Trapaça escrita por Sara Carneles


Capítulo 6
Inesperado


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo, gente. Espero que vocês gostem. Ficou um pouco extenso porque eu queria introduzir um certo personagem que a gente ama muito ainda nesse capítulo, mas tinha que ser no contexto da história então...
Enfim, sem mais enrolações.
Enjoy!



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Finalmente o fim de semana estava chegando.

Eu já não aguentava mais anotar recados, arrumar arquivos, atender telefonemas, e ser a garota do café. Tudo isso porque de repente meu chefe de uma hora para outra havia decidido incorporar o papel.

Já faziam duas semanas desde a mudança drástica no comportamento dele. Eu já não o via mais com as roupas despojadas de antes, nem ouvia as fofocas se espalhando pelo escritório sobre qual garota do trabalho havia sido sua última conquista.

É claro que santo ele não havia virado, pois de vez em quando eu atendia algumas ligações de mulheres que pediam de seu paradeiro, dizendo que ele havia esquecido alguma coisa em seu apartamento e que ele deveria retornar pois elas não tinham o seu número pessoal.

– Graças à Deus hoje é sexta. – ouço Sara comemorar enquanto vem em direção à minha mesa com alguns papéis. – Ele ainda está aí? – pergunta ela apontando para a sala de Oliver.

– Por incrível que pareça... – eu zombo, mas tento falar o mais baixo possível para me poupar de mais uma cena constrangedora entre meu chefe e minha sinceridade desenfreada.

– Ótimo. Entregue estes papéis à ele, são os contratos revisados que ele me pediu.

– Ok.

Eu estava quase abrindo a porta da sala quando ouvi Sara me chamar.

– Ah, ei... Vai fazer o que depois do trabalho?

– Você diz... além de chegar em casa e tirar esse par de saltos que estão me matando? – apontei para meus pés – Nada em especial, sabe, o de sempre, um pouco de TV, comida japonesa, talvez uma maratona de Sherlock...

Ela estalou a língua em desapontamento.

– Que decepção! – ela ri – E que tal se eu lhe oferecer uma noite super divertida, em um lugar cheio de caras gatos? A inauguração daquela boate que eu lhe falei é hoje e eu ia amar se você fosse comigo...

Meneei com a cabeça.

– Não é bem o meu tipo...

– Ah por favor Felicity! – Sara juntou as mãos, implorando quando notou meu pouco entusiasmo – Toda semana eu te convido e toda semana você recusa, o que é muito injusto, porque se você ao menos experimentasse, talvez percebesse como às vezes pode ser divertido sair e conhecer novas pessoas.

Uau. É um discurso e tanto.

Penso melhor sobre o assunto, tentando não olhar para Sara no processo, pois sua cara de cachorro pidão é uma das melhores que eu já vi.

Por fim, suspiro e me rendo.

– Tudo bem. Certo!

Ela dá vários pulinhos no mesmo lugar em comemoração.

– Ótimo.

– Será só eu e você? – pergunto.

– Ah não, Alice e Caitlin da contabilidade também vão. Será uma noite de garotas.

Noite? Será que isso implicava a noite toda ou só umas duas horas eram suficientes? Ok, eu já estava começando a me arrepender.

Mas já era tarde demais para reconsiderar, Sara já havia me dado as costas e ia andando alegremente para sua sala.

– Oliver? – chamei enquanto batia na porta.

– Entre.

Ainda era estranho para mim chamá-lo pelo primeiro nome em voz alta. Mas de tanto ele insistir dizendo que Senhor Queen era o seu pai, acabei tendo de aceitar. Para os outros eu ainda o chamava formalmente, mas para ele, já estava em processo de adaptação para apenas "Oliver".

Entrei e fechei a porta atrás de mim.

– Os contratos revisados que você pediu à Sara.

– Ah sim, obrigado.

– Disponha.

Eu já estava me retirando quando ele acrescentou um comentário.

– Acho que já basta, Felicity.

Virei-me novamente, meu coração começando a palpitar.

– Você diz... sobre hoje, certo? O trabalho. Quero dizer, você não está dizendo basta do tipo "basta, já chega de você e seus comentários fora de hora", não é?

Oliver estava me encarando com uma expressão tão séria que eu já podia sentir um suor frio se acumular em minha nuca.

Mas então ele riu e eu fiquei sem entender qual era o motivo da graça.

(Na verdade eu sabia que eu era o motivo, mas estava me negando a acreditar que ele estava rindo dessa maneira por minha causa.)

– Como você consegue fazer isso? – perguntou ele depois de se recuperar.

– Desculpe, é que acabei de receber a notícia de que estou sendo recrutada para uma noite de bebidas e balada, o que vai me fazer gravar o episódio de Sherlock que eu planejava assistir ao vivo. O que nem é a pior parte porque sinceramente eu não sou muito fã de festas e... – paro e percebo que estou fazendo aquilo de novo – Mas é claro que você não precisava de toda essa informação, então eu vou parar de falar agora porque só estou piorando tudo.

Ele riu, a expressão admirada, provavelmente pelo fato de que ele acabara de descobrir o meu talento de falar o maior número de palavras em menos de um minuto, sem tomar fôlego.

– Certo, primeiro de tudo: sim, o basta era de basta por hoje. – esclareceu ele – E segundo: no último episódio da primeira temporada, você também não desconfiou que aquele homem fingindo-se de gay havia aparecido de uma forma estranha? Quero dizer, a cena foi totalmente fora de contexto, estava na cara...

– ... que ele apareceu por um motivo! Sim! – concordei em espanto, não conseguia acreditar que Oliver Queen assistia a uma de minhas séries preferidas.

Ele riu.

– Thea sempre discorda de mim nesse episódio.

– É muito óbvio porque ele aparece totalmente fora do contexto do episódio. – comento, e rio.

Um silêncio constrangedor se instala enquanto Oliver mantém um sorriso no rosto e continua me observando.

– Enfim... Se você não precisa de mais nada. Acho que tenho uma festa para ir. – reviro os olhos.

– Divirta-se.

Saio da sala e rio, imaginando o quanto a convivência pode mudar a visão que uma pessoa tem sobre a outra. Eu ainda não fazia ideia do motivo pelo qual Oliver de repente havia começado a ser tornar mais responsável, mas tinha certeza de que já não o via como o playboy mesquinho de antes.

Não que eu tivesse alguma dúvida de que ele estava se tornando responsável em todos os quesitos de sua vida, porque não estava, e isso também não é da minha conta, mas era ótimo saber que ainda havia esperança para alguém como ele.

***

Uma batida na porta seguida de uma série de gritinhos femininos animados anunciou a chegada de Sara e as garotas.

Dei uma última checada no espelho, a alça esquerda da blusinha de cetim preta mais uma vez estava caindo levemente do meu ombro, pensei em trocá-la, mas eu não tinha nenhuma outra que combinasse com a saia branca que eu estava usando, sem falar que não havia mais tempo, e eu simplesmente amava aquela saia, só nela eu conseguia me sentir confortável e bonita ao mesmo tempo, porque ela não era colada ao meu corpo e tinha um caimento até o meio da coxa que era revelador mas reservado ao mesmo tempo.

– Ah Deus, eu preciso de mais roupas... – comentei.

Corri até a porta e a abri.

Sara estava bem na minha frente, usava um vestido dourado curtíssimo de um ombro só. Caitlin usava uma saia azul de paetês e um blazer preto com apenas dois botões em uso, já Alice usava um short de cetim branco e uma tomara que caia vinho.

– Uau, vocês estão maravilhosas! – comentei, rindo das caras e bocas que elas faziam enquanto eu as avaliava.

– Não. Você é que está um arraso Felicity! Olhem só meninas, ela não parece uma bonequinha com essa saia plissada? Você parece uma bonequinha!

– Você está bêbada? – perguntei à Sara enquanto elas entravam em meu apartamento.

– Apenas animadas. – comentou Alice.

– Nós tomamos algumas doses antes de vir para cá. Você sabe, um aquecimento... – Sara riu.

– Posso ver. – comentei – Eu só vou pegar meu celular e nós podemos ir.

Corri para o meu quarto e cacei meu celular sob a pilha de roupas que estavam em cima da minha cama. Eu podia ser a pessoa mais organizada da face terrestre em vários níveis da minha vida, mas escolher uma roupa para uma festa não era um desses níveis.

– Muito bem. – falei quando já estava de volta à sala – Vamos?

– Sexta-feira, aí vamos nós! – Sara gritou enquanto saíamos para a noite.

Pegamos o mesmo táxi que levou-as até meu apartamento e seguimos para os Glades. Aparentemente a nova boate resolvera se instalar em um dos bairros mais badalados de Starling. – imagine o Brooklyn e todo o seu charme hipster que já havia conquistado muita gente. Os Glades eram o Brooklyn de Satrling City, mas sem o lado hipster. – E era muito bem representado por boates e bares sofisticados, ruas cheias de entretenimentos de todos os tipos.

Estacionamos na esquina à uns 500 metros da boate, dava para ver a placa "Verdant" em luzes de neon verde brilhando ao longe. A quantidade de pessoas na rua era absurda e nenhum carro conseguia passar daquele ponto.
Pagamos o motorista e seguimos para a fila. Pelo número de pessoas, eu calculava que levaríamos horas para conseguir entrar, e eu já podia prever a dor em meus pés se preparando para chegar junto com a espera.

Mas então algo estranho aconteceu.

– Felicity? – ouço alguém me chamar em meio ao som vibrante que vêm de dentro da boate.

Viro-me e encontro um rosto familiar. Sorrio na mesma hora.

– Tommy?!

Ele sorri enquanto eu reparo em sua roupa. Está incrivelmente sexy com uma jaqueta de couro marrom, uma calça jeans azul escura e uma camisa preta que combinam com seus sapatos. A única coisa não-despojada é seu cabelo, mas isso só o deixa com uma aparência ainda melhor.

Ele me cumprimenta com um beijo na bochecha. Não sei se é por empolgação ou nervosismo, mas eu não me sinto incomodada com a intimidade repentina.

– Meninas, este é o Tommy...

– Merlyn. – Sara terminou a frase – Prazer em conhecê-lo pessoalmente, Senhor Merlyn.

Merlyn? Espere... Merlyn do Grupo Merlyn Global? Oh-oh.

– Me chame de Tommy – ele sorriu, cumprimentando as três, depois fez um gesto para um dos caras da portaria. – Passe vip para as quatro. – ele indicou para nós e o homem colocou uma fita verde neon em nossos pulsos.

– Melhor. Noite. De. Todas! – Alice comentou.

– Uau. Obrigada! Nem sei como agradecer. – eu ri, mal acreditando que não precisaríamos ficar esperando na fila.

Tommy riu.

– Beba um drink comigo e estamos quites. – ele abriu espaço e indicou para o acompanharmos – Por aqui.

Não sabia como, mas lá dentro estava ainda mais cheio. Eu só conseguia me perguntar como todas as pessoas que ainda estavam lá fora conseguiriam se espremer aqui dentro.

Seguimos para a ala vip, a única parte da boate que tinha espaço suficiente para todos ficarem confortáveis. Uma parte de mim se sentia mal por estar sendo privilegiada apenas por conhecer alguém que aparentemente tinha influência.

– Devo concluir que você é o dono. – digo à Tommy enquanto nos sentamos em um dos sofás que tinha uma vista direta para o palco onde o DJ estava.

Tommy riu.

– Digamos que eu tenho certos privilégios por ser o melhor amigo do dono.

– Felicity! – Sara me chamou do bar onde ela e as garotas estavam.

Senti minhas bochechas esquentarem ao notar que eu havia me separado delas para conversar com Tommy.

– Acho que suas amigas estão querendo você de volta. – comentou ele – De qualquer forma, eu preciso ir lá para baixo – ele apontou para a pista.

– Vai dançar? – questionei.

Ele levantou-se, sorriu, mas não me respondeu.

– Guarde aquele drink para mais tarde. – ouvi-o gritar por cima da música enquanto se afastava.

– Pensei que ele não ia te largar. – Alice comentou assim que me aproximei do bar. – Afinal, de onde você conhece ele?

– A pergunta correta é, como você o conhece. – falou Caitlin.

Dei de ombros.

– Tivemos uma conversa num elevador há algumas semanas.

– Espere, você está me dizendo que falou com ele uma vez e ele já descolou passes vip's para todas nós? Amiga você precisa namorar esse cara. – Sara comentou e as outras riram, mas eu não.

– O quê? Não! Não, de onde vocês tiraram isso? – perguntei incrédula e assustada por elas me relacionarem à ele dessa maneira.

– Ah por favor! Ele está na sua, garota! – Alice riu, me dando um tapinha nas costas.

– Acho que preciso de uma bebida. – falei, já chamando o barman.

***

Não encontrei com Tommy durante o restante da noite. Mas devo dizer que aproveitei mais do que imaginava. Dancei, gritei e ri como se estivesse tendo uma experiência extra-corpórea. Mal conseguia acreditar que estava tão solta.

Claro que boa parte do motivo foram as doses de tequilas que eu tomei, mas ainda assim. Percebi que Sara estava certa e que eu precisava mesmo daquela noite.

Eu não estava bêbada. E mais tarde agradeci à Deus por isso.

Já estava na área vip, voltando ao bar depois de ir ao banheiro quando esbarrei em alguém. Não estava prestando atenção, então não vi quem era até a pessoa me chamar pelo nome.

– Felicity?

Olhei para cima e encontrei Oliver me encarando com uma animação pra lá de sóbria.

– Então era para essa balada que você vinha? – perguntou ele, quase não entendi o que ele dizia por causa da altura da música e também porque ele já estava falando de uma maneira meio enrolada – Se eu soubesse teria te dado uma carona... Não, espera, a gente não mora perto, mora?

– Oliver, você está bêbado. – constatei em voz alta o óbvio.

– Jura? – ele riu. – Puxa, você está linda. – comentou ele, mas eu não levei à sério.

– Acho que você precisa de um táxi. – falei.

Ele riu, mesmo bêbado conseguia zombar de mim.

– Eu sou Oliver Queen, e um Queen não anda de táxis.

Tentei não rir da forma como ele falou "um Queen não anda de táxis" imaginando como ele se sentiria na segunda-feira de manhã, e como eu nunca mais conseguiria olhá-lo da mesma forma depois de hoje.

– Muito bem então, onde está o seu carro?

– Eu não vou embora. Ainda não escolhi quem será a escolhida da noite, então não tenho onde dormir.

– Que tal a sua própria casa, desta vez? – sugeri.

Oliver riu, não um riso debochado ou descontraído, um riso amargurado, que era acompanhado por um olhar perdido.

– Não posso voltar para lá. Hoje não.

– Por que não?

Ele aproximou-se de meu ouvido.

– Porque meu pai está morrendo, e eu estou tentando esquecer isso por algumas horas.

E então ele se afastou, indo em direção ao bar.

Não conseguia me mover. Fiquei parada sem olhar para um lugar em foco, apenas absorvendo o que Oliver havia me dito.

Será que era mesmo verdade?

Desta vez eu quis que fosse mentira. Sabia que Oliver podia ser muitas coisas, mas não acho que ele mentiria sobre algo desse gênero.

De repente ouço um tumulto perto do bar, corro para ver o que está acontecendo quando noto que Oliver está agarrando um rapaz pela gola da camisa dele, pronto para desferir-lhe um soco. Todos ao redor estão em choque, observando os dois sem nem ao menos tentar impedir a briga.

Estou prestes a eu mesma me arriscar a levar um soco quando um homem alto e forte de pele morena puxa Oliver para fora do burburinho e o leva em direção à saída com muito esforço.

Eu os sigo, imaginando o que aquele segurança brutamontes vai fazer com ele. Uma parte de mim está de perguntando por quê eu me importo.

– Ei! Deixe-o em paz! – eu grito assim que saio para a noite.

O homem vira-se com uma expressão de confusão.

– E quem é você? – pergunta ele.

– Felicity! – Oliver responde, aparentemente pior do que antes.

– Eu trabalho para ele. – disse, apontando para o que sobrou de Oliver Queen.

– Eu também. – falou ele – Sou o segurança.

– Sou a assistente.

O homem observa-me, provavelmente tentando avaliar se minha história é verdadeira. Depois de alguns segundos ele estende-me a mão livre em cumprimento.

– John Diggle.

– Felicity Smoak. – eu digo enquanto aperto sua mão.

– Então... Pode me ajudar, Felicity? Preciso colocá-lo no carro.

– Claro.

Corro para o lado livre de Oliver e coloco seu braço em meu ombro para apoiá-lo.

Meu Deus ele parece pesar uma tonelada!

Travamos uma guerra para colocar Oliver no banco de trás do Mercedes preto, mas no fim, ganhamos a batalha.

– Obrigado. – John agradeceu-me.

– Para onde vai levá-lo? – perguntei.

– Para casa.

Então me lembrei novamente do que Oliver havia dito sobre o seu pai e o fato de ele ter ido para aquela festa para não precisar ficar em casa. Imaginei que as coisas estavam péssimas por lá, e levá-lo para casa naquelas condições não parecia uma boa ideia nem para Oliver, nem para sua família.

– Não pode. – falei – Acho que eles já estão tendo trabalho demais por lá.

John pensou por um momento e concordou.

– Mas para onde eu vou levá-lo? – perguntou ele.

Pensei por um minuto, mas é claro que eu já sabia qual era a única solução. Não conseguia acreditar que estava fazendo isso, mas eu estava.

Suspirei em conformidade e disse:

– Vamos para a minha casa.


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Notas finais do capítulo

O que acharam desse capítulo? Não acharam muito enrolado? Mandem suas opiniões, por favor.
O próximo sai sexta-feira. Até lá.
Beijos!



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