A Missão escrita por StefaniPPaludo


Capítulo 69
Diário




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/617123/chapter/69

Fiquei um tempo sem escrever no diário, pois o esqueci na casa de minha mãe há um pouco mais de uma semana. De certa forma, isso foi uma coisa boa, tendo em vista que reviraram meu quarto em busca de provas que comprometessem outras pessoas na missão.

Se eles encontrassem esse ou o meu outro diário, saberiam de quase todos os envolvidos e aí teríamos um grande problema.

Muitas coisas aconteceram desde que escrevi pela última vez. Vou relatar apenas os acontecimentos mais importantes para mim.

Primeiro foi a minha prisão. Eu estava caminhando, verificando os corredores, quando fui surpreendido por Alexandre e alguns outros soldados, que me obrigaram a me render e foram até meu dormitório, onde reviraram tudo em busca de provas para a acusação que haviam me feito. Alguém havia me denunciado por traição. De tramar alguma coisa contra o governo. Não sabia de certeza o que era, mas torci para que ninguém da missão tivesse contado alguma coisa e que estivessem suspeitando somente de mim.

Liss apareceu antes de me levarem embora. Não queria que ela me visse naquele estado e naquela situação. Mas não teve jeito. Liss sem pensar muitos nas consequências, se aproximou de mim e dos guardas que me prendiam, e me agarrou. Uma parte de mim gostou muito daquilo. Eu tinha consciência o tempo inteiro que podia nunca mais voltar para o quartel. Que poderia ser morto. Mas a minha outra parte, aquela que quer acima de tudo protegê-la, fez com que eu tentasse a afastar dali. Eu tinha medo que resolvessem levar Liss como cúmplice.

Felizmente nada disso aconteceu e apenas eu fui preso.

Os dias que passei no calabouço do palácio do governo foram os piores da minha vida. Desde que cheguei fui torturado. Queriam que eu revelasse a verdade e lhes contasse novas informações sobre o que eu planejava fazer e sobre quem iria me ajudar. Eu jamais lhes daria qualquer informação. Estava disposto a morrer sem dizer uma palavra.

As torturas eram semelhantes as que fazíamos no quartel. Durante o meu treinamento, as torturas foram a pior parte, mas eu aguentava bem. Mas dessa vez, sendo tudo de verdade e não podendo falar nada, sobre qualquer circunstância que fosse, era tudo muito pior.

As seções de tortura eram quase de hora em hora no início. Depois acabei perdendo a noção do tempo e só percebia quando me tiravam da cela e me colocavam de volta lá dentro. Não me deram alimento nenhum nos dias que fiquei preso, somente água e muito pouco. Meio copo por dia, para ser exato.

Tenho que ser sincero, no início eu me preocupava muito com quem estava no quartel. Com Liss, com Danilo, com minha família, com todos os que faziam parte da missão. Pensava principalmente em Liss e nos meus familiares a todo instante. Ficava imaginando se eu os veria de novo algum dia, e se eles viveriam bem sem mim. Eu esperava que sim. Mas nos últimos dois dias, eu não conseguia mais pensar em nada. Era como se nunca tivesse vivido uma vida fora daquela cela escura. As minhas lembranças pareciam nebulosas. Eu não conseguia pensar, não conseguia fazer nada.

Apenas ficava esperando minha hora de morrer. Na verdade queria que aquilo acontecesse de uma vez. Não aguentava mais tanto sofrimento. Meu corpo não respondia mais a mim, meu cérebro não funcionava direito, as seções de tortura continuavam. Não existia o porquê de eu continuar vivo. Eu não conseguia me lembrar de nenhum motivo para isso. Fui egoísta e quis morrer.

Quando eu já tinha me entregado de vez e tinha certeza que não suportaria mais uma seção de tortura, ouvi uma voz baixa em minha mente chamando meu nome. Tentei distinguir aquela voz, decifrar se ela estava dentro da minha cabeça ou não. Se era a morte me chamando.

O restante ficou ainda mais confuso para mim. Meu olhos pareciam me enganar, parecia que eu estava enxergando Liss na minha frente, com um olhar desesperado, entre uma névoa branca. Em seguida senti seus lábios tocando os meus e ela dizendo que me amava. Conclui que estava delirando de vez. Mas fiquei feliz com aquele delírio.

Depois percebi que estava sentado no chão, fora da minha cela, com várias pessoas por perto. Como que eu havia chegado lá, não me lembrava. Khaless estava ali, ela estava me atendendo e me dando um copo de água. Aquilo parecia real. Deveria ser.

Aceitei o copo d'água e um pedaço de chocolate. Quando terminei de comer e beber, me sentia melhor. Eu podia perceber que aquilo era real mesmo. Podia ver que existiam motivos para continuar vivo. Um deles estava ao meu lado me olhando preocupada.

Levantei-me e conseguindo pensar, puxei a contra mim. A névoa, que percebi que anteriormente estava em minha visão, não a cobria mais. Eu podia ver cada detalhe do seu lindo rosto. Como podia ter desejado estar morto? Puxei Liss ainda mais contra mim, tentando provar a mim mesmo que aquilo era cem por cento verdade.

E acabei descobrindo que era mesmo quando ela gritou de dor. A soltei rapidamente, tentando entender se eu a havia machucado ou o quê. Olhei para os outros ao nosso redor. Imaginei se alguém pudesse tê-la machucado sem que eu percebesse, mas todos estavam tão confusos quanto eu.

Olhando para ela, vi que estava sangrando perto do quadril. No mesmo instante percebi que aquilo tudo era real. Esqueci de qualquer dor ou fraqueza que sentia. A única coisa que me importava era Liss. Mantê-la segura e bem.

Ela havia levado um tiro e estava tentando esconder.

Eu tinha que salvá-la, protegê-la. Essa era a minha verdadeira missão. A minha missão nesse mundo. Liss era o que mais me importava. Não podia tê-la de volta em um instante e no minuto seguinte a perder. Não aguentaria isso.

Tentei carregá-la para cima, para um lugar onde Khaless pudesse retirar a bala e a fizesse parar de sangrar. Eu havia me esquecido do meu estado físico. Assim que a peguei no colo voltei a me lembrar. Mas não importava. Eu iria levar Liss.

Ela começou a protestar, e eu percebi que a arriscaria ainda mais fazendo isso. Poderia derrubá-la e feri-la. A entreguei para Danilo, o único em quem eu a confiaria.

Permaneci todo o resto do tempo ao seu lado. Inclusive durante o procedimento de retirada da bala. Liss era uma guerreira. Não soltou um único grito. Como uma mulher daquelas poderia estar ali na minha frente em carne e osso?

Quando tudo acabou vi que Liss não estava bem. Ela estava fechando os olhos. O medo me invadiu. Eu não poderia perdê-la. O mundo não podia existir sem ela. Khaless me assegurou que aquilo tudo era normal, ela havia perdido muito sangue e estava fraca e ia ficar sonolenta. Juntei a lógica que me restava e me convenci com aquilo. Eu sabia que aquilo era verdade. Eu mesmo havia explicado aos meus alunos isso na aula de primeiros socorros. Mas na prática parecia diferente.

Coloquei Liss na cama, e fiquei mais sossegado. Ela parecia estar somente cansada mesmo. Inclusive havia me pedido para que descansasse também. Havia dito que isso era um favor a ela.

Já que era um favor que ela pedia a mim não pude deixar de atendê-lo. Depois de me alimentar mais um pouco, me hidratar, conversar com Thomas e tomar um banho, dormi a noite toda.

No outro dia de manhã a primeira coisa que fiz depois que acordei foi ir ver a Liss. Ela ainda estava dormindo, e eu podia ver seu corpo se movendo no ritmo da sua respiração. Resolvi deixá-la descansar mais um pouco e fui comer alguma coisa. Encontrei Khaless e depois de nos alimentarmos, fomos juntos ver a Liss.

Daquela vez Liss acordou quando abrimos a porta. Senti um alívio no peito quando vi seus olhos abertos nos olhando. Khaless fez o curativo em Liss, e nos deixou a sós para que conversássemos. Conversamos um pouco, e percebi que ela devia estar com fome. Encerramos a conversa e Liss levantou. Dei uma olhada em todo o seu corpo. Não havia percebido antes que Liss estava somente de sutiã. Seu corpo era maravilhoso assim como todo o resto. Bem esculpido, magro, seus seios eram médios, sua pele branca. Desviei a atenção disso e tirei a minha camisa da farda e lhe entreguei. Ela não tinha roupa alguma para vestir, e não podia sair daquele jeito pelo palácio. Ia causar confusão em muitas pessoas. Liss vestiu minha camiseta e ficou ainda mais linda. Era um sentimento bobo, mas eu fiquei contente em vê-la usando uma peça que eu estava usando anteriormente. Uma peça que estava tocando a minha pele e agora estava tocando a dela.

À tarde de hoje, tivemos a primeira reunião da missão aqui no palácio. Decidimos a nova forma de governo e como faremos para colocá-la em prática. O país será governado por 12 pessoas, os governantes. Essas doze pessoas poderão ser qualquer um. Daremos a oportunidade de todos do país se inscreverem. Mas somente poderão concorrer os que passarem em alguns testes. A população que elegerá os governantes. E os governantes votarão entre si em um líder para eles.

Terminada a reunião, marcamos de gravar um anúncio explicando para o país inteiro o que estava acontecendo. Fomos para os quartos nos lavar e trocar de roupa, para ficarmos um pouco mais bem apresentáveis.

Quando eu estava pronto, resolvi passar no quarto de Liss. Ela ainda estava se arrumando. Ficamos conversando enquanto ela terminava de se aprontar. Como sempre acontecia quando eu estava com ela, me peguei rindo de alguma coisa que ela disse. Depois num instinto, sem pensar no que estava fazendo, vi que eu estava colado a Liss, e segurando sua cintura. Era incrível como eu perdia o controle sobre mim mesmo. Estávamos conversando sobre quem ela era, e eu acabei confessando que para mim ela era a garota que me deixava louco, que me fazia perder a razão.

Estávamos começando a nos beijar quando alguém bateu na porta. Era Thomas. Deixamos de lado aquele momento, como se não tivesse acontecido. Na verdade, às vezes, eu não entendo se esse tipo de coisa aconteceu de verdade ou não. Parece tudo fruto da minha imaginação. Mas não sei. Inclusive ontem, quando Liss apareceu na minha cela, e começou a me beijar e disse que me amava. Ainda não consegui distinguir se isso foi realidade mesmo ou não. Talvez se foi ela vá dizer alguma coisa sobre isso um dia desses. Não vou pressioná-la.

No caminho com Thomas, questionei-o sobre a pessoa que havia nos traído e me denunciado aos antigos governantes. Essa foi uma questão que Liss me perguntou. Eu não tinha pensado muito sobre isso. Não me interessava guardar rancor da pessoa que fez isso.

Thomas disse que descobriu quem foi, mas não quis nos contar quem e disse que não fez nada a respeito. De certa forma ele estava certo, aquilo era passado, não adiantava prender, nem nada do tipo. Não mudaria em nada. É a mesma coisa de Thomas ter matado dois dos governantes. Eu não queria isso. Mas ele fez. Não fiquei bravo com ele quanto a isso. Os governantes já estavam mortos, não tinha mais o que fazer a não ser aceitar.

Mas é estranho Thomas não querer dizer quem foi que nos traiu. Isso eu ainda terei que descobrir.

Passamos a noite inteira gravando. No fim eu não aguentava mais. Estava muito cansado. Meu corpo ainda não está muito bem. Mas tentei disfarçar e permanecer normal.

Agora faz mais de uma hora que vim pro quarto, dormir. Mas não consigo. Primeiro porque precisava desabafar e contar tudo que aconteceu aqui. E segundo porque descobri que dois integrantes do grupo da missão acabaram morrendo na invasão do palácio.

Não consigo não me culpar por essas mortes. Eu não conhecia muito bem o Sergio e o Mathias, mas eu me importava com eles.

To tentando pensar no que Liss disse, que não foi minha culpa, e que os dois sabiam no que estava se metendo. E que agora a única coisa que nos resta é fazer com que suas mortes tenham valido a pena e que possamos mudar o país para muito melhor.

Vou tentar dormir agora. Mas tenho quase certeza que não irei conseguir. Mesmo com o meu extremo cansaço.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Estamos chegando no final da história e eu estou desanimada para postar o resto.
Quase não recebo comentários, e não consigo saber se tem alguém acompanhando a história e quando já leram o capítulo e é hora de postar outro.
Assim fica difícil :/