The Bastard Heir escrita por Soo Na Rae, Lady Ravena


Capítulo 20
Capítulo 16 - A Corte de Hessen / Por Patrick


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura.



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Capítulo 16

A Corte de Hessen

“A bondade é a força do fraco” – Adágio Popular

The Lumineers – Stubborn Love

Não se importaria de passar horas e mais horas pensando nela. Em seus lábios, o formato do queixo, como subia a curva de suas costas, como seus olhos brilhavam. Deixou o ar escapar dos pulmões, materializando-a a sua frente. Havia algumas partes que não poderia contar, outras diria com o coração aberto, se não gaguejasse tanto. Seus quinze anos de nada serviam diante de tanta beleza, era um anjo, flutuando acima de sua cabeça, muito além do que ele poderia chegar, acima de qualquer nuvem ou torre, sem qualquer possibilidade de escalar até ela. Era uma princesa, tão distante. E tão próxima. Gostava de como sua voz soava gentil e como ela cantava, era manteiga quente em pão morno. Era mel na língua. Quando cantava, os pássaros paravam para ouvi-la, e seu coração também. Mas seu amor era inútil ali. Sua Senhora jamais o veria, em meio a trapos tão esfarrapados, carregando cestos cheios de roupas sujas e esfregando o chão com uma escova menor que sua mão. Patrick queria ter nascido filho de algum nobre, qualquer que fosse. Barões, condes, viscondes, qualquer senhor dono de terras por mais longínquas que fossem. Mas nasceu plebeu. Um mero filho de criado, destinado a passar o resto dos dias debaixo do salão de festas, servindo vinho, lavando a latrina que os ricos utilizavam. E ela continuava a ser um anjo.

– Pate! – ouviu-se o nome do garoto, vindo da boca do chefe da cozinha. – Onde está este menino?

Patrick inclinou-se e abriu as pálpebras, perdendo a imagem de sua princesa. Renan o olho de cima a baixo e suspirou, entregando-lhe um pedaço de papel. A letra de Josephine estava bem caprichada, como sempre, mas redonda o suficiente para que pudesse ler. Entretanto Renan não deveria saber que ele sabia ler e por isso disse:

– Está escrito: “Venha aos meus aposentos o mais rápido possível”, da Princesa. – o homem gordo passou novamente seus olhos sobre os ombros de Patrick e mediu-o com exagero. Era comum a princesa chamar por ele, afinal era seu amigo de infância, com quem correra pelo castelo ainda garota e que provavelmente agora a servia como seu pajem. Patrick limpou as mãos nas calças já sujas e deixou o avental sobre a mesa de canto. Renan pigarreou – Espero que não fique muito tempo longe, precisarei de ajuda hoje na cozinha. – e então fez um gesto em direção a porta.

Patrick saiu assim que pôde, sem se intimidar com Renan. Estava indo encontrar a princesa, o chefe dos criados não poderia impedir aquilo, e não poderia descontar, afinal Josephine o tinha como um grande amigo.

O castelo de Hessen tinha paredes altas, com quase quatro metros de altura, porém estreitas, os corredores só permitiam que um homem caminhasse por eles. Os quadros pintados nas paredes eram de antigos reis e rainhas, príncipes e princesas, e mais adiante, uma gravura de Josephine, ao completar seus quinze anos. Faziam mais de três anos que isto acontecera, a princesa era mais velha que ele, mais esperta, madura, importante. Ela nascera nobre, a mais nobre entre todos os nobres. A filha de um rei. E mesmo assim tão bondosa e acolhedora... Dobrou o corredor sem notar. Seus pés sabiam exatamente qual caminho seguir, fazia o mesmo trajeto duas ou três vezes por semana, e sentia o formigamento nas mãos, sempre que parava em frente a porta do quarto de Josephine. Limpou a garganta, pronto para bater e pedir permissão para entrar, porém ouviu as vozes.

– Sua bastarda prostituta! – a voz enraivecida e alta era de Josephine. Patrick nunca a vira gritar assim, e ainda menos dizer palavras tão baixas. – Aproveitadora! Usurpadora! Assassina!

Os pelos da nuca de Patrick se eriçaram. Quem estava no quarto com Josephine que lhe despertasse tanta raiva? Quem poderia ser chamado de aproveitador, usurpador e assassino, tudo ao mesmo tempo, na mesma frase? Patrick aguçou os ouvidos para tentar captar a voz de quem estivesse lá dentro, entretanto o que ouviu deixou-o ainda mais atormentado. O estalo de um tapa. Um tapa forte, violento e preciso. Ouviu o gemido baixo de uma voz doce. Empurrou a porta com o ombro sem se importar com a deselegância. Parou ao pé do batente, encarando a cena.

A cama de Josephine estava arrumada, e a água que ela usava para lavar o rosto pela manhã ainda não fora trocada. As janelas estavam fechadas e ela tinha os cabelos desalinhados e vestia ainda a camisola. Viu por debaixo do pano fino suas formas. Os seios grandes, a cintura fina e as pernas. Sentiu o rubor subir por suas bochechas, pois Josephine estava inclinada, seios a mostra, pernas sugando todo o tecido por entre elas, deixando a virilha bem definida. E os quinze anos de Patrick gritaram mais alto, até que a visse tocando a bochecha, onde havia uma marca avermelhada de dedos. A sua frente, uma mulher. Uma não, a mulher. Isabeau. A mulher soltou o pulso de Josephine com relutância, enquanto arrumava as mangas de seu vestido e dava-lhes as costas, caminhando em direção a porta.

Patrick sentiu vontade de barrá-la, porém não podia fazê-lo. Ele era apenas um criado, e ela uma das amantes mais importantes do rei de Hessen. Assim que a mulher passou a seu lado, sentiu o cheiro de lírios emanando de sua pele. Ela fechou a porta do quarto com um estrondo, e enfim ficaram a sós.

Patrick não se segurou. Correu até Josephine e a tomou em seus braços, tocando seu rosto com gentileza exagerada. Virou-o em sua direção, o queixo da princesa estava bem erguido entre seus dedos, a bochecha vermelha inchada não limitava a beleza estonteante de sua princesa. Os cabelos dela caíam castanho-avermelhados sobre os ombros, e seus olhos... Ah... Patrick sentiu uma vontade terrível de beijá-la. Mas não podia. Não podia nem mesmo segurá-la assim. Ajudou a levantar Josephine e soltou-a imediatamente, se afastando até a cama. Olhou de relance a princesa. Ela arrumou os cabelos com as mãos e sorriu de lado.

– Desculpe a cena, Pate. – e então sorriu abertamente, um sorriso caloroso, cheio de Sol, de fogo e de verão. Era o que ardia ainda mais as labaredas daquele amor fadado ao fracasso que Patrick ainda alimentava. – Espero que não o tenha desrespeitado de alguma forma.

– Dói? – Patrick ignorou completamente o que ela disse, jamais se sentiria desrespeitado pela princesa. Ela tinha direito de pisar sobre ele e de quebrar-lhe todos os ossos, se quisesse. E Patrick não se importaria nem um pouco. – Seu rosto, está tão vermelho. Quer que chame o doutor?

– Não. – a resposta veio rápida e firme, como um nobre sabe fazer desde que nasce. Mas Josephine sabia ser doce, e logo em seguida sorriu, solidária. – Estou bem, mesmo, Pate. Obrigada pela preocupação.

Patrick sentiu aquele calor subir mais ainda em seu peito. Vibrando em ondas.

Por favor, só um segundo. Um mísero segundo, deixe-me te tocar, minha Senhora. Mordeu os lábios, tentando concentrar-se apenas no fato de que a janela ainda estava fechada e que a escuridão reinava na maior parte do quarto. Aprontou-se para acender as velas. Era manhã, mas Josephine odiava olhar o Sol antes de se acostumar com o fato de estar acordada. Ela sentou-se em frente a penteadeira e começou a pentear os cabelos acobreados. Pelo espelho, Patrick conseguia vê-la. Olhos verdes, pele branca. Delicada, como uma flor de inverno.

– Não me olhe tão descaradamente, Pate. – ela repreendeu, de repente. Patrick sentiu as bochechas rubras. Virou-se e, de costas, trocou a água de seu jarro e preparou as roupas de Josephine, um vestido de tecido fino branco, com mangas curtas, deixando os ombros a mostra, a barra cobria os pés, e a cintura era bem apertada. Particularmente, era um dos vestidos preferidos de Patrick. Adorava quando Josephine o vestia, ela sempre parecia ainda mais angelical. A menina terminou de escovar os cabelos e levantou-se.

– Ah, sim, o meu preferido – ela sorriu. Ainda havia uma marca intensa em seu rosto, porém parecia mais que ela dormia sobre a mão, que levara um tapa. As sardas se amontoavam sobre o nariz e ele adorava contá-las.

Josephine pegou o vestido e virou-se. Seguindo um padrão, Patrick deu meia volta e ficou bem próximo a porta, de onde não poderia ver o espelho da penteadeira, muito menos Josephine pelo canto dos olhos. Era assim que vencia todas as batalhas contra o desejo de espiar. Sabia que não podia, mas, raios, ainda era um homem. E ela ainda era a mulher mais linda de toda a Terra. A única em toda a Terra. Única dentro de si.

– Muito bem, meu salvador, venha amarrar isto aqui – ela disse, segurando a fita da cintura. Patrick caminhou até lá e apertou gentilmente a faixa, amarrando-a com um nó firme. Josephine virou-se assustadoramente próxima e segurou suas bochechas. Ela era uma cabeça mais alta. – Você é sempre tão delicado. – e então sorriu.

A única coisa que conseguiu fazer foi desviar os olhos, enquanto as bochechas assumiam uma cor vívida de vermelho e Josephine soltava um risinho malvado e ao mesmo tempo adorável. Largou-o assim como soltava a escova sobre a penteadeira e virou-se, o vestido esvoaçando ao seu redor, inclinou o corpo e abriu as cortinas grandes e grossas. Os raios solares penetraram pelo vidro e brilharam contra os fios avermelhados. Patrick contemplou, fascinado. Tinha certeza de que nunca vira algo tão belo.

O desejo era inegável. Mas não iria ousar mais que uma olhadela.

– Chamai-o para me ajudar em algo. – ela disse, com calma, sentando-se sobre a cama.

– O que desejar, minha princesa. – disse, com cortesia, lembrando-se de se curvar levemente. Josephine balançou a mão de um lado para o outro, como se espantasse um mosquito imaginário.

– É tanta pompa desnecessária – e então bufou – Detesto as pessoas falsas, normalmente elas se curvam e então sorriem, gentilmente. Você entende, Pate? A gentileza é tão rara, quando genuína. Somos gentis apenas com o que nos convêm. Olham para mim, a princesa de Hessen, e então me dão presentes. Mas adorariam estar tomando meu lugar na Corte. – e em seguida ergueu seus lindos olhos, fazendo-o se arrepiar. Ela era a única mulher na face da Terra capaz de empertigar um homem a ponto de arrepiá-lo apenas com seu olhar. Mas não duvide. Josephine era sem dúvida a moça mais bela em toda Hessen.

– Minha cortesia não possui segundas intenções. – Patrick sentiu os ombros desfalecendo, os braços pendendo ao lado do corpo. Ela o observou e então sorriu.

– É claro que não, jamais pensaria algo assim. Eu o conheço, Pate. – e levantou-se, espreguiçando o corpo, alongando as costas. Aquele simples ato era sensual demais, e por isso Patrick desviou o olhar. Seus instintos de adolescente afloravam rapidamente ao lado de Josephine. – O que quero dizer é que... Ah, esqueça. – ela deu de ombros, e Patrick sentiu o coração se reprimir. Havia feito algo errado? – Você pode me fazer um grande favor, Pate?

– Claro. – assentiu com força e convicção. A princesa também balançou a cabeça.

– Preciso saber o que a concubina anda colocando na cabeça de meu pai. – disse, e virou as costas, escondendo seu rosto e a tempestade que passava por ele. – Aquela mulher é uma cobra sorrateira e logo irá mostrar as presas. Temos de pisar em sua cabeça antes. – e então rodopiou nos calcanhares, esvoaçando o vestido, os cabelos e os braços. Patrick segurou a respiração. – Entende, Pate?

– Quer que eu descubra o que ela planeja contra você?

– Quero que descubra o que meu pai planeja contra mim. Isabeau apenas acrescentará algumas coisas, mas antes tenho de ter certeza do quê ele pensa a meu respeito. – então encolheu os ombros – Ele está afastado. Isabeau o roubou de mim por tempo demais. Creio que estou perdendo o jogo.

– Seu pai jamais a trocaria por qualquer outra mulher. – disse, porém Josephine não acreditou. Ela estava com os olhos baixos, um olhar leve pairando sobre o carpete. O impulso de envolvê-la e consolá-la quase o dominou, entretanto conseguiu fechar bem os olhos e continuar – Aposto, Vossa Graça.

– Estamos sozinhos, Pate. Chega de toda essa formalidade. Sabe o quanto odeio isso – e então ela jogou-se na cama, o vestido escorregando pelas pernas. Patrick engoliu em seco. Por que, Deus, por quê? Detestava o modo como seus pensamentos eram guiados para aquilo. Antes sentia apenas a necessidade extrema de falar com ela, de ouvir sua voz, de tocar sua mão. Mas tudo se avolumou. De repente, queria mais. Queria beijar sua boca, seu pescoço, seus seios. Queria acariciá-la. Queria e queria, e isso o torturava. Pois sabia que eram pensamentos imundos, e Josephine não os merecia.

– Sim, Josie. – ele disse, era o apelido de infância, há tempos não chamava Josephine deste modo, mas ela abriu um sorriso caloroso, que o aqueceu por dentro, e bastou para quebrar a muralha de gelo que construía. Furtivamente, aproximou-se da cama e se sentou sobre ela, ao lado de sua princesa. A mão de Josephine estava bem ao seu lado, poderia pegá-la, se quisesse. E queria. Mas não o faria.

– Temo que ele me mande para algum convento, ou que me prometa a um velho doente qualquer. Estou velha, Pate. Logo serei apenas uma mulher com seio caídos, barriga inchada e um ventre não usado. É tudo o que poderei ser, além de um peso morto nos ombros de meu pai. Preciso urgentemente me casar, antes que meu tempo passe. Dezoito anos. Tudo passou tão rápido. – ela não olhava para ele, olhava o teto do quarto. Fixamente. Como fazia quando refletia sobre algo. Era adorável seu ar melancólico. Patrick soltou um som gutural, em concordância. Seus quinze anos também passaram com rapidez. E ele também estava na idade de se casar.

Você obviamente sabe qual ideia se passou por sua cabeça neste instante. Mas ele a afastou com rapidez surpreendente e uma força de vontade ainda mais surpreendente. Patrick era forte, de um modo que outros homens jamais seriam.

– Pate... – ela sussurrou, virando-se para ele. A curva de sua cintura se ressaltou, as pernas entrelaçadas, seus seios... - ... não quero me casar com ninguém.

– Eu sei – ele sorriu e segurou uma de suas mãos, confortando-a – Mas também não quer ir para um convento.

– Exatamente. – ela sorriu, torto. – Quero apenas continuar a ser jovem, sem responsabilidades. Mas... Dezoito anos. – e suspirou novamente, desta vez mais cansada – Sabe, Pate, você pode deitar se quiser. Sei que quer. – e então o olhou com intensidade – Você sempre quer, mas nunca faz. Todos os homens dariam tudo para me abraçar, para poder estar em meu quarto, comigo ao seu lado, sobre a cama. Mas você é o único que se contenta em segurar minha mão e sorrir amigavelmente. Isso machuca, sabia?

– Não pensei que você fosse orgulhosa. – disse, com delicadeza. Era mais uma brincadeira, porém Josephine se levantou, furiosa.

– Não sou orgulhosa. Isto não é orgulho. Você é realmente cego – e então jogou-se novamente contra as cobertas, desta vez vermelha e espumando raiva – Você é tão bobo, Patrick! Eu sei exatamente o que pensa e quando pensa. Mas você não consegue perceber o que eu penso, o que quero.

– Não tenho experiência com entender mulheres. – retrucou, ousado.

Josephine o observou por alguns segundos e então mordeu a língua.

Ela continuou em silêncio, algo que encheu Patrick de perguntas, por isso, deitou-se como ela havia sugerido. Imóveis, na cama, tudo parecia desencaixado. Como se não pertencessem àquele lugar. A cama era grande demais, as cobertas grossas demais. Mesmo sem se tocar, Patrick sabia que nunca iriam se enroscar com perfeição. Ele era mais baixo, seus braços não envolveriam Josephine por inteiro, ela não poderia se deitar sobre seu peito, pois não era grande. Seus ombros também não ajudavam, eram estreitos.

– Você já se apaixonou, Pate? – ela perguntou, de repente. Josephine não estava enraivecida, a discussão foi evitada com sucesso, Patrick suspirou, aliviado.

– Sim – respondeu, naturalmente. – E você?

– Claro. – ela sorriu fraco – Mas ele era horrível. Um esnobe metido. Nunca me perdoei por isso. Graças a Deus ele foi embora da Corte – e então ela virou o rosto, sorrindo.

Talvez você entenda agora o que Josephine queira dizer com “conseguir ler os pensamentos de Patrick”. Assim que o viu, o garoto a encarava, os olhos cinzentos tempestuosos, os lábios entreabertos e uma mensagem fraca pairando sobre seu corpo “Você já se apaixonou por outra pessoa”. Josephine comprimiu uma gargalhada e sorriu, gentilmente.

– Quem era a sua garota?

– Não quero falar disto – ele desviou os olhos.

– Ande, Pate. Conte-me. Ela beijava bem?

– Não beijei ninguém – ele respondeu, bravo. Josephine achava aquele jeito irritado tão fofo...

– Oh, então ela não sabe? Você nunca disse a ninguém antes?

– Não.

Josephine sorriu largo.

– Vamos, conte-me tudo.

– Não quero falar disto. – ele recuou.

– Eu te contei sobre o barão-nariz-em-pé, agora me conte sobre a sua dama.

Patrick sempre enrolava, mas no fim acabava cedendo. Josephine sabia disso, e quando o garoto começou a falar e a gesticular com as mãos, sentiu o gosto da vitória ardendo nos lábios.

– Ela não é uma dama. Ela é como um pedestal. – explicou – Jamais poderei chegar até ela. É alta demais para minha posição.

– Você ama uma nobre? – Josephine sentiu aquilo atingi-la no peito – M-Mas... Pate, você não pode...

– Eu sei, eu sei. – ele fechou o rosto, taciturno. – Eu sei.

– Pate...

– Já pensei sobre isto, sei que é impossível. Pode parar de falar como se eu fosse a pessoa mais desafortunada do mundo.

– Mas você é. – ela o encarou, apoiando-se nos cotovelos, inclinada. Vendo-a de cima, assim, deitado, Patrick não hesitou em roçar os dedos em seu ombro, apenas como um carinho fraco. Josephine quase não notou. – Merece uma garota que te ame, não uma duquesa... Os nobres não amam, Pate. Nem os ricos. Não existe amor para nós.

– Você ama. – retrucou.

– Mas eu aprendi que não posso mais amar. – e então sorriu – Mas espero que isto mude. Sinto inveja desta moça. Ela tem o melhor dos cavalheiros para beijá-la – e então segurou a mão de Patrick que a acariciava, beijando os nós de seus dedos.

Naquele momento, todos os pensamentos lógicos desapareceram da mente do menino.

– É você. É você.

Sussurrou. O rubor subiu com intensidade avassaladora, enquanto escondia o rosto contra o cobertor, começando a suar frio. O que dissera? O que fez? Quebrou completamente o ambiente agradável entre eles. Josephine se encheria de raiva e o repreenderia duramente por alimentar sentimentos por alguém da nobreza, ainda por cima a princesa. Porém o silêncio que se seguiu lhe garantiu de que Josephine estaria com o rosto fechado em uma carranca de puro repúdio e nojo. Não ousaria erguer a cabeça. Nunca mais. Nunca.

– Você é tão gentil... – ela suspirou e abaixou o rosto, até descansá-lo sobre as costas de Patrick. Ele sentiu todos os pelos de seu corpo se eriçarem. – Meu Pate... Você é tão gentil...

Patrick nunca mais se moveria. Era isto. Jamais se moveria, nem um músculo. Queria permanecer assim para sempre, deitado de cara contra as cobertas, com Josephine com os braços ao seu redor. Congelado. Admirado. Iluminado. E outros “ados”.

– Eu sei que sou eu. – ela disse, com calma. – Há tempos.

Uma nova onda de rubor cresceu dentro do peito de Patrick e subiu até seu rosto.

Josephine soltou-o, e o modo como a cama se moveu deu-lhe a impressão de que ela havia levantado. Ousou espiar e realmente a viu em pé, contornando a cama, em direção a porta. Ergueu-se e arrumou a roupa esfarrapada. A princesa chamou uma criada e pediu por seu café da manhã.

– Comerei com meu amigo. – disse, e então se virou para Patrick – Traga ovos a mais e bacon também. Maçãs e leite.

A criada se curvou e deixou-os. Josephine fechou a porta novamente e suspirou, saltando sobre a cama novamente. Patrick não havia ouvido a criada na porta, talvez por estar absorto nos próprios devaneios. Pensou se não havia imaginado tudo aquilo. Josephine inclinou-se e beijou-o nos lábios, doce.

– Você demorou tempo demais para isso – ela disse e então sorriu. – Detestava o modo como fingia me ignorar – e então ela o beijou novamente, na bochecha. – Tentei de todos os modos chamar sua atenção, para ganhar apenas um garoto que adorava olhar os próprios pés - e em seguida beijou-o na boca com mais suavidade – Eu odeio você, Pate. Você deixou a princesa muito magoada.

– Perdão. – disse, foi o máximo que conseguiu, porém Josephine apenas gargalhou de leve, como uma criança encantada.

– Shhh... – ela colocou o dedos obre seus lábios, sedutora. – Agora é minha vez, certo? – e então sorriu, encantada realmente. – Mas a princesa não pode ser pega nos braços de um criado. – disse e em seguida levantou-se, saltitando até seu grande armário. Abriu uma das gavetas e inferiores, que estava fazia, e puxou-a até o final, revelando uma abertura no fundo. De lá, retirou calça e camisa de botão, sapatos caros e meias grossas. Luvas, um sobretudo quente e uma boina que estava em moda na Inglaterra. Ela sorriu – Imaginei que um dia precisaríamos disto. – e entregou-lhe as roupas – Pode usar meu banheiro, pedi para a criada arrumar tudo durante meu desjejum. – e então sorriu – Se não se importar em usar a minha água, é claro – e piscou. Patrick sentiu as bochechas queimarem.

– Mas por quê...?

– Como eu disse, uma princesa não pode estar de braços dados com um criado. Mas um cavalheiro bem arrumado e cheiroso... Isso pode. – ela respirou fundo – Sabe, Pate, você não conseguirá nada comigo aqui.

Aquilo foi o mais perto da tristeza que o coração de Patrick já havia chego em toda a sua vida, e olhe que ele já passara noites infindáveis pensando em sua diferença social com Josephine. Nunca notou o quando a queria, até que ela mesma dissesse que não poderiam jamais ficar juntos.

– Eu sei. – respondeu, desviando os olhos.

– Não foi isto que eu quis dizer – ela segurou seu rosto com firmeza – Iremos fugir.

Patrick voltou a encará-la com a mesma rapidez.

– Josie...!

– O que foi? Tem alguma ideia melhor? – ela se sentou ao seu lado, os braços sobre seus ombros. Patrick tentou imaginar como antes nunca havia pensado em algo assim, apenas sentados, inclinados um contra o outro. – Eu sei. Meu pai. Isabeau. Todos... – ela parecia cansada. Extremamente cansada. – Estou apenas dizendo de alguns dias, não precisamos fugir de verdade. Eu só quero...

– Não.

– O quê? – ela o soltou, a raiva começando a inflar suas veias – Como não? Pensei que gostasse um pouco de mim. O mínimo para concordar.

– E eu gosto. – concordou – Amo. Mas é perigoso demais. Em todos os sentidos.

– Não vejo problema algum em tirar uma folga do mundo. – ela estava visivelmente enraivecida, mas de um modo diferente. Não explodindo, mas controlada. Era ainda pior, pensou Patrick.

– Seu pai jamais deixaria que sua filha desaparecesse por uma semana e ficasse tudo bem. Enviaria patrulhas de busca e provavelmente culparia Overath por isto. Isabeau tentaria matá-la de qualquer forma, aproveitando que você estará fora dos controles de seu pai e da Corte. Sua irmã ficaria arrasada, e eu seria julgado como sequestrador da princesa e nada que você dissesse me salvaria da morte. Além disto...

– O quê? Fale! – ela sibilava.

– Você sabe. Somos jovens, e tudo.

– Não, não entendi.

Patrick respirou fundo.

– Não quero violar sua pureza. – e então encarou-a, de um modo que jamais fez antes. – Não quero, Josie. Você pode se arrepender depois, e tudo será terrível. Uma princesa impura é pior que uma mulher não-casada. – e então ele segurou seus ombros – Nada disto importa para mim, desde que você esteja bem, segura. Não quero estragar sua reputação.

– Então é isto? Se trata de minha reputação? A princesa de Hessen, a filha do rei não pode ser ela mesma, ela tem de viver sempre pensando na imagem que passará. – Josephine respirou, bufou e inspirou e voltou a bufar. – Estou cansada disto!

– E eu estou cansado de ser um servo, abaixando a cabeça e vendo os outros comerem tudo sobre a mesa e jogando fora a comida que ainda presta. Estou farto de trabalhar o dia inteiro para ter apenas alguns minutos com você, para apenas ajudá-la a amarrar o vestido, pentear os cabelos ou arrumar o baú de roupas. Estou cansado de minha vida ridícula, onde não posso agir com ousadia demais, ou estarei ofendendo algum nobre mesquinho. – disse, com força. – Mas não estou cansado de te proteger, de esperar. Eu posso esperar. Anos, se precisar. – então sua convicção preencheu todo o quarto – Posso te esperar, Josie. O quanto quiser.

– E eu posso te abraçar agora – ela abriu os braços, porém ele não se moveu, o que azedou ainda mais seu humor. – Você diz tudo isto, e continua a fugir de mim. Que tipo de amor é este?

– Um amor inteligente. – respondeu, segurando seus pulsos. Josephine tentou se desvencilhar, porém Patrick conseguiu arrancar-lhe um beijo, o que acalmou um pouco a fera. – Paciência. Tudo pode dar certo, da maneira certa. Só é preciso paciência. – e então se aproximou o suficiente de sua orelha para falar em um sussurro. – Inscrevi-me para o exército.

Os olhos de Josephine saltaram.

– O exército? – ela exclamou – A guarda?

– Sim. – o sorriso de Patrick era radiante. Não caloroso, como o de Josephine, porém radiante. – Irei treinar e me tornar um soldado. Então irei subir de posição, até ser um importante cavaleiro. Seu pai olhará para mim e me dará terras. – disse. Era o máximo que poderia em as vida. Se tornar um senhor feudal. Nada mais. A não ser que enriquecesse e conseguisse comprar o título de visconde, marquês, conde, barão ou duque. Mas era impossível. Simplesmente impensável.

– Sim. – ela concordou – E quando receber suas terras, falarei a meu pai para dar-lhe o título de barão, assim não precisará viver na Corte, mas contará com uma posição nela. – o cérebro de Josephine juntava todas as peças. – Um barão rico e importante, ex-militar, com certeza faria meu pai pensar. E se eu insistir, aposto...

A porta abriu-se e a criada trouxe a bandeja com a comida. Ambos permaneceram em silêncio até que ela se fosse, fechando novamente a porta. Josephine olhou a comida e entregou um prato para Patrick. Ele normalmente comia uma refeição por semana com ela. Enchia a barriga até não poder mais. Josephine sabia disso e por isso fazia questão de pedir o que ele mais gostava: ovo frito.

Após devorar um ovo e começar outro, Patrick se lembrou do que falavam e ergueu os olhos para Josephine. Ela o observava, sorridente.

– Espero que esteja bom – ela disse.

– E está. – de repente ele fechou o rosto – Está bom.

– O que foi?

– Nada.

– Me diga. Eu te conheço.

– Não gosto quando cuida de mim. Eu deveria fazer isto.

Ela sorriu.

– Gosto de cuidar de você.


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Notas finais do capítulo

Votem:
a) Guerra
b) Amor
c) Traição
d) Aventura
e) Hereges
f) Seleção
g) Amizade
h) Morte
i) Tortura
j) Sexo
Votem em pelo menos 2 destes, no máximo 4. Não direi por quê. Apenas escolham e votem.