Eu amava Meredith. Como á uma irmã, apesar do pouco tempo que nos conhecíamos, e como em uma relação de irmãos havia momentos em que eu queria matá-la, e me perguntava silenciosamente o que em nome dos céus havia feito para ter alguém como ela como melhor amiga.

Como o momento atual.

Olhei para o lado e suspirei rindo.

Desde que começou a sentir dor no olho inchado e pediu para que eu pegasse gelo – alguns minutos atrás Meredith criou um ritual.

Colocar o saco de gelo sob o rosto.

Tirar.

Resmungar.

E estava levando isso a sério, pois a cada pequeno intervalo de tempo o repetia.

— Porque você não deixa o gelo no rosto afinal de contas? - perguntei divertida. Mas antes de receber uma resposta minha atenção se desviou rapidamente para meu telefone vibrando no meu colo. Era uma notificação do solteirosembuscadeamor.com

—Parabéns você tem sua primeira combinação! Era a mensagem em vermelho que aguardava para ser aberta.

Estiquei o celular para Meredith que endireitou a coluna e enfiou o rosto para mais perto da tela do celular.

— Teddygostoso43- nós duas lemos em uníssono.

Gemi baixinho. Que grande primeira combinação.

De alguma forma tal combinação não me surpreendia antes isso que um assassino virtual, pois com a minha falta de sorte tudo era possível.

— Que ego - Mer cobriu a boca tentando manter um sorriso fora do rosto. O saco de gelo esquecido enquanto seu olhar irradiava um genuíno divertimento.

Bufei. Eu poderia fazer um milhão de piadas sobre isso.

— Abra o perfil dele - Meredith disse colocando o gelo outra vez no rosto.

Apesar de estar contrariada acatei a sugestão. Quem dera não tivesse feito.

A foto de perfil de Teddygostoso43 era de um homem moreno e sem camisa. Seu corpo sarado e atlético estava à mostra não só nessa foto, como em praticamente todas as fotos postadas. Havia possivelmente umas trinta fotos dele malhando e mais umas 40 selfies. Era nítido que o cara se idolatrava. Até ai tudo bem porque não existe nada de errado em... Se idolatrar (pelo contrário amor próprio é tudo), contudo quando li a discrição do seu perfil quis rir histericamente e atirar Meredith pela janela por ter dado a ideia de procurarmos um namorado online. A descrição que ele havia feito de si mesmo era tão machista que me fez rolar os olhos ao ponto de quase ficar vesga.

Jesus me ajude! Se Teddygostoso43 fosse uma indicação do que estava por vir, eu estava indo apagar minha conta hoje mesmo.

— O que de ruim pode acontecer?- levantei a sobrancelha para Meredith, entoando sua pergunta. - Essa muito provavelmente é a melhor resposta que posso lhe dar.

— O cara é um idiota que grande coisa. Não está escrito em lugar nenhum que vocês têm que casar e ter filhos.

—Mesmo com apenas um dos seus olhos estando aberto posso ver seu olhar zombeteiro Meredith Benson!

Pegando isso como permissão para soltar o riso preso, ela soltou uma gargalhada alta. - Pode não ser tão ruim quanto parece – ela deu de ombros mordendo o lábio para conter uma nova gargalhada.

— Ou então pode piorar.

Balancei a cabeça, e apesar do esforço não consegui morder de volta um sorriso. Alguém alguma vez tinha se dado bem nessa coisa de amor virtual?

— Há tantas pessoas nesses sites, que com a nossa sorte seria impossível encontrar alguém legal logo de cara.

Abri a boca, pronta para reforçar meu argumento principal.

 Tudo isso era uma perda de tempo, e internet.

— Mas – Meredith continuou me cortando – tenho certeza que nesse exato momento há alguém bacana se cadastrando, a gente só precisa esperar e ter um pouco de calma.

Ter calma e saber esperar. Eis duas coisas que nunca consegui ter ou manter por muito tempo.

— Não sei como fazer isso e segundo o Google não existe nenhuma faculdade para se aprender a ser emocionalmente estável  e ter mais paciência – pisquei meus cílios e sorri. – Confie em mim, eu pesquisei.

Thor alongou a coluna e pulou para cima do sofá mendigando carinho.

— Vivo pensando em como deve ser isso – Mer comentou retomando seu ciclo colocar o gelo sob o rosto, tirar e resmungar. – Não querer empurrar alguém contra a parede toda vez que se irritar. Deve ser ótimo!

Assenti contemplativa acariciando a parte de trás das orelhas d e Thor.  – Ou então não jogar uma obscenidade de palavrões por cima das palavras açucaradas que deveríamos falar. Deve ser incrível.

— Embora se formos sinceras, vamos admitir que temos uma parcela de culpa nisso.

— Nisso o que? – indaguei vendo-a torcer o cabelo em um coque no topo da cabeça.

— Você se esquiva toda vez que alguém aparece.

— Eu? Não seja louca isso não é verdade.

— Não é? – murmurou ceticamente erguendo as sobrancelhas.

— Você está delirando – afirmei. Embora para ser honesta eu ás vezes tendesse a fazer exatamente isso, porém dificilmente percebia até ser tarde demais. Não era como se eu fosse boa em perceber que alguém estava flertando comigo de qualquer maneira.

— O fato de não admitir não me surpreende nenhum pouco. Só tenho duas palavras sobre isso.

— Quais seriam elas?

— Livraria Spring.

— Nem comece – avisei aconchegando Thor perto do meu rosto na esperança de disfarçar minhas bochechas quentes.

Não se tratava da minha livraria favorita, e sim do filho do dono.

Will Keller.

Alto, negro, olhos amendoados e sorridentes.

— Ele me dá cupons de desconto de vez em quando – esfreguei o nariz na cabeça de Thor e bufei. – Aposto que faz isso com todo mundo que é gentil.

— Se você prefere acreditar nisso – ela deu de ombros. – Posso dar outros exemplos.

Bom Deus onde ela estava querendo chegar?

— Já provou seu ponto caolho, agora se cale.

— Houve aquele homem no café perto doo seu trabalho.

Rolei os olhos e mexi a mão desconsiderando a informação

— Não seja exagerada.

Meredith sorriu. – Basta dizer que tenho razão.

Ainda com Thor aconchegado contra mim, tirei meu tênis de corrida e puxei os pés para cima do sofá. Correr estava fora de cogitação, já que dificilmente nossa conversa acabaria em breve.

— Você está certa – dei de ombros para o sorriso aumentando em seus lábios. – Em algumas coisas. Quer saber? Chega disso. Amor virtual, ou amor real, tanto faz. Não quero falar disso agora - encerrei o assunto.

A verdade é que Meredith mesmo com tão pouco tempo de amizade, me conhecia tão bem quanto alguém conhece seu livro favorito, e por isso mesmo tinha as cartas certas para me manipular. Ela tinha razão, em parte pelo menos, eu fugia inconscientemente do flerte e do romance, mas talvez o problema não fosse só eu, afinal se alguém fizesse minhas pernas tremerem e meu coração tropeçar na batida eu não fugiria.

Estava certa disso.

— Brent me telefonou pouco antes de eu chegar aqui.

Ergui a sobrancelha. - Ah é e o que ele queria?

— Seu número. Ele perdeu quando mudou de celular ou algo assim.

— Sobre o que ele quer falar?

— O apartamento – respondeu.

— Oh – mordi o lábio.

Com minha volta ao Brasil marcada no calendário, era normal que ele estivesse em busca de um novo morador.

Olhei nostalgicamente ao redor do apartamento, que em breve eu deixaria de chamar de meu.

Inacreditável pensar que logo eu estava indo dizer adeus não só á ele, mas como em tudo relacionado à Nova York.

“Qualquer um pode parecer bonito se cuidar da aparência externa.” – Antigo provérbio japonês.