Dad's Boyfriend escrita por Bruno Borges


Capítulo 20
A vaca de nome Sharon


Notas iniciais do capítulo

Olá! Hoje volto com as narrações dos personagens. Vocês devem ter ficado confusos sobre o motivo dos últimos capítulos terem sido todos narrados em terceira pessoa enquanto a maioria sempre foi narrada por diferentes personagens. Pois bem, isso vai ficar bem claro ao final, mas acho que já imaginam o motivo de um narrador onipresente em alguns capítulos.
Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/618678/chapter/20

(David — Floresta Encantada, há muitos anos atrás

 ou algumas horas antes do reencontro em Storybrooke)

Decidi  que buscaria a ajuda de Rumplestiltskin para voltar para casa. Há muito que não sentia aquele frio na barriga e a insegurança de estar prestes a pedir um acordo com o Senhor das Trevas. Gold havia desaparecido durante o ataque dos deuses em Storybrooke e ninguém teve mais notícias dele, o que foi na verdade, um alívio pra todo mundo. Rumple ou Gold por perto nunca os deixou confortáveis. Ele não era confiável e volta e meia trazia problemas de novo. Mas lá eu estava, prestes a se encontrar com aquele demônio outra vez.

— David. — Chris segurou minha mão, me puxando pra olhar pra ele. Não posso negar que fiquei feliz com o toque do mesmo modo que Neal ficava feliz quando eu dizia que ele podia escolher duas coberturas para seu sorvete. — Você tem certeza que vai pedir ajuda a esse sujeito? — ele me olhou com olhos de pena. Nós estávamos do lado de fora do castelo do Senhor das trevas, a uns dez metros da grande porta. — Você está tremendo. Eu não quero que faça algo que vá se arrepender depois. Se você não quer fazer isso, tenho certeza que podemos encontrar outra solução. Pode confiar em mim.

Eu fiquei perdido em seus olhos, com a boca entreaberta com tamanha calma e segurança que meu namorado cabeça-oca demonstrava naquele momento. Ele estava completamente certo. Eu não queria fazer aquilo de jeito nenhum. Mas que outra opção eu tinha? Apesar de incrédulo nas possibilidades de sairmos dali de outro jeito, ele tinha dito exatamente o que eu queria ouvir e já estava prestes a desistir, abraçá-lo e dar-lhe um prêmio Nobel ou muito bacon. Eu não sei por que, mas sei que ele merecia um dos dois.

Antes que eu pudesse falar qualquer coisa, um barulho de madeira rangendo veio do castelo e imediatamente o puxei para atrás de uns arbustos ali perto. Nos abaixamos e ficamos escondidos enquanto a figura asquerosa de Rumplestiltskin saía pela porta, incomodada com o sol.

— Engraçado. Tive a sensação de que alguém me esperava aqui fora. Vai ver finalmente o que todos falam se tornou verdade e comecei a ficar louco. — ele tagarelou sozinho e soltou uma série de risadinhas agudas que fez Chris me olhar com os olhos arregalados.

Um cachorro vira-latas surgiu ali de um lugar e rezei para que ele não latisse em nossa direção. Rumplestiltskin pareceu bem incomodado com a presença do bichinho, e fez um movimento com as mãos como se estivessem molhadas e ele as sacudisse para espirrar água no cachorro e nesse instante, houve um estouro e no lugar do cachorro só havia uma fumaça amarela que exalou um cheiro terrível de enxofre.

O que tinha acontecido com aquele animal ou pra onde tinha ido, eu não queria saber.

Rumple entrou e a porta se fechou sozinha atrás dele. Chris pousou sua mão em meu rosto e me olhou ternamente. — Eu não quero fazer isso. Tenho medo desse feiticeiro ou sei lá o quê. Você quer mesmo?

— Não. — respondi sem hesitar, segurando-o também, dos dois lados do rosto e lhe dando em seguida um breve selinho. — Vamos sair daqui. Vamos encontrar uma outra solução.

Nós caminhamos o dia todo, conversando obre todo tipo de coisas. Falamos da gente, do que ele poderia fazer depois da faculdade, e sobre o futuro. Mas ele ficou interessado mesmo em saber quem de Storybrooke que ele conhecia era como personagem dos contos de fadas. Ele ficou em choque quando mencionei que Neal brincava com a Alex, filha de Cinderella, que era Ashley Boyd no nosso mundo. Ele me contou sobre a história da festa da sala de Juliet, em que saiu correndo e se trombou com uma mulher e uma menina que pela minha descrição só podiam ser Ashley e Alex e que tinha ficado com muita vergonha por isso pois a mulher havia lhe chamado a atenção furiosa.

Ele me perguntou se Peter, amigo de sua ex-namorada era o príncipe Hans, de Frozen e eu comecei a rir. Eu não havia conhecido Hans antes, mas sabia que era ele.

— Sempre odiei aquele mala até no filme. — ele resmungou fazendo cara feia. — Eu acho a Elsa chata, mas aquele cara é sem comparação! Aliás, jurava que ele ia ter poderes de fogo, pra ser um inimigo a altura. Nem isso, ele é um bocó.

Eu ainda estava rindo quando respondi. — Também acho ele um bocó. Prefiro você. Qual seu poder? — Christopher me olhou inconformado e visivelmente irritado com a ousadia da minha pergunta. — Você tem o poder de me seduzir. — brinquei em seguida, porque ele não tinha nenhuma resposta.

A noite caiu e as estrelas encheram o céu. Estávamos no meio da floresta, procurando um lugar para fazer uma fogueira e acampar quando escutamos um som de passos se aproximar de nós.

Eu engoli em seco quando a figura se aproximou e pude ver melhor quem era. Outra vez puxei Christopher e nos escondemos. Por sorte não tínhamos acendido nenhuma fogueira ainda, ou seríamos descobertos. Mas como estava muito escuro, o rapaz passou por nós e continuou andando.

Chris me olhou de boca aberta, tentando gaguejar algo sem som.

— Sim, aquele sou eu. — disse bem baixinho quando o jovem David já estava longe.

— Uau. — ele começou a rir. — Isso é surreal!

Eu me sentei no chão e fiz um sinal pra que ele, que ainda estava agachado se escondendo atrás do grande tronco, se sentasse também.

— Você lembra do dia que nos conhecemos? Ah não, certo. Você não lembra, é verdade. Pois deixe-me contar. — ele deitou o rosto em uma das mãos, que apoiou com o cotovelo na coxa e me ouviu atentamente, sorrindo desde o começo. — Como pôde ver, eu era um camponês bem pobre da Floresta Encantada. E houve uma época em que minha mãe e eu, passamos por muita dificuldade na nossa fazenda. Nessa época não tínhamos bicho quase nenhum, plantação nenhuma. Tudo que plantávamos morria. Tudo que tínhamos era uma vaca e algumas galinhas, que mais davam despesa que lucro pra nós. Mas não deixavam de ser uma fonte de alimento, pelo menos tínhamos leite e ovos. Mas minha mãe pediu que eu fosse à cidade mais próxima e vendesse a vaca no mercado. A gente precisava de novos grãos para plantar e comida decente. Foi difícil aceitar, eu adorava aquela vaca. — admiti um pouco tímido. — Mas não tínhamos muita escolha. Bem... — suspirei fundo. — eu fui roubado no caminho. Uma velha cigana me parou pra pedir ajuda, disse que estava há dias sem comer e eu fui pegar algumas das poucas moedas que tinha para ajudar aquela senhora. No momento em que mexi nas minhas coisas pra procurar as moedas, pelo menos uma meia dúzia de homens surgiram do meio das árvores e avançaram em minha direção. Eles levaram todo dinheiro que encontraram e a vaca. — Nesse momento o sorriso dele se desfez e Chris foi tomado por uma expressão muito triste. — Eu fiquei horas ali parado, sentado no chão. Mas decidi que iria à cidade mesmo assim e tentar comprar comida e sementes com o resto de dinheiro que tinha, escondido pela minha roupa e sapatos. Minha mãe sempre me fez andar com dinheiro escondido, pra nunca ficar sem nada caso fosse roubado. Eu sabia que não era muito, mas tinha esperança de convencer algum comerciante muito bondoso a compreender minha situação e me fazer um preço mais barato. — a essa altura os olhinhos dele brilhavam ansiosos. — Eu cheguei à cidade. Não consegui nenhum acordo. O sol estava muito forte e eu não aguentava mais de fome.  Foi quando encontrei você. Christopher. Estava um calor de uns 30º e você estava com uma roupa preta enorme de mangas cumpridas que cabiam dois de você dentro. Você estava com um carrinho de madeira vazio e reclamando sozinho.  “Eu não acredito nisso!”, você gritava em alto e bom tom. “Todo meu gelo derretido e ainda não vendi nenhum!”

— Corta essa! — ele protestou entre risos.

— Eu juro por tudo que é mais sagrado! Você saiu de Arendelle para vender gelo num reino vizinho debaixo de sol, Kristoff. — me permiti a chamá-lo assim outra vez. — Ah! E você não sabe quem estava te fazendo companhia.

— NÃO! O Sven?!

— Sim! Você e aquela rena, debaixo de um sol danado, com aquele carrinho vazio. Você tropeçou numa pedra e eu comecei a rir de você. E você veio tirar satisfação comigo todo bravo. Mas nossas barrigas roncaram simultaneamente, foi embaraçosamente engraçado. Você por algum motivo, esqueceu que estava bravo e começou a se explicar todo embobado, contando o que tinha acontecido consigo e como voltaria pra casa de mãos vazias e não teria experimentado o pão recheado dali que tanto estava com vontade. E eu te contei minha história também. Você se sentiu muito, muito mal por mim. Então tirou uma cenoura do bolso e disse que não era muito, mas era tudo que tinha pra almoçar. Que o Sven tinha comido todas as outras. Então você quebrou a cenoura no meio e deu a parte mais gorda pra mim.

Kristoff estava sorrindo com os olhos. — Cara, olha isso! Como eu era bonitinho! — ele disse cobrindo a boca com uma das mãos. — Não, mas sério, eu totalmente acredito nisso. Soa exatamente como algo que eu faria com você. Mesmo que não te conhecesse direito. — e então mexeu com a cabeça, gesticulando pra que eu prosseguisse.

— Eu não queria aceitar, mas estava com muita fome. Nós comemos juntos a cenoura e nós dois continuamos com fome. Você estava se despedindo de mim quando te pedi pra esperar um pouco. Eu tirei todas moedas que tinha escondidas e nos sentamos no chão pra contar. Eu tinha o exato dinheiro para comprar um pão recheado qual você tanto queria.

— E você comprou? — ele coçou os olhos.

— Comprei. Nós dividimos também. E eu gostei da sua companhia e de conversar com você. Então não te deixei ir embora. Eu te levei a um lago que conhecia ali perto, para que o Sven pudesse beber um pouco de água. Mais tarde, Sven derrubou a barraca de um comerciante e fomos perseguidos por uns três quarteirões por uns oito homens furiosos. A gente fugiu pra um bosque, invadimos território de um grupo de Centauros e também fomos perseguidos por eles.  Aquela mulher que vimos hoje, Marian, salvou a gente, nos dando cobertura com seu arco e flechas e nos levando por um caminho seguro até uma vila ali perto. Nós nos separamos aquele dia, mas nos encontramos um punhado de outras vezes, nas mais inusitadas situações e nas mais inacreditáveis coincidências. Nós nunca combinamos de nos encontrar em algum lugar, mas sempre nos encontrávamos mesmo assim. Acho que era o destino que queria que estivéssemos por perto. Você foi por um bom tempo, um dos meus melhores amigos.

Kristoff não disse mais nada. Ele simplesmente se aproximou de mim mordendo o lábio inferior num sorriso malicioso. Eu olhei brevemente nos olhos dele e depois para sua boca e nós caímos no chão, com ele por cima de mim. Começamos a nos beijar e ele abriu singelamente os botões da minha roupa. Eu passei minas mãos pelos braços dele e ele apoiou sua cintura contra a minha. Estava muito escuro, mas o céu estrelado. E estava um clima perfeito para tirarmos nossas roupas e fazermos sexo ali mesmo. Se um mugido não tivesse atrapalhado tudo.

— Você ouviu isso? — ele disse se desgrudando da minha boca repentinamente e olhando pros lados.

— Sim... Eu acho...

— David, é a sua vaca! Os ladrões devem estar por perto! – ele me fitou bastante preocupado e ao mesmo tempo, de alguma forma, esperançoso, era difícil de entender.

— Não, Chris. Isso é impossível. Eu não terminei de te contar a história. Mas agora, é a noite do dia em que te conheci. Eu voltei, rumo à minha casa sem um tustão. Eu revirei toda essa floresta em busca dos bandidos pra reaver minha vaca. Eles eram muitos, mas dessa vez eu estava disposto a lutar. Ver o quão corajosa era a mulher que nos salvou deve ter me dado um gás. Eu não achei nada, nem eles, nem sinal da vaca. Procurei por pegadas, mas olha só, o chão tá coberto de folhas. E você me viu passando por aqui. Eu procurei nessa área toda. Não tem chances da minha vaca estar aqui e eu não ter visto. Além de que fui roubado muito longe daqui. Entretanto, e atenção ao entretanto, eu tive uma surpresa quando cheguei em casa de madrugada. Um homem achou minha vaca e a levou até a fazenda a noite. Perguntou para minha mãe se a vaca era dela. — dei uma risada. — Pobrezinha, imagina o susto! A vaca volta e o filho, até então, não. Mas no dia seguinte ficou tudo bem.

— Você não só passou por aqui e não viu sua vaca como passou por aqui e não viu nós dois. Vamos procurar essa vaca. — ele se levantou e estendeu a mão pra mim.

Eu sacudi a cabeça em desaprovação, mas peguei sua mão e me levantei. — Não foi necessariamente um som de vaca.

Ele simplesmente ignorou meu comentário. — Qual era o nome da sua vaca, David?

— Quem disse que a vaca tinha um nome?

— Claro que tinha, eu conheço você e é sua cara por um nome na vaca. Um nome de gente. — ele disse fazendo careta.

— A vaca não tinha nome. — insisti constrangido.

— Me fala logo o nome da vaca, caramba!

— Sharon. — acabei falando com um risinho de canto.

Nós saímos andando por ali e ele inventou de gritar a vaca pelo nome de “Sharon” e eu tive um ataque de risos. Realmente a vaca não tinha um nome.

— Para com isso, seu doido! E se eu, e por eu digo o eu novinho, escutar você e vir ao nosso encontro?

— Aí você evita contato visual e eu vou perguntar se ele perdeu uma vaca e oferecer ajuda pra procurar, oras.

— As vezes seu raciocínio me surpreende. Sério. — coloquei a mão sobre minha testa, esfregando-a.

— Obrigado! — ele sorriu inocente.

— Não foi bem um elogio, eu disse isso porque se você topar com o David novinho, ele pode reconhecer você também. E se           fingir que só quer ajudá-lo a procurar, vai perguntar porque estava chamando a vaca de Sharon. E espera, ele pode perguntar como sabe que é uma vaca.

— Nossa. — ele parou seus passos por um instante e olhou pra mim que estava um pouco atrás. — Você é tão inteligente. Tem razão, mas quanto a saber que é uma vaca eu sei porque sei reconhecer esse barulho, oras. Ou vaca ou boi.

— Boi? — indaguei após uma longa risada.

— Sim David, parece que nunca viu, eles fazem o mesmo barulho, sabia?  — Eu estava tendo outro ataque de risos quando ele pôs a mão na minha barriga e me mandou ficar quieto. “Shhh!”, ele fez sinalizando com o indicador na boca. — Ali. — ele apontou a alguns metros à frente , lá estava a minha vaca de muitos anos atrás, deitada a um riacho de distância de nós.

— Oh meus deuses. — eu fiquei incrédulo. — É mesmo a minha vaca. Eu passei por aqui no dia e não vi nada. Ela deve ter fugido dos bandidos. Minha garota!

— Vamos tocá-la pra sua casa. — ele disse indo a frente e eu puxei com pressa para trás de novo.

— Você está doido? Nós não podemos mudar o passado. Já basta toda confusão que nos metemos hoje. Esse foi um dia importante na minha vida e amanhã essa vaca vai estar na minha casa quando eu chegar, por isso devemos ficar na nossa pra tudo ocorrer exatamente como aconteceu.

Ele olhou pra mim e assentiu. Nós decidimos nos sentar ali, além do riacho e observar o misterioso homem chegar e levar a vaca. Nós ficamos por umas duas horas e eu já estava com o corpo dolorido, querendo um colchão para deitar e dormir. A vaca, por sua vez, estava muito bem confortável deitada sobre um monte de folhas debaixo de uma árvore e estava dormindo ali mesmo.

— Chega. — Chris levantou-se irritado. — Vou fazer alguma coisa.

— Não, Chris! Você tá louco!? E o que eu te falei? Você não pode mudar isso, vamos ficar aqui e esperarmos o homem levar a vaca pra minha mãe.

— Acorda, Harry Potter. Você não percebeu ainda? Não vai vir nenhum Tiago aqui te salvar dos dementadores não! — ele resmungou como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. Eu demorei alguns segundos pra raciocinar e entender o que ele estava dizendo.

— Não! Não... Você... Você acha? — eu estava começando a ter minhas próprias dúvidas. Talvez não viesse nenhum homem mesmo se ficássemos esperando. Talvez nós estivéssemos destinados a interferir nessa história. Porque qual fosse a realidade, haveria um David viajante do futuro ali com seu namorado pra garantir que seu passado acontecesse de forma correta.

Antes que eu pudesse  fazer alguma coisa, Chris estava pulando por pedras no riacho e atravessando do outro lado ao encontro da vaca. A bichinha acordou assustada ao vê-lo e ameaçou fugir, mas ele conversou com ela algo que não ouvi e de alguma forma conseguiu acalmá-la. Christopher abraçou o pescoço da vaca e encostou sua cabeça na dela, acariciando-a. Por um momento, pude ver Kristoff e Sven se entendendo juntos. Ele realmente levava jeito com os bichos.

— Me mostre o caminho mais rápido pra sua casa. — ele disse baixinho com um sorriso enorme no rosto.

(Chris)

Depois que resgatamos a vaca, David me mostrou um atalho para sua casa. Andamos em silêncio por alguns minutos até que decidi quebrar o clima de tensão, mas não sei se tive uma boa ideia introduzindo aquele assunto.

— Então... Eu queria saber. Você já tinha se sentido atraído por um homem antes? — perguntei sem olhá-lo nos olhos.

Meu namorado tossiu incomodado. — Eu nunca parei pra pensar nisso. — ele coçou a cabeça. — Mas agora que perguntou, não sei, talvez eu tivesse ficado admirado por um homem antes. Graham, o antigo xerife da cidade, era um cara bastante bonito. Sempre achei isso dele, mas como era apaixonado pela minha mulher, não posso dizer que achei algo estranho. Mas confesso que não teria me incomodado de ter sido beijado por ele, se fosse um homem livre à época. — David deu uma risadinha. — Mas eu teria entendido como uma mera curiosidade. E você?

Continuei sem olhar pra ele. Sabia que não tinha motivos e ele simplesmente tinha respondido o que eu perguntei, mas eu estava irritado e insatisfeito com a resposta. — Eu não. Você foi o primeiro a despertar minha atenção e foi quem me fez entender quem eu realmente sou.

Eu sabia que ele entenderia que eu estava com ciúmes, mas não liguei.

— Ei, ei! O que eu disse não quer dizer que também não me descobri com você. Você perguntou se eu tinha me atraído por outro antes e eu respondi que só achava ele bonito. Bom, em todo caso, ele não vive mais em Storybrooke. Ele faleceu há um bom tempo já.

Nossa, “tadinho”. Eu estava morrendo de dó do tal Xerife Graham. Com bastante ênfase nessa ironia. Me chame de sádico, de insensível ou o que for, mas eu estava sim feliz de que esse cara não estava mais na cidade. — Sinto muito, David.

— Tudo bem, Chris, relaxa. Nós nem éramos próximos. — ele abriu a boca e juntou ar pra continuar a falar, mas demorou a pensar em algo. — Enfim, estou feliz que tenhamos descobrindo junto que nos atraímos por ambos os sexos. E agora ninguém, seja de qualquer sexo, vai ficar no meio da gente. Pode ficar desencanado!

Eu parei de andar e a vaca, que me seguia, logo parou também e ficou me olhando. — Você está errado. — disse formando nele uma expressão de paisagem. — Nós não somos iguais, David. Eu não me atraio por ambos os sexos. David, eu sou gay. Você me fez ver isso, mas eu sempre fui. Eu teria continuado minha vida achando que era hétero mas sem estar plenamente feliz, porque estar com garotas sempre foi algo indiferente pra mim. — Ele olhava pra mim, buscando palavras com a boca entreaberta e os olhos assustados, mas nada saía, então continuei. — Eu tinha minha namorada em Storybrooke. Eu a amava... amo. Mas agora entendo que o amor que tenho por ela, não devia ser o amor que temos pela pessoa com quem queremos passar o resto de nossas vidas e sim por um mero amigo. Estou dizendo, que ela nunca foi essa pessoa certa pra mim. E eu achava que estava satisfeito amorosa e sexualmente até conhecer você e me identificar. Agora eu sei como é amar alguém quem quer passar sua vida toda junto. Nenhuma mulher teria me feito me sentir assim.

— Kristoff, eu... — Ele me chamou assim outra vez. Não nego que não era fã do nome, preferia ser chamado de Chris ou Christopher. — Eu não sei o que te dizer. Mesmo. Só quero que saiba que independente da minha sexualidade, a única pessoa pra quem tenho olhos é você. E eu não pretendo tirar você da minha vida. Por ninguém.

Eu entendia ele. Mas não estava feliz. Eu sempre tive muita dificuldade em esconder quando ficava triste ou incomodado com alguma coisa.

Poxa, que droga. Ainda que ele só tivesse olhos pra mim, não era a mesma coisa. Eu já não conseguiria me relacionar com uma mulher de novo. Eu só tinha ele. Eu só queria ele. E David, que já tinha tido um homem que chamou sua atenção antes de mim, poderia me largar a qualquer momento e ter um leque de opções pra me substituir.

(David)

Chris e eu tínhamos acabado de ter uma conversa no mínimo estranha sobre nossos interesses em homens e nossa sexualidade. Eu realmente não esperava que ele fosse se abrir pra mim como literalmente exclusivamente gay, no sentido real da palavra. Tive medo de que ele estivesse confuso do que dizia. Mas ao mesmo tempo, era um alívio porque me senti muito culpado quando começamos a ter algo, porque me sentia mal por tirá-lo de Anna, também minha amiga. Mas sabendo disso, talvez tinha sido melhor mesmo tirá-lo de uma relação frustrada.

E claramente houve uma quebra de expectativa enorme da parte dele por eu não coincidir com ele em como me sentia. Mas qual era a diferença? Nossos sentimentos eram recíprocos! Homo ou bissexual eu o amaria da mesma forma. Eu já tinha refletido sobre minha sexualidade dias atrás e estava muito bem conformado com ela, finalmente. Não é como se alguma coisa tivesse mudado agora. Eu era o mesmo David de horas atrás que ele derrubou no chão e quase despiu no meio da floresta. E agora estava esquisito comigo.

Depois de mais uns vinte minutos de caminhada, já podíamos ver minha velha casa.

— Bom, eu vou lá, vou chamar sua mãe e entregar a vaca, dizendo que a encontrei perdida perto daqui, ok? — Kristoff forçou um sorrisinho.

— Ok, Chris. — ele deu as costas pra mim, mas eu o puxei de volta e o virei pra mim, trazendo seu corpo pra junto do meu. — Eu te amo. — reforcei, olhando em seus olhos e lhe dei um beijo, não lascivo, mas carinhoso e profundo.

Dessa vez ele me olhou com um sorriso sincero, embora suas sobrancelhas fizessem uma expressão triste em seu olhar brilhante, como de quem sorri de emoção, mas após pisar num espinho. — Você não tem noção do quanto amo você. Nós vamos voltar para a casa. Vai dar tudo certo.

Eu não entendia como ele estava tão confiante. Ainda não tínhamos pensado em nada!

Kristoff saiu andando, acariciando a cabeça da vaca para que lhe seguisse. Eu me abaixei e fiquei atrás de uma pedra, olhando de longe. Ele bateu na porta, gritou alguma coisa e logo que a porta se abriu, surgiu uma senhora muito assustada, segurando uma velinha na mão, clareando o rosto dos dois na noite escura. Uma lágrima rolou de um dos meus olhos ao ver minha mãe de novo. Era um sentimento inexplicável, ver minha amada mãe viva outra vez, após tantos anos. Eu não podia ouvir nada, mas eu via bem o que estava acontecendo. Christopher estava segurando os braços dela e dizendo algo para acalmá-la, provavelmente porque se assustara com alguém trazendo somente a vaca, devia ter pensado que algo ruim acontecera ao seu filho. Mas Chris realmente conseguiu acalmá-la. E mesmo de longe, pude vê-la sorrir. Eu sorri junto imediatamente. A cena era linda. Minha mãe agora surpreendia meu namorado com um abraço sincero e humilde, em agradecimento pelo retorno do animal. Era o pouco que ela podia fazer por ele, mas eu sabia que ele também estava feliz.

Eu nunca imaginaria que Kristoff fosse o sujeito que devolveu a vaca à minha mãe. Naquele momento, me lembrei de minha mãe ter mencionado que o homem vestia roupas estranhas, coisa que não me atentei à época. E saber que passei a noite procurando a vaca, inclusive naquele mesmo local e em toda área próxima, enquanto uma versão de mim mesmo no futuro, andava com a vaca rumo à minha casa com o homem que a entregaria de volta à minha mãe.

Queria poder ficar e me assistir chegando de manhã e tendo a surpresa de encontrar a vaca a salvo. Mas era arriscado demais e nós precisávamos de um descanso também.

— Você está chorando? — ele me disse quando chegou até mim.

— Sim. — admiti limpando os olhos e sorrindo pra ele. — Obrigado pelo que fez.

Ele sorria de volta pra mim e isso era muito importante. — O que eu fiz era destinado a fazer, seu bobão. Não tinha como escapar disso. — retrucou seguindo com uma risada.

Chris me abraçou bem forte e passou uma mão por trás da minha cabeça, deitando-a no ombro dele, enquanto acariciava meus cabelos.  — Nós vamos embora logo, eu tenho certeza disso. — acrescentou e beijou minha cabeça, me soltando logo em seguida.

Nós começamos a caminhar pelo mesmo lugar de onde viemos. — Como pode estar tão certo disso? — perguntei. — Digo, aquele cara de dois rostos disse que tínhamos que completar o fim do início ou sei lá. Nós não temos a menor ideia do que temos que fazer para voltar pra casa. Se ao menos tivéssemos uma pista do que ele falou...

“Voltem para onde tudo começou. E retornarão para o ponto de partida após completarem a transição que dá fim ao início”.

Eu tropecei em um galho.

— C-Como é!?

Meu namorado sorriu, confiante. — Você não tem a menor ideia. Eu já decorei falas de filmes mais difíceis que essa. E David, nós concluímos nossa missão aqui. Não entende? Nós voltamos para onde tudo começou. O dia em que nos conhecemos nesse mundo. Nós completamos a transição desse início, quando devolvi a sua vaca. Nós já podemos retornar para Storybrooke, de onde saímos. Não era nenhum enigma super complicado.

Eu comecei a rir. — Você entendeu tudo logo que viu a vaca né?

Ele não respondeu, apenas me olhou sorrindo e ficamos nos olhando felizes, quando um portal se surgiu bem à nossa frente. Bastou que eu entendesse a mensagem para que pudéssemos voltar pra casa.

Eu estendi minha mão para ele, que segurou com força. E um a um, passamos pelo portal.

Chegamos em Storybrooke, no tempo real. E lá era dia. Foi chocante me deparar com toda minha família perto da linha da cidade me encarando. Mas o susto devia ter sido maior ainda para Kristoff.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí!? O que acharam?! Vamos conversar nos comentários!
Aqui vão algumas curiosidades sobre esse capítulo.
As aventuras de David e Kristoff no passado, demorariam uns três capítulos pelo menos, mas condensei e achei melhor colocar tudo num só e inserir muito diálogo pra abordar todos temas que queria abordar.
Essa referência à Harry Potter que o Chris faz, está planejada praticamente desde o começo da fanfic. Desde o momento que decidi que iria sim ter aventura e vilões e não seria uma simples história de "real life", imaginei eles no passado e pensei na referência.
A vaca teria um nome real. Acho que a primeira ideia era chamá-la de "Milky", porque esse capítulo tem uma pitada de referência a João e o Pé de Feijão e o musical Into The Woods. Mas de última hora achei que seria mais engraçado se a vaca não tivesse um nome e David deixasse Kristoff pensar que tivesse. Sharon foi a primeira coisa que veio à cabeça e é o nome de uma drag queen toda trevosa, Sharon Needles.
Sven é mencionado, mas ainda pode ou não aparecer.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Dad's Boyfriend" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.