu sono e checando sua temperatura. O filme já tinha acabado e ela estava passando por canais de esportes e notícias, e Maura continuava profundamente dormindo, aninhada em seu abraço. Jane não se importou, ela preferia ter Maura por perto, era tão mais fácil cuidar dela assim. Agora, por exemplo, ela já sabia que a febre tinha diminuído significativamente, talvez nem existisse mais. Isso a deixava tranquila e feliz, e os dedos de Maura sobre sua barriga ora contraindo, ora apertando em sua pele não tinha nada a ver com isso. Talvez, um pouquinho.

Ela deveria se sentir culpada por isso? Ela deveria se sentir mal por estar gostando de poder abraçá-la assim? Incomodada com a onda de pensamentos duvidosos, ela abandonou o controle remoto em cima do sofá e deslizou a mão no braço da loira.

'Maura?' Ela chamou, a voz rouca e grave. A loira franziu as sobrancelhas e inclinou a cabeça para ela, sem nem mesmo se afastar dali. Jane abriu um sorriso; Maura era fofa. 'O que você achou do final do filme?'

'Hm...' Ela franziu o nariz. 'Previsível.'

Jane riu, tentando não chacoalhar o peito. 'Mesmo? Bem, eu não previ que o personagem principal era um vampiro mortal da era medieval que caçava lobisomens durante essa Revolução Francesa.' Ela observou enquanto a loira franzia mais uma vez o cenho.

'Historicamente incorreto.' Ela murmurou.

Jane não resistiu e plantou um beijo em sua testa. 'Maura, querida, você precisa acordar.' Ela disse sorrindo, acariciando a bochecha da outra.

'Hm.' A médica resmungou demoradamente e depois abriu os olhos. Quando se localizou, ela arfou e se afastou rapidamente de Jane. 'Oh meu Deus! Eu dormi em cima de você?'

Jane sorriu e encolheu os ombros.

'Jane! Por que você não me acordou? Ou por que simplesmente não me empurrou para o lado?!' Ela estava envergonhada. Como ela tinha simplesmente dormido em cima da morena? Ela nem lembrava de ter pego no sono durante o filme. O filme! Ela olhou para a tv e viu um jogo passando, o volume baixo.

'Bem, eu...' Jane não sabia exatamente o que dizer. 'Te empurrado para o lado, sério?' Ela recorreu ao sarcasmo.

Maura suspirou e revirou os olhos. 'Você não precisava ter... Bem... Me segurado.' Ela disse e lambeu os lábios, logo depois abaixou a cabeça, tímida.

'Qual é, não foi nada demais.' Jane disse fingindo indiferença, mas a verdade é que tinha sido alguma coisa, e que ela havia gostado, mas ela não diria isso para Maura.

'Me desculpa sobre o filme. Eu realmente estava gostando.' A voz da médica veio mais firme dessa vez, recomposta.

'Não por isso. Mas eu vou te lembrar disso quando eu dormir no meio dos espetáculos de balé.' Ela provocou.

'Como se você já não tivesse feito isso algumas vezes.' Ela rebateu e dispensou a coberta que estava em cima de suas pernas.

'Você se sente melhor?' Jane se remexeu no sofá e cruzou as pernas em cima dele.

'Melhor, obrigada.' Maura sorriu agradecida e se levantou. 'Desculpa se eu fui um pouco... chata, mais cedo.'

'Chata? Você?' A morena ergueu uma sobrancelha em provocação e Maura beliscou seu braço. 'Ai! Ok, Maura, isso é agressão!' Ela esfregou o lugar, fingindo estar irritada.

'Foi por auto-defesa.' Ela devolveu.

'Muito engraçado.' Jane revirou os olhos e se levantou em seguida. 'Isso não conta como...'

Mas a frase morreu na metade porque Angela entrava pela porta, cheia de energia e sorrindo. 'Jane, Maura!'

A morena se virou alarmada para encarar a mãe. O que ela estava fazendo ali no meio da tarde? 'Ei, mãe.' Ela disse desconfiada.

'Oi, querida.' A mais velha beijou o rosto da morena e depois se virou para a médica. 'Oi, Maura. Você se sente melhor?' Ela passou os braços em volta da mulher menor e a colocou num abraço apertado.

Jane esticou os próprios braços para tentar livrar Maura do aperto, temendo que a mãe pudesse amassá-la, mas em vez disso o semblante de Maura pareceu sereno.

'Bem melhor, Angela, obrigada.' Ela respondeu educadamente enquanto soltava a mulher.

'Maravilha! Sabe de uma coisa? Trouxe cartas. Vamos jogar um pouco para matar o tempo.' Ela pegou um jogo de cartas de dentro da bolsa e gesticulou para que as duas se sentassem no sofá.

Jane e Maura trocaram um olhar. Elas se sentaram ao mesmo tempo e esperavam enquanto Angela distribuía o jogo de cada uma.

'Vocês foram ao apartamento de Frankie ontem?' Ela perguntou naturalmente.

'Sim, nós fomos.' Foi Maura quem respondeu, já organizando as cartas na mão.

'Oh. Vocês sabiam que ele me apresentou a namorada dele hoje?' Angela disse empolgada.

O sorriso de Jane morreu instantaneamente. Ela tombou a cabeça para o lado e suspirou. 'Apresentou? Ou você se enfiou entre os dois, mãe?'

'Bem, ela estava de saída do apartamento dele, e eu estava chegando, Jane! O que você espera que eu fizesse? Virasse as costas e ignorasse a garota?' Ela se defendeu enquanto arrumava suas próprias cartas.

Jane olhou para Maura e balançou a cabeça em reprovação, mas curiosa, perguntou para a mais velha. 'Certo, e como ela é? Me diga que é pelo menos bonita, Frankie fica todo bobo quando fala nela.'

'Não vai durar.' Angela disse com a maior naturalidade.

'O que?' Jane se sobressaltou.

'Ah, Jane... Aquela menina é toda fofa, não faz o estilo de Frankie.'

O que era engraçado, de fato, é que Jane achava que uma garota fofa, como a mãe colocava, era tudo o que Frankie precisava. 'Bem, eu duvido. Mas... vamos esperar.' E ela iniciou o jogo descartando uma sequência de cartas.

'Bem, se durar você sabe o que isso significa, Jane?' Ela não esperou de fato a morena responder. 'Que você é a única Rizzoli sobrando! E você ainda não me deixa arrumar alguém para você.'

Jane bufou e revirou os olhos, na mais pura irritação. 'Eu não preciso de você me arrumando alguém, mãe.' Ela lançou um olhar para Maura e a loira abaixou os olhos, constrangida.

'Jane, Casey já se foi por algum tempo. É hora de seguir em frente.' A mais velha constatou, não se dando conta do desconforto da duas outras.

É claro, Angela não sabia que Maura estava grávida. Angela não sabia da proposta que Jane tinha feito para ela - de um casamento de faixada, apenas para ajudar a criar uma criança, um bebê que também carregaria o sobrenome da detetive. Ela suspirou e descartou algumas cartas também. Ela tinha que se decidir logo em relação ao bebê. Ela tinha que terminar com situações constrangedoras como essa, que poderiam ser evitadas se ela simplesmente decidisse abortar e negar o convite de Jane e fingir que nada tinha acontecido, ou então aceitá-lo e contar para todos que interessassem sobre os planos das duas. Mas enquanto mantivesse a gravidez em segredo, enquanto a decisão estivesse flutuando, suspensa, esperando pela sua decisão para só depois pousar e tomar um papel em suas vidas, ela passaria por situações assim. E Jane também.

'Maura, é você de novo.' A voz rouca da morena a despertou dos pensamentos.

'Certo.' Ela franziu o cenho e comprou uma carta, descartou outra em seguida. Depois ela estudou o rosto de Jane, o perfil da morena, tão bela e concentrada em seu próprio jogo, talvez emburrada por causa do comentário da mãe. Maura se perguntou o que se estava passando na cabeça da morena. Se ela ficava brava toda vez que a mãe fazia algo do tipo porque ela realmente não queria namorar homem algum, ou se era por causa da privacidade que a mãe insistia em não respeitar... Ou se, agora com essa nova situação, era porque ela tinha se comprometido com Maura. Mas Jane sempre fora assim, então não podia ser apenas por causa da médica. Podia? Ela lançou um olhar furtivo para Jane de novo. Os dedos da morena trabalhavam cuidadosa e rapidamente em suas cartas. Jane sempre fora cuidadosa com ela, protetora. A morena nunca vacilava quando se tratava de seu bem-estar e segurança. Ela enfrentaria o mundo inteiro de uma só vez para mantê-la em paz. E se Jane tivesse feito a oferta apenas para manter o seu bem-estar, não pensando por um segundo que aquilo comprometeria o resto de sua vida? E se Jane fosse infeliz porque era tão altruísta quando se tratava de Maura? E se Jane tivesse acabado de se prender a ela, aniquilando qualquer possibilidade de encontrar outra pessoa e ser feliz?

Maura olhou para Angela. O que a mulher pensaria quando soubesse - se soubesse - do que Jane tinha feito? Angela a culparia. Ela tinha sido a mãe que por toda a vida procurara um homem para Jane. A avó que estava esperando um neto que a única filha mulher poderia lhe dar, e o fato de Jane ter engravidado uma vez e perdido o bebê parecia só aumentar as possibilidades de isso acontecer futuramente, pelo menos na cabeça de Angela. E se ela aceitasse o pedido de Jane, ela estaria acabando com mais essa chance para a mulher mais velha também. Porque Jane nunca se casaria com um homem, e não geraria nenhuma criança dele.

'Maur, você.' Jane estava estudando ela. Ela balançou a cabeça e descartou uma sequência ao mesmo tempo que engoliu o nó na garganta. Ela não poderia chorar agora.

'E você, Maura? Ninguém a vista?' Angela mais uma vez soube como ser inconveniente.

Jane revirou os olhos e disparou contra ela. 'Qual é mãe, a vida dela não é da tua conta!' Ela disse ainda mais irritada.

'Não, Angela.' Maura respondeu com a voz rouca, sem realmente encará-la. Se Angela começasse a falar sobre bebês agora em sua direção, ela simplesmente hiper-ventilaria. Ela não conseguiria lidar com uma mentira agora, com algo que estava tão à flor da pele. Graças ao bom Deus, a mulher mudou o foco da conversa de novo.

'É claro, você acabou de sair de um relacionamento. Mas já a Jane...' Ela apertou os lábios e balançou a cabeça em reprovação.

'Mãe.' Jane advertiu com a voz dura, o olhar frio. E fora o suficiente para Angela se calar.

'Eu só quero o teu bem.' Ela acrescentou num último sussurro antes de descartar uma carta.

Maura engoliu mais uma vez o nó na garganta - ela não conseguia se livrar dele. Estava tudo bem enquanto ela estava sozinha com Jane. Estava tudo bem antes de Angela sugerir que a morena se envolvesse com outro alguém - um homem. Ela apertou os dentes e contou as cartas. Ela tinha ganhado o jogo, anunciaria quando sua vez chegasse. A idéia de Jane se envolvendo com outra pessoa a atormentava demais nesse momento. E se a detetive mudasse de ideia? E se ela se desse conta da atitude tomada por impulso? E se Jane se envolvesse com alguém que a levaria para longe de si? Maura se sentia tão insegura agora, tão confusa. A morena tinha passado o dia todo tomando conta dela, dando-lhe remédio, colo, cozinhando. E mesmo com a presença física de Jane ali, uma dúvida sombria lhe esfriava o sangue. E se Jane tivesse se sacrificado por ela? Ela sabia que ela não tinha a obrigação de ficar? De que ela poderia ir se quisesse? Maura estudou o rosto da morena, um leve sorriso brotando em seus lábios.

E se Jane jamais voltasse a sorrir?

Ela abaixou a cabeça e escutou a voz da morena soando rouca aos ouvidos. 'Ganhei.' Ela disse sem muita empolgação.

Maura abaixou as próprias cartas, mas não anunciou que também havia ganhado. Em vez disso ela se levantou, sem olhar para ninguém. 'Me desculpem, mas me sinto exausta. Preciso me deitar novamente. Fiquem à vontade.' Ela se virou sem nem mesmo olhar Jane nos olhos. As lágrimas queimavam, mas ela se recusava a chorar. Não de novo, não agora. Para seu alívio ninguém tentou impedi-la, e ela se encontrou em um momento de paz em seu quarto. Ela decidiu que tomaria um banho. Um banho sempre ajudava a clarear os pensamentos e depois de uma febre, iria ajudar o corpo dolorido também. Um momento em baixo do chuveiro, sentindo as gotas acariciarem seu corpo e ouvindo nada mais do que o barulho da água, ajudariam a pelo menos acalmar os pensamentos.

Lá em baixo, na sala, Angela olhou assustada para Jane.

'O que aconteceu?' Ela dispensou as cartas e olhou curiosa para a filha.

Jane fechou a cara, mal-humorada. Ela queria gritar com a mãe nesse momento, mas ela sabia que Angela tinha sido deixada na ignorância, sem saber da condição delicada da loira. Não era justo que ela simplesmente a mal tratasse, então ela decidiu por engolir a raiva e respondeu em uma voz controlada. 'Ela ainda não se recuperou, você sabe.'

'Ela parecia bem mais cedo.' Angela insistiu, se levantando.

Jane fez o mesmo, olhando para o corredor pelo qual a loira tinha sumido. 'Parecia.' Ela concordou. 'Mas você sabe como é, mãe. Maura nunca fica doente, e agora que ela tá... Não sei, ela parece bem abatida.' Jane suspirou aliviada quando viu a mulher mais velha balançando a cabeça.

'Certo, Jane. Vamos organizar isso aqui, ok? E depois eu vou fazer algo para vocês comerem, ou congelarem para mais tarde, tanto faz.' Ela disse enquanto já começava a organizar as coisas por ali.

Jane concordou e ajudou com a pouca bagunça ao redor. Depois de devolverem tudo ao lugar, Jane colocou as mãos no bolso e se remexeu sobre os pés.

'Vou conferir como ela está, e...' Ela encolheu os ombros.

'Eu sei. Vou cozinhar algo e depois vou para casa.' Angela beijou o rosto da filha e se afastou.

Jane se apressou para o quarto da loira e entrou sem nem mesmo bater. 'Maura?' Ela anunciou a entrada apenas por estar chamando a mulher.

A médica se virou e encarou Jane. Ela estava terminando de escovar o cabelo quando a outra entrara ali. 'Ei.' Ela disse e abaixou a escova, dando alguns passos em direção à detetive. Por algum motivo ela sentiu as pernas se enfraquecerem ao erguer a cabeça para direcionar o olhar direto nos olhos negros.

'Maura, sinto muito sobre minha mãe.' Ela revirou os olhos e balançou a cabeça em negativo. 'Deus, essa mulher fala demais.'

Maura foi capaz de rir suavemente com o comentário dela. 'Eu conheço sua mãe, Jane, sei que ela não fez por mal.' Ela piscou os olhos e tentou um sorriso.

'Mas foi o suficiente para te deixar incomodada.' Jane suspirou e levantou a mão para tocá-la, mas quando Maura lançou os olhos em direção a ela, Jane recuou em covardia.

Era a vez de Maura suspirar agora e falar sobre algumas coisas não ditas. Algumas, não todas. Havia tanta coisa acontecendo no momento que ela tinha certeza de que ela só conseguia identificar metade delas. Como Jane recuou com o toque, ela se viu na oportunidade e no direito de fala. 'Eu realmente preciso me deitar, Jane, mas há algo que... cruzou minha mente, e quero que você saiba.'

Por um minuto Jane sentiu o coração disparar. Ela se sentiu desorientada, sem conseguir imaginar ao certo do que se tratava. Ela balançou furiosamente a cabeça e esperou. Maura segurou em suas mãos e disse de cabeça baixa.

'Obrigada por ter cuidado de mim hoje. E por... se dedicar tanto a mim.' Ela sorriu e levantou a cabeça. Os olhos escuros de Jane brilhavam numa intensidade e ela sabia que toda aquela atenção era genuína, o que quase a fazia sentir dor por causa das palavras que estava prestes a dizer. Ela respirou fundo, pegando o ar para pensar melhor, ignorando novamente a vontade de chorar. Se ela chorasse, Jane se inclinaria mais uma vez à necessidade de cuidar dela, e ela precisava de Jane centrada em si mesma agora. 'Jane...' Seus dedos apertaram e acariciaram a mão da morena. 'Eu não quero que você me coloque em frente de você mesma. Não quero que você se furte de seus planos e desejos apenas para satisfazer aos meus, a mim. Você me ofereceu algo que vai comprometer o resto da tua vida se eu decidir por aceitá-lo, e você decidiu isso de uma hora para outra.'

'Maura, eu já deixei claro que sei no que isso implica. Essa conversa com minha mãe...' Ela tentou explicar, mas Maura a cortou de novo.

'Você entende que assumir um bebê, esse bebê, Jane, te torna mãe? E que você não pode renunciar a isso? E que isso torna Angela em avó, e seus irmãos em tios? E que isso vai afetar todo mundo e não só você? Você não tem a obrigação de mudar sua vida por mim. Eu consigo lidar com isso sozinha, Jane. Eu sei que agora provavelmente parece que não, mas eu consigo. Você não precisa se prender.' Ela disse de uma vez e sentiu a garganta fechar. Não era como se ela estivesse afastando Jane dela, ela esperou do fundo do coração que a morena entendesse isso. Ela só queria que Jane soubesse que ela tinha escolha, e que uma delas era recuar enquanto houvesse tempo. Suas mãos foram envolvidas pelas mãos da morena e ela respirou fundo. Quais palavras estavam prestes a deixar aqueles lábios?

'Eu não me anularia por causa de você, Maura. Esteja certa disso. Eu fiz uma escolha, uma que eu posso arcar com as consequências, uma que eu estou consciente sobre. Eu ofereci algo que tem a ver com o que eu quero também, e o que eu quero é que você tenha esse bebê comigo, caso você decida tê-lo. E o que eu quero, acima de tudo, é que você saiba que mesmo que você decida não ter o bebê, eu ainda vou estar aqui. Sou eu quem vou te levar e te trazer de volta do hospital e eu quem vou cuidar de você enquanto você precisar, mesmo que você esteja insuportavelmente chata, como hoje. Eu nunca me senti presa à você. É mais como... se a gente tivesse andando lado a lado, numa direção que acontece de ser a mesma. Aconteça o que acontecer, eu não quero que a gente se separe.' Ela encolheu os ombros e abaixou o olhar. Jane não era de se revelar muito com seus sentimentos.

'Você ainda pode encontrar outra pessoa, eu não quero que... esse casamento anule suas chances.' Maura acrescentou num murmúrio.

Jane riu levemente. 'Sabe de algo engraçado, Maura? Nessa altura da minha vida eu percebi que de todas as pessoas, você é a única com quem eu conseguiria passar o resto da vida. Pode soar estranho, mas não me vejo casada com homem algum, é como se eu simplesmente não me encaixasse nesse perfil. Eu não me importo Maura, contanto que eu tenha você. E tudo bem se for só nós duas pelo resto da vida. Com bebê ou sem bebê. Eu acho que vai terminar assim de qualquer jeito.'

Maura riu suavemente e abaixou a cabeça. De alguma forma aquilo fazia sentido para ela também. Quando olhava para o futuro a única coisa certa de que via nele era Jane ao seu lado. Ela concordou com a cabeça, se sentindo mais aliviada.

'Você ainda tem tempo para tomar uma decisão. Pense sobre isso. Eu sei exatamente o que quero, Maur. Pode acreditar, eu sei mesmo, e não é só sobre você, é sobre mim também. Ok?'

'Ok.' A loira respondeu e se sentiu envolvida pelos braços da morena. Ela abraçou a outra com o mesmo carinho e descansou o queixo em seu ombro. Ela se sentia tão segura ali, e talvez fosse por isso que temia tanto perder aquela sensação.

Jane acariciou as costas da loira por algum tempo. Os abraços ultimamente duravam mais do que já duraram no passado. Eles serviam para reafirmar a presença uma da outra, para relembrá-las de que ambas estavam ali, ainda juntas, prontas para lidas com os problemas e situações difíceis uma da outra. Elas se mantinham em pé, e abraçadas pareciam mais fortes para continuarem assim.

A morena de repente se sobressaltou com um beliscão em suas costas. 'Ai, Maura!' Ela quase gritou, pega de surpresa. 'O que foi agora?' Ela olhou escandalizada para a outra mulher.

'Isso é pelo insuportavelmente chata.' Maura tentou esconder o sorriso em vão.

Jane revirou os olhos. 'Já chega com isso de me beliscar, Maura!' Mas em seguida ela riu baixinho e beijou a testa da outra. 'Apenas descanse, ok? Porque por mais que você negue, você está doente.' Ela provocou enquanto levantava a coberta para a loira, que já se enfiava ali em baixo.

'Eu não estou doente.' Ela disse firmemente ao puxar a coberta até o queixo.

'Eu odiaria ter que deixar o ar quente da casa só para te levar no hospital.' Jane ameaçou e Maura se encolheu na cama, desviando o olhar.

Certo, ela também poderia evitar uma ida ao hospital. Em contraponto, ela poderia usar de sua indisposição para continuar com as pequenas provocações entre elas. Apenas porque era a coisa delas, porque era como tudo parecia estar bem. Ela segurou a mão de Jane uma última vez e sorriu contente, porque ela pareceu descobrir naquele exato momento, que apesar de tudo, Jane sempre seria a sua Jane: aquela mal-humorada, sarcástica e inegavelmente cuidadosa mulher que estivera ao seu lado por mais de cinco anos, e que aparentemente estava disposta a passar ao seu lado pelos próximos que se seguiriam. De um jeito ou de outro.


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Notas finais do capítulo

Comentários são sempre bem-vindos! (Ps: viram como eu fui boazinha nesse cap? Depois me chamam de Shonda! auheauehuahe)