Goodbye escrita por MihChan


Capítulo 5
Aquele motivo...


Notas iniciais do capítulo

Oi~
Olha eu aqui de novo!
Fiquei muito feliz com o comentário da Escritora Anônima. Muito obrigada, viu?
E o que dizer sobre a recomendação da Major V? Nem sei como expressar o quanto você me deu entusiasmo pra continuar postando! Obrigada mesmo!
Boa leitura ❤



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– O fato é: As férias começam na semana que vem! O que você vai fazer?

Mirela me abordou na entrada da sala e me levou para o ginásio, que estava vazio, junto com as outras garotas e... Victor. O que ele está fazendo aqui?

– Ora. – sorri como se fosse óbvio – Vou aproveitar à beça! – fechei o punho e dei um soquinho no ar, nada empolgado.

Na verdade, eu tinha passado o resto da semana depois da nossa conversa, me flagelando porque, além de estarmos em cima das férias, haverá mudança de sala. Quase nunca mudam as pessoas, só adicionam gente nova, mas com o Murilo é diferente. Ele é o único da minha classe que é repetente.

Aproveitei a deixa de Victor dizer que queria sair muito com Lara nas férias e ela então dizer que ele não devia estar ali, para sair de fininho e voltar para sala.

Suspirei aliviada quando finalmente me sentei. Senti um olhar sobre mim e virei-me para cruzar meu olhar com o de Murilo, que sorriu. Corei levemente lembrando de tudo que me falaram e que eu imaginei, mas sorri de volta.

Depois daquele dia da touca, comecei a falar mais com Murilo e acabamos nos tornando colegas, assim como com minhas amigas e Victor. Fizemos alguns trabalhos em dupla, já que nunca ninguém se oferecia para fazer com ele e o mesmo sempre acabava sobrando. Eu achava tão injusto! Ele me dizia que não se importava, mas parecia uma criança que tinha ganhado doce quando eu me juntava a ele em algum trabalho. Na verdade, eu gostava da presença dele.

Eu não conseguia entender porque as pessoas insistiam em manter distancia dele, já que não havia nada para temer. No fundo, aquilo me irritava bem mais do que quando o toddynho vinha sem canudo.

Tivemos a formatura do ensino fundamental com direito a fotos como formandos e tudo. Eu fiquei feliz por Murilo poder participar como um garoto normal, que tem amigos e que se diverte.

Logo as férias chegaram.

Antes disso ele me disse que as passaria indo bastante ao hospital e fazendo vários exames. Aquilo não me parecia ser as férias dos sonhos. E eu até já tinha planejado chamá-lo para ir para um festival que teria na cidade para arrecadar dinheiro para abrigos que não tem ajuda do governo. Também estariam meus amigos, claro, que agora também gostavam dele.

Fiquei sabendo também que ele fazia aniversário no dia quatorze de dezembro, faria 15 anos. Ele também gostava dos mesmos desenhos que eu, apesar de ser mais velho, parecia ser infantil, como eu, para a idade.

Passei o começo das férias planejando o que daria de presente a Murilo até que consegui achar algo que pudesse agradá-lo. O engraçado é que eu nunca tive vontade de presentear ninguém que acabei de conhecer em datas comemorativas, mas eu queria que ele tivesse um motivo pra lembrar-se de mim... Como eu sempre lembro dele.

Venho sentindo alguns sentimentos estranhos em relação a ele e isso eu já aceitei. Gabi e as outras disseram que eu estou apaixonada, mas eu não acho que seja isso. Acho que, por causa da doença dele, eu estou tomando sua dor. Isso não me deixa orgulhosa, muito pelo contrário, mas acho que se eu não tentar me redimir com ele vou me sentir mais miserável do que já estou me sentindo.

Com uma blusa de manga longa, uma calça jeans e sapatilhas, peguei uma caixa dentro do guarda-roupa, um guarda-chuva e sai do quarto. Quando passei pela sala os olhos astutos de dona Lidia se fixaram em mim.

– Aonde vai? – ela perguntou.

– Ãhn... à casa de um amigo. – falei. Ela franziu o cenho como se não entendesse.

– Fazer o que?

– É aniversário dele então... – mostrei a caixinha – Já vou.

– Tome cuidado. – ela sorriu de orelha a orelha com um olhar cúmplice.

Andei em passos lentos até a casa que eu sempre admiro. Parei em frente ao pequeno portão e encarei lá dentro. Uma luz iluminava pelo vidro da porta. Toquei a campainha.

A porta se abriu depois de pouco tempo. Uma mulher com os cabelos pretos sorriu e acenou para que eu entrasse. Puxei o portão e entrei. Ela me esperava em frente à porta e sorria, animada.

– Você é amiga do Murilo? – ela perguntou.

– Ãhn, sim. – respondi.

– Entendo. Ele não está no momento. Teve uma de suas crises esta manhã e está em observação no hospital mais próximo. – ela parecia ter chorado bastante.

Suspirei derrotada e encarei a pequena e comprida caixinha em minhas mãos. Ela dirigiu seu olhar para onde o meu estava e sorriu.

– Você sabia que hoje era aniversário dele... – disse.

– Ele me contou antes do término das aulas. – confirmei.

Ficamos em silêncio. Imaginei o que ela estava sentindo agora. Vi que segurava um telefone sem fio na mão direita. Talvez estivesse esperando que alguém ligasse. Talvez ele não estivesse mesmo bem. Talvez ela estivesse se preparando para o pior.

Então fiz o que me veio à cabeça sem pensar duas vezes:

– Quer companhia?

Ela aceitou. Parecia que ficava muito tempo sozinha. Notei coisas estranhas pelas paredes e nos móveis. Nada que eu possa descrever, mas pareciam algo com relação a crenças.

– O pai de Murilo é judeu. – ela explicou.

– Desculpe, senhora...

– Miranda.

– Dona Miranda.

Ela suspirou e sorriu. Conversamos por muito tempo, ela era uma pessoa gentil e inteligente. Tinha largado o emprego de enfermeira em um hospital para poder cuidar mais do filho. Ela era formada em pediatria.

Eu tinha esperanças de que Murilo voltasse pra casa, mas cada vez que eu olhava o relógio, mais certeza eu tinha que as minhas esperanças estavam se esvaindo cada vez mais.

O telefone tocou em cima da pia e Miranda atendeu, rápido. Depois de uma breve conversa, ela pareceu muito desanimada, mas desligou-o e sorriu pra mim.

– Parece que ele não vai poder voltar hoje. – sua voz estava abalada.

– Eu sinto muito.

– Não sinta. Contarei a ele que esteve aqui e com certeza ele ficará feliz. Não é todo dia que ele faz amigos.

Sorri forçado e encarei a caixa no meu colo. Entreguei a caixa a ela. Miranda sorriu e me abraçou num ato repentino. Senti que ela iria chorar, mas, igual a minha mãe, ela foi forte o suficiente para que eu não visse aquilo. Talvez depois que estivesse sozinha, ela chorasse.

Estava eu mofando no meu sofá, como sempre fazia quando não estava na escola, cinco dias depois da ida à casa de Murilo. Meus irmãos gritavam e corriam pela casa, jurando que tinha um dragão perseguindo a princesa e o valente cavaleiro nem tão valente assim, já que estava correndo do tal dragão junto com a princesa.

Minha mãe estava fazendo cálculos e olhando umas contas. Eu me perguntava como ela conseguia se concentrar com toda aquela gritaria, mas ela parecia nem se importar com a baderna.

– Wah. – choraminguei.

Minha mãe me encarou de esguelha e suspirou largando o que estava fazendo.

– Eu quero sorvete. – falei.

– Manoela, sorveteria. Sorveteria, Manoela. – ela disse, óbvia, como se me apresentasse à sorveteria.

– Estou com preguiça. – queixei-me.

– Então vá catar coquinho.

– Quanta maldade nesse coraçãozinho. – falei e ela me fuzilou. Calei a boca. Ela poderia estar na TPM...

Acabei ligando para a panelinha de sempre e chamei-as para ir à sorveteria. Acabaram dizendo que podíamos passear na praia depois, já que é bem perto, concordei. Não tendo muitas opções e estava muito entediada para ficar em casa.

– Que demora, Manoela! – Mirela reclamou quando cheguei na sorveteria.

– Pega leve, moça. – Lara riu.

– Desculpem. – pedi me sentando com elas – Tive que levar meus irmãos na casa de um colega de sala deles antes.

– Deve ser muito legal ter irmãos. – Aki suspirou, sonhadora.

– Não, não é. – eu e Mirela respondemos e Gabi riu.

A morena também tem uma irmã mais nova.

Ficamos batendo papo, pedimos os sorvetes, tomamos e ainda ficamos sentadas lá matando tempo até que a atendente começou a nos olhar de uma maneira que dizia “comeu, pagou, cai fora.”

Andamos um pouco até chegar na ponta da praia. É um pouco longe, mas quando se está conversando nem se vê o tempo passar, chegamos bem rápido.

– Me pergunto o que exatamente viemos fazer aqui. – comentei enquanto andávamos pelo calçadão da praia.

– Ver o pôr do sol. – Aki sorriu, empolgada.

– É lindo. – Mirela sorriu.

– Parecem velhas comentando com outras velhas sobre os netos. – Gabi brincou.

– Ora! – reclamaram e começaram a correr atrás de Gabi.

Lara também saiu correndo atrás alegando que venceria a corrida imaginária dela. Olhei ao redor notando que tinha ficado sozinha. Que ótimo. Parecem crianças. Tirei as sandálias e andei até a água.

Eu até correria atrás delas, mas meu lado sedentário falou mais alto algo como “Não se atreva!”.

A praia não estava tão cheia porque os dias não estavam tão bons para nadar. Havia muitos surfistas ao longe, mas também, no momento, não tinham muitas ondas. O mar estava calmo.

Por algum motivo me lembrei de Murilo.

Balancei minha cabeça negativamente e resolvi me sentar no calçadão até que as loucas das minhas amigas se dessem conta de que tinham me deixado sozinha.

Ouvi passos e depois alguém sentou bem perto de mim. Eu teria me distanciado se não tivesse percebido o cheiro de hospital misturado a madeira que só Murilo emanava. Ele me disse que estava escapando um pouco do hospital. Perguntei se estava tudo bem em ele sair assim e ele disse que o máximo que podia acontecer era chegar uma ambulância com camisa de força. Dei risada, nervosa. Estava a ponto de discar o número da ambulância eu mesma.

– Não ria. – ele sorriu torto.

Ele não tinha voltado para casa ainda depois do seu aniversário e já haviam passado cinco dias desde. Ele disse que estava bem, mas não parecia bem. Estava mais pálido e mais magro, se é que era possível. Ele agradeceu pelo presente: um chaveiro de um dos desenhos que gostamos. Não era grande coisa, mas ele pareceu mesmo feliz.

Parei e encarei o horizonte. O sol já estava se pondo. Belo momento para refletir, mas a única coisa que eu conseguia pensar era no quanto meu coração estava batendo descompassado e agitado.

De repente uma pontada de pavor me invadiu.

– Você não tem medo da morte? – perguntei sem encará-lo.

– O que?

– A morte. Você está aqui sem supervisão médica e nem ao menos tem a permissão deles para...

– A morte é um fato. – ele me cortou – É o destino das pessoas. Lembra? – ele me olhou, dobrando os joelhos, abraçando-os com os braços e apoiando a cabeça sobre eles – Você me disse isso. – sorriu. Corei.

– Sim, mas você pode evitar morrer antes da hora.

– Não vou ficar me proibindo de fazer o que eu quero. Eu posso morrer a qualquer momento mesmo.

O fitei, finalmente. Ele encarava o sol que estava se pondo. Tinha um misto de expressões em seu rosto. Medo, emoção, alegria e tristeza.

– Isso é meio egoísta. – murmurei sem minha própria permissão desviando meu olhar para meus pés.

– O que?

– Você é egoísta. – falei para que ele pudesse ouvir.

– Você nem me conhece tanto a ponto de...

– Conheço o suficiente pra saber que as pessoas ao seu redor estão lutando contra a doença que você tem! E você? Você está lutando? Ou já desistiu? Você é cruel. E a sua família? Você só está pensando em si mesmo.

Não dei uma única pausa e nem chances para que ele protestasse. Parei de falar e encarei-o. Ele estava surpreso com o que eu tinha dito, mas desviou o olhar para o mar, indiferente. Me senti horrível. Eu era a egoísta. Eu estava com medo da morte. Eu não queria perdê-lo.

– Desculpe. – pedi baixinho.

– Você não sabe o que é sentir que está morrendo e não poder fazer nada para impedir. – disse no mesmo tom que eu.

– Você pode impedir. Vivendo intensamente, sem deixar que seus problemas façam de você alguém cético. – murmurei tudo isso, mas ele pareceu ouvir ao menos o começo da minha frase.

– Não posso. Uma hora os remédios vão parar de surtir efeito. Algum dia vou ter que parar de vez a quimioterapia. Algum dia... eu já não vou estar aqui.

–... – franzi o cenho, frustrada.

– Manoela, eu...

– Não diga mais nada. – falei.

O olhei ainda por algum tempo. Desviei meu olhar e fiquei em silêncio, até perceber que ele estava se fazendo de forte o tempo todo. Foi questão de segundos para que eu pudesse segurá-lo antes que ele batesse a cabeça no calçadão.


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Notas finais do capítulo

E esse final, ein?
Comentem para eu saber o que estão achando, certo?
Até o próximo!