Alexa e a Guerra da Irmandade escrita por Priscila Luciani
A viagem foi um pouco conturbada. Alexa e Bernardo não paravam de falar, ou melhor, discutir, e Lua resolveu tirar um bom cochilo enquanto isso. A neblina ficava mais densa conforme se afastavam da Vila, em comparação, as casas ficavam cada vez mais raras. Em determinado ponto a carroça cambaleou um pouco e foi possível perceber certa inquietação no cavalo.
— Bernardo, você tem certeza que está no caminho certo?
— Claro que estou. Essa é a única estrada que dá acesso à floresta.
— Não sei. Parece que está ficando mais frio. Estou com uma sensação estranha.
— Eu sei.
— Você também está sentindo?
— Claro que não, sua medrosa.
— Eu não estou com medo!
— Então por que está tremendo?
— Eu não estou tremendo.
— Está sim.
— Não estou nãããããããão...
A discussão foi interrompida pelo cavalo que balançou bruscamente a carroça, provocando um desequilíbrio e acordando Lua. Bernardo conseguiu acalmar o animal e atravessou a ponte que dava aceso a ultima casa da Vila, na entrada da floresta, coberta pela neblina, só era possível ver sua silhueta, ainda com muita dificuldade, e a situação só melhorou quando chegaram mais perto. Alexa observou a moradia, simples, porém bonita, flores por toda parte, na varanda uma cadeira de balanço ainda estava embalada, embora fosse estranho o fato de que a casa estava totalmente fechada.
— Viu como eu sabia?
— Sabia do quê, seu tolo?
— Da casa, sua medrosa.
— Eu já disse que não estou com medo.
— Então prove! Desça e vá até lá.
Ela estava com medo, isso era verdade, mas não iria deixar-se abater, desceu da carroça e caminhou até a varanda da casa. Olhou pela abertura da porta e percebeu que realmente havia alguém ali, pois exalava um cheiro de sopa. Ela subiu os três degraus da varanda e dirigiu-se lentamente até a entrada.
— Sabia que bisbilhotar é feio?
Alexa soltou um grito, deu um pulo e desequilibrando-se caiu nos braços de alguém, paralisada. Tinha sido pega, e o que a incomodava mais era o fato de Bernardo estar assistindo a tudo aquilo da carroça. Porém, quando finalmente conseguiu ver o rosto de quem a descobriu, sua incomodação transformou-se em raiva. Debateu-se e pôs-se de pé.
— Seu idiota! Você quase me matou de susto!
— Ficou com medo, foi? – provocou ele, entre risadas.
— Eu vou te matar!
Ela partiu para cima dele dando tapas descoordenados e xingando-o loucamente. Quando, de repente, alguém intrometeu-se na briga tentando afastar os dois.
— Acalmem-se! Acalmem-se, por favor!
— Eu não quero ficar calma! Eu vou matar ele!
— Alexa! – gritou Bernardo.
— Cale a boca!
— Bernardo! É ela!
— Ela quem, seu idiota?
Só então Alexa pôde perceber que se tratava da ruiva a quem procurava. Imediatamente seu rosto enrubesceu, e ela sentiu um enorme buraco se abrindo no chão. “Que vergonha! O que eu faço agora?”, pensou. Tentou se recompor e ficar calma, mas estava extremamente nervosa e sem graça.
— Olá... eu...
As palavras sumiram. Resolveram viajar juntamente com os neurônios justamente na hora que Alexa mais precisava. Foi então que Benjamim tomou a frente.
— Olá senhora! Viemos entregar seu livro.
— Oh, já chegou? – ela perguntou.
Alexa estendeu o livro para a ruiva que o tomou excitada, esquecendo-se da cena que testemunhara há pouco e abrindo-o com uma pressa exagerada. Suas mãos suavam e seus olhos estavam vidrados nas páginas que virava agilmente. Por alguns minutos, os dois jovens se viram perplexos, apenas observando a mulher estranha que parecia nunca ter visto um livro na vida.
— Bom, então já vamos indo... – disse o rapaz.
Foi aí que a mulher finalmente deu-se conta de que tinha visitas e fechou o livro, um pouco sem graça.
— Oh, perdoem-me. Estava distraída. É que este livro é muito importante para mim e fiquei feliz em tê-lo. – ela sorriu, depois continuou – Esperem um pouco, vou pegar seu pagamento.
A mulher se encaminhou para dentro da casa, deixando Alexa e Bernardo desconcertados com tamanha estranheza.
— Ela é meio esquisita. Você não acha, Bernardo?
— Ela não é esquisita, é misteriosa.
Não adiantaria a garota tentar argumentar, o amigo estava encantado pela mulher que acabara de conhecer. “Como os homens são bobos!”, pensava ela. Mas ambos os sexos têm suas peculiaridades e talvez seja isso que os torna tão interessantes.
Alguns minutos depois a mulher retornou com um pequeno saquinho vermelho, obviamente contendo o valor estipulado pelo livro.
— Podem ficar com o troco. Muito obrigada, queridos, e mais uma vez perdoem-me pela distração.
— Não se preocupe. – respondeu o garoto.
— Até mais. – despediu-se Alexa.
Logo que os dois saíram, a mulher fechou a porta rapidamente, o que Alexa reparou de imediato, ficando ainda mais intrigada com aquele ser de cabelos ruivos. Enquanto caminhavam, Bernardo ia suspirando, o que irritava a garota.
— Pare com isso! Está parecendo um idiota!
— Ahhh... Ela é tão linda...
— Ora, ora! Você só pode estar enfeitiçado. Vamos pra casa logo, e deixa que eu guio a carroça.
— Tudo bem... – foi só o que ele conseguiu dizer.
Os dois subiram e a garota tomou as rédeas, seguindo para a Vila o mais depressa possível. Assim que atravessaram a ponte, e a neblina ficou menos densa, Bernardo finalmente percebeu que sua amada carroça estava nas mãos de Alexa.
— O que você está fazendo? – perguntou ele.
— O que você deveria fazer, mas sua tolice não permitiu. – retrucou ela.
— Do que você está falando?
— Finalmente voltou ao normal! – ela diminuiu a velocidade e continuou – Você estava enfeitiçado por aquela mulher.
— Eu não estava enfeitiçado, ela realmente é muito bonita. Um mulherão, isso sim! – ele refletiu um pouco – E me dê já as rédeas da MINHA carroça, sua aproveitadora.
— Eu não sou aproveitadora, apenas resolvi ser útil enquanto você se ocupava de seu maior talento: ser inútil. – ela parou a carroça - E tome logo essas rédeas, esse cavalo é tão xucro quanto o dono.
Eles continuaram discutindo enquanto trocavam o comando da carroça e depois seguiram viagem. Alguns minutos depois, ainda distantes da Vila, a garota resolveu abrir o pequeno embrulho vermelho que a ruiva lhe dera, viu três moedas reluzindo e um quarto objeto não identificado, então resolveu virar o conteúdo em seu vertido azul e verificar do que se tratava. Ficou surpresa ao encontrar uma chave, velha e enferrujada, com um desenho em forma de lua.
— Bernardo, olha só! – disse ela.
Ele olhou um pouco intrigado, depois perguntou:
— Que chave é essa?
— Estava junto com as moedas.
— Então faz parte do pagamento. – concluiu ele.
— Claro que não. Para que meu pai iria querer uma chave como pagamento? Ela só pode ter colocado aqui por engano. Temos que voltar para devolver.
— Voltar? Você está ficando louca? Já começa a escurecer.
— Será rápido, eu levo a chave e você me espera na carroça. E ainda estamos longe da Vila.
— Não, não e não. A floresta já é perigosa durante o dia, que dirá à noite.
— Então você está com medo!
— Não estou, não.
— Está sim!
— Não estou, só não quero que seu pai fique preocupado.
— Medroso!
— Já disse que não sou!
— Então prove!
— Ok, vamos voltar para aquela casa.
E então eles foram abraçar o destino que tinham acabado de escolher.
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