Gone escrita por Eduardo Mauricio


Capítulo 12
Capítulo 11 - A Última Vez




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Michael estava sentado na mesa da cozinha com uma garrafa de vodka na mão e um copo de vidro na outra. Despejou um pouco do líquido no copo e começou a beber sozinho, como sempre.

Sua mãe chegou ao cômodo e ficou preocupada com a cena. Pegou um copo e sentou ao lado dele na mesa.

– Você não parece nada bem, sabia? – Perguntou ela.

– Eu sei – Ele respondeu, bebendo um gole da bebida.

Cecilia pegou a garrafa e colocou um pouco para ela.

– A morte da Victoria pegou todos de surpresa, principalmente você, não sai mais do quarto, não come, só bebe e fuma, o que está acontecendo Michael? – Ela virou um copo com um pouco da vodka.

– Eu não consigo aceitar que ela está morta – Ele abaixou a cabeça.

– Eu sei como se sente... Quando eu perdi seu pai e seu irmão, entrei em depressão, parecia um zumbi, arrastando-se pelos cantos com uma foto dele, e o Alzheimer foi só mais um dos problemas que me fizeram tentar tirar minha vida.

– Como você superou?

– Eu não superei, só aprendi a conviver com a perda, Heather também quase entrou em depressão, mas ela é uma mulher forte... Aquela foi a época mais difícil das nossas vidas.

– Eu ia pedi-la em casamento... Só estava esperando conseguir um bom emprego, mudar para uma casa e fazer a proposta, ela tinha tanta vida pela frente...

– Você tem uma coisa que eu não tenho, filho.

– O quê?

– Memória... O maior medo da minha vida é de um dia esquecer seu pai e seu irmão, eu vivo rodeada de fotos deles porque não quero esquecê-los, e eu sei que um dia isso vai acontecer, é só questão de tempo, o Alzheimer aos poucos está tirando tudo de mim, mas você, você tem Victoria guardada na memória e nunca vai esquecer, enquanto tudo o que eu tenho são lembranças desgastadas de como eu os amava, prestes a se desintegrar como poeira.

– Você nunca vai esquecê-lo, eu garanto.

– Quem dera você estivesse certo – Ela derramou mais um pouco de vodka no copo e virou.

***

Enquanto isso, duas viaturas da polícia, todas pretas e com as tradicionais sirenes azuis e vermelhas ligadas, atravessavam a rodovia que cortava Springfield. Ao seu redor uma floresta e à sua frente a pista vazia. Os carros iam em alta velocidade até o centro da cidade.

***

– Eu não sei como vocês aguentam morar aqui, está tudo tão diferente – Disse Michael.

– Muita coisa mudou nessa pequena cidade, ela perdeu a cor, o brilho e a alegria que tinha nas ruas.

– As crianças não brincam mais nas ruas, o parque está abandonado, e é sempre tão frio e triste, eu queria voltar à infância, quando nós íamos à cachoeira nos fins de semana.

– Isso se chama crescer filho, agora você tem uma nova visão do mundo, a visão real.

***

As viaturas chegaram ao centro da cidade, deixando as pessoas na calçada curiosas. Todos olhavam assustados para os carros em alta velocidade, perguntando-se o que havia acontecido.

***

– Há uma diferença entre cometer um erro e fazer uma coisa ruim, certo?

– Eu não sei.

– Às vezes a coisa ruim é o certo a se fazer.

– Por que está dizendo isso?

– Mãe, eu fiz uma coisa da qual não me orgulho.

– O que?

Michael já ouvia as sirenes se aproximando.

– O que será isso? – Perguntou ela.

– Desculpa, mãe – Falou ele, dando um último gole na bebida.

– Como assim desculpa?

– Vó, a polícia está aqui na frente! – Exclamou Patrick, que estava na janela da sala, olhando os dois carros parados em frente à sua casa.

– O que?

Cecilia caminhou até a janela ao lado da porta da frente e olhou os policiais descendo dos carros.

– Vá para o seu quarto – Disse ela para Patrick, que obedeceu e subiu as escadas correndo.

Dois deles bateram à porta e ela abriu.

– Pois não – Disse ela, assustada.

– Onde está o Michael? – Perguntou o agente Simmons.

– O que ele fez?

O agente viu Michael sentado na cozinha, bebendo sua vodka, e mandou os homens entrarem. Os policiais entraram na casa e Simmons mostrou o mandado de prisão a Cecilia, que estava confusa e aterrorizada.

– O que ele fez?!

– Michael Brooks, você está preso pelo assassinato de Hector Moretz – Disse ele, quando Michael chegou à porta, trazido por dois policiais altos, já algemado.

– O quê? Não, não é verdade, ele não faria isso, Michael! – Ela tentou correr para seu filho, enquanto ele era levado à viatura. As pessoas na rua olhavam toda a cena espantadas.

O agente Simmons barrava a mãe desesperada.

– Desculpa, mãe! – Michael gritou, antes de ser colocado dentro da viatura.

Simmons voltou ao seu carro e as duas viaturas partiram, o olhar de Michael para sua mãe era de tristeza por vê-la daquele jeito. A imagem do cadáver de Hector não saía de sua cabeça e ele já não acreditava mais que havia feito a coisa certa.

Cinco meses depois

Pelos assassinatos de Victoria Lawson e Hector Moretz, eu condeno o réu à pena de morte. As palavras do juiz não saíam da cabeça de Michael enquanto ele estava deitado na parte de cima da beliche de sua minúscula cela, esperando o momento em que a pessoa responsável por conduzi-lo ao local de sua execução chegasse. Era extremamente angustiante saber a hora exata da sua morte. Em vinte e sete horas ele estaria morto.

Michael não havia conseguido provar sua inocência, pois as provas eram muitas, Hector realmente havia planejando tudo muito bem, e nem mesmo poderia contar com a confissão do assassino, já que o havia matado. Por isso foi condenado injustamente pela morte de Victoria.

Um homem chegou à sua cela e o chamou. Ele se aproximou e seguiu a instrução que o homem deu.

– Coloque as mãos para trás.

Michael virou-se e o agente penitenciário prendeu as algemas em seus pulsos. Em seguida abriu a porta e ele saiu. O “colega de cela” ficou observando-o, como se tivesse pena. Estava ali por conta de um assalto.

Três homens guiaram Michael por vários corredores iluminados por frias lâmpadas fluorescentes até chegar a uma pequena porta de metal nos fundos do presídio. Lá fora uma van os esperava, com as portas traseiras abertas.

Michael entrou e se sentou em um dos bancos de couro, dois dos homens foram junto e o outro entrou na frente, onde já estava o motorista.

Por todo o caminho, o réu foi com a cabeça baixa. Todos estavam em silêncio.

Alguns minutos depois, quando chegaram ao destino, um outro presídio de Ohio, que realizava as execuções, as portas da van se abriram e Michael foi conduzido por mais corredores vazios e iluminados por lâmpadas fluorescentes, até uma cela solitário, apenas com uma cama e um vaso e uma pia não muito distantes dela.

Ele deitou na cama e ficou olhando para o teto. Imaginava como todos os condenados à pena de morte se sentiam nas poucas anteriores à execução, se ficavam nervosos como ele ou não, se conseguiam dormir à noite, se conseguiam parar de pensar naquilo por um segundo sequer ou se passavam as horas se arrependendo dos crimes que cometeram. Michael só havia cometido um e não se arrependia.

***

No dia seguinte, para sua última refeição, ele havia escolhido batatas fritas, um sanduíche e um sorvete de chocolate com granulados para a sobremesa. Estava em seu quarto, comendo sozinho, aproveitando a última refeição que teria em sua vida.

Horas mais tarde foi avisado de que tinha direito a uma ligação, então decidiu que a pessoa com quem falaria pela última vez seria sua mãe.

Poucos minutos antes de sua morte, ele estava em seu quarto, com um telefone na mão. Ele emitia os bipes que avisavam que o telefone da sua casa estava tocando. Alguns instantes depois, Cecilia atendeu.

– Michael? – Perguntou ela, com uma voz frágil e sofrida.

– Mãe – Ele disse, se sentindo confortável ao ouvir a voz dela – Eles disseram que eu tinha uma última ligação e ninguém melhor que você para conversar.

– Eu sinto tanto sua falta.

Os olhos dele começaram a lacrimejar, ele não queria que ela o escutasse chorando e ficasse mais arrasada do que já estava.

– Eu sinto muito, mãe, por ter feito você passar por isso.

Ele só conseguia ouvi-la chorando do outro lado da linha.

– O Alzheimer tem seu lado positivo agora, pelo menos você vai me esquecer e ter menos uma coisa para ficar triste.

– Não diga isso.

– Eu nem acredito que essa é a última vez que eu escuto sua voz.

– Eu não quero acreditar.

– Eu te amo, mãe.

Ela ficou em silêncio e ele só a ouviu chorando. Cecilia não conseguia responder, pois chorava muito.

– Eu te amo – Falou ela, finalmente.

– Eu quero que diga ao Patrick que, não importa o que ele queria fazer da vida, nunca se afaste da família, e diga a Heather que nunca deixe de ser a mulher forte que ela é hoje.

– Eu direi.

– Eu estou sofrendo tanto.

– Eu também, meu filho, você não sabe o quanto.

– Eu espero que isso logo acabe.

– Vai acabar, vai acabar tudo bem, você vai encontrar seu pai e seu irmão, será uma nova vida.

– Você sabe que eu não acredito nisso, mãe.

– Não importa, só não tenha medo.

O homem alto que o vigiava se aproximou da cela.

– Está na hora – Disse ele.

Michael olhou para baixo e fechou os olhos, deixando as lágrimas caírem. Respirou fundo.

– Eu tenho que ir.

– Não.

– Eu preciso...

Ele ouviu os murmúrios do choro de sua mãe do outro lado do telefone.

– Tchau mãe.

– Tchau filho.

Michael desligou o telefone e entregou ao homem, mais dois agentes penitenciários apareceram e ele se levantou para prender as algemas.

Segundos depois, ele estava em um corredor mal iluminado, e no fim havia uma porta. Quando ele entrou, deparou-se com uma cama diferente no centro, com lugares para apoiar os braços e fitas de couro para prender braços e pernas.

Seu nervosismo atingiu o ápice ao ver aquela cama, era ali que iria morrer.

***

Ao mesmo tempo, em Springfield, mais precisamente em sua casa, Cecilia caminhava pelo corredor até seu quarto, levando consigo um frasco com várias pílulas dentro – pílulas para dormir, do tipo mais agressivo possível – e um copo com água.

Ela entrou no quarto, fechou a porta e sentou na cama.

***

Enquanto isso, Michael já estava amarrado à cama e os homens colocavam as agulhas em suas veias. Ele não sentiu muita dor, apenas pequenas picadas, como quando ia doar sangue com seus pais na infância.

Depois de tudo pronto, os homens se afastaram e ficaram em silêncio por alguns segundos.

***

Cecilia abriu o frasco e respirou fundo, olhando para aquelas pílulas brancas e redondas. Fechou os olhos e levou o objeto à boca, engolindo várias das pílulas. Depois tomou a água e se deitou na cama.

***

Michael quase não sentiu quando começaram a injetar o primeiro líquido em suas veias, a dor era praticamente nula. Depois veio o segundo e ele continuou sem sentir dor, mas já se sentia fraco, com sono.

Cecilia estava do outro lado do estado, deitada em sua cama, já se sentia cansada e esperava o momento de sua morte. Não sentia dor, mas não se sentia confortável. Esperou com os olhos fechados, logo todo aquele sofrimento acabaria.

Quando o terceiro líquido foi injetado, não se passou mais de cinco segundos e Michael fechou os olhos.

Era o seu fim.

A escuridão chegou para os dois. Nenhuma vida, nenhuma memória, nenhum sentimento. Não havia coisa nenhuma, apenas o fim, a escuridão, o nada. Finalmente, tudo acabou.


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