Sixteenth Moon escrita por Nath Schnee


Capítulo 15
Capítulo 14 – 10 de Outubro


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoal! Demorei, mas aqui estou novamente! Tudo bem com vocês? Espero que sim. Espero que gostem do capítulo.
Boa leitura!



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Quase ensolarado

O resto daquela noite passou imemorável. Talvez tio Macon tenha perguntado o motivo de eu estar tão distraída, talvez só tenha ignorado. Eu já não lembrava nem a aparência de Ravenwood aquele dia ou o que a Cozinha havia servido para nós.

Não que eu tivesse esquecido tudo o que aconteceu. Pelo contrário, eu simplesmente não conseguia esquecer, tampouco acreditar; mesmo agora, encarando meu teto branco. Mesmo ao tentar fazer algo como uma linha de acontecimentos, tudo parecia surreal, como se fosse tudo um sonho.

Julia aparecera em Ravenwood, de início. Aliás, Julia não. Ridley. Minha prima das Trevas. Eu causei um tornado e a joguei para fora da mansão. Como se não bastasse, ela não tinha aparecido sozinha. Ethan estava lá também. Controlado por sua Persuasão, mas estava. Logo Ethan, logo o garoto que eu não queria admitir ser meu amigo e que eu gostava um pouco além daquilo.

Logo Ethan, o garoto que eu admiti na frente de todos ser meu namorado.

Eu realmente admiti?!

Rolei na cama, inquieta, encarando a parede mais a frente. O que tinha de errado comigo? Eu estava ficando louca? Mesmo que uma parte de mim só quisesse dizer aquilo para afastar Ridley, a outra parte sabia a verdade. Não havia mentira alguma no sentimento que eu tinha. Na vontade de ouvir ele me pedir em namoro como aqueles filmes que Jules e eu assistíamos quando criança.

Porém não existe mais nenhuma Julia. E Ethan não me pediria em namoro. Não quando ele era um Mortal e sabia de qual podia ser meu destino.

Ou, pelo menos, eu queria gritar isso para mim. Queria me convencer de que não haveria nada entre nós. Ainda assim, tudo o que havia na minha cabeça era aquele beijo! O seu cheiro parecia permanecer em mim, e eu quase me sentiria bem em me abraçar — se isso não fosse tão estranho.

O modo como ele admitiu estar apaixonado por mim, o modo como nós parecíamos ser puxados na direção um do outro com uma gravidade dos nossos corpos, um caindo no abismo do outro até que ambos estivessem presos a uma paixão que sequer deveria existir...

O que Ethan estava fazendo comigo?!

Revirei-me na cama novamente, virando para o outro lado. Ouvi passos no corredor, e pelo barulho da coleira, Boo havia ouvido minha agitação. Fechei meus olhos, com intuito de fingir dormir, mas não me lembro de abrir os olhos de volta.


Desobediente.

Mesmo que eu lutasse para controlá-lo, a ventania permanecia desobediente. Os ventos giravam, ricocheteavam, rodopiavam, lutavam uns contra os outros, como se numa luta eterna entre si.

Ou contra nós.

Na mão direita, eu sentia a dor de segurar um galho seco espinhento, que se dobrava a cada instante, cedendo contra o vento. Além dos espinhos, provocavam dor também o granizo batendo forte contra minha pele e meu punho esquerdo, sendo puxado por uma força que tentava me impedir de ser levada para longe. Ethan. Ele estava tentando me salvar. De novo. Eu não podia vê-lo, mas sabia que era ele. Sentia.

Eu não sabia o que doía mais. Meu punho quase quebrando ou pensar que ele nunca conseguiria o que estava tentando.

Mas talvez salvar a si mesmo fosse uma opção viável.

Solte-me e fique seguro, Ethan!

O galho que eu segurava quebrou, apenas aumentando a tensão na mão que Ethan segurava meu pulso dolorido. Não havia escapatória. Eu seria levada, o vendaval me levaria para a escuridão, como sempre previ.

Ethan querendo ou não, nunca mais me encontraria de novo.

Meu braço escorregou pelos dedos dele, senti minha pele novamente sendo arranhada por suas unhas fincando em mim desesperadamente, falhando em evitar o pior. E mesmo em meio ao tornado, eu me sentia calma.

Ethan conseguiu se apoiar na árvore  quando me perdeu. Estava salvo agora.

Era isso o que importava.

LENA!


Acordei sentindo meu corpo ardendo e doendo em diversos lugares. Era uma sensação estranha, nova, mas eu não podia negar o quando parecia o que deveria ser a sensação de ser açoitada.

Levantei devagar. Meu cabelo estava mais espantado que eu, de pé em mais direções do que eu podia contar. Um filete de sangue escapava do meu punho arranhado e minhas mãos pareciam cheias de farpas, eu não duvidava que estivessem.

Depois de levantar, encarei minha cama molhada. Suspirei e me aproximei para pegar um dos lençóis. Como se não quisesse ser lavado, ele escapou das minhas mãos, eu podia jurar que alguém puxou do outro lado.

Hesitei e encarei o nada.

— Quem está aí? — Minha voz soou um pouco baixa, apenas para que Boo ou Tio M não ouvissem. Ninguém respondeu, e o lençol foi levantado no ar de qualquer jeito, como se algo segurasse, mas ao mesmo tempo não fosse nada. Seria um Feitiço?

Ou um Conjuro…

Suspirei, rindo um pouco aliviada em perceber o que era.

— Isso me assustou, Casa. Mas pode levar. — Ri e, como se ouvisse, o lençol desapareceu em um piscar de olhos, assim como os outros, o colchão e as roupas sujas do balde.

Saí do quarto para tomar banho e tirar toda aquela água de chuva de mim. Pelo menos não era lama como da última vez. Quando entrei no chuveiro e observei as bordas do sonho desaparecerem, pensei em como aquilo parecia acontecer de propósito, como o destino demonstrava querer nos unir.

Eu poderia ter ficado com vovó em Barbados até minha Invocação, mas não era o que minha família decidiu por fim, e eu vim para Gatlin. Eu sempre conheci tio Macon, ele sempre cuidou de mim, mas eu ainda não tinha visitado a Mansão Ravenwood de Gatlin, onde ele morava de verdade. Chegava a ser estranho eu, de repente, morar nela.

O rabecão tinha que quebrar logo na hora e no lugar que Ethan passaria naquela estrada. A música tinha que existir apenas para nós dois. Havia o Kelt também, a estranha ligação mental que nunca havia existido antes entre eu e um Mortal.

E os sonhos. Meses antes de vir para esta cidade abandonada, eu já havia tido alguns. Sempre com aquele garoto, sempre com a sensação de que ele tentava me ajudar e não conseguia. Eu já não conseguia lembrar quando fora o momento exato que Ethan entrou na minha vida.

Ainda assim, tudo me ligava a ele.

Ergui a cabeça, deixando a água do chuveiro levar os últimos indícios do sonho. Eu deveria aproveitar isso, não deveria? Pelo menos por um dia, agir como se Ethan fosse realmente meu namorado, mesmo que nenhum de nós tivesse coragem de admitir algo como isso, agir como um casal de adolescentes normal, com problemas de pessoas normais. Não iria custar nada, certo?

Quando saí do banho, não fiz como sempre. Não usei minha caneta para escrever o número em minha mão, fiz um esforço para também não surgir sozinho como em alguns dias. Até mesmo minha roupa foi diferente, pois vasculhei meu guarda-roupa até, no fundo, encontrar um suéter de lã que tia Delphine me dera uma vez. Ela possivelmente me confundiu com Reece, pois aquilo não chegava nem perto do meu estilo. Eu não usava vermelho. Mas iria dar uma chance àquele suéter confortável.

Assim que acabei de me arrumar, saí do quarto e desci as escadas. Como todas as outras vezes, ver Ravenwood despertava uma profunda admiração quanto a tudo. Era como visitar um museu, mas que mudava seus aspectos e suas obras a cada entrada que você pagava, tornando tudo novo sempre, sem deixar de ser… bom, um museu.

A escada, pela primeira vez, tinha um corrimão preto, em destaque do mármore da escada, que corri os dedos conforme descia. O ferro intrincado quase me impedia de ver a luz dourada que preenchia o ambiente. Uma dessas fontes de luz era o lustre no teto, feito de cristais que refletiam a luminosidade das velas e tornava a sala dourada como o entardecer no verão. Os sofás e poltronas eram acolchoados, de um marrom pálido com desenhos brancos. As mesas eram de vidro, e as cortinhas combinavam com as outras cores. Dava a impressão de que tudo era de ouro.

Mas eu não queria pensar em dourado naquele dia. Eu queria pensar em verde.

Como sempre, tio Macon me esperava na sala de jantar. Ele não tomava café, mas sempre me acompanhava. Cumprimentamo-nos e eu sentei. Antes que eu percebesse que tinha esquecido a mochila, a casa a fez aparecer do meu lado. Dei um sorriso e voltei ao café.

— Devo comentar sobre o clima ensolarado hoje ou logo estaremos sob outra nuvem negra? — comentou, ainda por trás dos jornais.

— Por que falar sobre dias ruins quando podemos aproveitar os dias bons? — Sorri e olhei em seus olhos negros. Eles deveriam me assustar, porém tudo o que faziam era me dar a sensação de conforto.

Terminei de comer, em seguida peguei minha mochila e me aproximei dele, dando um beijo em sua bochecha.

— Lena. Eu tenho algo para você. — Tio M dobrou os jornais e os apoiou sobre a mesa, levantando e caminhando até mim. Como sempre, estava vestido de maneira impecável com sua camisa branca engomada.

Tirou do bolso um lenço dobrado cuidadosamente, e com a mesma atenção começou a desdobrá-lo. Havia um barbante de contas ali, algo que espantou. Os presentes de Macon nunca eram pequenos, muito menos rústicos como aquele. Meu tio gostava de mostrar que comprava as coisas mais caras que encontrava para mim, então vê-lo me entregar algo tão simples era uma novidade.

Eu peguei. Tinha o tamanho certo para uma pulseira, então olhei para ele e sorri, mesmo que estranhando um pouco. Era um presente, de qualquer forma, e eu estava feliz em receber. Ele deu um nó no barbante, deixando preso como uma pulseira no meu punho.

— Obrigada! Eu gostei muito, tio. — Coloquei a mochila nas costas e dei outro beijo em sua bochecha. — Eu tenho que ir. Eu te amo, tio Macon! Até mais tarde! — Corri porta afora.


Eu estava com uma ideia doida na cabeça, e queria colocá-la em prática. Mas, para isso, precisava de Ethan. Se eu queria agir como uma adolescente apaixonada normal — eu sou adolescente, não tenho certeza se apaixonada e não sou normal — precisava agir como aqueles adolescentes que iam para as quatro últimas filas do Cineplex. Mas dessa vez não iríamos para o cinema. Era para outro lugar que Ethan havia me dito que eles costumavam ir.

Tentei me concentrar nele, em nosso Kelt, para saber se ele já estava acordado. Descobri que ele estava acordado demais, agitado, mas tudo o que consegui entender era que estava com fome.

A caminho do Pare & Roube, encontrei com Link. Nós conversamos brevemente e eu falei que daria a carona a Ethan. Ele deu de ombros e deu um sorriso de quem iria perturbar Ethan mais tarde. Eu apenas ri.

Alguns minutos depois, quase discuti com o policial sobre quem deveria ficar com os donuts que eu paguei, mas acabei conseguindo o que queria e dirigi até a casa de Ethan. Talvez nem mesmo os policiais quisessem competir com a aberração de Ravenwood, então tentei levar aquilo com bom humor novamente. Ele saiu perdendo e eu ganhando.

Ethan estava esperando na esquina. Pareceu espantado ao me ver em vez de Link.

— Você deve ter ouvido. — Ethan falou enquanto deslizava no banco, colocando a mochila no chão, em frente de onde estava sentado.

— O quê? — Eu sorri, um pouco tímida. De repente, ver Ethan cara a cara só me fazia realmente acreditar que minha ideia era uma loucura. Empurrei o saco até ele. — Que você gosta de donuts? Consegui ouvir seu estômago roncando lá em Ravenwood.

Ethan não me respondeu, apenas pegou o saco. Mas me encarava. Eu senti meu rosto corar enquanto olhávamos um para o outro com desconforto. Será que a cena no meu quarto também não saía da cabeça dele?

"Cena no meu quarto"?! Que frase é essa, Duchannes?!

Senti meu corpo assumir a cor da minha roupa, o rubor ficando ainda pior e olhei para baixo, puxando um pedacinho daquele macio suéter, que de repente tinha um significado enorme de distração.

Ethan ainda me fitava. Eu não sabia ao certo o que ele estava pensando, e tinha medo de descobrir. Afinal, o que tinha na minha cabeça era o quanto eu queria vê-lo e passar o dia com ele. Mas e na dele? O que passava?

Ele sorriu e abriu o saco de donuts.

— Tive de brigar com o policial gordo por eles, então espero que você esteja com fome. — Recuperada depois de respirar fundo, manobrei o rabecão para longe do meio-fio.

— Espera. Você só quis me dar carona para a escola então? — Ele parecia realmente pasmo.

— Nosso destino não é a escola. — Abri a janela a janela, permitindo que a brisa da manhã soprasse meu cabelo. Hoje, era realmente o vento, não meus poderes. Era uma sensação boa, eu me sentia leve.

— No que está pensando? Tem alguma coisa melhor em mente?

Eu sorri. Tinha sim, e era uma coisa completamente louca. E queria rir, não podia contar para ele.

— Há algo melhor do que passar nosso dia numa escola maravilhosa como a Stonewall Jackson High? — Mordi meus lábios enquanto fazia o trajeto para um lugar bem longe da nossa escola, mas que ele ainda não iria perceber.

Era algo novo dirigir o rabecão sem ver o número em minha mão, mesmo que ele estivesse em minha mente. 120. Cento e vinte dias até descobrir de que lado eu sou. Mas, enquanto minha Invocação não chega, vou fazer com que, pelo menos hoje, meu dia acabe bem.


Ethan começou a ficar desconfortável no banco assim que chegamos a Summerville. Mas foi quando o rabecão deslizou pela terra atrás da torre de água, na extremidade do outro lado, que ele quase entrou em desespero. E eu quase ri. Dessa vez, eu sabia bem o que adolescentes faziam ali, e estava indo por vontade própria, não por algum engano como quando fomos para as últimas fileiras do Cineplex.

— Lena. Estamos estacionando? Aqui? Na torre de água? Agora? — Ethan estava com uma expressão de quem não sabia se saía correndo ou sorria. Ou os dois.

Eu desliguei o motor como resposta. Mas agora, com o vento entrando pela minha janela e saindo pela dele, enquanto estávamos ouvindo um profundo silêncio, a loucura parecia ainda pior. Eu mal conseguia falar em voz alta.

Não é isso o que fazem aqui? Estacionam?

É. Não. Quero dizer, não a gente.

Ele realmente parecia confuso, e ainda desesperado.

Não pessoas como nós. Não agora no horário de aula.

Olhei para Ethan.

Não podemos ser como eles pelo menos uma vez? Temos sempre de ser nós?

Gosto do que somos.

Eu tirei o cinto de segurança, ignorando sua resposta. Como se ele também não resistisse, também tirou o cinto e me puxou para o seu colo. Eu não pude deixar de sentir um alívio e felicidade por ele não ter saído correndo.

Então é assim que se estaciona?

Eu ri, não pude evitar. Ethan tinha essa capacidade de me fazer rir, de me fazer bem, em todos os momentos. Eu estiquei a mão para afastar o cabelo de seus olhos, mas eles focaram em algo distante dos meus. Focou no meu braço.

— O que é isso? — Ethan pegou meu braço direito, vendo a pulseira que tio Macon me deu pendurada em meu punho. Sua expressão era de enjôo.

— Tio Macon me deu, hoje de manhã

— Tire.

Ele girou a corda, procurando o nó que a fechava.

— O quê? — Senti meu sorriso esmaecer e franzi o cenho. — Como assim? Por que?

— Tira isso, Lena. — Ethan insistiu.

— Por quê? — Puxei meu braço de volta, afastando dele.

— Aconteceu algo ontem a noite, de madrugada.

— O que? — Meu coração estava começando a ficar acelerado, não de um jeito bom.

— Quando eu cheguei em casa, eu estava deitado e ouvi alguma coisa em casa. Amma estava saindo. Eu segui ela até onde ela mora, Wader’s Creek. Ela saiu da casa dela para encontrar alguém no meio da noite no pântano.

— Quem ela encontrou?

— O sr. Ravenwood.

— Por que meu tio foi encontrá-la? — Dessa vez, realmente senti minha respiração falhar.

Tio Macon nunca saía de Ravenwood, e ouvir aquilo que Ethan dizia não me agradava de modo algum. Ser recluso é ruim, mas sair para visitar mulheres em pântanos não era um avanço.

— Eles estavam conversando. Amma falava com os ancestrais dela, ela os chama de Os Grandes. Ela e Macon estavam falando sobre você, sobre mós, e sobre o medalhão.

Não tinha como deixar de prestar atenção quando o assunto era eu. Mas eu não queria pensar naquilo, não naquele momento. Não queria me irritar com Ethan, com Macon, Amma ou qualquer pessoa. Eu não queria me lembrar do que aconteceria comigo, não queria voltar a sentir que minha Invocação estava tão próxima. Só havia uma coisa a ser focada naquele assunto se não os outros que eu estava evitando.

— O que estavam falando sobre o medalhão?

— Não sei o que é, mas disseram que é algum tipo de talismã das Trevas, seu tio contou a Amma que eu não enterrei, e eles estavam surtando por causa disso.

— Como eles poderiam saber sobre o medalhão ser um talismã se nunca o viram? — Minha pergunta irritou Ethan, pois ele me olhou como se não acreditasse no que eu perguntava.

— Que tal focar no que mais importa, tipo como eles se conhecem? Desde quando? Você tinha alguma ideia?

— Não, mas eu não conheço todo mundo que tio M conhece. — Continuei tentando agir como se não tivesse um motivo para me irritar com eles.

— Lena, eles estavam falando de nós. Sobre manter o medalhão longe de nós, e sobre nos manter afastados. Fiquei com a sensação de que eles acham que sou algum tipo de ameaça. Que estou atrapalhando alguma coisa. Seu tio pensa...

— O quê? — Ethan começar e não terminar a frase não era algo exatamente bom.

— Ele acha que tenho algum tipo de poder.

Eu ri alto, gargalhando. Ethan estava desesperado por conta daquilo? Algo tão impossível, até mesmo para tio Macon acreditar. De repente, eu não duvidava que ele simplesmente tivesse sonhado aquilo.

— Por que ele acharia isso? — Tentei parar de rir, uma coisa quase impossível.

— Porque levei Ridley para dentro de Ravenwood. Ele disse que eu teria que ter poder para fazer isso.

Parei de rir, franzindo o cenho. Eu não havia pensado nisso. Os Conjuros de Proteção sobre Ravenwood não era fracos, e deveriam manter Conjuradores das Trevas afastados, principalmente com tamanho poder que era toda a família junta. Mas não era aquilo que aconteceu. Ethan entrou em Ravenwood com Ridley como se ambos fossem muito bem vindos.

— Ele está certo. — admiti.

Ethan não queria essa resposta.

— Você está brincando, certo? Se eu tivesse poderes, não acha que eu saberia?

— Não sei. — Desviei meu olhar para o chão de areia lá fora.

Eu realmente não sabia. Ethan não tinha olhos verdes ou dourados, mas fazia Kelt comigo como se fosse um Conjurador. Não demonstrava ter poder algum, mas tudo indicava que ele tinha alguma conexão com meu mundo. Ele havia me contado uma vez que Amma era uma Vidente, sem deixar de ser Mortal. Sua família era uma família inteira de Videntes. Mas mesmo que ela tivesse essa capacidade, talvez nem ela soubesse se Ethan tinha poderes ou não.

Mas ainda assim, a ideia de que aquele na minha frente era um Conjurador não deixava de ser absurda.

— Relaxe. Tenho certeza de que há alguma explicação. Então Macon e Amma se conhecem. Agora sabemos. — Tentei agir com indiferença.

— Você não parece muito aborrecida com isso.

— O que você quer dizer?

— Eles têm mentido pra nós. Os dois. Se encontram secretamente, tentam nos separar. Querem que nos livremos do medalhão.

— Nós nunca perguntamos se eles se conheciam. — respondi, e acidentalmente enfureci o Wate.

— Por que perguntaríamos? Você não acha esquisito que seu tio vá ao pântano no meio da noite com Amma, para falar com espíritos e ler ossos de galinha?

— É esquisito, mas tenho certeza de que só estão tentando nos proteger. — Tentei desviar o olhar, não queria continuar naquele assunto, sabia que não estava seguindo na direção que eu queria.

— De quê? Da verdade? Estavam falando sobre outra coisa também. Estavam tentando encontrar alguém, Sara alguma coisa. E sobre como você pode fazer mal a todos nós caso você se Transforme.

— Como assim? — Franzi o cenho. Eu não conhecia ninguém chamado "Sara alguma coisa". Com uma dificuldade gigante, tentei ignorar a última frase. Mas Ethan não parava.

— Não sei. Por que você não pergunta ao seu tio? Veja se pelo menos essa vez ele vai contar a verdade.

Aquela foi a gota d'água. Ethan estava chamando meu tio de mentiroso, quando eu o conhecia a vida toda e só conhecia Ethan havia um mês.

— Meu tio arrisca a vida dele pra me proteger. Sempre esteve ao meu lado. Ele me acolheu mesmo sabendo que posso me tornar um monstro em poucos meses.

— De que ele está protegendo você? Você ao menos sabe?

— De mim mesma! — gritei, retorquindo.

Ele havia conseguido testar minha paciência ao limite. Abri a porta e pulei para fora do carro. O vento me envolveu naquela sensação costumeira de que a tempestade estava chegando. O céu azul imaculado lentamente dava lugar a um céu de nuvens negras, e eu já não me importava com isso.

Era incrível a capacidade de um dia bom ir embora pelo ralo, tornando-se apenas mais um tempestuoso. Eu tentava me preparar para ter um dia péssimo, tinha um dia péssimo. Tentava tornar meu dia ótimo, e tinha um dia péssimo.

Ethan não calava a boca, mesmo que eu deixasse claro que não queria falar no assunto.

— Isso não faz sentido. Por que ele encontraria Amma no meio da noite para dizer a ela que ainda temos o medalhão? Por que não quer que a gente fique com ele? E o mais importante, por que não querem que a gente fique junto?

O vento só se tornava mais forte, e só havia nós dois gritando naquele campo deserto. A velocidade do vento só aumentava e eu fechei os olhos desejando que ele me levasse para longe de Ethan. Para longe de Macon e Amma. Para longe de todos.

— Não sei. Pais estão sempre tentando afastar adolescentes, é o que eles fazem. — Abri meus olhos e encarei Ethan com toda a irritação que consegui acumular. Não era muito diferente do que ele sentia também, pelo visto. — Se quer saber por que, talvez devesse perguntar a Amma. É ela que me odeia. Eu nem posso pegar você em casa porque você tem medo de que ela nos veja juntos.

A frase seguinte de Ethan era a pior que ele podia dizer naquele momento. Era como concordar comigo.

— Você só não a entende. Ela acha que está...

— O quê? Protegendo você? Como meu tio está tentando me proteger? Você já pensou que talvez eles estejam ambos tentando nos proteger da mesma coisa... eu?

— Por que você sempre fala isso?

Afastei-me ainda mais dele. Se não duvidasse do meu controle sobre o vento, tentaria fazê-lo realmente me levar para longe dali, decolar até outro país. Ou outro mundo que eu não precisasse discutir sobre meu aniversário.

— O que mais há para falar? É disso que se trata. Estão com medo de que eu vá machucar você ou alguma outra pessoa.

— Você está errada. Isso é sobre o medalhão. Tem alguma coisa que eles não querem que a gente saiba. — Ethan começou a remexer nos bolsos, provavelmente procurando pelo talismã. Mesmo depois de tudo, ele não largava aquele objeto. — Precisamos descobrir o que acontece depois.

— Agora? — Meu estômago se revirou. Já não bastava discutir com Ethan e descobrir mais mentiras de tio Macon, eu precisava ver fogo e morte de novo?

— Por que não?

— Você nem sabe se vai dar certo. — Na verdade, eu estava torcendo para que não desse.

Ethan começou a desembrulhar e apertou o objeto.

— Só há um jeito de descobrir.

Pegou minha mão e segurou firme, impedindo que eu pudesse escapar do seu toque.

A sombra da torre de água começou a perder forma, a luz se tornou mais forte e o familiar movimento, um puxar do meu corpo, que sempre me levava a 150 anos antes, surgiu novamente. Mas ele foi interrompido por um sacolejo.

Abri meus olhos, Ethan me encarava.

— Você sentiu? Começou e depois parou.

Assenti e, aproveitando que ele segurava meu punho mais fraco, empurrei ele para longe e voltei a ficar distante. Meu estômago estava embrulhado, e eu tinha certeza que não era pela "visão falida".

— Acho que estou enjoada do carro, ou sei lá de quê. — Talvez de você, eu queria dizer.

— Você bloqueou?

— Como assim? Não fiz nada. — Eu sequer sabia de onde vinha aquelas visões, como poderia bloqueá-las?

— Jura? Não usou seus poderes de Conjuradora, nem nada assim? — insistiu, duvidando de mim. Quanto mais Ethan falava, mais eu me irritava com ele.

— Não, estou ocupada demais tentando afastar seu Poder da Burrice. Mas não acho que sou forte o bastante.

Pela primeira vez, eu estava tentando afastar ele de mim por raiva, não por medo que se aproximasse demais. Porém, ele não estava sequer ouvindo, olhando o medalhão como se ele fosse responder suas perguntas. Então ele se aproximou de mim de novo.

— Tire isso. — Colocou o dedo sob o fio da minha pulseira, erguendo até meu braço estar na altura dos seus olhos.

— Ethan, é para proteção. Você disse que Amma faz essas coisas o tempo todo.

— Acho que não é.

— O que quer dizer? — Ethan só podia estar ficando louco.

— Que talvez tenha sido por causa disso que o medalhão não funcionou.

— Não funciona sempre, você sabe. — Eu já estava ficando cansada.

— Mas começou a funcionar, e algo impediu.

Balancei minha cabeça, cabisbaixa e quase desistindo.

— Você acredita mesmo nisso.

— Prove que estou errado. Tire isso.

Olhei para ele de novo. Ethan definitivamente estava ficando louco. Por que uma pulseira iria impedir uma visão? A única coisa que coincidia com a suposição dele era a ocasião, o fato de eu não ter usado antes. Ethan ainda tinha esperança.

— Se eu estiver errado, você pode colocar de volta.

Hesitei por um segundo, depois estendi o braço para ele desamarrar, desistindo. Ele afrouxou o nó e tirou o barbante, colocando no bolso. Esticou a mão para o medalhão e eu coloquei minha mão por cima. Senti seus dedos se fechando sobre ele e começamos a girar para o vazio…


A chuva começou quase imediatamente. Chuva forte, um aguaceiro. Como se o céu despencasse. Ivy sempre dizia que as gotas da chuva eram as lágrimas de Deus. Hoje, Genevieve acreditava. Eram poucos metros, mas Genevieve não conseguia chegar lá rápido o bastante. Ela se ajoelhou ao lado de Ethan e aconchegou a cabeça dele nas mãos. A respiração dele estava entrecortada. Ele estava vivo.

— Não, não, não o garoto também. Vocês tiram muita coisa. Muita. Não esse garoto também. — A voz de Ivy chegou a um tom frenético e ela começou a rezar.

— Ivy, chame ajuda. Preciso de água, uísque e alguma coisa para retirar a bala.

Genevieve pressionou o material acolchoado da saia no buraco que tinha sido o peito de Ethan até poucos momentos antes.

— Eu te amo. E teria me casado com você independente do que nossa família pensa — sussurrou ele.

— Não diga isso, Ethan Carter Wate. Não fale como se fosse morrer. Você vai ficar bem. Vai ficar bem — repetiu ela, tentando convencer a si mesma tanto quanto a ele.

Genevieve fechou os olhos e se concentrou. Flores desabrochando. Bebês recém-nascidos chorando. O sol nascendo.

Nascimento, não morte.

Ela viu as imagens na cabeça, desejando que fosse assim. As imagens se repetiam em sua mente.

Nascimento, não morte.

Ethan engasgou. Ela abriu os olhos, e os olhos dos dois se encontraram. Por um instante, o tempo pareceu parar. E então, os olhos de Ethan se fecharam e a cabeça dele virou para o lado.

Genevieve fechou os olhos de novo, visualizando as imagens. Tinha que ser um engano. Ele não podia estar morto. Ela tinha evocado seu poder. Tinha feito isso um milhão de vezes antes, tinha movido objetos na cozinha da mãe para dar sustos em Ivy, curado filhotes de pássaro que tinham caído dos ninhos.

Por que não agora? Quando importava?

— Ethan, levante. Por favor, acorde.


Quando abri os olhos, ainda estávamos no campo, sem nos mover. Ethan demorou um pouco mais para olhar em volta, o que significa que talvez também tenha demorado a perceber que eu estava quase chorando.

— Oh, Deus.

Eu não conseguia encarar as visões com indiferença. Eu me sentia sempre no lugar da Genevieve, e sentia Ethan no lugar daquele soldado, Ethan Carter Wate. Genevieve não podia perdê-lo! Eles se amavam muito!

O Ethan Lawson Wate, ao meu lado, se abaixou e tocou na grama. Só então eu percebi a mancha rubra que marcava o chão, as plantas e tudo ao nosso redor.

— É sangue.

— Sangue dele? — Meu coração não parecia bater direito.

— Acho que sim. — Ethan olhou em volta, como se procurasse mais vestígios da visão, mas eu estava ocupada em meus próprios pensamentos.

Pensamentos hesitantes que admitiam que ele não tinha errado.

— Você estava certo. A pulseira estava nos impedindo de ter a visão. Mas por que tio Macon me diria que era para proteção?

— Talvez seja. Só que não só pra isso.

— Você não precisa tentar me fazer sentir melhor. — Meu cansaço só parecia maior depois da visão.

— Obviamente, tem alguma coisa que eles não querem que a gente descubra, e envolve o medalhão, e estou disposto a apostar que envolve Genevieve também. Temos que descobrir o máximo possível sobre os dois, e temos que fazer isso antes do seu aniversário.

— Por que meu aniversário?

— Ontem à noite, Amma e seu tio estavam conversando. Seja lá o que eles não querem que a gente saiba, tem a ver com seu aniversário.

Eu respirei profundamente, tentando não me irritar com o fato de que tudo apontava para a mesma coisa, mas Ethan não acreditava no que eu dizia.

— Eles sabem que vou para as Trevas. É disso que se trata.

— O que isso tem a ver com o medalhão?

— Não sei, mas não importa. Nada disso importa. Em quatro meses, não serei mais eu. Você viu Ridley. Vou ficar daquele jeito, ou pior. Se meu tio estiver certo e eu for uma Natural, então farei Ridley parecer uma voluntária da Cruz Vermelha.

Desviei o olhar novamente, mas Ethan me puxou para perto dele é me envolveu em seus braços, meu corpo encontrou no seu peito aquele lugar tão confortável de antes. Toda a minha raiva tinha sumido, sendo consumida pela resignação de que eu iria para as Trevas, mesmo que Ethan tentasse me proteger com seu abraço. Seria como nos sonhos, eu seria levada para a escuridão, não importava quanto ele tentasse impedir.

— Você não pode pensar assim. Tem que haver um meio de impedir isso, se for mesmo a verdade.

— Você não entende. Não tem como impedir. Apenas acontece. — Minha voz estava mais alta, eu estava frustrada com ele insistindo em lutar contra aquilo. Ethan não viu o que vi acontecer com Ridley. Não tinha noção de como aquilo podia acontecer comigo também.

— Tá, talvez você esteja certa. Talvez apenas aconteça. Mas vamos descobrir um jeito de fazer com que não aconteça com você.

Olhei para Ethan. Em outro momento, eu teria chorado, mas a exaustão me impedia. Não soltei dos braços dele, sequer discuti novamente se eu tinha alguma escolha, apenas fitei seus olhos castanhos Mortais quase ocultos pelo cabelo. Ele parecia com Ethan Carter Wate. Mas eu não queria que tudo acabasse como tinha acabado para ele e Genevieve. Mas se ter um final diferente significava que eu iria para as Trevas e ele ficaria vivo, eu não queria desperdiçar tudo em uma luta vã.

Atrás de Ethan, o céu estava nublado. Não havia descrição melhor para o meu humor:

— Não podemos apenas aproveitar o tempo que temos?

O rosto de Ethan se tornou pálido, ele pareceu não se sentir bem por um momento, com minhas palavras pesando no ar. O vento parecia tentar empurrá-las para longe, assobiando ao nosso redor com força e grande velocidade. Apesar de tudo, eu não estava irritada. Eu estava cansada. Eu só queria que tudo aquilo acabasse. Mas aquilo era apenas o início de tudo — o início da tempestade.

Uma tempestade que podia nunca mais passar até o meu aniversário, onde ela poderia se tornar um cataclismo.

Eu só esperava que Ethan não acabasse embaixo dele.

— Não fale assim. Vamos descobrir um jeito.

Eu tinha certeza que nem mesmo Ethan acreditava naquilo.


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Notas finais do capítulo

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