Na tarde daquele dia marcamos o primeiro encontro para conversar sobre o trabalho integrador de música e então preciso encarar Mariana e Evangeline, que fazem fotografia e moda, respectivamente. Estou aguardando em uma das mesas do RLU – que elas afirmam que ficar na biblioteca é muito chato – quando vejo Henry passar pelo corredor. Ele me avista e se aproxima de minha mesa, sorrindo.

― Presumo que esteja esperando sua equipe ― ele diz, ao sentar-se à minha frente.

― Infelizmente você está correto ― comento, talvez um pouco grosseira.

― Não gostou do tema? ― ele questiona preocupado.

― Não gostei do grupo ― afirmo, quase de imediato. ― Posso trocar?

― Receio que não, Natalie.

― Vou ter problemas, fato! ― afirmo.

― Algo que eu possa ajudar? ― ele sorri levemente. Se ele soubesse o que isso causa em mim, não o faria.

― Você não entenderia ― acuso.

― Você está duvidando da minha capacidade, senhorita Natalie? ― ele ri, colocando sua pasta na cadeira ao lado.

― Agora está confortável para escutar reclamações inúteis de uma das suas alunas, Henry? ― brinco.

― Exatamente ― ele apoia seus braços sobre a mesa. ― Pode começar.

― Você que frequência você faz isso? ― questiono.

― O tempo todo ― ela brinca, referindo-se ao filme.

― Coisas de garotas, professor, o grupinho dela não se dá bem com o meu e vice-versa ― explico.

― Então essa é uma boa oportunidade para que todos possam se entender ― ele sugere, passando a mão pelo cabelo que cai em seu olho.

― Ou para piorar tudo um pouco mais ― dou de ombros.

― É outra hipótese ― ele ri.

― A mais provável ― admito.

Vejo as duas se aproximando da mesa, surpresas por Henry estar sentado comigo. Elas se aproximam devagar, cochichando algo.

― Bom, o grupo está formado ― ele diz, pegando sua pasta ao lado e levantando-se. ― Tenham um bom trabalho, garotas.

― Obrigada, professor ― Evangeline diz, enquanto Mariana apenas acena com a mão.

Mariana senta exatamente à minha frente e Evangeline ocupa o lugar ao seu lado.

― Estou trabalhando em uma coleção sobre os anos 70 e 80 ― diz Evangeline. ― Eu e Mariana decidimos, então, utilizar este tema.

― Que bom que vocês já vieram com decisões tomadas ― comento ironicamente.

― De todo modo, somos a maioria ― diz Mariana.

― Ok ― respondo. ― O que eu preciso fazer?

― O maior trabalho ficará conosco, cenário, vestimentas, modelos, iluminação, fotografia e filmagem. Você só terá que fazer a trilha sonora ― indica Evangeline.

― Eu posso ajudar nas outras coisas ― digo.

― Não, não pode ― Mariana resmunga. ― Fique com a sua parte e deixe que do restante nós cuidamos. Não confiamos no seu trabalho.

― Certo. Terminamos? ― questiono irritada. O quando antes sair dali melhor.

― Sim ― as duas dizem em coro.

Pego minha bolsa e deixo a praça do RLU, sem me despedir das duas. Caminho pelo corredor que direciona para a rua. Não tenho mais aulas hoje, então já posso ir para casa. Henry está na sala de Xerox e ao me ver passar vai até o corredor. Vejo-o, mas não paro de caminhar.

― Como foi a reunião, Natalie? ― grita ele. Levanto meu braço livre e faço um sinal de positivo e continuo caminhando.

― ― ―

Estou no quarto, Viola ainda não chegou da Universidade, então aproveito para ler alguns artigos, mas sou interrompida pelo vibrar do meu celular.

― Alô? ― digo, ajeitando-me sobre a cama.

― Boa noite. Sou Cecília da ESNES Imóveis, tudo bem com a senhora? ― A garota tem um sotaque estranho.

― Tudo ótimo ― me limito a dizer.

― Por gentileza, a senhora Lauren?

― A própria ― indico.

― Entro em contato para anunciar que o processo de aquisição do seu apartamento chegou ao fim. Já podemos lhe entregar a chave do seu imóvel. Você prefere que um dos nossos agentes lhe acompanhe para a primeira visita? ― ela parece ser bastante solicita.

― Creio que não seja necessário ― respondo. ― Eu já conheço o local.

― Então pedimos que a senhora compareça ao ESNES Imóveis e retire sua chave. Tudo bem?

― Tudo certo! Amanhã é sábado, vocês funcionam? ― questiono.

― Até às 12h00min, senhora Lauren ― ela menciona. ― Posso confirmar sua presença amanhã?

― Pode sim ― afirmo.

― Certo. Estamos lhe aguardando. O ESNES agradece a preferência e boa noite.

― Boa noite! ― a ligação cai e eu não me controlo de tanta felicidade.

A porta se abre e Viola parece estar exausta.

― Pelo menos alguém nesse lugar está contente ― ela reclama, jogando suas coisas em cima da sua casa.

― Meu apartamento está liberado ― anuncio.

― Sério? ― ela parece não acreditar. ― Que ótima notícia, Lauren! Parabéns!

― Obrigada Viola ― digo sorrindo, ao receber um abraço dela.

― Quando é que você vai para lá? ― ela questiona, sentando-se em sua cama.

― Vou pegar a chave amanhã. Vou aproveitar o final de semana para levar as minhas coisas. O apartamento já é mobiliado e por isso o que mais vai dar trabalho são os livros e roupas.

― Entendi. Bom, se precisar de ajuda é só pedir. Vou tomar um banho quente, estou precisando ― ela diz, pegando um pijama em sua cômoda.

― Não vai sair hoje? ― questiono. ― É sexta, vamos aproveitar!

― Quem sabe amanhã ― ela responde ao entrar no banheiro.

Deito em minha cama e meu celular vibra novamente. Miah fez um grupo no WhatsApp e vejo que com exceção de Viola, todas as outras meninas já estão no grupo.

C: Por que a Viola não está aqui ainda? 20:45

M: Não tenho o número dela, alguém já tem? 20:45

N: Acho que ninguém. Lauren? 20:47

L: Ela está no banho, vou perguntar. 20:47

― Viola ― grito. ― As meninas estão perguntando qual é o seu número.

― Ainda não decorei, Lauren ― ela responde. ― No bolso pequeno da minha bolsa está o cartão com o número, você pode olhar e passar para elas?

― Claro! ― respondo. ― Valeu.

Vou até a cama de Viola onde está sua bolsa, pego o cartão com o chip destacado e salvo o contato de Viola em meu telefone.

L: Viola – Clique para adicionar. 20:50

M: Obrigada Lauren. Vou colocá-la aqui. 20:51

C: Isso! 20:51

Viola entrou no grupo.

M: Vocês vão fazer alguma coisa hoje? 20:53

C: Vou ficar em casa estudando. 20:54

M: Mas hoje é sexta, Candice. 20:54

C: E não se estuda as sextas? 20:55

M: Sexta é dia de sair um pouquinho. 20:55

V: Isso se faz no sábado. 20:56

Não percebi que Viola havia saído do banho, por isso me surpreendi com sua mensagem.

L: Eu convidei Viola para sair, mas ela esta chata hoje. 20:57

V: Viola está se sentindo perseguida. 20:57

N: O que aconteceu? 20:58

L: Suzy, sempre. 20:58

N: Hoje me estressei com as amiguinhas dela. 20:58

M: O que houve? 20:58

N: Só faltou dizer que não tenho capacidade e que não deixarão eu participar de outras funções, pois, posso estragar o trabalho. 20:59

M: Eu já dava na cara. 20:59

C: Falando nisso, acho que as meninas ainda não sabem, né Miah? 20:59

L: O que? 20:59

Olho para Viola deitada em sua cama, mas ela dá de ombros, também não sabe do que estão falando.

M: Digamos que pratiquei judô hoje. 21:00

C: Ela resolveu pular em cima do gótico. O ataque aconteceu na biblioteca. 21:00

N: Na biblioteca? 21:00

L: Oi? Biblioteca? 21:00

V: Logo lá? 21:00

M: O que? É proibido? 21:00

N: Acho que sim, Miah. 21:01

L: Estão vendo? Todas estão confusas, estressadas e passando por alguma situação estranha. Nada que um barzinho não possa ajudar. 21:01

V: Alcoólatra detectada. 21:01

Viola aponta o celular para a porta do banheiro e emite um “pi... pi... pi...” com a boca. Ao aproximar o celular na minha direção o “bipe” emitido é mais constante, chegando ao “pipipipipipi” ininterrupto.

― Sua tola! Só quero aproveitar a noite com as melhores garotas de Ohio ― justifico.

― Certo! Você venceu! ― ela diz.

― Jura?

― De dedinho!

L: Já convenci a Viola. 21:02

M: Eu já estou convencida há tempo. 21:02

V: Aonde TODAS nós vamos? 21:02

N: Minha mãe autorizou, acabei de pedir. 21:03

L: Obrigada Deus por fazer a mãe da Nat gostar da gente. 21:03

M: Sim, obrigada! 21:03

V: Amém! 21:03

N: Retardadas! Quer carona, Candice? 21:03

C: Acho que não vou, gente. 21:04

V: Vai sim! 21:04

L: Todas ou nenhuma. 21:04

C: Injusto! Vocês vão mesmo fazer isso comigo? 21:04

L: Acho que vamos! 21:04

C: Certo! Vamos então. 21:04

M: Ótimo! 21:04

L: Tem um barzinho aqui chamado Meu Escritório. É paro o público universitário. O que acham? 21:05

M: Ótimo! Onde fica? 21:05

L: Já mando a localização por aqui. 21:05

N: Vou me arrumar e fico esperando o local. 21:05

L: Certo. 21:05

― ― ―

― Vai sair novamente, senhorita Miah? – Marco me questiona, enquanto saio do elevador.

― Vou sim, Marco ― me debruço sobre o balcão onde ele está. ― Algum problema?

― Não senhorita.

― Vou aguardar uma amiga ― digo. ― A mãe dela passará aqui para me pegar.

― Aonde a senhorita vai? ― ele questiona.

― Marco, pode parar de me chamar de senhorita? ― peço novamente.

― Certo ― ele parece ficar envergonhado.

― Vou ao Meu Escritório ― digo. ― Você conhece?

― É um local bacana.

― Você fica até que horas aqui, Marco?

― Meu expediente termina em 1 hora, senh... Miah ― ele responde.

― Por que você não dá uma passadinha lá depois? ― dou uma piscadela para o rapaz.

― Prometo passar se não estiver muito cansado ― ele responde.

Ouço a buzina na frente do meu prédio.

― Deve ser a Natalie ― indico. ― Preciso ir, Marco.

― Tudo bem.

― Até logo, Marco ― dirijo-me em direção à porta.

― Será que posso ficar com o seu número, Miah? ― ele questiona e eu paro para olhá-lo, mas ele não está me olhando. Noto-o corar.

― Quem sabe... Se fores hoje.

― Eu irei.