Era para ser você escrita por Tamires Rodrigues


Capítulo 58
Última vez




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— Se a sua nova secretária entrar aqui e nos ver... – interrompi o beijo e me levantei indo até a janela.

— Ela não tem nada com isso – ele disse com cuidado.

Soprei o ar fitando o movimento do lado de fora da janela. Como sempre Nova York estava inquieta. Já tinha me acostumando com o ritmo da cidade, mas às vezes tudo ainda era desconcertante para mim.

Dei de ombros limpando o batom borrado. Pelo reflexo do vidro eu o vi se aproximando.

— Tão confusa – ele sussurrou balançando a cabeça e tocando meu ombro.

— Posso dizer o mesmo de você – devolvi no mesmo tom baixo.

Ficamos em silêncio. Um silêncio bom, porque nenhum de nós sabia o que falar ou o que fazer, e ficarmos quietos parecia melhor do que dizer alguma bobagem (embora fôssemos conhecidos por isso).

— Seus pais estão felizes por sua volta? – perguntou. Sua mão brincando com meu cabelo.

Balancei a cabeça.

— Estão. Quase toda vez que nos falamos citam o fato de eu estar voltando pra casa.

Sua mão continuou apertando meus cachos entre os dedos, mas o diálogo morreu por pelo menos uma batida.

— Você está feliz por estar voltando?

Fechei os olhos e encostei a testa no vidro.

— Sim. Não. Às vezes sim, pois estou morrendo de saudades. Mas os meus amigos estão aqui, minha casa e... – hesitei sobre o que dizer em seguida. – Muita coisa está aqui – completei.

Mabuchi deixou sua mão cair ao lado de suas coxas e assentiu. Nós dois permanecemos num silêncio desconfortável outra vez.

— Como está Ellie? – perguntei.

— Bem, deixei que ficasse em casa hoje. Mas amanhã voltará a sua rotina normal.

Balancei a cabeça concordando.

— Ela gosta de ficar perto de você – falei me virando pra ele. – Assim como eu gostava de ficar com meu pai quando era pequena, seguindo-o por toda parte.

Ele me encarou surpreso como se até então não tivesse percebido isso.

 

Tão perspicaz sobre negócios e tão cego para coisas óbvias.

 

— Ela me mostrou as bonecas que comprou para ela. Ela sente sua falta – continuei quando ele não disse nada.

Gregory se afastou de mim e voltou a se sentar em sua cadeira. Suspirei temendo ter ido longe demais.

— Você nunca tira férias? – minha curiosidade aflorou. – Dias de folga? – insisti.

— A empresa...

— Ellie precisa de você mais do que a empresa precisa – murmurei com cautela.

Seu punho apertou em cima da mesa e ele suspirou.

— Eu trabalho duro para que Ellie tenha um bom futuro e não precise depender de ninguém.

Era um bom ponto, mas eu tinha um ainda melhor.

— Você tem o bastante em sua conta bancária para que ela não precise depender de ninguém.

— Por que você está me dizendo tudo isso?

— Ela sente sua falta – repeti indo me sentar na cadeira em frente a ele. – Muita.

Antes que ele pudesse me dizer alguma coisa, meu telefone tocou. Talvez um sinal do universo para que eu calasse minha boca e parasse de me meter em assuntos que não eram meus. Eu sequer sabia o porquê estava falando aquilo, mas de qualquer maneira sabia que me importava.

Fiz uma careta quando vi que era Brent ligando. Provavelmente para falar do apartamento.

— Preciso atender – falei e ele deu de ombros.  – Alô?

— Ei! Oi, Jas – Brent me saudou. – Tenho boas e más notícias. Quais você quer primeiro?

Senti meu estômago pesar. Más notícias?

— Notícia boa – pedi.

— Bem, talvez não seja tão boa assim para você.

 

Bom Jesus.

 

— Não enrole – ri nervosa. – Me fala logo.

— Lembra da interessada no apartamento?

Balancei a cabeça mesmo sabendo que ele não podia me ver.

— Lembro.

— Ela realmente está disposta a alugar.

— Oh! – tentei esconder meu desânimo. – Isso é muito bom, Brent. Mas qual a notícia ruim?

— Ela quer se mudar tão rápido quanto possível.

— Tão rápido quanto? – minha voz esganiçou. – Tipo, daqui duas semanas?

 – Tipo, nessa semana.

— Você tá brincando, né? – Soei tão esperançosa que quase quis rir.

— Mas eu disse que não seria possível ser tão rápido assim.

Soltei o ar, aliviada.

— Mas talvez na próxima semana? – quis saber. – Eu sinto muito Jas, mas estou supondo que você já tenha se formado até lá.

— Ainda não sei o resultado do meu TCC – falei me sentindo miserável. – Nem das provas finais. Uma semana Brent?

Não queria ser injusta com ele. Brent tinha sido além de legal comigo e nosso contrato já tinha oficialmente expirado, mas uma semana? Era muito pouco tempo para achar um lugar para ficar.

— Vou dar um jeito, não se preocupe.

— Você é demais, Jas. Obrigado!

Afastei o telefone do ouvido com uma sensação amarga na ponta da língua. Arrastei meu olhar para Mabuchi e sem muita surpresa notei que ele estava me olhando.

— Desculpe eu ter atendido à ligação, mas era o proprietário do apartamento – limpei a garganta. – Para acertar... – balancei a cabeça sem querer completar a frase. Parecia bobo, mas o simples pensamento de ir embora estava me deixando muito emotiva. – É realmente real agora – dei de ombros.

Meu Deus, o que havia de errado comigo? Até pouco tempo atrás estaria saltitante com a possibilidade de voltar para minha casa e matar a saudade dos meus pais. Mas... O que tinha mudado tão rápido assim?

 

Gregory.

 

Oh, não! O destino seria assim tão zombeteiro? De repente minha cabeça girou e eu quis correr.

 

Será... Será que...?

 

Precisava desocupar meu apartamento em no máximo uma semana e tudo que estou pensava era nele. Minha cabeça parecia prestes a dar pane.

— Por que eu estou aqui? – sussurrei baixinho para mim mesma.

— Por que você está aqui? – ele repetiu confuso.

— Às vezes eu não me entendo – falei, porque se guardasse para mim iria muito provavelmente explodir. – Sábado foi meu aniversário, e...

— Sábado foi seu aniversário?

— Foi e tudo que eu pensava era “seria legal se o Gregory estivesse aqui”. Meu aniversário... Eu nem suportava você – continuei agitando as mãos no ar. – E agora penso essas coisas. Eu estou indo embora, Gregory! Eu não posso ficar pensando coisas assim, porque eu... – me calei desistindo. Eu não queria admitir em voz alta, principalmente para ele.

— Por que você o quê? – ele insistiu frustrado. – Por que é tão difícil ser honesta comigo?

Eu ri. Não um riso normal, uma risada histérica e maníaca.

— Porque eu não quero que você entre na minha pele!

 

Mas ele já entrou. Ele já entrou.

 

Com horror percebi que meus olhos arderam em lágrimas e cerrei os punhos.

— Eu não podia ter me deixado apaixonar por você.

— Jasmim...

— Não, – eu interrompi – assim como eu você sabe que isso vai acabar mal.

— Eu não me importo – ele rosnou quando me levantei e joguei minha bolsa por cima do ombro. – Eu não quero fugir disso.

— Eu sim – comecei a caminhar até a porta, mas saltando da cadeira ele me alcançou no instante em que toquei a fechadura e entreabri a porta.

— Não seja covarde – ele grunhiu. Não havia calma, toda a sua postura dura e profissional havia sumido. E eu nunca tinha visto seus olhos tão ferozes.

— Eu estou me protegendo – retorqui balançando a cabeça. – Eu não devia ter vindo. Eu... Desculpe.

Olhei pelo vão da porta e vi a estagiária nos observando. Seu olhar rapidamente baixou para o teclado quando me pegou olhando. Ótimo, amanhã a empresa toda saberia da nossa discussão.

Pegando-me de surpresa, Mabuchi encostou a testa na minha. Senti meu corpo amolecer com sua respiração na minha bochecha.

— Nós não precisamos falar disso agora. Nós dois concordamos que iríamos aproveitar o tempo que ainda lhe resta em Nova York e...

— E nós aproveitamos – interrompi. Você só está dificultando as coisas.

Por um segundo esqueci que tínhamos plateia, esqueci tudo, menos o homem na minha frente.

— É tempo de recuar – suspirei tocando seu peito.

E eu realmente estava disposta a recuar, voltar a agir apenas com secretária. Mas quando ele encostou os lábios nos meus, cada terminação nervosa do meu corpo acordou para vida e eu não consegui mais pensar. Empurrei a porta com o quadril e retribui o beijo.

— Essa é a nossa última vez – forcei minha boca a falar.

— Última vez – ele confirmou sem parar de me beijar.


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