Mein Herz ist auf dem See escrita por Peter C Smith


Capítulo 1
Recordações


Notas iniciais do capítulo

O símbolo "•••" indica flashback. Para ouvir um fundo musical, clique em “∆”.



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“Minha alma ainda os conserva na memória, e se desfalece dentro de mim.”

Lamentações 3.20

°°°

“O Mar do Norte...” pensava o jovem moço ao olhar pelas grandes janelas de seu camarote, contemplando as águas do mar, negras sob a madrugada. Seu nome era Ernest Diefendorf, um jovem capitão da Marinha Mercante a serviço do Sacro Império Romano-Germânico, encarregado de transportar algumas mercadorias para Oriente Próximo em seu navio, o Siegfried. Ernest acordara cedo, e já trajava a sua farda.

Dirigiu-se ao armazém do navio, a fim de pegar uma bebida. Ele seguiu pelos escuros corredores com uma pequena vela iluminando seus passos, sua mente vagava em pensamentos. Pensava no mar, nas ondas, nas gaivotas... Em Mina... Após pouco andar, Ernest chegou à dispensa, mal havia adentrado no cômodo, o aroma agradável das carnes secas já invadia suas narinas, aroma de linguiça defumada, chouriço, bacon e charque. Ernest adentrou, passando pelos barris de feijão, carne seca, arroz e farinha de trigo e pelos bacons e chouriços pendurados em ganchos, até chegar à adega. Ernest sacou uma garrafa de cerveja e olhou para o rótulo. “1728”. Ernest lembrava-se muito bem desse ano, ele teve um devaneio...

•••

Era o ano de 1728, o pequeno Ernest, com apenas 10 anos, brincava freneticamente no píer com uma garotinha apenas dois anos mais nova que ele, que tinha lindos cabelos loiros, tão claros quanto uma seara de cevada; ambos descalços e de testas molhadas de suor. Moravam na ilha de Wangeroog, em uma pequena vila com vista para o mar.

– Vem me pagar! - provocava a garotinha entre doces risadas.

– Ei! Volta aqui! - respondia Ernest às provocações, visivelmente irritado.

A garota foi do píer à praia, correndo com dificuldade pelas brancas areias. Ao notar a dificuldade da amiga, Ernest deu um longo salto e a agarrou; ambos caíram juntos na areia, a garota ria como se recebesse cócegas.

– Tá com você! - bradou Ernest, se alegrando na vitória.

– Ai, Ernest! - dizia a menina enquanto ria.

Subitamente, um trovão interrompeu as risadas anunciando a chegada de uma fraca chuva, que logo haveria de engrossar.

– Essa não! - disse Ernest - venha!

Ernest puxou bruscamente a amiga pelo braço, conduzindo-a a um abrigo, debaixo do cais. Ambos estavam sentados um de frente para o outro, a menina sorria doce e inocentemente enquanto fitava Ernest com seus grandes olhos azul-claros, tão claros e cinzentos quanto às ondas do mar debaixo do alvorecer, deixando-o corado e nervoso.

Finalmente Ernest se manifestou:

– Que foi Mina?

– Ernest... Você que namorar comigo? - respondeu ela, tão direta e franca.

– Eu? Não!

– Por quê?

– Porque somos amigos!

•••

De volta não seu gabinete, o Capitão Diefendorf escrevia o diário de bordo enquanto bebia cerveja.

°

“Diário de Bordo, 15 de outubro de 1746, nota 1, última hora da madrugada.

Décimo segundo dia a bordo do Siegfried, aparentemente não houve quaisquer problemas durante a noite, nada de tempestades ou ventos não favoráveis. Herr Hoffmannn e Herr Bauer passaram a madrugada no timão guiando o navio, segundo os quais, manteve-se no curso traçado sem grandes dificuldades, só não pelo fato de os ventos mudarem o curso ao fim da madrugada, o que nos obrigará a reformular um pouco o curso, pondo o navio de volta a favor do vento e se assim permanecermos, até a noite de hoje, de certeza, alcançaremos o Atlântico.

Beijo às mãos do Sacro Imperador Francisco de Lorena. Saudai ao Imperador!

°

Após poucas horas, o sol já brilhava intensamente e o convés já se agitava, homens corriam por todos os lados realizando diversas atividades, e o capitão guardava o leme, mantendo sempre sua face serena, banhada pelos salpicos do mar.

Um homem veio pelas escadas, a encontro do capitão, era o Imediato Hoffmann.

– Capitão! - chamou.

– Diga Herr Hoffmannn.

– Isto é para o senhor - o homem entregou-lhe uma carta - entregue hoje cedo via pombo-correio.

– Obrigado, assuma o leme Herr Hoffmannn.

– Sim capitão!

Ernest deixou o timão e desceu as escadas, fitando o pequeno rolo de papel em suas mãos enluvadas; adentrou na sala de comando, havia mapas, compassos e garrafas de rum sobre a grande mesa central, onde ele e os oficiais traçavam a rota de navegação. Ernest tomou uma garrafa e sentou-se em seu gabinete, servindo a bebida em uma caneca metálica, e logo depois, desenrolou o pedaço de papel.

– Mina... - disse ele a olhar a carta, enquanto sentia o doce sabor do rum acariciando a sua boca.

A carta cheirava como Mina, um aroma agradável de trigo molhado de orvalho numa manhã fria de começo de primavera, algo que Ernest sempre admirou nela; Mina estudara música em Viena na mesma época em que Ernest se alistara na Marinha Mercante, o que fez de sua caligrafia, ao mesmo tempo, regular e delicada, de uma beleza simples e singela, algo que dava à carta um ar harmonioso, como se fosse uma partitura de violino.

°

Querido Ernest,

Não há um sequer dia nesses longos dez anos em que eu não sinta a sua falta, cada segundo longe de você é uma terrível tormenta. Mas tenho fé que você irá voltar logo para mim, assim poderemos nos casar, e cumprir a promessa que fizemos. Você lembra, Ernest? Quando juramos ficar juntos pra sempre?

Até nos vermos de novo, adeus.

Tamina Schneider

°

Lágrimas rolaram em seu rosto. “Mina...” pensou ele, ao contorcer a cara de dor.

•••

A chuva caia com muita força, deixando o ambiente com uma pálida luz cinzenta e azulada. Estava muito frio debaixo do píer, as crianças tremiam, a areia sob seus joelhos estava úmida, sujando suas vestes e algumas gotas geladas pingavam em suas cabeças.

Mina se aproximou de Ernest, buscando o calor de seu corpo. Ernest tentou se afastar, mas sentia tanto frio que não teve forças para se livrar dos braços da amiga. Mas logos percebeu que era uma sensação prazerosa, sentir uma pequena fonte de calor em meio à chuva gelada, a cabeça de Mina pousada em seu peito, os tremores do seu corpo contra o seu... Ernest finalmente devolveu o abraço; eles ficaram assim por muito tempo, apenas ouvindo os sons da chuva abafados pela madeira do cais, sentindo o cheiro agradável de água do mar com areia molhada.

– Ernest...? - disse Mina.

– Oi?

Mina saiu dos braços de Ernest e pôs-se a sua frente.

– Gosto de ficar com você - continuou.

Mina estendeu a mãozinha para Ernest, com o dedo mínimo erguido, Ernest fez menção de imitá-la, mas de forma tímida, sem saber o que esse gesto queria dizer.

– Vamos ficar juntos pra sempre, promete? - disse ela.

Ernest recuou um pouco a mão, e fitou a amiga, ela devolveu o olhar com um meigo e cativante sorriso.

– Pra sempre e sempre! - disse ele em fim e cruzou seu dedo com o de Mina.

•••

Ernest reclinou-se em sua poltrona, vagando em seus pensamentos sem rumo... Será que ele a amava? Mina estava determinada a se casar, porém Ernest não conseguia pensar nela daquela maneira. Eram tantas coisas rodando na mente do jovem capitão...

Em pouco tempo, Ernest já estava ao lado do imediato observando o horizonte vazio com um uma luneta, o sol já se mostrava em seu apogeu, fazendo as madeiras enceradas do navio reluzirem, o que o ofuscava a sua visão. Ernest abaixou a luneta e esfregou os olhos, para afastar as manchas em sua vista. Os ventos beijavam as costas do capitão, mas subitamente se voltaram a bombordo, tocando a lateral de seu pescoço. Ernest sentiu a mudança repentina.

Scheiße... – resmungou - Herr Hoffmannn.

– Capitão?

– Assuma o comando do convés, alinhe o navio ao vento.

– Sim meu capitão!

Herr Bauer, reúna os oficiais na ponte, precisamos de uma nova rota.

°

“Diário de Bordo, 15 de outubro de 1746, nota 2, meio-dia.

Infelizmente os ventos se voltaram contra nós nesta tarde, agora sopram a norte-noroeste, rumo à costa da Grã-Bretanha. Eu e os oficiais passamos horas discutindo sobre a nova rota, mas decidimos rumar em direção à Grã-Bretanha e contorná-la pelo norte. Será uma viagem difícil, fará muito frio naquela região, o inverno está às portas e não estamos nos preparados para desafia o frio nórdico. Ainda chegaremos ao Atlântico ao fim deste dia, todavia levará mais cinco para que possamos chegar à Baía de Biscay, tornando assim nossa viagem mais longa do que o previsto.

Beijo às mãos do Sacro Imperador Francisco de Lorena. Saudai ao Imperador!

°

Ao terminar de escrever, Ernest guardou o diário em um bolso interno e desabou em seu acento, suspirando de exaustão e limpando o suor da testa com um trapo. Ernest fez menção de por o chapéu, mas desistiu, tentou apenas descansar um pouco, deixando sua mente livre e vulnerável; logo, lembranças chegaram a sua mente mais uma vez, levando-o á outro devaneio.

•••

Subitamente, a porta se abriu em um rangido monumental, deixando o som estrondoso da chuva impetuosa adentrar na sala junto a uma pálida luz cinzenta, revelando a silhueta de duas crianças.

– Ernest! – disse uma mulher, ao ver as crianças à porta.

– Olá Frau Diefendorf... – disse a menina, espirrando logo depois.

– Meu Deus olha só vocês dois, estão ensopados – disse a mulher num tom de voz dócil enquanto abraçava e beijava as crianças, sentindo seus tremores. – estava tão preocupada.

Outra mulher chegou, vindo da cozinha, e perguntou:

– O que houve Sofie?

– Frieda, nossos filhos voltaram! – respondeu a primeira mulher.

– Oi mãe... – disse Tamina à, Frieda, sua suposta mãe.

– Oi Frau Schneider... – disse Ernest à Frieda.

A outra mulher, Frieda, correu até a filha e a abraçou.

Após pouco tempo, Frieda estava na cozinha, preparando uma bebida quente para as crianças e Sofie estava em seu quarto enxugando as crianças, já desnudas, despidas de suas vestes molhadas; Ernest sentia-se muito desconfortável nesse momento, seu rosto estava corado, tão vermelho quanto um tomate recém-amadurcido, e trazia uma expressão mista de desconforto e timidez. Mina mantinha-se inocentemente indiferente, até mesmo sentindo-se a vontade. Depois de enxugá-los, Sofie deu-lhes pijamas quentes de algodão, Frieda entrou com duas canecas de achocolatado quente e uma tigela cheia de biscoitos. Eles se sentaram sobre a cama e comeram, ainda tremendo e espirrando devido à hipotermia.

– Eles devem estar resfriados – dizia Frieda à amiga.

– Concordo contigo, essa chuva esta mesmo muito forte.

Ernest e Mina estavam deitados na cama casal de Sofie, lutando para se aquecer, Ernest apertava os braços dentro dos cobertores espessos. Mina abraçou o amigo com força.

Nein! Não faz isso! – reclamou Ernest, ao tentar se desvencilhar dos bracinhos de Mina.

– Não se sente melhor assim? – replicou Mina com uma voz trêmula.

Ernest sentiu o calor do corpo trêmulo de Mina, sentiu sua respiração falha devido aos tremores, era uma sensação agradável... As crianças logo adormeceram.

•••

Escutaram-se pancadas a porta.

– Capitão!

A voz do homem despertou Ernest de seus devaneios.

– Entre Herr Bauer!

Bauer entrou na cabine, e prestou continência.

– A vontade comandante.

– Já passa das dez na noite capitão – disse o comandante – permissão para anunciar o silêncio.

– Permissão concedida comandante.

– Obrigado, quem será escalado para os turnos à noite?

– Decidas tu mesmo Herr Bauer.

– Sim capitão! – disse isso e se foi, deixando Ernest a só em sua cabine.

Uma mente muito jovem, mas muito ocupada. Ainda sobrara rum na garrafa que pegara mais cedo, tomou alguns goles da doce e forte bebida enquanto dirigia-se ao seu camarote, abaixo da sala de comando sentindo seu corpo se aquecer devido ao álcool, deixando sonolento. Ernest precisava deitar um pouco, descansar sua mente exausta. Deito-se em sua grande cama, sem ao menos tirar o seu uniforme, e deixou-se levar pelos embalos do mar. Pôs-se a contemplar o teto sobre sua cabeça enquanto esperava pelo abraço do sono profundo; a carta de Mina ainda estava no bolso de seu casaco, Ernest tirou-a do bolso e a fitou, pensava em responder, mas não sabia o que escrever e mesmo que soubesse, talvez não tivesse tempo para isso. A nuvem nebulosa de pensamentos ainda o atordoava, mas o efeito do álcool ajudou a afastá-la. Adormeceu finalmente.

•••

– Ernest...

Uma doce voz o chamava em seu sonho. Será sua mãe? Será Frau Schneider? Mina?

– Ernest, acorde.

Ernest estava ainda sonolento, tentou erguer a cabeça, mas não conseguiu.

– Acorde... Ernest!

– Uhm... - resmungou - mais dez minutos...

– Capitão!

•••

Herr Bauer? – Ernest despertou lentamente.

O comandante estava ofegante e histérico, vermelho e suado como um leitão desprovido de uma refrescante poça de lama; seus dedos estavam vigorosamente enrolados em seu florete. Fez menção de responder ao capitão, mas o estrondo de uma explosão e um vulto negro atravessaram a cabine, despertando Ernest de sua sonolência num salto violento.

– O que foi isso! – exclamou.

– Estamos sob ataque!


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Notas finais do capítulo

Se você leu até aqui, significa que se interessou pela história, e obrigado por isso. Postarei mais capítulos se quiser.



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