The Fairy and The Dragon escrita por Aodh


Capítulo 8
Scars




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~~Erza~~

Cheguei em casa e joguei minha bolsa no sofá da sala, meus pais nesse horário já deviam ter chegado e pelo cheiro minha mãe devia ter usado o dia de folga para fazer um jantar, caminhei devagar até a cozinha, assim que me aproximei ela ouviu meus passos.

_Erza – Ela sorriu para mim – Adivinha o que temos para a sobremesa?

_Hummm, torta de morango com chantilly?

_Exatamente – ela disse enquanto se aproximava de mim e passava um pouco do chantilly em meu nariz – Então vá tomar uma banho e desça, seu pai já deve estar chegando.

Minha mãe assim como eu tinha cabelos vermelhos, na verdade nós somos extremamente parecidas, até nas atitudes, papai vive dizendo que sou tão forte quanto ela. Meus pais são médicos, até pouco tempo atrás eles viajavam uma vez por ano para serviços comunitários em vários países e dessa maneira conheci diversas culturas e fiz muitos amigos, até o dia em que...

_Erza! – Minha mãe me despertou dos meus pensamentos – O que houve meu bem?

_N-nada, só estou com um pouco de dor de cabeça. Vou tomar um banho e já desço.

Antes que eu pudesse sair minha mãe me puxou pelo pulso e segurou meu rosto entre suas mãos.

_Ah Erza, está chegando, não é? – Eu pude notar as lágrimas se formando no canto dos seus olhos. – Você ainda tem aqueles pesadelos? Sabe que eu e seu pai estamos aqui, podemos te ajudar.

_Não mãe – eu disse enquanto beijava suas mãos – Já passou, tudo que eu tenho são algumas lembranças vagas e nada mais. Estou bem e graças a vocês, agora vou indo.

Deixei minha mãe depositar um beijo estalado na minha bochecha e subi para o meu quarto, não queria que ela soubesse, todos aqueles anos de terapia foram o suficiente, mas em algumas noites eu tinha terríveis pesadelos e acordava em meio a uma poça de suor, podia sentir todas as torturas que passei naquele lugar e principalmente lembrado do dia em que machucaram meu olho direito.

Tomei um banho rápido e antes de ir jantar liguei para Mira, ela não atendeu o celular, mas liguei para Elfman e ele me disse que estava tudo bem e que ela já estava dormindo, ao menos uma notícia boa. O jantar com meus pais era sempre alegre, eles não davam muitos plantões e sempre fazíamos ao menos uma refeição juntos todos os dias. Decidimos assistir um filme após o jantar, apesar de minha cabeça continuar doendo eu não queria preocupa-los.

_Erza? – Meu pai tocou meu ombro – Está sentindo algo?

_Não pai, estou ótima – Menti.

_Seu olho direito está muito avermelhado, olha só – Ele se aproximou do meu rosto – Você se machucou hoje?

_Vamos levá-la ao hospital – Minha mãe já tinha se levantado do sofá – Temos que examinar bem isso.

_Mãe calma, eu só devo ter me esforçado muito no colégio e teve treino hoje, não é nada. Meu olho está ótimo, não como sempre foi, mas ótimo para tudo o que...

Eu parei de falar quando vi meus pais me encarando daquela forma, o mesmo olhar que todos fizeram quando eu voltei, pena.... Abracei meus joelhos tentando me controlar, não queria que eles pensassem que precisavam me levar para mais uma daquelas sessões.

_Parem de me olhar assim, eu estou bem – Me levantei e abracei eles – Só essa dor de cabeça que não passa, mas vou dormir mais cedo e amanhã tudo vai ficar bem.

_Erza...

Ainda ouvi minha mãe me chamar antes que eu subisse as escadas, se continuasse ali seria uma discussão que eu perderia e seria levada ao hospital contra a minha vontade para mais uma bateria de exames que só confirmariam o que eu já sabia e convivia a alguns anos: somente 30% da visão do olho direito. Peguei meu celular mais uma vez e liguei para Mira, no terceiro toque ela atendeu.

_Mira? Está tudo bem? Elfman me disse que você já estava dormindo.

_Está... – Ela parecia um pouco desanimada, talvez tivesse acordado com o celular tocando – Só estou cansada Erza, mas amanhã vou acordar melhor e você?

_Ah sim, tudo ótimo. Minha cabeça dói um pouco, vou tomar um remédio e ir dormir, mas amanhã também vou estar melhor.

_Okay... – Ela deu um suspiro longo e eu achei que desligaria em seguida – Erza-san?

_Estou aqui.

_Obrigada, de novo...

_Não precisa agradecer Mira, agora vá dormir para amanhã estar 100%. Boa noite.

Ela me deu um boa noite e logo em seguida desligou, eu espero que tudo esteja realmente bem com ela. Fui até o espelho da minha penteadeira e constatei o que meu pai falou, meu olho estava realmente avermelhado, isso acontecia às vezes, mas com um pouco de colírio e descanso ele voltaria ao normal rapidamente. Lavei meu olho com soro e coloquei o colírio, em seguida pus um dos meus tapa-olho descartáveis.

_Nada que uma noite de sono não resolva.

O dia foi tão cansativo que em pouco tempo tinha pegado no sono, não sei se o fato de ter comentado com meus pais sobre o incidente de anos atrás, ou meu olho que estava me incomodando, as lembranças do acidente vieram em forma de tempestade e por mais que eu tentasse me livrar delas e acordar eu estava mais uma vez perdida naquele pesadelo...

Eu sentia a dor lacerante tomar conta do meu rosto, era como se novamente eles estivessem me machucando com todos aqueles instrumentos e não pude controlar o grito que tinha se formado em minha garganta, eu sabia que era apenas um sonho e que quando eu abrisse os olhos tudo teria acabado, mas aquela dor era real demais. Me levantei abruptamente da cama e o desespero começou a tomar conta de mim: tinha um véu no meu olho direito e a dor continuava ali mesmo eu estando acordada, apalpei meu rosto arranquei o tapa-olho, senti uma humidade estranha no lugar.

_MÃE! – Minha mão tocou algo pegajoso no travesseiro, em meio a dor que me tomava alcancei o abajur e o acendi – PAI! – Me assustei quando vi a mancha enorme de sangue no travesseiro branco, então era aquilo que estava impedindo minha visão, meu desespero só aumentou – ME AJUDEM! MÃÃÃEE!!

Eu tentei me levantar da cama, mas a dor só piorava então abracei meus joelhos enquanto tentava me acalmar até que alguém aparecesse para me ajudar, eu sentia as gotas de sangue escorrendo do meu olho e descendo pelo meu queixo indo parar no meu lençol perfeitamente branco, em poucos segundos meu pai abriu a porta com minha mãe logo atrás, eles estavam extremamente pálidos e assustados.

_Erza! – Minha mãe foi a primeira a me agarrar pelos ombros – Erza o que aconteceu?! – Eu tentava me soltar das mãos dela enquanto escondia meu rosto – Olha para mim... Olha para mim! Consegue enxergar?!– Ela afastou minhas mãos e eu pude ver seus olhos encherem de lágrimas – Você consegue enxergar?

Eu balancei minha cabeça negando, o que eu mais temia parecia ter acontecido. Ela me abraçou enquanto com o lençol que eu me cobria limpava o excesso de sangue do meu rosto em seguida beijou meu olho sem se importar por estar sujo.

_Ah Erza... Vai ficar tudo bem okay? – Ela passava a mão pelos meus cabelos – Vamos, temos que ir ao hospital.

Eu não tinha forças para me movimentar e sentia que a qualquer momento perderia a consciência com a dor que eu estava sentindo, meu pai me levantou da cama e me segurou com todo o cuidado, mas ainda assim meu olho latejou e eu pude sentir o sangue voltar a sair por ele.

_AH! – Eu gritei e me encolhi no colo do meu pai – D-dói... muito...

_Eu sei, daqui a pouco vai passar meu bem – Meu pai já havia me colocado no carro com cuidado deitada no colo da minha mãe no banco de trás – Em pouco tempo essa dor não vai mais existir.

Chegamos muito rápido ao hospital e logo eu já estava medicada e deitada em uma maca esperando os resultados dos exames, minha mãe segurava firme minha mão e em nenhum momento parou de me olhar, ela tinha os mesmos olhos de quando me reencontrou anos atrás, eu estava numa condição lastimável, mas nunca vou me esquecer do abraço apertado que ela me deu.

_Mãe... – eu disse grogue dos remédios que havia tomado para aliviar as dores – Vai ficar... tudo bem?

_Claro, vai ficar sim – ela disse enquanto beijava minha mão – Você deve ter se esforçado hoje no treino no colégio, algum vaso deve ter rompido, mas vai fica tudo bem.

_Eu estou com medo – Não consegui conter as lágrimas, eu não podia chorar naquele momento – Muito...

_Meu bebê , não chora, você não pode chorar – ela pegou um lenço e limpou as lágrimas que tinham escapado pelos cantos dos meus olhos – Seu pai vai entrar daqui a pouco com uma boa notícia.

Assim que ela terminou de falar meu pai entrou no quarto, apesar de exausto ele parecia aliviado, colocou os papeis em cima da mesa próxima e em seguida se aproximou da cama sentando ao lado da minha mãe.

_Esta tudo bem – Ele soltou o ar dos pulmões e eu pude sentir o alivio que se formou no rosto da minha mãe – Não foi nada grave, você não vai precisar de cirurgia novamente, só descanso e alguns remédios para a dor, mas ainda temos que investigar o que realmente causou o sangramento.

_E a visão? Continua a mesma? – Minha mãe segurou o ar.

_Sim – Meu pai tirou do bolso uma coisa que eu já conhecia – Infelizmente você vai ter que usar isso durante um tempo.

_Tudo bem – eu disse enquanto estendia a mão e pegava o tapa-olho, apertei-o contra o peito – É só por um tempo.

_Agora vamos te levar para casa.

_Não seria melhor ela passar a noite aqui? Se algo por acaso...

_Não – Meu pai tocou a face da minha mãe – Ela vai ficar melhor conosco em casa, você sabe como nossa moranguinho aqui odeia hospitais – Ele apertou meu nariz – Amanhã com toda certeza ela estará 100% e pronta pra qualquer coisa.

Minha mãe ainda protestou, mas se deu por vencida quando olhou os exames e viu que não havia nada de errado. Os remédios que tomei para dor me deixaram muito sonolenta, meu pai teve que me carregar novamente do carro até dentro de casa, eu tentei ir andando até meu quarto, mas realmente não conseguiria, deixei meu orgulho de lado e chamei por ele.

_Pai, pode me levar até meu quarto?

_Não, não. Você vai tomar um banho antes e vai dormir conosco, não quero ter outro susto desses – eu ia abrir a boca para protestar, não tinha mais idade para aquilo – E não adianta reclamar, o assunto está encerrado Erza.

Certo, eu não tinha condições de protestar contra a minha mãe, deixei que meu pai me levasse até o banheiro e que em seguida minha mãe me ajudasse com o banho, sentir a água quente no meu corpo me fez sentir melhor. Em pouco tempo eu já estava seca e usando um pijama confortável deitada na enorme cama dos meus pais.

_Mãe – Eu virei para o lado dela.

_Sim Erza. Pode falar, só cuidado para não acordar seu pai, ele tem cirurgia amanhã logo cedo.

_Eu posso perder mais da minha visão? – Ela me olhou assustada, mas logo relaxou e sorriu.

_Não sei meu bem, coisas acontecem com as pessoas o tempo inteiro e nós não podemos saber quando nem onde ou o quê, mas eu e seu pai vamos fazer o possível para que você seja feliz, não importa o que aconteça está bem? – Eu balancei a cabeça e ela beijou minha testa – Agora durma, se amanhecer melhor poderá até ir para a escola.

Eu me aconcheguei na minha mãe, ela era tão quente que fez todos os meus medos se dissiparam, eu sabia que apesar de tudo eu tinha sorte, sorte de ter reencontrado meus pais, de estar viva e principalmente de eles terem recursos para cuidar de mim, ao contrário de Jellal que sempre foi tão sozinho, ao menos agora ele tinha uma família adotiva. Afastei meus pensamentos das coisas ruins e me concentrei em descansar o máximo possível, eu realmente queria ir ao colégio pela manhã, tinha a sensação de que Mira precisava de mim.

***

~~Mirajane~~

Desliguei meu celular após me despedir de Erza, mais cedo eu ouvi o celular tocando quando ela me ligou, mas não estava bem o suficiente para atender, também ouvi quando Elfman espreitou pela porta entreaberta do quarto e quando minha mãe me chamou para jantar, eu apenas disse que estava enjoada e com cólica e não tinha fome. Eu não tinha vontade de nada na verdade, queria apenas ficar deitada na minha cama e esperar aquela dor em meu peito passar.

Quando Freed gritou com Elfman todos aqueles pensamentos que eu tinha voltaram à tona, as cenas do acidente com Lisanna, meu desespero tentando salvar os dois e principalmente a culpa. Culpa por não ter tentando impedi-los de entrar naquela maldita lancha, culpa por não ter segurado mais forte a mão da minha irmã, culpa pela tristeza que ficou dentro de casa quando retornei do hospital e não tinha mais as risadas alegres dela no quarto da frente.

Olhei em direção a porta aberta do meu quarto, logo em frente a porta cor-de-rosa do quarto de Lis, as vezes minha mãe entrava lá e eu podia vê-la abraçando o urso preferido da minha irmã e aquilo doía muito em mim. Eu queria ficar sozinha no momento, mas meu quarto não tinha tranca na porta, meus pais a tiraram depois que surtei com a morte de Lisanna e tentei várias vezes me matar, eu não sabia o que estava fazendo, mas a cada vez que sentia o sangue jorrar por meus pulsos ou que sentia a lamina cortando a pele alva do meu braço sentia que de alguma forma estava me redimindo.

Vi uma sombra se aproximando e logo em seguida minha mãe apareceu, não era minha mãe biológica, fomos adotados logo que meus pais morreram em um acidente de carro e eu seria eternamente grata por isso.

_Mira, esta se sentindo melhor? – Ela era alta e tinha cabelos muito escuros assim como seus olhos – Elfman me disse que você voltou cedo hoje da escola.

_Esta tudo bem, só uma cólica chata que não queria passar e fiquei com medo de tomar algum remédio na enfermaria do colégio, mas estou bem.

Ela me olhou e eu pude notar que a mentira não havia convencido, mas mesmo assim parecia que não iria insistir no assunto. Em seguida ela pegou minha mochila e olhou dentro por alguns segundos, depois abriu cada gaveta da minha cômoda e do criado-mudo, eu sabia o que ela estava procurando.

_Quer conversar sobre isso? – Ela sentou ao meu lado na cama – Acho melhor você tomar o remédio hoje, esta com insônia? Ou se quiser podemos marcar uma sessão amanhã.

_Não, não quero remédio e também não quero nenhuma sessão, só preciso dormir um pouco...

_Sabe que sempre que quiser conversar eu vou estar aqui não é? – Ela afagou meus longos cabelos prateados – Eu sei que em todo momento você se sente sozinha, com medo e que tem vários pensamentos te assolando, mas quero que você me prometa que não vai fazer nenhuma besteira, eu não suportaria que algo ruim acontecesse com você.

_Certo, prometo.

_Tudo bem – Ela beijou minha testa e foi se afastando da cama, mas se deteve por um segundo na porta – Deixe a porta do quarto aberta esta noite e qualquer coisa pode me chamar.

Eu assenti e ela deixou a porta aberta como tinha falado, as vezes eu só queria que ela fosse mais minha mãe e menos minha psicóloga, era terrível não ter com quem conversar coisas de menina, sempre que eu falava algo eu sentia como se minha ela estivesse me analisando, tinha a Erza, mas alguns conflitos que existiam dentro de mim eu não podia simplesmente sentar e falar com ela...

Apesar de estar muito cansada passei horas olhando para o teto do meu quarto até pegar no sono, mas ao contrário do que imaginei não foram sonhos bons, mas sim o pior pesadelo que já vivi na minha vida veio me visitar novamente naquela noite.

~~flashback~~

Quase três anos atrás estávamos com nossos pais na praia, o dia estava terminando e eu podia sentir o vento gelado na minha pele, minha mãe já tinha nos chamado para voltar, parecia que iria chover, vi Lisanna abraçar seu corpo e coloquei minha toalha em seus ombros.

_Vamos para casa? Está um pouco frio aqui e mamãe disse que preparou um jantar delicioso para nós – Afaguei seus curtos cabelos prateados – Se comer tudo deixo um pouco da minha sobremesa para você.

Eu vi os olhos azuis dela brilharem e um sorriso gigante aparecer em seu rosto enquanto ela me abraçava. Elfman apareceu em seguida segurando uma chave nas mãos.

_Hey, me deixaram tomar conta da lancha! – Ele sacudiu as chaves para nós – Vamos dar um passeio?

_Não, você só tem 12 anos Elfman, não pode tomar conta de uma lancha. A única coisa que tem que fazer é guardar essa chave.

_Eu sou um homem! – Ele sorriu para mim – Não posso dirigir, mas podemos ir lá ver por dentro antes do passeio amanhã que tal? Lis – Ele se ajoelhou e segurou as mãos da nossa irmã menor – Quer ir comigo?

_Sim! – Ela se jogou nos braços de Elfman e ele a segurou – Vamos Mira-nee.

_Acho melhor voltarmos para casa, está tarde e olha aquelas nuvens no céu, vai chover.

_Não vamos sair do lugar, só queremos ver por dentro, daí amanhã vai ser bem mais fácil de encontrar tudo por lá – Elfman falou – Seja um homem!

“Acontece que eu não sou um homem Elfman”, pensei, mas ainda assim fui até a lancha com os dois, não podia deixá-los sozinhos e tudo indicava que seria rápido. Após algum tempo de exploração e de Lisanna ter vasculhado cada canto do lugar ouvimos o barulho de um trovão.

_Mira-nee! – Lisanna veio correndo e me abraçou – O que foi isso?

_Um trovão Lis, mas passou. Elfman, vamos voltar para casa antes que a chuva comece de fato, mamãe deve estar preocupada com a nossa demora – Ele assentiu – Eu vi umas capas de chuva dentro dessa primeira gaveta, pegue algumas para nós por precaução.

Quando alcançamos a parte de cima da lancha a tempestade já caia forte e não conseguíamos enxergar absolutamente nada a nossa frente, coloquei Lisanna atrás de mim e segurei firme sua mão enquanto falava que ficaria tudo bem

_ELFMAN! – Gritei, tentando fazer minha voz soar mais alto que o barulho do vento – O que houve? Você parou do nada.

Eu me aproximei tentando enxergar com a chuva forte que fazia meus cabelos colarem em meu rosto ao ver que meu irmão não se mexia e apenas olhava para baixo, pálido e com uma expressão assustada.

_M-mira... nee...

_O qu- Meus pensamentos foram cortados quando eu descobri o motivo dele estar tão assustado – Elfman! O que está acontecendo?!

Nós estávamos em alto mar, por conta da chuva não conseguia avistar a praia, mas para todos os lados que olhava via apenas água e as ondas que começavam a agitar a nossa lancha. Puxei Elfman junto com Lisanna para dentro e fechei a porta. Lisanna tremia e eu pude notar o medo estampado nos olhos dela, “Que droga, eu não devia ter permitido isso! Devia ter colocado os dois na minha frente e ido para casa!”. Certo, eu precisava organizar meus pensamentos antes de tomar qualquer decisão.

_Elfman, a corda que prendia a lancha, você notou se estava presa?

_E-eu não lembro, papai só me deu as chaves para segurar... a corda deve ter soltado com a força da chuva.

_Droga Elfman! – Meus olhos cintilavam, eu odiava ter que gritar com ele, mas naquele momento eu estava muito brava – Mas que droga!

_Desculpa... me desculpa – Ele parecia que começaria a chorar – Eu não queria...

_E agora?! Que faremos? – Eu o empurrei e ele acabou caindo no chão, tentei me acalmar – Ah, me desculpe...

_Mira-nee... – Lisanna estava no canto e parecia sentir medo de mim – Você está bem?

_Sim Lis, não precisa ter medo, vai ficar tudo bem okay? – Eu estendi a mão para ela – Fique sentadinha aqui, daqui a pouco vamos estar em casa e você vai poder comer a minha sobremesa, é uma promessa, okay?

_Okay! – Ela obedientemente sentou em uma das poltronas e eu me aproximei de Elfman – Você ao menos sabe pilotar essa coisa?

_Não – Ele estava choroso – É tudo minha culpa, eu devia ter escutado você. Não podemos nem tentar ligar, papai disse que estava sem gasolina e só iria encher o tanque amanhã antes de sairmos.

_Ótimo, agora estamos realmente encrencados, não podemos ficar aqui a deriva, Lisanna está assustada e eu também estou! Droga!

_Desculpa...

Eu suspirei, não era culpa dele, era minha, minha cabeça estava latejando e mais uma vez ouvimos um barulho ensurdecedor e um clarão, a lancha chacoalhou e quando menos percebi estava no chão, tentei levantar desorientada, meu coração apertou quando vi Lisanna com o rosto sujo de sangue.

_Lisanna!!! – Engatinhei até ela e toquei seu rosto – Lis, fala comigo!

Ela abriu os olhos com dificuldade, parecia não ser um corte profundo e eu suspirei aliviada, tínhamos que conseguir um jeito de mandar um sinal aos nossos pais, tirei o celular do bolso, mas como esperado não estava funcionando.

_Os comunicadores também não funcionam – Elfman disse – Eu vi um sinalizador dentro da gaveta, podemos usá-lo.

Estava chovendo demais e a visibilidade péssima não ajudaria, pelo tempo que estávamos fora com certeza nossos pais estavam nos procurando, então dessa vez tomei a decisão mais sensata: Esperar. Enquanto aguardávamos a chuva passar cuidei do ferimento da Lisanna do melhor jeito que pude, ela estava deitada no meu colo, mas eu não podia deixar que dormisse, tinha batido a cabeça e aquilo podia ser perigoso.

Mais uma vez o vento começou a soprar forte e a balançar a lancha para os lados, coloquei Elfman e Lisanna próximo a mim e os abracei, estávamos encolhidos num canto, prometi a mim mesma que não deixaria que nada acontecesse com os dois, a cada minuto a tempestade parecia piorar e às vezes eu sentia como se a lancha fosse se partir ao meio.

_Mira-nee – A voz de Lisanna era um sussurro – Vamos voltar para mamãe e papai?

_Vamos sim Lis – Eu sorri para ela tentando parecer calma – Vamos voltar, prometo que nada de ruim vai acontecer com você-

Antes que eu terminasse de falar fomos jogados para o lado, segurei a mão de Lisanna e a puxei para perto de mim, foi tudo muito rápido, a porta se abriu e na segunda vez que fomos lançados ao chão Elfman escorregou e acabou indo parar do lado de fora.

_ELFMAN! – Eu segurava Lisanna como podia enquanto sentia a água salgada entrando em meus olhos e ouvia o barulho de algo se partindo – Segure-se Elf!!!

Eu não sabia o que fazer, Elfman parecia estar perdendo as forças para se manter seguro enquanto eu tentava não soltar Lisanna e mantê-la calma nos meus braços.

_ElFMAN NÃO SOLTE OUVIU BEM?! Vamos sair daqui...

_Elf-niichan! Estamos aqui!

A lancha parou de balançar por um momento e Elfman conseguiu ficar de pé, o braço dele estava machucado e parecia sentir muita dor. Levantei e coloquei Lisanna do meu lado, ela percebeu Elfman cambalear e correu ao seu encontro.

_LISANNA! Não! – Eu tentei segurar sua mão, mas não pude, então a pior cena aconteceu na minha frente. – Segure a Lisanna, Elfman!

_Elf-niichan!

Elfman não me ouviu e não viu quando Lisanna escorregou próximo a porta, eu tentei correr a tempo de segurá-la, mas não pude, ele se desequilibrou e acertou Lisanna fazendo com que ela caísse do lado de fora da lancha, meus olhos se encheram de lágrimas e eu corri para tentar fazer algo, o barulho da lancha se partindo só aumentava, de repente os cabos de aço começaram a se soltar enquanto parecia que estávamos afundando. Quando alcancei a porta vi Lisanna no chão, ela estava tentando se levantar, mas antes que o fizesse um dos cabos de aço se soltou acertando-a e jogando-a longe.

_LISANNA!! – Eu gritei e corri até onde ela estava, sem me importar em cair ou me machucar – Lisanna! – Me aproximei e segurei sua mão – Lisanna, fale comigo!

_Não consigo me mover... – Segurei sua mão enquanto deixei as lágrimas se misturarem com a chuva que caia. – Mira-nee?

_Não fale! – Eu segurei seu rosto com minhas mãos – Estou aqui com você, vai ficar tudo bem... Vai ficar tud- comecei a soluçar.

_Mira... nee... Sabe – Ela me olhou, mas a vida parecia estar se esvaindo aos poucos do seu rosto – Eu realmente... Amo vocês...

Ela fechou os olhos lentamente e pude sentir sua respiração ficando mais fraca.

_LISANNA! Lisanna abra os olhos! – Eu a sacudi – Espere, Por quê? O que está acontecendo? VOCÊ NÃO PODE IR!

Elfman estava ajoelhado do nosso lado, a lancha estava se partindo, não tínhamos muito tempo, com um estrondo maior eu senti o chão aos nossos pés se romper e começar a afundar, abracei Lisanna o mais forte que consegui.

_VOCÊ NÃO PODE ME DEIXAR! ESTÁ OUVINDO LISANNA! Abra seus olhos – Eu beijava o rosto da minha irmã, podia ouvir o coração dela batendo, ainda tínhamos esperança – Aguente firme...

Então tudo que nos mantinha seguros desabou e em poucos segundos estávamos dentro da água gelada, Elfman tentava se manter à tona e nos alcançar e eu segurava Lisanna em meus braços com todas as minhas forças, mas as ondas a puxavam e tentavam arrancá-la de mim.

_NÃO! Lisanna, você não pode ir! Por favor... Por favor...

De repente fomos engolidas pela água, ainda pude ver Lisanna abrir um pouco os olhos e sorrir para mim, aquilo quebrou meu coração, a força da água era maior que a minha e então eu pude sentir aos poucos ela escorregando por minhas mãos, tentei mergulhar mais fundo para alcança-la, mas algo me puxava para cima... aos poucos fui perdendo a consciência e a única coisa gravada na minha mente eram os olhos tristes da minha irmã me deixando quando não pude salvá-la.

~~flashbackfinish~~

Acordei tremendo sozinha no meu quarto, as imagens daquele pesadelo se repetindo na minha mente mais uma vez, eu não poderia suportar, o sorriso de Lisanna ficou gravado na minha mente, os olhos azuis ficando tão opacos e perdendo aquele brilho que sempre tiveram. Joguei as cobertas para o lado e abri a janela do quarto tentando não fazer barulho.

_Respire Mirajane – eu falava para mim como se fosse um mantra que me acalmasse – Respire e pense nas pessoas que gostam de você.

Por mais que eu tentasse não me deter nos pensamentos e no pesadelo que tive as imagens vinham em desordem na minha cabeça, o barco quebrando, a tempestade que nos jogava para um lado e outro, a mão de Lisanna tentando segurar a minha e ela sendo levada pelo mar. Eu precisava me acalmar de alguma maneira, se tivesse mais um ataque histérico iria para a clínica novamente e eu não queria aquilo.

Corri ate o banheiro do quarto e me abaixei próximo a pia, entre a parede e o armário de madeira puxei um pequeno objeto que cintilou quando exposto a luz, era um ótimo esconderijo, nunca tinham encontrado ela ali. Eu sabia que o que estava fazendo era errado, que me machucaria e principalmente machucaria todas as pessoas que me amavam, mas tudo o que eu estava sentindo naquele momento não passaria apenas com conversas.

Me ajoelhei no chão frio do banheiro tentando controlar a minha respiração, tentando de alguma forma ser mais forte e me impedir de fazer aquilo, mas novamente as imagens voltaram, eu sendo levada por minha mãe a uma clínica, sendo amarrada naquela cama para que não continuasse me machucando, eu levei minhas mãos ao meu rosto e deixei que as lagrimas rolassem quentes por ele, estava ficando insuportável novamente.

Segurei a navalha com as mãos tremulas e a coloquei junto a pele no meu antebraço esquerdo e senti a lamina fria contra a minha pele, em seguida apertei com força, minha visão estava embaçada por conta das lagrimas, mas eu consegui ver o fio de sangue que se formou e escorreu por minha mão, senti a dor da minha carne sendo cortada. Em meio a tudo isso retirei a lamina e a levei em direção ao meu pulso, mas aí eu vi o rosto da Erza na minha frente, os olhos tristes dela me vendo deitada naquela cama, eu não falava nada, mas podia escutar tudo que ela me contava.

Principalmente, podia sentir o calor dela quando me abraçava ou segurava minhas mãos pedindo para eu voltar, lembrei da promessa que fiz a Elfman e a minha mãe, que viveria e seria feliz, apesar de não acreditar nas promessas que fiz eu devia isso a todos eles, soltei a lamina no chão e olhei para meu braço, o corte não era profundo e sararia logo, só tinha conseguido cortar a camada superior da pele, com sorte não deixaria uma cicatriz visível.

Limpei o chão sujo de sangue e fiz um curativo com algumas coisas que tinha no quarto, ninguém poderia descobrir o que tinha acontecido ali, se meus pais descobrissem as coisas não se resolveriam tão facilmente dessa vez, coloquei todas as provas que poderiam me ‘incriminar’ em um saco plástico preto e o escondi dentro do armário, antes de ir para a escola resolveria o que fazer com ele.

Voltei para a cama e me cobri mais uma vez, eu sabia que não conseguiria dormir, mas dessa vez, ao menos dessa vez... Eu iria cumprir a promessa que fiz a alguém, iria tentar viver uma viva feliz, assim como Erza me disse quando estava no hospital: ‘Lisanna viveria para sempre em nossos corações e tínhamos que viver por ela”.


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