Foi num dia como esse, amargo e chuvoso, que o vi na praça aqui perto de casa. Você estava com aquele seu casaco preto de sempre e os tênis amarelos que hoje em dia nunca mais os vejo em seus pés. Você sorria enquanto falava ao celular, e eu estava só sentada lendo algum livro qualquer pedindo para quem quer que seja que habite os céus acima não deixe você me ver.

Mas seus olhos negros encontraram minhas írises curiosas, e com as faces febris procurei me esconder novamente atrás das trezentas e quarenta e seis páginas.

Não que adiantasse muita coisa, afinal você já havia me pegado lhe observando. E suavemente o barulho de seus passos na grama molhada se aproximou, pouco a pouco até eu vislumbrar suas canelas expostas pela bermuda e os sapatos gastos.

Ignorei, e você começou a puxar assunto mais uma vez. Quem me dera que tais palavras gentis fossem reais, que sua atenção estivesse realmente focada em mim.

"Thalia, Thalia, acorde!", eu ouço um chamado distante. Minha cabeça se levanta pesadamente e vejo uma colega de sala me chamando da porta para irmos aproveitar o intervalo. Sua silhueta já virou um ponto desfocado pelos meus olhos míopes.

Suspiro enquanto me levanto.

Um sonho.

Somente um sonho.

Foi apenas um sonho, Thalia.

“Ele nunca falaria tal coisa para você.”

Tem razão.

Nunca.

Foi um sonho ingênuo e infantil.

Um sonho.

Nem mais sonhar eu posso.