CIDADE DAS PEDRAS - Draco & Hermione escrita por AppleFran


Capítulo 30
Capítulo 29


Notas iniciais do capítulo

Três recomendações! Três! De uma vez! Meu Deus! Eu até pensei que tinha entrado na página da fanfic errada quando abri Cidade das Pedras! hahahaha Muito muito muito obrigada a Ba Gilbert Salvatore, a Blair Herondale (que inclusive me mandou fotos e montagens lindas da fanfic tbm!) e a Valentina! Não sei nem como agradecer vocês! Esse apoio todo me dá uma super força! Obrigada e vamos logo ao capítulo!



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Capítulo 29

Draco Malfoy

Já havia parado seu pé de bater nervosamente no chão pela segunda vez, enquanto escutava Severo Snape dar um relatório completo sobre como andava a comunicação com os administradores dos outros fortes. Draco estava impaciente com aquela enrolação. Não seria possível que aquilo fosse colocado em dia em uma visita particular ao gabinete do mestre como todos os outros faziam? Respirou fundo e parou o pé novamente quando percebeu que continuava a movimentá-lo incessantemente. Era como estar em uma sala de aula outra vez, com a voz constante e severa de Snape soando em um ritmo perturbadoramente entediante.

– Lucio. – Voldemort voltou-se para seu pai, assim que Snape calou a boca. – Como anda a mudança dos departamentos?

– Perfeito. – adiantou-se Lúcio. – Exatamente como o Lorde queria. Conseguimos eliminar dois departamentos e trocar as funções de mais dois nos últimos oito meses. Estou começando a introduzir os rumores absolutistas do novo governo. As pessoas têm aceitado a maquiagem dada no novo ideal. Estarão prontos para recebê-lo fora do forte dentro de mais alguns anos, se assim a guerra nos permitir.

– Excelente. Estamos trabalhando nisso. – disse o mestre e Draco pensou que o próximo seria ele, visto que a guerra fora mencionada, mas o nome do secretario do tesouro veio em seguida.

Mais um tedioso relatório, que poderia ser tratado em particular, começou a ser verbalizado ali. Draco já estava cansado de saber a movimentação da união de Gringotes e a forma como os duendes estavam caindo nas estratégias do mestre para entregarem o controle de todo o tesouro bruxo.

Seu pai se aproveitou da situação e se intrometeu quando viu uma oportunidade. Draco ficou surpreso de vê-lo querer agir logo ali, mas conseguiu entender com rapidez no momento em que secretario do tesouro se manifestou um tanto indignado:

– Está querendo dizer que não sou capaz de exercer meu trabalho?

– Mestre. – Lucio ignorou o homem, voltando-se para Voldemort. – Estou apenas querendo dizer que centralizar a aplicação das estratégias com os duendes a alguém que tem contato direito no círculo interno pode torná-los resistentes...

– Eu já faço isso há quatro anos! – o homem insistiu.

– ... talvez se as estratégias viessem de vários lados diferentes. – Lúcio continuou o ignorando. – Tenho propriedade para dizer isso. Ganhei o Ministério e estou conseguindo manipular a opinião da massa sem levantar suspeitas com essa proposta, mestre. Apenas considere. Estamos tratando de duendes, eles são muito mais espertos que a maioria das outras criaturas mágicas. Conseguem farejar conspiração há milhas de distância.

– Eu os tenho sob controle!

Lúcio riu.

– É óbvio que não tem. – voltou-se para o homem pela primeira vez. – Por Merlin! Eles são duendes. Não se é possível ter controle sobre eles e se a ideia for essa, acredito ser muito arriscada. Podem estar abrindo Gringotes para você agora, mas estão sempre com um pé atrás. – voltou-se para Voldemort. – Nós estamos falando de mudar o controle do tesouro bruxo, mestre. Gringotes é centenário. Não se pode confiar um trabalho desse a um homem apenas.

– Teríamos que trazer mais gente para o círculo interno. – Voldemort comentou.

– Eventualmente. – confirmou Lúcio. – Mas não gosto da ideia de termos muitas cabeças aqui, sabe disso. Poderíamos abrir uma extensão que servisse de fachada na catedral, dentro de um departamento, talvez. Alguma extensão que dependa dos serviços de Gringotes e do tesouro bruxo. – Draco pensou na Seção da Cidade. – Talvez no Departamento da Cidade. – disse seu pai e Draco quase sorriu. Ele era mesmo um maldito bastardo. Sabia jogar bem. – Isso diminuiria o número de pessoas que precisariam ser arrastadas para o círculo interno, talvez um. No máximo dois. Não mais do que isso.

– Mestre! – o secretário do tesouro clamou pela atenção de Voldemort. – Acaso o decepcionei em algum momento para que desse ouvido a alguém que não trabalha no que temos construído todos esses anos?

– Tenho um objetivo claro. – Voldemort voltou-se para o homem. – Quero o domínio do tesouro bruxo. Como conseguirei isso, não depende de você. Posso conseguir isso com você, dando ouvidos a Lúcio, da forma como eu bem quiser. Portanto não venha clamar pelo poder, a posição que tem ou seus feitos. Se quer sentar nessa mesa, se quer ter respeito e influência, se quer ter contato direto comigo. Prove que é capaz de cumprir com inteligência a tarefa para a qual eu o designei. O que Lúcio disse deveria ter vindo de sua boca, em uma sessão privada onde teria me colocado a par de todo o relatório que perdeu tempo comentando aqui, em uma mesa aberta. – o homem se manteve calado e não ousaria abrir a boca novamente. Voldemort voltou-se para Lúcio. – Sei que não teve tempo para desenvolver o que disse, apenas manifestou-se ao encarar os fatos expostos aqui. Podemos desenvolver o que disse, mas estou cansado de adicionar pessoas ao círculo interno. Se tivermos uma mesa lotada, deixará de ser um círculo privado.

– Sei que não deveria interromper, mas realmente não me importo. – Draco se manifestou, seu tédio era explícito, mas sabia que seu pai estava esperando por aquilo e por mais que nunca fosse uma boa ideia interromper uma sessão como aquela, Draco e Lúcio eram Malfoys, sentavam-se nas duas laterais do mestre, estavam no topo da hierarquia. Tinham o poder de voz. – Não quero defender meu pai, sabe como me sinto com relação a ele, mas estamos falando de um império mundial. Precisa fazer com que suas mãos alcancem todos os lugares, vai precisar de gente, gente de dentro.

Voldemort não disse nada por um bom tempo. Draco sabia que ele estava ponderando a situação levantada ali por Lúcio. Tinha que admitir que seu pai fazia um excelente trabalho contra o poder do mestre. A maioria daquelas cabeças sentadas ali na mesa do círculo interno dos comensais era obra dele, uma obra que distribuía o controle e o poder do Lorde das Trevas nas mãos de muitos que se diziam e se mostravam confiáveis e fiéis, nada mais do que isso.

– Sei que o círculo interno precisa crescer. – Voldemort se pronunciou. – Trabalhei numa estratégia para isso, mas não desmereço o esforço da importância do que dizem. – ele se referiu a Lúcio e Draco.

– Como quiser, Milorde. – não queria ter usado seu tom tedioso, sabia que estava soando de forma rebelde, mas não conseguiu evitar. Draco deveria estar recebendo informações de sua casa naquele instante, deveria saber como Hermione estava.

Voldemort o encarou como se reprovasse a atitude e estivesse pronto para colocá-lo contra a parede. Draco estava pronto.

– Me conte sobre a guerra.

– Sabe tudo sobre a guerra.

– Inclusive das suas duas últimas falhas tentativas em York.

– Já discutimos isso. – diferente do que os outros líderes ali, Draco não deixava para relatar nada em uma mesa aberta. Tratava disso em sessões particulares. – Os cuidados para a terceira tentativa também já foram discutidos. - ele não levaria nada daquilo para a mesa aberta, já era o suficiente ter os homens de seu conselho dando “pitacos” em suas decisões. – A mesa precisa apenas saber que assim que tomarmos York, nós iremos seguir para a eliminação efetiva dos rebeldes, como já discutido aqui antes.

Voldemort abriu um sorriso.

– Gosta de ser esperto, não gosta?

Draco mostrou as mãos.

– Gosto. – apenas respondeu. Voldemort não questionaria. Ser esperto havia o feito vencer aquela guerra para ele.

– E por isso eu sempre o testo. – finalizou o mestre. – Nott. – desviou o olhar de Draco para Theodoro sentado há algumas cadeiras. – Espero que tenha conseguido resolver o problema com a imprensa. Se continuarem soltando os comentários que fazem, terei que encontrar outro governador para o seu lugar. Precisa acertar sua relação com a Sra. Malfoy.

– A imprensa está sendo amenizada aos poucos, mestre. – Theodoro se manifestou. – Tenho soltado notas diárias sobre as atividades do departamento, fazendo com que tudo fique mais transparente ao público. Hermione e eu também estamos trabalhando em nossa relação.

Estão? Os olhos de Draco foram imediatamente até ele. Theodoro apenas piscou e o encarou calmamente de volta.

– Perfeito. – Voldemort disse. Draco não desviou seu olhar de Theodoro e ele também fez o mesmo. – Acredito termos terminado por aqui, então. – foi o primeiro a se levantar e quando o fez todos os outros o seguiram em respeito. – Quero que saibam que o propósito da mesa aberta é discutirmos o império como um todo, vermos as ações de cada um e como elas estão contribuindo para o andamento do meu governo. A intenção nunca foi escutar como andam seus departamentos ou tarefas. Que passo devem seguir ou que estratégias devem tomar. Devem discutir isso comigo em particular. Que fique claro que se essas sessões continuarem nesse ritmo, me sentirei obrigado a trocar cada um de vocês e sabem bem o que faço com quem acabo descartando. – deu as costas e foi embora.

Draco não desgrudou os olhos de Theodoro em nenhum momento. Theodoro fez o mesmo. Os comensais começaram a se dispersar e eles ficaram ali. Draco queria ver quem desistiria primeiro.

– Será que você poderia ter sido um pouco menos rebelde? – Lúcio vociferou ao se aproximar dele.

– Não me diga como jogar o meu jogo. – seus olhos não desgrudaram dos de Theodoro.

– Nosso jogo. – seu pai consertou.

Meu jogo. – disse e Lúcio apenas soltou o ar impaciente e tratou de sumir. Theodoro se moveu e Draco fez o mesmo, se colocando exatamente no caminho que ele tomaria até a porta. Aproximou-se. – Você não quer mesmo brincar de me desafiar.

– Quem disse que estou te desafiando? – Nott foi corajoso ao permanecer naquela postura.

– Está mexendo com a minha mulher.

– Sempre tão possessivo com o que pensa ser seu, Draco. – Theodoro abriu um sorriso discreto. – Só porque são casados, não quer dizer que ela seja inteiramente sua. Não creio que Hermione se entregou totalmente a você. Ela nunca o faria. Você a possui apenas em um papel e ela é um ser humano. Hermione é muito mais do que a assinatura que a faz ser uma Malfoy. – Theodoro se aproximou mais e abaixou o tom da voz. – Pensa que Hermione é sua, mas não sei se Hermione também pensa o mesmo. – Nott abriu um pouco mais o sorriso e então passou por ele. Draco pensou estar livre da detestável imagem ao qual ele estava se apresentando ali, mas ainda escutou àquela detestável voz continuar as suas costas: – Ela não parece ser um milhão de mulheres em uma? – riu - É uma pena que eu nunca tivesse me permitido aproveitar dela em Hogwarts. Não gostaria de perder a chance agora.

– Se tocar em minha mulher é um homem morto.

Theodoro riu novamente.

– Você não me pareceu tão assustador o dia em que me viu beijá-la.

Draco sentiu suas entranhas revirarem, mas apenas cerrou os punhos e virou-se para ele.

– Não é assim que eu trabalho. Me conhece. Não preciso parecer assustador, preciso apenas vê-lo encarar a morte tendo a consciência de que eu o coloquei lá, em frente a ela. – o sorriso de Theodoro se desfez. – Desse jeito é melhor. – Draco comentou a nova expressão dele e o deixou seguindo o mais rápido possível para sua torre. Assim que subiu todas as escadas e chegou ao hall do ambiente comum, Tina o esperava. Estalou os dedos para que ela o seguisse enquanto atravessava até sua sala. Quando se sentou em sua cadeira, a mulher já estava de pé à frente de sua mesa. – Me informe. – ordenou, abrindo a pilha de pastas que já haviam se acumulado em sua mesa. Ela já estava pronta com sua prancheta.

– Os bruxos da Comissão acabaram de confirmar a elaboração de duas novas magias para a proteção do acampamento que pretende implantar no centro de Yor...

– Não isso, Tina. – ele a cortou.

A mulher pareceu ficar confusa.

– Hum... – ela mexeu apressada em seus papéis. – Seu grupo de conselheiros tem...

– Isso não. – a cortou novamente e de forma mais severa, tendo que erguer os olhos para encará-la.

Tina ficou ainda mais confusa. Mexeu em seus papéis franzindo o cenho, como se tentasse descobrir o que ele queria. Acabou puxando um pedaço de pergaminho aberto.

– Bem... Hum... – ela começou como se estivesse apostando naquilo, incerta. – Sua mãe mandou uma coruja com um recado sem selo.

Draco sentiu seus ouvidos apurarem instantaneamente e todos os seus sentidos de alerta levantarem guarda. Tina continuava o encarando confuso. Ele estava começando a se irritar.

– Diga logo o que está escrito. – detestava quando alguém era devagar quando precisava que fosse rápido.

– Diz... – ela apertou os olhos para ler novamente, como se tivesse se esquecido do que era. – “Ela acordou.” Só isso. Não me parece fazer nenhum sentido.

Draco se levantou imediatamente.

– Faz para mim. – passou por ela. – Estou indo para casa.

– O que? – ela saltou os olhos e o seguiu. – Não posso fechar seus compromissos! São muitos! Além do mais, a Seção Financeira acabou de mandar um memorando informando que não financiará uma nova tentativa em York porque o Conselho não o apóia e se não atender a uma reunião com eles em menos de uma hora, até mesmo nosso orçamento mensal pode ficar comprometido.

– Apenas os atrase, vinte minutos, meia hora. – a cortou. - Não me peça para dizer como deve fazer seu trabalho. Preciso ir para casa, vire-se. – e foi embora.

Não esperou que aprontassem sua carruagem e pegou uma da Catedral, pedindo para que fossem o mais rápido possível. Quando chegou aos portões dos terrenos de sua propriedade teve dificuldades para atravessá-lo. A imprensa estava amontoada ali desde que os carros do St. Mungus tomaram conta do pátio da frente.

Assim que passou para o lado de dentro de sua casa, foi recebido por uma curandeira que carregava uma dúzia de pequenos frascos cheios de poções em uma bandeja de madeira envelhecida. A mulher disse que Hermione havia acordado não fazia mais do que duas horas, Draco pediu para que aprontassem a equipe de medibruxos responsável por Hermione em um dos escritórios de recepção daquele andar e apressou-se para subir as escadas e fazer o caminho até seu quarto.

Sua mãe estava de costas sentada em uma poltrona ao lado da cama e Hermione foi a primeira ao ver quando ele entrou. Ela estava sentada na beira do colchão, de frente para sua mãe, usando uma camisola de algodão e tocando os pés descalços no chão frio. Ela não teve nenhuma reação ao vê-lo, apenas não tornou a encarar Narcisa.

– Draco. – sua mãe se levantou. – Não esperava que viesse.

– Preciso voltar para a Catedral logo. – ele anunciou.

– Então é melhor que eu deixe vocês conversarem. – ela disse e se afastou, passando por ele e fechando a porta ao sair.

Draco se aproximou e tomou a poltrona, sentando-se. Hermione permaneceu em silêncio. Ele soltou o ar e acomodou-se colocando os braços sobre os braços da cadeira e cruzando a perna. Encararam-se em silêncio por um tempo, até que ele finalmente perguntasse:

– Como se sente?

Ela piscou com calma, tirando as mãos do colo para segurar as laterais do colchão. Havia uma agulha em sua mão que era ligada a uma bolsa cheia de um líquido cintilante, porém translúcido, pendurado num suporte de madeira.

– Estranha. – ela respondeu com uma voz fraca e rouca.

Era compreensível. Hermione iria se sentir melhor depois de alguns dias tomando as poções que deveria e seguindo as recomendações dos medibruxos.

– Eles contaram o que aconteceu a você?

Ela assentiu.

– Narcisa me explicou.

Hermione havia sido vítima da própria magia colocada para que ela tivesse mais chances de gravidez. Os medibruxos informaram que não era uma magia simples porque o mestre havia feito diversas especificações e uma delas era que a vida gerada por Hermione deveria ser protegida sob prioridade nas circunstâncias mais extremas. Na teoria, realmente era excelente, o grande problema foi quando a magia reconheceu que Hermione estava gerando duas vidas e não apenas uma. A magia entrou em contradição com si mesma tentando identificar um deles como intruso para expulsá-lo, embora preso à característica de proteção incondicional. O corpo de Hermione acabou por entrar em colapso como resposta a isso.

As chances de Hermione engravidar de gêmeos existiam, embora os medibruxos tivessem trabalhado para que fossem chances pequenas. Haviam dito que trabalharam na magia para que ela estivesse pronta para receber mais de uma vida, caso acontecesse, mas que as especificações de Voldemort haviam sido uma lista grande e que o tempo para verificar se tudo estava em perfeita ordem não fora totalmente suficiente, o que acabou por colocar alguma dessas especificações em conflito com outras. O importante é que Hermione estava bem depois de três dias desacordada, estava livre da droga daquela magia e precisava ser monitorada diariamente para que o crescimento dos dois fetos fosse acompanhado com cuidado para receberem o que precisassem. Voldemort não hesitaria em tirá-los de Hermione se caso algum deles tivesse sido comprometido pela guerra que a magia havia travado nela.

– Gêmeos, certo? – Hermione comentou após desviar o olhar para longe do dele.

– Gêmeos. – confirmou Draco.

O silêncio os seguiu por um tempo.

– O que pensa sobre isso? – ela perguntou.

Na verdade, ele tentava não pensar sobre isso.

– Espero que ao menos um deles seja menino. – acabou por dizer, mesmo sabendo que aquilo não era só o que realmente pensava sobre isso. – O que você pensa sobre isso?

– Ainda não tive tempo para pensar. – ela disse e eles entraram no silêncio. Hermione trouxe novamente as mãos para o colo e as encarou, analisando por um momento a agulha em sua veia. - É realmente necessário que tenhamos toda essa gente morando aqui em casa?

– Você passou por um trauma, está gerando duas vidas aí dentro e não a quero em um hospital. – Draco disse e ela não contestou. Sabia que estar em casa por mais grave que fosse seu caso, aliviava a situação para a imprensa. – Não será por muito tempo. – também não gostava da ideia de ter pessoas tirando a privacidade que tinha em sua casa. Lembrava-se de ter detestado Hermione por isso quando haviam se casado, mas aprendera a conviver com ela. Haviam criado a privacidade deles e não gostava da ideia de ter que abrir mão disso por um tempo.

O silêncio novamente. Céus, como ele queria tocá-la. Suas mãos coçavam. Era tão bom vê-la com as maças do rosto rosadas e os olhos vivos novamente. Queria tocá-la para ter certeza de que não se quebraria ou de que era realmente real, mas não se moveu. Apenas a observou quando ela se levantou e arrastou o suporte de madeira consigo até a janela onde se sentou novamente.

– Voldemort sabe que são dois? – Hermione perguntou sem encará-lo.

– Sim. – ele respondeu.

Ela suspirou fechando os olhos.

– O que ele disse? – ela o encarou.

Draco não estava certo se deveria passar aquela informação para ela.

– Disse que precisará apenas de um. – foi tudo o que Voldemort disse.

Hermione apertou os lábios, fechou os olhos e cobriu o rosto com as mãos.

– Ele vai matar o outro. Vai esperar que nasçam, e vai matar o outro. – ela disse com a voz apertada. – Especialmente se for uma menina. Irá matar os dois se os dois forem meninas.

– Ainda não sabemos sobre isso...

– Mas iremos! Pode parecer que temos tempo, mas não temos, Draco! – o encarou.

– Hermione. – ele se levantou – Vamos cuidar disso. São dois bebês! Sei que temos apenas cinquenta por cento em cima dos dois por serem idênticos, mas tenho...

– Não fale de porcentagens, Draco! São nossos filhos! Eles não são mercadoria, não são negócios, são vidas! Não pode apostar em cima deles! – Hermione tentou exaltar o tom da voz, mas saiu apenas um rouco cheio de indignação.

Draco soltou o ar cansado.

– O que sugere então?

– Você sabe o que eu sugiro.

– Não, não sei.

Ela puxou o ar o encarando bem.

– Sim, você sabe.

Ele a encarou confuso por alguns segundos, mas não demorou até que sua mente clareasse. Puxou o ar e lutou para não revirar os olhos.

– Potter? – soltou com desgosto. – Acredite, Hermione, você não vai querer carregar a culpa da morte de Harry Potter.

– O que eu não quero é carregar a culpa da morte de mais um filho...

– E também não quer a de Harry Potter!

– Eu fiz um acordo com o mestre!

– E acaso fizeram um Voto Perpétuo? Não acredito que seja ingênua de pensar que ele é um homem de palavra!

– Eu não faria um Voto Perpétuo sem nem estar grávida ainda, Draco! – ela se levantou. - Mas agora que estou, posso barganhar um se caso estiver carregando uma menina ou até mesmo duas!

– O que te faz pensar que o Lorde das Trevas esperaria nove meses até que você tivesse novamente a chance de lhe dar um herdeiro? Isso é importante para ele, Hermione! Acha que ele quer essa criança para brincar de casinha com minha tia Bella? Ele tem planos e sabe-se lá Deus o porque ele está com tanta pressa!

– Eu acredito que Voldemort carrega uma maldita profecia com Harry a muito mais tempo do que deseja esse herdeiro, Draco!

– E é por causa dessa profecia que nós precisamos de Harry Potter vivo! – disse e viu Hermione trocar de expressão no mesmo instante. Aproximou-se dela. Não gostava da ideia de falar sobre aquilo com pessoas desconhecidas rondando os corredores de sua casa. – Temos um interesse em comum, queremos que Voldemort caia. – abaixou o tom de voz. - Ele não irá descansar enquanto estiver vivo, portanto precisa morrer. Alguém terá que matá-lo e esse alguém não sou eu, nem você. Já há uma profecia que diz quem deve matar o Lorde das Trevas, portanto guarde Potter para o momento certo, Hermione.

Ela abriu a boca para contestar, mas tornou a fechá-la. Ficou em silêncio um tempo, embora não desviasse os olhos dele. Não parecia nada contente, mas ao mesmo tempo seu olhar era angustiante. Fechou os olhos desistindo do que quer que fosse protestar contra e soltou o ar um tanto frustrada, dando as costas para poder encarar o pátio externo.

– Eu não sei o que fazer. – a voz dela soou baixa. – Como você consegue fazer isso? Ficar tão calmo, tão centrado! Parece sequer se preocupar! – havia um pouco de indignação junto com sua frustração. – Como consegue dizer que vamos encontrar uma forma de lidar com isso? – tornou a virar-se para ele. - Eu não consigo parar todos esses pensamentos. Não consigo parar de imaginar o que Voldemort faria ou o quão horrível seria ter uma criança minha sendo tirada dos meus braços, porque perder a vida que eu carregava da última vez já me pareceu terrivelmente doloroso para que eu já me sentisse suficientemente atormentada dessa vez. – ela puxou ar devido a sua corrida com as palavras e então começou a andar de um lado para o outro, gesticulando como estivesse buscando as palavras para se expressar. – Eu tentei. Desde que comecei a desconfiar que eu pudesse estar grávida. Tentei deixar que as emoções, os medos e as inseguranças não tomassem conta de mim. Tentei me manter confiante e inabalável como você sempre se mantém. – puxou o ar novamente buscando oxigênio para continuar. - Quando te contei e nós viemos para casa eu tentei ser otimista, tentei olhar para toda essa preocupação, pressão e tensão sem deixar que elas me abalassem. Eu me permiti sorrir, me permiti ficar feliz por estar grávida ao invés de me martirizar por ter sido tão burra. Me permiti lembrar que na verdade eu queria isso. Me permiti tentar apreciar sua companhia. E... – os olhos dela brilharam e sua voz ficou apertada. – Foi bom. E... – ela puxou oxigênio novamente. – E parece que esse susto foi algum tipo de punição por isso. Como se os olhos de Voldemort estivessem a todo o segundo me vigiando a espreita do momento em que eu sorrir para que ele possa me derrubar. Agora tenho que ter uma casa cheia de medibruxos me cercando como seu eu pudesse vivenciar tudo de novo a qualquer momento, sem poder saber realmente se essas duas vidas estão mesmo bem, se estão se desenvolvendo corretamente, se a droga dessa magia os afetou de alguma forma ou se vou mesmo chegar a tê-los um dia em meus braços. – Hermione parou e apertou os pulsos contra os olhos. – Merlin. Eu odeio esses hormônios.

Draco sentiu uma urgência crescer. Queria ir até ela, segurá-la pelos pulsos, trazê-la para si, tocar seus cabelos, mesmo que parecessem não tão macios por aparentarem estar bastante embaraçados. Quis confortá-la e ter plena consciência de todas essas vontades que lhe cresciam em relação à Hermione o segurou bem onde estava.

Lembrou-se da noite em que passou o anel de noivado a ela. Lembrou-se de suas palavras. Lembrou-se de que não queria uma mulher derramando lágrimas em sua casa. A diferença do que queria naquela época e do que queria agora era baseado simplesmente na visão que tinha da mulher à sua frente. Naquele jantar Hermione estava perfeita, incrivelmente sexy, elegante e tudo que Draco realmente conseguia enxergar era o belo e detestável pacote que ela era, cheio de sangue trouxa nas veias, que ele não sabia se seria capaz de suportar por mais de alguns minutos. Agora ele a via descalça, usando uma camisola de algodão que parecia maior que o corpo, cabelos emaranhados e o que ele via na verdade era uma mulher tão extremamente única que o deixava incapaz de rotulá-la, incapaz de definir, incapaz de processar. Draco não entendia como conhecê-la a fazia parecer sempre mais incrível conforme os dias se passavam. Ele não se entediava. Não se cansava. Isso a fazia ser tão absurdamente interessante e tão loucamente mais linda, mesmo de camisola de algodão.

Ali ela não era a vaga imagem que ele tinha da Hermione que conhecera em Hogwarts, nem a que havia enfrentado durante os anos de guerra. Ali ela era sua mulher, a que vivia debaixo do seu teto e sabia quais pratos ele preferia para o jantar, a que deitava ao seu lado na cama, que sabia quais os dias que mais o cansavam, a que horas levantava e a que horas dormia, a que conhecia até mesmo a qualidade de seu sono. Ali Hermione era a mulher que sempre deitaria em sua cama como uma Malfoy, a que sempre viveria na mesma casa que ele, a que sempre estaria ao seu lado e a que o acompanharia nos seus melhores e piores momentos. Ali ela era a única mulher com quem Draco se via verbalizar coisas que jamais colocaria para fora, a única além de sua mãe que conheceria alguns dos segredos que ele jamais deixaria que ninguém soubesse e a única que estava carregando o laço de sangue entre eles em sua barriga. E a única que o fazia... sentir. Sentir demais.

– Hermione. – ele disse calmamente, deixando-se apreciar como era diferente toda vez que o nome dela saia de sua boca. – Preciso que olhe para mim. – ela só tirou as mãos dos olhos quando soube que estava pronta para fazer isso, sem deixar que derramasse alguma lágrima. – Você já me conhece o suficiente para saber que não faço promessas com facilidade. – se aproximou mais. – Quero que saiba que é uma promessa quando eu digo que ninguém irá tocar nos filhos que carrega. Eles também são meus. Que sejam um ou vinte. Me arrependo o suficiente de não ter te feito essa promessa da última vez em que esteve grávida.

– E como especificamente você pretende cumprir essa promessa quando na verdade...

– PARE de pensar que é a única que é capaz de bolar uma estratégia aqui! – Draco a cortou sério o suficiente para fazê-la engolir qualquer outra palavra que tivesse para rebater. Segurou-a pelos ombros e a fez encarar novamente através das vidraças. – Consegue ver todas aquelas pessoas amontoadas no nosso portão? Aquela será a nossa arma. A imprensa, o boca a boca, a imagem que já temos diante da mídia. Jornais, rádios, revistas. O povo será nossa arma.

Hermione ficou em silêncio alguns segundos, tentando entender o que ele havia dito.

– Aonde quer chegar? – ela indagou.

Draco aproximou sua boca do ouvido dela para poder diminuir o tom de voz.

– A imprensa saberá que está grávida, logo. Faremos o favor de sermos descuidados para que eles descubram sobre isso, e então, nós vamos nos tornar as pessoas públicas mais ativas na mídia de todos os tempos. Seremos o casal mais apaixonado que essa cidade já viu. Mãos dadas, abraços, almoços e saídas ao parque. Deixem que nos fotografem, que nos façam perguntas, deixem que nos acompanhem. Mostre-se feliz, amigável, gentil. Iremos passar que nada poderia nos deixar mais feliz e nada poderia nos unir ainda mais do que a ideia de receber filhos. Faremos com que as pessoas deixem apenas de se simpatizar por nós para que passem a nos amar. Faremos com que os jornais e revistas mais vendidos sejam aqueles que nos tenham na primeira página. Faremos as pessoas esperarem ansiosamente pelo dia em que comprarão uma revista onde estaremos felizes e alegres, num dia de primavera segurando nossos filhos nos braços bem na capa. Faremos com que nos amem tanto que a figura da nossa família perfeita se torne intocável. O mestre não agiria contra nós tão diretamente sem perder a qualidade de sua imagem para o público, o que é algo que ele não se daria ao luxo quando precisa ser aceito por ele para se livrar da proteção dos fortes e encarar o mundo. Até mesmo o Lorde das Trevas sabe que é necessária simpatia para governar um império. Não pode ter as pessoas apenas pelo temor, não todas, não o tempo inteiro. Precisa ganhar o apoio delas e ele vem trabalhando nisso a um bom tempo, não iria destruir esse trabalho para se tornar o terrível vilão novamente tocando na preciosa e encantadora família Malfoy, amada e admirada por todos.

Hermione pareceu precisar de alguns segundos para processar aquilo.

– Voldemort saberia que estaríamos jogando com ele. – ela finalmente disse algo.

– Deixe que ele saiba. Voldemort sabe que eu não sou como os outros comensais, ele sabe que eu desaprovo muita das decisões dele, mas já me testou o suficiente para não ousar questionar que estou do lado dele nessa guerra. Além do mais, posso defender meus filhos porque Voldemort conhece a relação que tenho com meu pai e foi ele quem aceitou o acordo de entregar meu herdeiro ao Lorde. Seria natural que eu lutasse contra uma vontade do meu pai.

– Você não lutou quando ele induziu meu aborto bem na sua frente da última vez.

– Porque eu posso muito bem não ter tido tempo de formar uma opinião forte sobre a ideia de filhos naquela época, mas agora tive e quero protegê-los. E não use esse tom acusador quando sabe como realmente me senti sobre a última vez.

Hermione soltou o ar e fechou os olhos.

– Desculpe. – ela usou um tom muito baixo e, mesmo assim, ele ainda sentiu que poderia revirar os olhos ao escutar aquilo.

Ela se desculpava demais e isso a fazia ser compreensiva demais. Ninguém que Draco conhecia ou que já conhecera era compreensiva como Hermione, nem mesmo sua mãe. Às vezes ele achava um tremendo exagero, mas ao mesmo tempo não conseguia detestá-la por isso.

Deslizou sua mão dos ombros pelos braços dela. Estava a tocando e agora já era tarde demais para recuar. Passou um de seus braços pela cintura dela e aproximou-se ainda mais para colar seu corpo no dela. Céus! Ele não conseguia descobrir o que é que corria cada extensão do seu corpo quando a tinha daquela maneira, tão próxima. Não era como o desejo por sexo, o desejo de olhar o suficiente para os detalhes de uma mulher e sentir a urgência de arrastá-la para um canto mais reservado, mas era tão forte e tão intenso quanto.

– Sei que será bem mais complicado. Construiremos uma base forte com o público e ficaremos de olho para agir contra qualquer oportunidade que o mestre tiver de chegar até nós. – concluiu para ela.

Hermione ficou em silêncio, como se estivesse considerando toda a ideia.

– Nós... – ela sussurrou como se estivesse jogando ao vento e Draco percebeu o peso do que havia dito. – É isso que somos agora? É isso que eu e você nos tornamos? Nós? – ela puxou o ar enchendo o pulmão e se afastou empurrando com cuidado o braço dele para se libertar. Afastou-se antes de girar sobre os calcanhares para encará-lo. – Me parece bastante para digerir. – Hermione começou. – Mas devo confessar que você conhece melhor o Lorde do que eu. Presumo que esteja certo do que está planejando. – ela consertou a postura como se estivesse tentando recobrar o orgulho. – Vamos ter que fingir bastante, espero mesmo que esteja pronto para isso. – soltou o ar. – Mas se algo acontecer, Draco. Eu não vou me importar com a droga da profecia o que você pretende com Harry.

Ele soltou o ar, lutando para não revirar os olhos. Ela estava insistindo com Harry Potter.

– Certo, Hermione. Potter será nossa última opção. Última opção. – ele se fez claro. – Enquanto isso, nós iremos trabalhar com o que eu disse. Podemos ganhar tempo jogando com Voldemort.

Hermione o encarou profundamente, como se quisesse passar que nada era mais sério do que aquilo para ela. Quando pareceu ter certeza de que a mensagem daquele olhar fora assimilada, caminhou passando por ele e voltando até a cabeceira da cama, onde puxou uma minúscula alavanca colocada do lado onde Hermione deitava. Ela teve apenas o tempo de se sentar com cuidado e ajeitar o suporte de madeira ao qual estava aprisionada, antes de escutarem batidas educadas na porta para então receberem uma das curandeiras que entrou receosa e começou um atendimento cuidadoso em Hermione.

Draco apenas observou enquanto Hermione pedia pelas receitas daquilo que estavam lhe dando e uma explicação detalhada de qual o tratamento que estava recebendo. Ela era educada, sua voz saía completamente dócil e amável em respeito à profissional que a atendia. Qualquer outra mulher que ele conhecesse estaria lançando ordens no lugar dela e ainda exigindo que fossem atendidas imediatamente ou haveria consequências. Hermione era gentil até mesmo com elfos que não os serviam. No começo, Draco achava que era uma patética encenação, mas com o tempo aprendeu que aquela era apenas quem ela era.

Enfiou as mãos no bolso e seus olhos se encontraram, enquanto a curandeira tirava a agulha de sua veia e lhe estendia um frasco de poção, informando que ela precisava daquilo para seguir para um exame dentro de alguns minutos.

– Preciso voltar para a Catedral. – ele informou.

Hermione assentiu, sem mudar sua expressão. Draco precisou respirar fundo e desviar o olhar rapidamente para curandeira para que ela finalmente entendesse. Quando sua ficha caiu, ela abriu um sorriso. Um sorriso tão adorável que ele quase se esqueceu de que ela estava fingindo. Hermione estendeu a mão a ele que se aproximou e a segurou.

– Queria que pudesse ficar. – sua voz doce quase o fazia sentir o mel deslizar por sua língua. Ele desejou que fosse verdade.

Draco abriu um sorriso convincente. Podia ser um bom ator. Fazia isso há anos.

– Queria que pudesse vir comigo. – não era realmente uma mentira.

Hermione apenas sorriu.

– Mantenha-me informada. – ela disse e ele soube pelo olhar dela que era um pedido sério.

Draco assentiu, segurou seu queixo e abaixou-se para beijá-la. Quando seus lábios estavam contra os dela, inalou seu cheiro para guardá-lo em sua memória inconscientemente. Afastou-se e a observou abrir os olhos calmamente para que ele pudesse ver o misto do âmbar e dourado que formavam sua íris.

– Te amo. – tentou soar o mais natural possível, como se já tivesse dito aquilo mais de um milhão de vezes, mas a verdade é que Draco sentiu como se estivesse vomitando um alienígena. Era a primeira vez que dizia aquilo e até mesmo sua língua pareceu formigar ao pronunciar aquelas palavras.

O sorriso de Hermione começou a se desmanchar e ele teve que segurar seu queixo com mais firmeza para que se lembrasse que haviam olhos sobre eles. Ela recuperou o sorriso, mas Draco estava tão próximo que conseguia ver o olhar intenso dela.

– Também te amo. – ela soou quase inaudível e engoliu a saliva depois, como se estivesse tentando passar pela garganta uma enorme pedra.

Draco selou rapidamente seus lábios nos dela mais uma vez e se afastou, virando-se para a curandeira que detinha um sorriso sonhador nos lábios e um olhar encantador. Era isso que ele queria, isso que ele precisava. Cada curandeiro naquela casa deveria sair falando para o mundo que Draco e Hermione Malfoy eram o casal mais apaixonado que já tiveram o prazer de observar.

– Você cuide bem da minha esposa. – disse a ela e viu a mulher corar e assentir com a cabeça no mesmo segundo.

Deixou o quarto. Não contou dez passos e escutou a porta abrir e fechar às suas costas. Suspirou e virou-se para encará-la. Hermione tinha um olhar furioso e veio determinada até ele, com os pés descalços sobre o carpete e a camisola de algodão tão larga que deixava um de seus ombros nu.

– Não vamos dizer isso um para o outro. – ela cuspiu a ordem, tomando cuidado para manter o tom de voz baixo.

– Sim, nós vamos e...

– Eu não vou! – estava muito determinada. – Não estou brincando, Draco. Podemos fingir o que for, mas não vamos dizer isso um para o outro.

– São só palavras, Hermione!. – ele vociferou aproximando-se. – Quer colocar Harry Potter nas mãos de Voldemort para salvar nossos filhos, mas não quer usar estúpidas palavras vazias para o mesmo fim? Você é mesmo alguém muito exótica!

– Você não entende...

– E não pretendo entender. – a cortou como ela havia feito antes. – Vamos fazer isso com autenticidade. Como deve ser feito. Acostume-se. Agora volte para o quarto, querida, e encha os ouvidos daquela curandeira de lindas histórias falsas sobre Hogwarts e nosso espírito aventureiro no amor.

Hermione o encarou com os olhos faiscando e a postura feita, como se estivesse pronta para contra atacar. Por fim, ela apenas bufou deu as costas e saiu marchando de volta para o quarto. Draco soltou o ar e continuou seu caminho. Desceu as escadas e encontrou sua mãe direcionando um grupo de jornalistas devidamente identificados para dentro de uma sala privada. Narcisa estava organizando a situação com a imprensa e ele se sentia grato o suficiente por isso para ir até ela agradecer por estar fazendo aquilo. Era algo a menos para se preocupar.

Seguiu para o seu escritório de recepção e assim que entrou a equipe de três medibruxos, que consistiam em dois homens e uma senhora de meia idade, se levantaram do sofá onde estavam sentados conversando aos cochichos. Draco apenas passou por eles e se sentou em sua cadeira inclinando-se no espaldar para se sentir confortável.

– Li o que me passaram. – abriu uma das gavetas da mesa à sua frente e puxou a pasta que deixara ali. – Criação, inserção, funcionamento... bla-bla-bla... – disse enquanto folheava os pergaminhos. Fechou a pasta e a jogou sobre a mesa. Encarou os medibruxos à frente dele. Conhecia um deles. Havia trabalhado para a Comissão por pouco tempo. Os três estavam em suas perfeitas posturas, mas sabia que cada um deles temia pelo fim de tudo aquilo. – Parece algo que demoraram bastante tempo para desenvolver.

– O mestre pediu com urgência. – um deles usou um tom exageradamente respeitoso para se manifestar.

– Sim, sim. Já fizeram o favor de me dizer isso mais de dez vezes nós últimos três dias.

A mulher soltou o ar e tomou a frente.

– Sabemos que não há nenhum tipo de perdão pela nossa falha...

– Perdão? – Draco soltou um riso fraco. – Vocês quase mataram minha esposa.

– Se leu os documentos que o enviamos, sabe que tudo estava em perfeita ordem.

– Na verdade, não estava. Se realmente estivesse ela estaria bem agora e nada disso teria acontecido. Vocês claramente deixaram passar algo.

– Sim, e nós admitimos nosso erro!

– E acreditam que isso alivia a situação em que estão? – Draco foi sério. Nenhum deles respondeu. O silêncio pesou entre eles. Ele precisava fazer com que se lembrassem que estavam com a corda no pescoço.

– Nós... – o homem que costumava trabalhar para a Comissão se manifestou. Engoliu a saliva como se ela cortasse sua garganta e continuou: - Nós preparamos tudo com muito cuidado. A intenção nunca foi que ela atingisse esse ponto. Ficamos surpresos que isso chegou a acontecer, mas estamos dando nosso melhor para que ela fique bem e para que tudo acabe bem com os gêmeos que está gerando. E sim, nós cometemos uma falha, deixamos passar algo que não deveríamos, mas já fui parte da Comissão e sei que não é um homem que sabe analisar muito bem as situações. Não teríamos nos envolvido com isso se não fosse ordens diretas do mestre. Tenho certeza de que já se sentiu encurralado dessa forma antes. Somos todos comensais aqui e todos estamos presos a ele. Estamos fazendo nosso melhor, estamos trabalhando com nossa melhor equipe e colocando todos os esforços nela. Sabemos que tem o direito e o poder de tomar a decisão que quiser com relação a nós, mas pedimos... – ele parecia desconcertado ou como se estivesse buscando coragem para dizer o que Draco já sabia que ele ia dizer. – Se talvez... – ele respirou fundo. – Talvez pudesse suavizar o nosso caso para o mestre. – e se calou.

O silêncio entre eles gerou uma expressão receosa no rosto dos dois homens e da mulher. Draco conseguia ver que eles preferiam muito mais estar no funeral de alguém próximo do que ali.

– Devo lembrá-los de que quase mataram minha mulher mais uma vez?

– Senhor, entendemos...

– Me parece que não. – Draco interrompeu. O silêncio novamente. Ele suspirou e se levantou. Deu a volta na mesa e enfiou as mãos no bolso para encarar os medibruxos à sua frente. – O pedido que fazem exige de mim muita generosidade, se querem saber, e estão no lugar errado para encontrarem generosidade. Isso onde vivem é uma cidade de comensais, estamos todos debaixo de uma ditadura e sabem muito bem que não há lugar para misericórdia aqui.

– Sabemos bem...

– Não me interrompa novamente. – Draco usou de seu tom mais ríspido e o homem recuou, piscando desajeitadamente e arrumando os óculos sobre o nariz. – Eu não sou um homem generoso. Se eu fosse, essa guerra não estaria quase ganha. Também gostaria de poder punir pessoalmente cada um de vocês por quase me tirarem alguém que agora é o meu sangue, tem meu sobrenome e é minha família. Mas... – puxou o ar e refez a postura. Os olhos deles se tornaram atentos ao escutarem a última palavra. – Posso não ser generoso, mas isso não me impede de ser sensato. – o olhar de esperança que surgiu neles o fez enxergar o sucesso que conseguira ao colocá-los contra a parede. – Claramente não houve o desejo de se colocarem nessa situação por parte de nenhum de vocês, portanto não consigo deixar de imaginar que a punição que certamente terão será evidentemente... – puxou o ar. – injusta. – concluiu, embora não achasse que fosse injusta. Injustiça é algo que há muito tempo eles deveriam ter esquecido. E era exatamente por isso que Draco precisava trazer de volta a eles esse conhecimento. – Sabemos que o senso de justiça do mundo que vivemos hoje é muito diferente de como costumava ser antes e, obviamente, concordamos com isso, se não concordássemos não seriamos comensais e não estaríamos seguros debaixo da proteção do mestre. – tinha que ser cuidadoso, claro. As cabeças em frente a ele assentiram em concordância quase que imediatamente. Draco deu as costas e caminhou pela sala, como se estivesse tomando tempo para pensar sobre o caso deles. Quando finalmente achou que havia dado tempo o suficiente, voltou-se para eles e disse: - Posso tomar conta do caso de vocês com o mestre. Estão fazendo um bom trabalho com Hermione até agora, visto o estado em que ela estava antes e tenho certeza que temem o suficiente por outro deslize para que acabem errando novamente. – voltou a se sentar em sua cadeira, enquanto os via conter o suspiro de alívio que queriam dar.

– Certamente, senhor. Nos lembraremos da sua... sensatez. – o homem não iria dizer bondade. – E o que quiser de nós, estaremos à disposição para atendê-lo. Qualquer coisa. Acaso existe algo que possamos fazer pelo senhor agora?

Draco poderia sorrir por escutar exatamente o que queria ouvir, mas apenas permaneceu neutro.

– Não. – respondeu, mesmo que já tivesse uma lista de pedidos que seria atendida em seu devido tempo. Precisava que os medibruxos entendessem que ele não estava negociando nada em troca. – Concentrem-se em Hermione. Isso é tudo que quero de vocês. – eles assentiram e Draco os liberou. Quando estavam próximos à porta de saída, voltou a se manifestar. – Na verdade... – disse e a equipe voltou-se para ele com atenção. – Pode haver algo a mais que seria interessante ter de vocês.

– Qualquer coisa, senhor. – disse o que parecia haver se tornado o porta-voz.

– Quero ser o primeiro a receber toda e qualquer informação sobre Hermione e os gêmeos. Assim como também quero que a atendam em qualquer pedido que ela vier a fazer.

– Como quiser, senhor. – respondeu o homem sem nem mesmo hesitar e todos os outros se apressaram em concordar.

Draco tornou a dispensá-los e eles foram embora apressados, como se precisassem desesperadamente de algum canto escuro onde pudessem livremente chorar o alívio das noites mal dormidas que vinham tendo. Ele poderia sorrir pelo sucesso que havia tido, mas não conseguiu ver a necessidade. Apenas levantou-se e seguiu seu caminho de volta para o pátio externo.

Sua mãe apareceu descendo as escadarias da entrada principal, chamando por ele antes que entrasse em sua carruagem. Draco voltou-se para ela já impaciente por saber que deveria voltar logo para a Catedral.

– Você deve falar com a imprensa. – Narcisa disse assim que chegou até ele.

– Pensei que estivesse cuidando disso.

– Eles querem ouvir você, Draco. Eles querem respostas. Eu sou apenas a outra Malfoy que pede por privacidade e não tem autorização para responder perguntas pessoais.

Draco soltou o ar.

– Sei disso, mas sabe que não posso dar respostas a ninguém agora, enquanto Hermione estiver instável. Além do mais, eles sabem que eu tenho uma guerra nas mãos e uma mulher de cama. Tempo não é algo que tem me sobrado.

Narcisa suspirou.

– Certo. Mas não pode adiar isso por muito tempo. É sua casa que está cercada por carros da St. Mungus. – ela disse e Draco assentiu. – Que horas pretende voltar para casa?

Draco estranhou a pergunta.

– Ultimamente estou sem uma rotina. As coisas ainda andam um pouco intensas e o mestre não me autorizou deixar Brampton Fort até ter algo mais consistente sobre a gravidez de Hermione, portanto ainda tenho trabalhado em dobro.

– Havia me dito que está dividindo mais as tarefas e que o novo plano com York exige menos de sua constante atenção.

– Sei disso, mas...

– Precisa voltar para casa.

Draco franziu o cenho, não gostando de ter sido interrompido.

– Eu quero voltar para casa, mãe. O que te faz pensar que eu iria preferir uma noite conturbada e cheia ao invés de uma lareira e uma cama?

– Não é uma questão de preferência, Draco. Você tem uma esposa que não está bem e o mundo sabe disso, precisa ser o marido atencioso e preocupado mesmo que não queira.

Draco revirou os olhos.

– Não se preocupe porque eu tenho certeza que Hermione vai se cansar de ver o marido atencioso daqui a alguns meses. – foi tudo que se prezou a dizer, deixando para atualizá-la sobre sua nova estratégia com Hermione depois. – Apenas tente ficar com ela o máximo que puder.

Entrou na cabine e fez seu caminho de volta para a Catedral, onde foi recebido por Tina que tratou de apressá-lo para dentro de uma reunião com o Financeiro que não estava nada amigável graças aos péssimos comentários que seu Conselho vinha soltando nos últimos dias. Saiu de lá direto para um encontro com a Comissão, onde ele foi apresentado a nova magia que garantia uma melhor segurança para a fronteira estável que iria precisar ao estabelecer um acampamento no meio de uma zona dominada pela Ordem.

A Comissão estava desenvolvendo magias que ele nunca imaginara ser possível desenvolver. Hermione tinha uma grande participação naquilo porque estava passando a ter domínios sobre elementos identificados nas análises da nova magia que a Ordem vinha usando, dessa forma ela era capaz de introduzir ao grupo da Comissão o que vinha os fazendo avançar como nunca. Draco tinha absoluta certeza que aquilo entraria para os livros de história. Às vezes ele simplesmente não entendia como Hermione podia ser tão brilhante. Eles estavam avançando anos e anos de estudos em alguns poucos meses.

Sabia que deveria acompanhar o grupo da Comissão até a sala de simulação, onde provariam os benefícios da nova segurança junto com os planos para a tomada do edifício escolhido para se tornar o novo acampamento no centro de York, mas simplesmente não queria. Destinou um de seus líderes para essa tarefa, ordenando que fosse reportado de todos os detalhes e voltou para sua sala assim que viu a chance.

Tina se surpreendeu por vê-lo novamente tão cedo e Draco não deu nenhum esclarecimento, apenas se fechou em sua sala onde encheu um copo de bebida e se sentou em sua cadeira, livrando-se da gravata e puxando as mangas da camisa. Fechou os olhos e inclinou-se no espaldar ajustando-se confortavelmente. A única imagem que não conseguia sair de sua cabeça quase se materializou novamente e ele pôde sentir a estranha sensação em seus lábios e sua língua. Algo como se estivessem dormentes ou formigando. Parecia o preço por ter dito algo tão estrangeiro.

A reação de Hermione ainda o perturbava tanto quanto a sensação que o perseguia por ter usado palavras que até poucos minutos atrás achara que jamais diria a nenhuma mulher. Nem mesmo sua mãe havia tido a chance de escutar aquilo de sua boca mais vezes do que o número de dedos que tinha em uma mão apenas.

Eram palavras vazias, Draco sabia que eram, mas não deixava de incomodá-lo. Era quase como se fosse impossível dizer aquilo sem que não tivesse nenhum significado. Pareciam palavras fortes demais para serem vazias. Não eram. Ele sabia que não eram. Mas tentava se convencer de que eram.

E a reação de Hermione...

Abriu os olhos puxando o ar. Era incapaz de se deixar pensar naquilo sem ser dominado por uma agonia que beirava o insuportável. Deu um longo gole em sua bebida e puxou o Diário do Imperador dobrado de um canto de sua mesa. Precisava de distração. A ideia de que Hermione havia escutado aquilo de sua boca, mesmo que não tivesse significado algum, o perturbava loucamente. Não Hermione. Por que logo Hermione?

Não tinha tempo para se dedicar a leitura do principal jornal dos fortes de Voldemort fazia um bom tempo. Detestava não saber o que andava influenciando a mente do público, mas estipular prioridades nos últimos dias também era uma de suas prioridades e acabara descartando sua atualização diária de informação.

Passou a primeira página quando não conseguiu se entreter com os textos inúteis. Procurou por alguma atualização no caso sensacionalista que faziam sobre os carros da St. Mungus em sua casa e não encontrou nada além de uma nota sobre os Malfoy estarem segurando informações mais detalhadas sobre o caso. Mais algumas páginas, chegando a uma parte mais informal do informativo, achou algo realmente interessante quando visualizou a fachada dos fundos de sua casa. A imagem não estava muito boa devido à neve que caía constante, mas havia um zoom da mesma imagem logo ao lado que mostrava quem Draco muito bem reconhecia como sendo ele e Hermione.

Não havia tido aquela visão dos dois, mas conseguia se lembrar bem daquele dia. O dia que Hermione havia dito achar estar grávida. O dia em que ele havia se cansado da louca rotina que vinha tendo e apenas foi para casa antes que chegasse a enlouquecer. O dia em que achara graça por ver Hermione incrivelmente linda mesmo usando uma bota de chuva vermelha maior que o pé. Lembrava-se bem de como era vê-la ali, sentada nos degraus de sua casa, abraçando o próprio corpo ao tentar se proteger do frio e com os cabelos esvoaçando na direção do vento. Eles haviam criado uma intimidade que o assustava sempre que se dava conta. Era confortável tê-la por perto, vê-la não tentar parecer a melhor das mulheres ou não tentar esconder seus defeitos. Não tentar ser sexy para impressioná-lo, nem fingir ser alguém que não é para ter sua atenção. Ele gostava disso, gostava que ela mostrasse realmente quem era sem ter receios, gostava de como isso a deixava tão absurdamente linda. Sentia que podia ser o mesmo, que podia ser ele mesmo, que podia despir-se de todas as suas máscaras e de todos os seus segredos mesmo que Hermione nem tivesse consciência de metade deles.

“...e para aqueles que duvidaram de toda a história entre Draco e Hermione Malfoy, para aqueles que julgaram que o romance entre eles não passava de uma farsa apenas por se comportarem, na maioria das vezes, friamente um com o outro em público, a mídia fez questão de divulgar uma história que mais se assemelha a um conto de fadas do que apenas uma história de romance. Isso gerou no público um apego pela figura do novo casal Malfoy de uma forma que os grandes observadores ficam sempre à espera daquele momento em que haverá uma troca de olhar amoroso, um momento em que vão dar as mãos de alguma forma especial ou se beijarem em público. A grande verdade é que Draco e Hermione Malfoy são apenas um casal apaixonado que se mantiveram em segredo por tanto tempo que guardam seus momentos românticos para espaços privados e reservados, onde se sentem mais confortáveis, o que qualquer casal normal faria. Fontes diretas da Catedral também informam constantemente que o casal procura manter discrição em ambiente profissional tanto quanto...”

Draco leu apenas esse trecho antes de voltar a se focar na imagem com o zoom, onde conseguia distinguir a figura de Hermione, com as botas vermelhas, e a sua logo atrás dela envolvendo-a com uma manta. Ele franziu o cenho um tanto confuso. Não havia nada romântico naquilo. Estavam apenas conversando e ele apenas queria protegê-la do frio. Fora erro de Hermione levar apenas uma manta quando na verdade estava decidida a ficar exposta ao frio como ele. Obviamente que Draco havia se sentido tentado a se aproximar, mas não havia nenhum tipo de intenção romântica naquele ato. Olhar aquela imagem, entretanto, o fazia ter duvidas.

Quase balançou a cabeça para espantar alguns questionamentos que lhe surgiram e se focou numa imagem diferente que havia logo ao fim do texto. Era escura e demorou até que ele conseguisse entender, mas logo que a entendeu, quase largou o jornal sobre a mesa. Estava escuro, e o zoom não deixava a imagem em sua melhor qualidade, mas conseguia distinguir bem a sombra de sua figura e a de Hermione contra a luz do lado de dentro da casa. Havia sido no mesmo dia, logo que eles haviam entrado novamente para dentro de casa. Ele se aproximava calmamente, cercava-a pela cintura e a beijava, enquanto ela confortavelmente colocava os cotovelos sobre seus ombros e passava as mãos em seu cabelo. Eram apenas as sombras de seus corpos fazendo aquilo contra a luz amarela de um dos espaços internos que ligava para a varanda dos fundos, mas foi o suficiente para levá-lo de volta a lembrança daquele dia, do sorriso que Hermione tinha nos lábios que faziam as maças rosadas de seu rosto apertar o canto de seus olhos e dar vida a cor dourada de sua íris, da linguagem corporal leve e espontânea que ela adquirira quando tudo entre eles ficou confortável e descontraído, do som do riso que vinha do fundo de sua garganta, da sensação de sentir que poderia desacelerar o tempo para observar os detalhes de tudo aquilo. Draco se lembrava perfeitamente dos flashes dele se movendo até ela e passando os braços por sua cintura. Se lembrava da sensação de ter seu corpo encostando ao dela. Se lembrava de cheirar seu perfume antes de fechar os lábios sem pressa sobre os dela. Se lembrava da sensação em seu peito, como se pudesse sentir o calor de próprio coração com vida. Se lembrava da vontade única que fora apenas querer beijá-la sem nenhuma intenção que fosse de arrastá-la para cama ou nada relacionado. Queria apenas senti-la, tê-la em seus braços, sentir seus lábios macios e seu cheiro e calor de perto. Ele se lembrava bem e o fato de se lembrar de tudo aquilo enquanto encarava aquela imagem o assustou por inteiro. Acabou por realmente soltar o jornal sobre a mesa.

Aquilo era, de fato, romântico. Casais de verdade faziam aquilo e não era para convencerem ninguém de nada. Casais de verdade faziam aquilo porque sentiam vontade de fazer aquilo, porque fazia parte de serem casais de verdade. Draco continuou a encarar a imagem estampada na folha de jornal sobre a mesa. Ele e Hermione não eram um casal de verdade, por que haviam feito aquilo? Por que ele havia feito aquilo? Por que tivera vontade de fazer aquilo? Por que todas aquelas sensações?

Não podia continuar olhando aquilo. Fechou o jornal e o enfiou em uma das gavetas em que guardava coisas desnecessárias. Levantou-se, encheu um copo e o virou de uma vez. As sombras do jornal se movendo de encontro uma a outra e a lembrança de ter feito aquilo atormentavam sua cabeça. Era quase como sentir novamente o calor de Hermione e escutar o riso baixo preso em sua garganta...

– Tina! – ele chamou pela secretaria. Precisava trabalhar, precisava se ocupar. Ir para seu escritório tentar colocar a cabeça no lugar não havia sido uma boa ideia.

A mulher não demorou a surgir preparada para receber as milhões de ordens que ele sempre cuspia. Ela ficou de pé, intacta em sua postura, enquanto Draco apenas a observava vestida numa saia não tão curta, mas não era longa e num terninho não tão decotado, mas também não tão comportado. Ele manteve seus olhos sobre ela. Não era uma mulher comum, sem dúvidas, era bonita. Sempre arrumava os cabelos loiros e curtos de um único jeito o que valorizava o azul de seus olhos.

– Me chamou, senhor? – Tina soltou um tanto desconfortável, quando o silêncio tomou o lugar onde ela não esperava que tomasse. Ele apenas assentiu, mas continuou em silêncio. – E-eu tenho recebido recados daqueles que esperam alguma resposta com relação...

– Sei disso. – Draco a cortou. Queria observá-la de boca calada. – Não há necessidade de trabalhar nos meus compromissos de hoje. Apenas os cancele. – a mulher fez menção de protestar contra, mas ele tratou de tomar o lugar da fala dela. – Sei que estou cancelando muito os compromissos de ultimamente, mas sei o que estou fazendo. – sabia que precisava se ocupar, tinha trabalho em dobro para executar, mas talvez...

Deixou o copo e se aproximou dela. Tina Muller era uma mulher casada, Draco sabia. Tinha um filho pequeno, ele também sabia. Era uma mulher presa a um homem que ele não conhecia e não se importava em conhecer. Eram uma família irrelevante. Mas se realmente sabia algo sobre a mulher à sua frente era que ela o desejava. Ela conseguia se vestir de modo que os detalhes estragavam um pouco do comportado ao qual ela deveria se apresentar sempre. Também costumava prender os cabelos sempre que sabia que ficaria com ele em sua sala revisando papéis por muito tempo para que assim ele pudesse ter a visão livre de seu pescoço até o decote simples, mas significativo.

– Senhor? – ela soltou incerta, mas sem recuar e pareceu fazer a saliva descer rasgando sua garganta.

Draco parou exatamente de frente a ela. Seus olhos azuis pareciam ainda mais azuis de perto. Tina era realmente bonita. Deu mais um passo duvidando que ela recuasse. Ela não recuou. Foi corajosa e manteve seus olhos exatamente fixados nos dele. Draco ajustou-se de modo a ficar extremamente perto. Ele precisava fazer aquilo. Tinha que fazer aquilo. Ela não recuou, não piscou e nem tentou desviar o olhar parecendo incomodada. Ele sabia que ela havia desejado aquilo por muito tempo. Apenas ergueu uma mão e fez a ponta de seus dedos tocarem a base da garganta dela. Desviou seu olhar para encarar sua mão percorrer a pele dela e envolveu seu pescoço. A mulher tinha a pele macia. Tornou a encará-la e ela agora tinha as maças do rosto bem rosadas, sua boca estava entreaberta como se precisasse de mais oxigênio e as pálpebras de seus olhos mexiam-se como se lutassem para não se fecharem.

– Você me quer, não é mesmo? – usou sua voz profusa e quase pôde sentir o corpo inteiro dela estremecer.

– Quem não o quer? – ela usou uma voz quase falha e inaudível.

Desviou seu olhar para a boca dela. Parecia macia como sua pele e Draco queria ter vontade de senti-la, mas não tinha. Os olhos dela não tinham o brilho do verão que os de Hermione tinham. A boca dela não era tão rosada quanto à de Hermione. Nem mesmo seu cheiro era tão bom quanto o de Hermione. E o mais importante de tudo, Tina não causava nele o efeito que Hermione causava. Ela não o fazia sentir aquele calor em seu peito, um calor acolhedor e confortável. Certas vezes quando tocava Hermione, ele tinha a impressão de que conseguia sentir seu coração vivo e pulsando com intensidade.

Ali, encarando sua secretária, ele esperava pela ansiedade dominar cada pedaço de seu corpo, esperava pelas sensações que iriam o fazer querer tocá-la, penetrá-la e escutar os sons que fazia quando sentia prazer, mas nada daquilo chegava como antes. Sua cabeça não se libertava da incessante análise que seus olhos faziam. Não eram os olhos de Hermione, não era a boca de Hermione, não eram os cabelos dela, o cheiro dela, a pele dela. Não era Hermione. Isso o irritava. Ela não podia ter tomando conta dele dessa forma. Draco costumava adorar mulheres, todos os tipos delas e não conseguia nem mesmo se lembrar da última vez que havia tido uma que não fosse Hermione. Não conseguia nem mesmo entender como ou quando Hermione se tornara a única mulher com quem se ocupava.

Passou seu polegar pelo lábio inferior de Tina. Ela fechou os olhos sem perceber e puxou o ar. Aquilo costumava ser muito apelativo para ele, costumava provocá-lo, mas nada aconteceu. Tudo que ela continuava sendo era apenas uma mulher que não o interessava em frente a ele e completamente domada por ele. Sentia que do ponto em que sua secretária estava já tinha o poder para fazer o que quisesse com ela.

– O que quer que eu faça com você? – perguntou, embora não tivesse o mínimo interesse de fazer nada.

– O que quiser. – ela respondeu num tom quase inaudível novamente e abriu os olhos para encará-lo cheia de expectativas e com um desejo queimando em sua íris.

Draco poderia sorrir se não estivesse com raiva. Não achava possível que tivesse perdido o interesse por mulheres. Continuou sério a encarando e talvez isso tenha feito Tina finalmente perceber que, embora a proximidade e o toque dele desse sinal de que a queria, não havia desejo ou interesse em seu olhar, o que a fez automaticamente recuar. Suas bochechas coraram violentamente e ela engoliu novamente a saliva, como se estivesse fazendo descer pela garganta uma afiada navalha.

– Q-qual o propósito disso, senhor? – Tina perguntou pigarreando para ter sua voz de volta e tentando refazer sua postura profissional.

– Ter certeza de algo que eu já sabia. – Draco respondeu e passou por ela. – Cancele meus compromissos. – ordenou e saiu de sua sala, deixando-a se questionar o que diabos ele havia feito.

Draco podia dizer que sua paciência não estava cooperando com seu estado de irritação naquele momento. Sua tentativa com Tina fora o pior colírio que poderia ter jogado nos olhos depois de se ver romanticamente envolvido, em um jornal, com a única mulher que um dia havia desejado matar. Era como se finalmente estivesse encarando com os olhos completamente abertos e limpos quem ele costumava ser e quem ele era agora. Como tudo isso havia acontecido sem que tivesse dado importância? Claramente havia notado, de uma forma desleixada, mas havia notado. Por que não havia dado importância? Essa era a pergunta e só existia uma pessoa que poderia lhe dar uma resposta.

Não demorou a encontrá-la quando sabia bem onde todo o entretenimento ao público acontecia na Catedral. Pansy parecia estar a meio caminho de uma das saídas para um pátio externo, onde poderia barganhar por alguma atenção na mídia, e se encontrava na companhia dos filhos do terrível casal Monet: Amélie e seu irmão Lavern. Duas criaturas tão igualmente terríveis.

Aproximou-se não conseguindo evitar os contatos e comprimentos alheios. Pansy logo o viu e parou no mesmo instante com os olhos travados sobre ele. Amélia foi a segunda a vê-lo e puxou um sorriso de lado com a mesma rapidez que seu irmão que ajeitou a postura para mostrar seu refinado terno de milhões.

– Temos que conversar. – Draco foi direto ao ponto, assim que chegou até ela.

Lavern não deu nem meio segundo e tratou de se manifestar antes que Pansy tivesse tempo:

– Lembro-me bem que havia prometido me deixar desenhar seu traje para a Cerimônia de Inverno do ano passado. – ele usou de sua afeminada voz para deixar aquilo sair num arrastado sotaque francês.

– Não faço promessas a ninguém. – foi tudo que Draco se limitou a responder.

– Como vai o casamento, Draco? – Amélie foi quem não deixou que Pansy se manifestasse dessa vez, também usando de seu mais sexy sotaque francês. Sua paciência estava se esgotando. Será que não haviam notado que a conversa não era com eles? Draco sabia bem que a pergunta dela era uma tremenda de uma indireta. Eles Haviam dividido algumas salas escuras no passado e podia dizer que, embora ela não fosse o seu tipo de primeira escolha, a mulher tinha um tremendo poder de persuasão com o corpo. – Sua adorável esposa foi ao nosso ateliê faz algumas semanas com aquela amiga Astoria. Ela é uma mulher bastante interessante e educada, posso dizer. Sem dúvida bonita e bastante inocente embora saiba se impor, por assim dizer. – Amélie continuou a usar seu sotaque passando para um tom mais provocante.

Pansy a encarava fazendo sua expressão se transformar cada vez mais em desgosto ao notar o jogo de Amélie para cima dele.

– Ele veio falar comigo. – Pansy a lembrou de forma nada amigável.

– Meu casamento está perfeitamente bem, Amélie. Fico grato que tenho perguntado. – Draco acabou sendo seco, embora devesse ter soado educado. A menção a Hermione havia o afetado, principalmente quando Amélie zombou de seu espírito puro, e pensar nisso foi o suficiente para fazê-lo voltar-se rapidamente para Pansy. – Temos que conversar agora.

– Estou numa reunião de negócios agora. – Pansy desdenhou voltando-se para Draco. – Parece estar com raiva. Não me lembro de ter te atrapalhado em nada.

– Eu disse agora, Pansy. – foi toda a saliva que se permitiu gastar ali e passou por eles. Contou cinco segundos e Pansy já estava ao seu lado, acompanhando seus passos.

– Sua sala? – ela indagou.

– Não. Seu quarto. – ele não hesitou e se privou de ter que ver o sorriso dela abrir ao escutar aquilo. Não queria se deparar com Tina novamente tão cedo e precisava de um lugar onde ninguém poderia colocar os olhos sobre eles.

Obviamente que a torre do quarto de Pansy não era muito distante do único lugar em que a vida da Catedral fervia. Não passou poucos minutos e ele já estava pisando no carpete púrpura do quarto dela. Tratou de se ocupar em trancar a porta e lançar um silenciador e, no minuto que se virou, ela já estava fazendo o vestido que usava deslizar pelo seu corpo. Pansy não era o tipo de mulher que se podava a usar roupas íntimas nunca. Ela estava sempre pronta. Sempre.

– O que está fazendo? – ele uniu as sobrancelhas.

Ela sorriu.

– Nós não costumávamos perder tempo.

– Eu disse que precisávamos conversar e não que eu precisava do seu tempo.

Pansy revirou os olhos.

– Acha mesmo que eu iria perder tempo? – ela se aproximou depois de dar tempo o suficiente para que Draco apreciasse seu corpo nu de onde estava. – Você tem me evitado por tempo demais para que eu perca qualquer chance. Além do mais, nós não conversamos. Conversar para nós é apenas uma consequência, Draco, ou se esqueceu de quem éramos? – ergueu o braço para passar pelo seu pescoço, mas ele segurou seu punho antes que ela pudesse concretizar seu ato com sucesso.

– Leu o Diário do Imperador hoje?

Ela mudou seu olhar para um entediado.

– Sim. – respondeu. – E não tenho o menor interesse de discutir noticiário.

– Sabe bem o porquê estou perguntando isso.

Pansy revirou os olhos e aproximou-se, colando seu corpo nu no dele. Ele seria hipócrita se dissesse que aquilo não o havia afetado. Não o afetara como antes, era obrigado a concordar, mas também não havia deixado de ser homem e como homem ainda era um alívio saber que, de alguma forma, podia reagir à insinuação de Pansy. Hermione não havia tomado conta daquilo. Pelo menos não daquilo.

– Eu sei o que vi e não me importo. – ela usou a outra mão para começar a abrir os botões de sua camisa.

– Eu sei que você se importa sim. – ele soltou.

Ela sorriu e ficou na ponta dos pés para deixar que Draco sentisse o hálito dela.

– Certo, a verdade é que eu me importo sim. Fique satisfeito. Mas você está aqui agora e posso ter uma boa ideia do motivo. – Pansy o tocou entre as pernas ousadamente e ele decidiu que talvez não fosse uma má ideia o que quer que estivesse se passando pela cabeça dela. - Eu sei do que precisa. – ela sussurrou. – Precisa de uma mulher de verdade. Precisa do sexo que só eu e você sabemos fazer.

E talvez ela tivesse razão. Embora sua intenção de ir até a mulher fosse escutar sobre o que havia pensado da reportagem, no fundo sabia que era daquilo que realmente precisava. Precisava tocá-la, precisava tocar outra mulher e Pansy sabia fazer com que ele quisesse, mesmo que não fosse exatamente como antes, sabia que consideraria um crime negá-la quando ela estava ali, sem roupa nenhuma, o tocando e usando aquela voz.

Não foi mais do que alguns segundos de hesitação para fazer suas mãos e seu corpo trabalhar junto com ela. Embora sentir Pansy contra ele fosse familiar e não fosse nenhuma novidade, se havia alguém com quem Draco deveria dar aquele passo era ela. Não que estivesse inseguro, mas se ver bem longe da tentação de tocar outra mulher que não fosse Hermione era o suficiente para deixá-lo mais do que em estado de alerta.

O sabor dela, ele conhecia. Os sons dela, ele conhecia. O corpo dela, sim, conhecia muito. Assim como Hermione, Pansy era um campo inteiramente bem explorado, mas diferente de Hermione, em Pansy faltava algo. Enquanto suas mãos tocavam cada parte exposta da pele quente da envolvente mulher ali, enquanto seus hálitos e salivas se misturavam, enquanto a domava como sempre havia domado e batiam contra as coisas que havia no caminho para cama, Draco não se privou de se sentir acuado e uma parte de seu cérebro o alertava constantemente para esse fato. Não era nenhum desafio sentir desejo por uma mulher como Pansy e sim, ele precisava tocá-la, precisava sentir quem realmente era. Era um canalha, sempre havia sido, ser aquilo sempre havia lhe trazido algum tipo de conforto, havia o construído como homem, precisava encontrar em qual momento e porque havia imperceptivelmente deixado de ser um.

Quando ele a lançou na cama, ela já estava completamente molhada para recebê-lo, gemia loucamente pedindo por ele e Draco ainda nem havia tido o prazer de deslizar para dentro dela. Gostava de brincar com o corpo das mulheres e era exatamente isso que faria com Pansy. Aquilo o ajudou a ficar latejando para entrar nela. Ela se contorceu, puxou os lençóis, praguejou e soltou todo o tipo de palavra pesada. Ele se lembrava de gostar daquele lado dela na maioria das vezes, se lembrava de ficar excitado ao experimentar o desespero bem expressado de Pansy, mas agora aquilo o incomodou. Quando deslizou para dentro dela, o desejo lhe ardia pelo corpo inteiro e acabou por tapar a boca dela para que pudesse apreciar completamente a sensação daquele maravilhoso prazer físico. O ato obviamente fez Pansy ir à loucura, o que começou a deixá-lo irritado.

Draco foi bruto. Ela gostou. Ela gostaria de qualquer coisa, de qualquer forma. O ápice de seu exagero verbal chegou quando Pansy começou a beirar seu orgasmo. Por algum motivo ele queria acabar logo com aquilo e isso também o ajudava a ficar mais irritado. Estava fazendo sexo e, por mais que o desejo o consumisse naquele momento, ainda não era o suficiente para deixá-lo completamente alheio ao simples pensamento de que não estava apreciando aquele ato como costumava e como deveria. Aquela pequena parte de seu cérebro continuava o alertando que deveria se acuar.

Ela veio com um grito de que estava tendo o melhor sexo de sua vida. Draco viu espaço para finalmente poder acabar com aquilo. Não demorou a terminar seu serviço, sentindo-se aliviado por descarregar toda a energia que havia levantado naqueles minutos e ainda mais aliviado por ter chegado ao fim. Encarou Pansy abrir um sorriso tão satisfeito que parecia estar caminhando por algum tipo de paraíso naquele momento. Foi naquele instante que algo lhe pesou. Pesou em seus ombros, em sua cabeça e em seu corpo topo. Draco havia a usado para sexo. Havia a usado para sexo como usara toda e qualquer mulher antes de Hermione e nada havia ficado mais claro do que aquilo naquele momento. Era diferente com Hermione porque com ela não era só sexo. Ele não a usava para o prazer físico apenas já fazia um bom tempo, ele a usava para ter também todos os outros prazeres adicionais que vinham com isso, a sensação de satisfação, de liberdade, de leveza, de conforto e familiaridade de se sentir vazio e completo ao mesmo tempo, de calor e bem estar. Não era apenas sexo, era bem mais do que isso, o que estendia todas aquelas sensações para não só quando estavam na cama, mas para quando conversavam o que quer que fosse, para quando permaneciam no mesmo ambiente mesmo que fosse em silêncio, para quando agiam juntos como cúmplices, para quando dormiam lado a lado, para quando até mesmo discutiam bravamente suas opiniões distintas ou colocavam expostas à mesa suas rivalidades.

Draco saiu de dentro de Pansy e jogou-se de costas na cama encarando o teto de madeira escura. Nunca em sua vida havia tido a sensação de traição. Nem mesmo quando trocou para o lado de sua mãe, no relacionamento entre seu pai e ela, sentiu-se mal ou chegou a se desculpar com Narcisa pelas mentiras que sentira prazer em contá-la quando criança e adolescente. Mas enquanto estava ali, bem consciente da companhia de Pansy e do que haviam feito, sentia-se um traidor. Um traidor por ter agido contra o que tinha com Hermione, sendo o que tinha com ela o que quer que fosse. Ele se sentia um completo violador do laço que havia criado com sua esposa.

– Eu duvido que sua adorável mulher faça isso tão bem quanto eu. - Pansy gemeu em um riso de satisfação ao seu lado. – Ela parece ser muito rígida para te satisfazer na cam...

– Cale-se Pansy. - foi tudo que ele se limitou a dizer ao interrompê-la severamente.

Hermione podia não ser como Pansy na arte da sedução. Pansy não media esforços e tinha muita consciência do que fazia e como fazia para chamar atenção ou acender qualquer olhar que estivesse sobre ela. Hermione era sutil e nas mínimas coisas ela superava qualquer decote ou rebolado da mulher ali com ele naquele momento. Pansy não tinha ideia do que era ver Hermione coberta apenas com uma camisa aberta dele, segurando em uma mão um pedaço de pergaminho e na outra uma taça de vinho ao andar descalça e distraidamente sob a luz de uma lareira. Pansy nunca havia tido a chance de ver a postura da mulher dele quando lia em voz alta andando de um lado para o outro, completamente distraída de sua própria sensualidade. Pansy não tinha a menor noção de como um único sorriso de Hermione era capaz de fazê-lo desejá-la mais do que já havia desejado qualquer outra mulher. Hermione era totalmente alheia ao fato de que tinha o poder de seduzir qualquer homem sem a menor intenção. Draco não entendia, mas havia algo no modo como Hermione se livrava dos sapatos, colocava o cabelo para cima e alongava o pescoço de um lado e do outro massageando um dos ombros assim que chegava em casa que ele simplesmente não conseguia resistir. Pansy jamais entenderia aquilo.

– Você parece irritado. Sei que não está satisfeito com o que viu no jornal. - Ela rolou ficando de bruços e balançou os pés no ar, ainda com seu sorriso no rosto.

Draco virou o rosto para encará-la.

– E está zombando disso com esse sorriso patético no rosto. – ele sabia que Hermione jamais zombaria de qualquer coisa que ele estivesse sentindo, por mais ridículo que fosse, e estar acostumado a isso o fez abominar Pansy naquele momento, principalmente quando ela riu com vontade do que escutou. Talvez ter convivido com ela por tanto tempo o ajudara a se esconder ainda mais atrás de sua máscara fria e sua grossa camada de insensibilidade, como se não se importasse com nada além de seus próprios ganhos e todo o resto não passasse de uma grande roda de palhaços.

– Estou zombando do que eu normalmente zombaria, Draco. Você parece sensível com o fato de estarem comentando sobre um envolvimento romântico relacionado ao seu nome. Claro que sabia que estavam tirando fotos suas com ela, como sempre sabe quando a imprensa invade sua propriedade. Obviamente é patético, você queria que uma reportagem como essa viesse à tona para que pudessem ir contra aqueles que negam a “história” de vocês dois. – Pansy riu. - Eu realmente esperei que viesse até mim para se desintoxicar um pouco da sua árdua tarefa de cooperar com o mestre em sua péssima farsa com aquela mulher.

Draco a observou intrigado por alguns segundos e não deixou de observar que, em qualquer outro momento do passado, ele teria soltado uma risada daquilo que havia escutado da boca dela mesmo que agora para ele isso o irritasse. Pansy estava falando de Hermione da mesma maneira que sempre falava, com desprezo, e ele se lembrava de não se importar com aquilo, nem minimamente sequer. Agora apenas queria apertar a garganta dela até que sua boca ficasse roxa. Além do mais, era isso que Pansy pensava sobre o que havia estampado no jornal? Que ele sabia que estavam tirando fotos dele e de Hermione? Que era essa sua intenção?

– Eu não sabia. – ele disse.

– Não sabia sobre o que? – ela pareceu confusa, mas ainda com aquele sorriso nos lábios.

– Sobre estarem tirando fotos minha e de Hermione quando estávamos em casa.

Pansy levou alguns segundos para processar aquilo, mas no momento em que cada palavra dele fez sentido para ela, o sorriso que havia em seus lábios murchou.

– O que quer dizer?

– Exatamente o que escutou. Eu não sabia que haviam invadido minha propriedade e não sabia sobre estarem tirando fotos minha com dela.

– Mas você sempre...

– Eu não sabia, Pansy! Lide com isso!

Ela ficou estática por mais alguns segundos, como se estivesse tentando acreditar. Como que num clique, deu as costas, se levantou, passou o robe de seda pelos braços e o amarrou na cintura enquanto procurava em suas gavetas pelo que logo apareceu. Era o Diário do Imperador daquele dia. Ela o abriu sobre a cama exatamente na página em que havia as imagens com Draco e Hermione e as observou atentamente. Ele se sentou.

– Você não agiria assim com ela. – Pansy disse quase que tentando convencer a si mesma. – Você a odeia, não a odeia? - Draco abriria a boca para dizer com prazer e muita vontade que “sim”, mas não tinha tanta certeza dessa declaração. Seu silêncio fez com que Pansy movesse seus olhos para ele. – A odeia, não é? – insistiu ela. – Por que está a tratando dessa forma? – tornou a olhar confusa para as imagens. – Está a tratando como se... – a mulher pareceu repudiada com o pensamento que se passou em sua cabeça. O encarou novamente. – Gosta dela?

– Não. – Draco apressou-se a dizer e se arrependeu no mesmo segundo. Não é que gostasse dela, mas também não era como se ainda a odiasse. O que diabos sentia por Hermione?

– Então por que está a tratando... assim?– Pansy encarou as imagens com desgosto.

– Eu não... – ele soltou o ar frustrado por ter que dizer aquilo. -... sei. Eu não sei.

Pansy ficou inconformada de ouvir aquilo.

– Você gosta dela... – soltou baixo para si mesma, dando as costas e passando as mãos pelos cabelos curtos agora. Puxou o ar uma ou duas vezes até virar-se para Draco, furiosa. - HERMIONE É UMA MALDITA SANGUE-RUIM! ACASO SE LEMBRA DISSO?

Ela ter gritado o fez sentir mais raiva. Detestava o descontrole de Pansy, principalmente quando era completamente desnecessário, fora de hora e ridículo.

– Ninguém aqui está gritando Pansy! – foi ríspido.

– Você não trata mulheres assim, Draco! Nunca tratou! – jogou o jornal em cima dele.

– Ela e eu estávamos conversando! – ele empurrou o jornal e se levantou.

– Não na última foto! – Pansy não parecia nem tentar diminuir seu estado alterado. – Vocês estão claramente se beijando!

– Hermione e eu... – Draco tentou pensar em qualquer coisa que justificasse, enquanto colocava sua calça. -... fazemos sexo com bastante frequência e você sabe disso.

– Há quantos anos nos conhecemos, Draco?! – a mulher estava indignada. – Há quantos anos você e eu fazemos sexo? – ela puxou o ar e no mesmo segundo, repentinamente e inesperadamente, seus olhos inundaram. Draco não soube como reagir no momento em que Pansy não conteve aquela fraqueza. Pansy não era assim. Ele parou. – Há quantos anos eu te faço companhia na cama, Draco? – a voz dela tremeu. – Há quantos anos nós usamos um ao outro para se satisfazer? – ela parecia lutar contra as lágrimas. – Você nunca me beijou assim. – Draco encarou a imagem no jornal onde sua sombra se juntava com a de Hermione calmamente. Ele tendo tempo para apreciar a sensação de passar os braços em torno da cintura dela. Os flashes daquela lembrança o atingiram novamente e ele pôde apreciar mais uma vez o sorriso lindo que sua esposa tinha nos lábios, o brilho de seus olhos, o rosado das maças de seu rosto. O perfume que ele se dera tempo de inalar antes de fechar seus lábios calmamente sobre os dela, muito consciente de que tinha um sorriso no rosto. Hermione o fazia bem. Draco sabia disso. – Esse beijo não tem nada a ver com sexo, Draco. Você não beija mulheres assim.

Ele sabia que não beijava mulheres daquela forma. Qualquer tipo de beijo que dava em uma mulher era para incitar desejo. Sentou-se na cama calmamente e puxou o jornal para poder observar mais uma vez aquela imagem. Aquele não havia sido o único beijo que dera em Hermione em que não tivera a finalidade de despertar nenhum desejo. Lembrava-se bem agora de todas as vezes que caíam exaustos um sobre o outro na cama, sorriam rapidamente satisfeitos pelo desejo consumido e Draco se deixava vencer pela tentação de se inclinar e colar seus lábios nos dela uma última vez, antes de se moverem cada um para o seu lado. Se lembrava bem de quando estavam entrelaçados debaixo do chuveiro e ele encarava fundo seus olhos antes de beijá-la uma última vez para, então, seguir seu dia. Conseguia se lembrar de como se sentia grato ultimamente pelas vezes em que era necessário colar seus lábios nos dela em público afim de que pudessem disfarçar seu relacionamento para o resto do mundo.

– Gosto de beijá-la. Me sinto tentando a fazer isso com frequência. Me sinto tentado a tocá-la, a ouvi-la e a tê-la por perto. Ela me faz bem. – ele soltou aquilo baixo quando sabia que deveria guardar para si. Hermione gostava quando ele jogava para fora e ele estava começando a perceber o quanto isso ajudava em sua saúde mental. Ela sempre o escutava com atenção e nem todas às vezes opinava ou o julgava, mas estava sempre disposta a escutá-lo, dos seus pensamentos mais idiotas aos que mais o consumia.

Pansy forçou um riso para mostrar sua incredulidade ao escutar aquilo.

– Ela te enfeitiçou! Te envenenou!

– Hermione não é a pessoa que você pensa que ela é, Pansy.

– Ela é uma Sangue-Ruim! Uma rebelde! Ela não pertence ao nosso mundo!

– E talvez seja por isso que ela é tão diferente!

– Diferente? – a mulher exclamou, como se quisesse lhe passar um sermão. Como se quisesse lhe abrir os olhos. – O que há de especial nela?

– Ela é autêntica, Pansy! – Draco soltou o jornal e ergueu os olhos para ela novamente. – Hermione é verdadeira! Ela não finge ser alguém que não é. A imagem que ela vende para os jornais é puramente dela. As coisas que ela pensa, as coisas que ela acredita, aquilo que ela defende. Não há máscaras, ela evita as máscaras! Eu não sou o centro dos interesses dela, ela não me trata bem quando não quer e se precisar soltar qualquer verdade na minha cara, tenha certeza, ela não irá pensar duas vezes. Eu aprendi a respeitá-la! Não porque ela exigiu respeito, mas porque demonstrou que o merecia! – ele soltou o ar. - Não é a beleza dela, não é o modo como se veste ou como se comporta na frente das câmeras, é quem ela é! A pessoa que Hermione é!

Pansy o encarou, incrédula, e em silêncio por alguns segundos.

– Quem é você? – ela soltou quase sem voz. – No que tem se transformado? O Draco que eu conheço nunca deu valor a isso! Será que você ao menos poderia escutar as coisas que está dizendo?

– Não tem o direito de falar isso, Pansy! O Draco que conhece é aquele que te procurou todos esses anos apenas para sexo e distração. Você não sabe sobre aquilo que dou ou não valor!

– Não elabore esse discurso para mim! Você nunca se importou realmente com o que uma mulher tinha além de físico!

– Porque nenhuma mulher nunca me provou que eu deveria me importar com algo a mais! Minha mãe até tentou me mostrar que eu deveria, Pansy! Sabe disso! Astoria é um grande exemplo de que eu tentei dar valor ao que parecia ter valor. A verdade é que nenhuma mulher, até a chegada de Hermione, provou que tinha algo e realmente merecia atenção, algo que me interessasse, que me prendesse o pensamento, que me intrigasse, que me gerasse curiosidade. – Draco soltou o ar e desviou os olhos. - Hermione... – ela era diferente. – Ela é... diferente. – Não havia outra palavra. Ao mesmo tempo em que ela às vezes parecia um grande livro aberto, ela podia ser misteriosa ao ponto dele querer abrir mão de sua herança para saber um único pensamento seu. – Sabia que ela sabe cozinhar? – encarou Pansy novamente e a viu fazer uma enorme careta de nojo.

– Como um elfo doméstico?

– Não, não. Ela gosta e aprecia cozinhar. Ela é boa, na verdade. Muito boa. E não usa magia. – ele poderia sorrir ao se lembrar de como sua mulher parecia se sentir bem quando se dava a chance de cozinhar um bom prato. – Sabia que Hermione gosta de ler de madrugada quando acorda sem sono? Que ela prefere caminhar descalça sempre que tem a chance? Que ela adora olhar o fogo queimar em uma lareira por horas? Que ela é fascinada pelo sol? Que ela sabe praticar magia sem varinha? Sabia que ela, mesmo depois de todo o tempo que passou aqui, ainda procura insistir no discurso que todo o mundo tem boas intenções até que se prove o contrário?

– Ingênua.

– Na verdade, nem tanto. Não é tão fácil derrubar Hermione. Ela pode dar o benefício da dúvida a muita gente que não deveria, mas se realmente observar, esse estranho método faz com que ela ganhe respeito com muita facilidade, até mesmo daqueles que você sabe que são os piores. – ele apenas deitou novamente e puxou as almofadas da cama para apoiarem sua cabeça. – Às vezes até mesmo o som leve da respiração dela durante o sono parece gerar curiosidade e cansei de me pegar a observando por longos minutos, me perguntando o que ela deveria estar pensando. – Draco se permitiu esquecer que Pansy estava ali. - Às vezes me sinto tentado a saber quais são todos os medos dela, todas as ansiedades, todas as expectativas. Às vezes queria ter o poder de barganhar pelos pensamentos dela. Às vezes sinto que tenho a necessidade de viver o mundo dela, enxergar através dos olhos dela e sentir as coisas que ela sente para saber se existe algum tipo de esperança fora desse círculo de pedras onde vivi a vida inteira.

Ele achou que iriam imergir em algum tipo de silêncio como costumava ser com Hermione, mas não demorou muito para que a voz de Pansy soasse, o fazendo lembrar de que ela não era Hermione e de que ela não seria nem um pouco compreensiva.

– Você não tem ideia do quanto está soando patético.

Hermione nunca teria dito aquilo de algum pensamento que ele tivesse colocado para fora.

– Esse sou eu, Pansy. Você quem nunca teve o interesse de saber o que eu era além do sexo e da minha opinião geral sobre o resto do mundo.

– Porque eu sei que não gosta de mostrar muito de você a ninguém!

– Não! É porque você nunca teve o interesse de realmente saber o que eu sou. O que eu mostro ser é o suficiente para você e tudo com o que realmente se importa é você. Quer que eu a ame, que eu te coloque no centro do meu mundo, assim como você me coloca no centro do seu. Quer que eu a queira, que você esteja acima de todas as outras para mim. Tudo com o que se importa, Pansy, é unicamente você. O seu mundo. A sua imagem. O seu poder e a sua influência.

Ela ficou em silêncio. Draco também se calou. Mas ambos continuaram se encarando. Poucas vezes na vida ele havia visto aquela mulher ressentida. Ela nunca derrubava sua máscara. Sempre estava orgulhosamente com o nariz levantado como se nada pudesse atingi-la, como se fosse de ferro e como se todo o resto do mundo fosse inferior e devesse se render a ela no exato momento em que aparecesse em cena. Draco não gostava desse lado dela e sempre que Pansy deixava mostrar seu frágil recheio, ele ficava muitas vezes em dúvida sobre como lidar com aquilo.

Pansy cruzou os braços trocando o peso de perna e tentou manter sua expressão ríspida, embora já não conseguisse manter longe o brilho exagerado nos olhos e o nó apertado que engolia a cada quinze segundos.

– Diz isso como se me desprezasse. Como se eu não tivesse nem um pingo de valor. – Dizer aquilo parecia machucá-la ainda mais, o que a fez precisar de um segundo para puxar fundo o ar e tentar com mais vontade se manter de pé sobre seu orgulho. – Sempre soube o que eu sou, Draco. Posso ser egoísta, mas você também é.

– Eu nunca disse, nem demonstrei ter orgulho de ser egoísta.

– Não faz diferença. – ela soltou. Draco não gostou, mas não se pronunciou. Talvez para Hermione fizesse. – Não faz diferença porque nós somos iguais e eu estive com você desde o começo. Sempre estive do seu lado, crescemos juntos, nos divertimos, seguimos nossas vidas, mas sempre terminávamos em algum momento aqui. Eu, você e a cama. Não vou aceitar que depois de tudo que nós passamos você resolva se apaixonar por alguém que não o merece. Alguém que sempre odiou e desprezou.

– Primeiro, eu não resolvi nada, Pansy. Tenho minhas dúvidas quanto a gostar ou não de Hermione e você quer rotular isso como paixão? Segundo, o que eu e você passamos de tão extraordinário todos esses anos? Nós convivemos bem todo esse tempo porque tínhamos sexo. O que eu e você passamos quando tudo o que realmente fazíamos de relevante era somente e apenas sexo? Passei, em um ano com Hermione, mais do que eu e você passamos desde que nos conhecemos!

– Diz isso apenas porque perderam um filho. – Pansy fez uma expressão de descaso ao dizer aquilo e, no mesmo segundo, Draco soube que ela havia cometido o pior erro de sua vida.

Ele se levantou sentindo o sangue fervendo em suas veias.

– Não abra a boca para falar sobre isso, Pansy. – Vociferou com o rosto a centímetros do dela. – Não ouse abrir a boca, sequer, para mencionar ou eu mesmo terei o prazer de cortar sua garganta.

Ela forçou um riso fraco e de desgosto.

– Por que veio aqui, Draco? Por que veio atrás de mim, se de repente me tornei tão desprezível e incapaz de compreender seu estado sensível e patético?

Ele deveria ter aquela resposta na ponta da língua. Na verdade a tinha sim, mas não sabia se poderia externá-la. Estava ali porque alguma parte de si não permitia que Hermione fosse a única. Ela não podia ser a única. Não ela.

Deu as costas, soltando o ar e sentindo a raiva ainda incrustada em suas veias. Pegou seu cinto e começou a passá-lo pelo cós de sua calça. Precisava ir embora dali.

– Vir até aqui não foi uma boa ideia. – foi tudo que ele concluiu. Atou o cinto e puxou sua camisa.

– Draco! Acorda! Nós fizemos sexo! Quando sexo se tornou uma má ideia para você?

– Eu não sei, Pansy! – ele exclamou voltando-se para ela, já se sentindo bem farto de tanta troca de palavras e da insistência dela. – Procurei você pelo mesmo motivo que sempre a procurei. Sexo. Você o teve e assim será sempre que eu quiser.

– Isso soa bem mais com o Draco que eu conheço!

– Que bom. Era isso que te incomodava, não era? – ele disse enquanto ocupava-se com os botões de sua camisa.

– Não. Me incomoda saber que existe uma mulher te domando, te moldando, te envenenando e você nem mesmo consegue perceber isso. Permitiu que Hermione conseguisse te deixar nesse estado, sem nem mesmo notar! Me surpreende que você, de todas as mulheres que tem, foi cair nos encantos de uma que não o merece, que não chega nem aos seus pés, que nem mesmo o sangue que tem é puro. – Pansy disse, enquanto o observava se alinhar em suas roupas novamente. Draco tinha que confessar que era extremamente incômodo ouvir todas aquelas coisas de Hermione, mas apenas o fato de se incomodar com isso, quando antes costumava rir e concordar, o fazia dar ouvidos à mulher ali. – Não sei como conseguiu enxergá-la como um tipo de anjo, Draco. Ela é venenosa e altamente de baixo nível. Ela me ameaçou na Cerimônia de Inverno.

Ele poderia ter facilmente soltado uma risada daquilo, se não estivesse tentando manter sob controle seu estado de desgosto.

– Hermione não faria isso. – disse quase que imediatamente.

Pansy riu.

– Viu?! Ela te dominou, Draco! Está duvidando de uma acusação minha apenas porque é contra ela!

Ele parou e encarou Pansy já totalmente pronto e impecável novamente.

– Estou duvidando porque sei que ela não faria, Pansy, não porque é uma acusação contra ela.

– Como pode ter tanta certeza?

– Por que Hermione não é uma de nós. Ela não é do tipo que faz ameaças de graça.

– Mas ela se acha uma Malfoy agora.

– Ela é uma Malfoy, Pansy.

Aquilo a calou. Draco sabia o quanto aquilo a machucava. Pansy teria dado a vida para ser uma Malfoy. A conclusão que ele via no olhar ferido dela era apenas a pura e dolorosa verdade do mundo de Pansy. Hermione agora era parte de sua família e parte de seu futuro, independente do que acontecer. Pansy não. Ela era apenas uma mulher do lado de fora daquele círculo.

– Ela é sua família agora e vai defendê-la. Entendi. Ela deixou de ser Hermione Granger há muito tempo para você. – Pansy usou uma voz baixa. – Eu pensei que fosse ao menos ser sua amante como sempre fui todos esses anos, mas depois de todo esse tempo em que você foi só um nome e uma imagem que me olhava como se nunca tivesse me levado para cama antes, perdi as esperanças de que pudesse tê-lo como sempre o tive. Ela o roubou de tudo, inclusive de mim.

– Por que dá tanto poder a ela? – Draco se aproximou. – Por que a acusa como se ela tivesse o poder de me controlar, me dominar, me usar de fantoche? Entenda algo, Pansy, Hermione não tem poder sobre mim. Ela pode tentar o quanto quiser, mas eu quem tenho domínio sobre mim. Ela não me roubou de absolutamente nada e ela não me roubaria porque eu sei que ela não quer. Se eu não te procurei todo esse tempo é porque não quis. – soltou um riso de desgosto. – Depois de todos esses anos e tudo que conhece sobre mim, não dá nem para encher metade de uma xícara de chá. – maneou a cabeça decepcionado. – Eu vou ter você quando eu quiser. Vou ter Hermione quando eu quiser. Vou ter a mulher que eu quiser, quando eu bem quiser. Foi sempre assim, sempre será assim e não tente me convencer de que ela está me domando. Ela não tem esse poder.

– Eu não estou tentando te convencer de nada, estou apenas te mostrando! Será que o Diário do Imperador de hoje não foi o suficiente para jogar na sua cara? – Pansy se aproximou mais. - Por que veio até aqui? Eu sei que me procurou porque não consegue suportar a ideia de que ela está tomando conta da sua cabeça. – Tocou seu braço. – Eu estive sempre do seu lado, Draco. E talvez realmente não o conheça porque você se tornou tão intocável e inalcançável, depois do retorno do mestre, depois que sua família se desfez, depois de todo o seu treino intensivo quando entrou para as zonas do quartel... mas eu não o conheço verdadeiramente porque sei que não quer que ninguém nunca o conheça. Eu sei disso e é o suficiente para mim, porque você sempre quis que fosse o suficiente e eu não iria ousar tocar em algo que você não quer que seja tocado! Não consigo compreender o porquê parece decepcionado com isso, mas eu só quero que entenda que quando ela diz que não o quer, ela mente. É parte do jogo dela.

– Ela não tem um jogo, Pansy! Ela não joga! Ela não conhecesse esse mundo.

– Todo mundo sempre tem um jogo aqui, Draco. Você, de todas as pessoas nesse lugar, sabe que todo mundo tem um jogo. Sempre há um jogo.

– Não Hermione. – ele sabia qual era o único jogo dela ali.

– Tem certeza?

Não. Seu ser racional sabia que nunca se podia ter certeza de ninguém.

– Pare, Pansy! Você já mostrou o suficiente e já me cansou o suficiente. – afastou a mão dela, saiu de sua vista e deixou seu quarto.

Pensou que quando saísse dali iria se sentir melhor, iria se sentir exatamente como costumava se sentir antes, como se tivesse conseguido barganhar um bom pedaço de entretenimento para o seu dia. Mas não se sentia e em sua cabeça um milhão de pensamentos fervilhava. Ainda estava à beira daquele enorme precipício que só agora ele havia conseguido enxergar. E de todas as pessoas, se surpreendia consigo mesmo por considerar que Hermione não tivesse um jogo, porque se havia algo que ser um Malfoy o ensinara, era que todo mundo sempre tinha um.

**

Já era noite quando conseguiu passar novamente pela imprensa empilhada no portão de sua propriedade. Era absolutamente irritante tê-los ali e ainda mais irritante que entraria em sua casa e saberia que estava entulhada de funcionários do St. Mungus. Era quase a mesma sensação de quando havia se casado. Chegar em casa sabendo que havia alguém ali com o direito de ficar, mesmo que ele desejasse que fosse embora.

Havia tentado ocupar seu dia nas salas de simulação, assim que deixara o quarto de Pansy. Não foi bem como o esperado. Mesmo tendo cancelado todos os seus encontros e discussões do dia, ter ido se distrair com o trabalho de suas zonas o mostrou o quanto aquele dia havia se tornado um pesadelo. Seus homens não estavam acreditando na causa que ele estava apresentado. Draco sabia que era loucura tomar um edifício no meio de uma zona inimiga e fazer dele um acampamento, mas ele precisava daquela opção e tentou vendê-la mais uma vez aos seus homens. Ele costumava ser bom com as palavras, mas sua cabeça estava em outro lugar e embora ele tentasse estabilizar seus pensamentos, como sempre conseguira para poder fazer seu trabalho como deveria, não obteve tanto sucesso.

No momento em que pisou dentro de casa, tinha uma certeza bem clara em sua cabeça: Hermione não tinha o poder de controlá-lo. Depois de deixar seu cérebro processar o suficiente do que vinha vivendo, as palavras de Pansy, o que vira no jornal e como sua perspectiva sobre muitas coisas vinham se distorcendo, culpar Hermione fora a maneira mais objetiva de lidar com a situação, embora soubesse bem que não fosse a mais racional.

Livrou-se de seu casaco no vestíbulo e avançou passando pelo hall até a sala principal. As luzes estavam todas acessas como Hermione sempre ordenava que estivessem. Parou em seu caminho para a escada escutando o som de uma conversa, enquanto abria os botões em seu pulso e dobrava as mangas de sua blusa. Virou-se para encontrar uma das salas privadas daquele andar com as portas abertas, o que o fez poder visualizar os dois medibruxos que cuidavam do caso de Hermione conversando com a própria. Ela estava de costas, usava seu longo robe de seda verde escuro que chegava a arrastar no chão, seus cabelos estavam soltos revelando a cascata de cachos, ela assentia em concordância com o que os medibruxos falavam e não havia mais nenhuma agulha ligada a ela.

– Mestre Malfoy. – era Tryn à sua frente e a voz da elfa chamou atenção de Hermione. Ela virou-se para olhá-lo quase que imediatamente e o sorriso que abriu ao vê-lo foi apenas lindo. – Tryn precisa de ordens para saber se deve ou não preparar a mesa de jantar.

Draco ignorou a elfa, não entendendo o sorriso de Hermione, embora estivesse bastante fascinado por ele. Ela não estava fingindo porque os medibruxos estavam ali. Aquele sorriso era verdadeiro porque faziam as maças de seu rosto apertar seus olhos dourados e brilhantes. Não era só sua boca que era linda, seu sorriso também era, seus dentes, seus olhos, cada parte dela era simplesmente magnífica. Ele achava tão injusto que ela fosse tão perfeita.

Hermione pediu licença educadamente aos medibruxos e avançou indo até ele. Draco tentou focar que não deveria ser dominado ou tentado por ela, mas não foi muito simples. Quando ela o alcançou, ele já sentia seus lábios pressionando suas bochechas num sorriso simples, discreto e sincero. Ele detestava como ela o contagiava, como aquele sorriso o contagiava.

– Como está se sentindo? – ele automaticamente perguntou.

– Melhor. – Hermione usou sua voz madura e suave para responder. - Desculpe, não tive tempo de falar com Tryn sobre o jantar. Não vou poder jantar, mas não acho que você tenha alguma pretensão em pular a refeição.

– Por que não vai comer? – ele perguntou curioso.

– Concordei em fazer um intensivo essa noite com os curandeiros. O tratamento vai ser um pouco pesado, vou ter que dormir em um quarto separado, mas vai me colocar em perfeito estado amanhã mesmo.

Draco ergueu uma sobrancelha, não muito certo se a escolha dela fora a melhor, mas deixou passar ao se pegar preocupando com Hermione novamente. Voltou-se para a elfa.

– Arrume a mesa só para mim. – informou à criatura que logo foi embora com sua ordem.

Encarou Hermione e ela ainda estava ali, as maças rosadas do rosto apertando seus olhos vivos como ele nunca vira antes. Draco queria perguntar o que estava a fazendo tão feliz. Se lembrava bem de ter deixado aquele casa pela manhã com a lembrança de um olhar furioso dela, mas a realidade de estar encarando aquele sorriso sentindo-se forçado a abrir um, também era quase demais depois do dia que havia tido e dos pensamentos que atormentavam sua cabeça. Fez menção de dar as costas e seguir seu caminho, mas Hermione o parou colocando a mão calmamente sobre seu braço, enquanto dizia seu nome para ter sua atenção. Ele parou e tornou a encará-la.

As maças do rosto dela rosaram ainda mais, ela desviou o olhar e seu sorriso abriu mais quando disse num tom baixo e bonito:

– Vou completar doze semanas. - Foi o suficiente para fazer com que todo e qualquer pensamento que o atormentava fosse varrido de sua cabeça tão rápido quanto o fogo se apaga quando perde oxigênio. – Eu também... – Hermione fechou os olhos, como se estivesse lembrando-se de algo capaz de arrebatar até mesmo seu fôlego. – Escutei o coraçãozinho deles.

– Eles estão bem? – foi a primeira pergunta que veio em sua cabeça. – Digo, saudáveis.

Ela assentiu e o encarou novamente. Seus olhos brilhavam excessivamente, se aproximou mais.

– Preciso acreditar que são meninos. – ela quase sussurrou com aquele lindo sorriso.

Draco sorriu. Foi tão fácil. Sua vida inteira ele sempre achava sorrir tão difícil e desnecessário. Aproximou-se ainda mais, estendeu a mão e tocou seu rosto não resistindo à sensação de senti-la, sentir o calor dela, mesmo que fosse só com aquele simples toque.

– Como você consegue ser sempre a melhor parte do meu dia? – queria que tivesse sido um pensamento apenas para ele, mas escutou sua voz baixa externar todas aquelas palavras.

Hermione puxou oxigênio, suavizou seu sorriso, fechou os olhos, soltou o ar calmamente e inclinou o rosto sobre a mão dele, como se quisesse sentir mais de onde aquele toque vinha.

– Eu queria que estivesse aqui. – ela abriu os olhos para encará-lo outra vez. – Queria que também tivesse escutado. Eles são saudáveis. Os curandeiros disseram que os dois estão saudáveis e estão se desenvolvendo bem, embora um esteja recebendo mais nutrientes do que o outro. – Hermione soltou o ar fechando os olhos rapidamente outra vez. – Foi um alívio tão grande.

– Vou estar aqui da próxima vez. – Draco disse e ela sorriu assentindo.

Eles usavam um tom baixo, como se estivessem sussurrando um com o outro. Era bom, era o tom que usavam quando estavam na cama, no escuro, prontos para dormir ou quando apenas não conseguiam dormir. Era íntimo, era só deles e ninguém iria escutá-los, por mais que sua casa estivesse abarrotada de gente.

– Obrigada. – ela sussurrou. – Eu sei que fez algo para que deixassem que eu tivesse informações, para que eu pudesse escutar, ver, saber o que estão fazendo comigo.

Draco assentiu. Sentiu uma enorme urgência em beijá-la. Queria sentir os lábios dela contra os dele, era quase uma fome pela vontade de sentir a boca dela, queria selar aquele momento que era só deles, só ela e só ele, trocando palavras que não seriam escutadas por mais ninguém, palavras que pareciam tão insignificantes, mas tão sagradas.

Às vezes ele se sentia tão parte dela que era assustador. Tinha que haver uma explicação, tinha que haver um porque para momentos como aquele. Distanciou-se quando aquilo se tornou intimidador o suficiente, o que fizeram todas as informações das últimas horas caírem sobre ele novamente. Como Hermione conseguira fazer com que ele se livrasse delas por alguns minutos com tanta facilidade? Informou que precisava tomar seu banho e ela apenas assentiu, liberando mais um de seus sorrisos dóceis, soltou seu braço e moveu-se de volta para os medibruxos que a esperavam.

Draco subiu até seu quarto sentindo os músculos tensos. Tomou seu banho ainda com os músculos tensos. Desceu e comeu seu jantar sozinho com os músculos tensos e, durante todo o tempo que passou em seu escritório, mesmo acompanhado de seu copo de whisky, seus músculos continuaram tensos.

Seus pensamentos giravam entre as palavras de Pansy e o quanto era mais difícil do que ele esperava resistir à Hermione. Ele queria culpá-la, era fácil, era prático, era o esperado e parecia a solução. Culpá-la a faria ser detestável, mas ela não era. Draco não conseguia detestá-la, não mais. Sabia quem ela era agora, a mulher que era, poderosa e frágil, sexy e doce, clássica e revolucionária. Theodoro estava certo quando dissera que Hermione parecia mil mulheres em uma. Pansy também estava certa porque sua mulher o dominava, e ele a queria, todo o tempo. Até mesmo naquele exato momento ele a queria. Queria que ela estivesse ali sentada em alguma das poltronas com um livro na mão e uma taça de vinho na outra, vestida em seu robe de banho com os cabelos presos no topo da cabeça, o rosto corado sem a maquiagem que era obrigada a usar sempre. Queria apenas a companhia dela.

Precisava trabalhar, principalmente depois de ter cancelado sua agenda do dia, mas não era capaz de se concentrar. Isso o irritava. Draco tinha que voltar a ser com Hermione o que sempre havia sido. Indiferente. Como faria isso com ela em sua casa, carregando o título de sua esposa, gerando seus filhos, seus herdeiros? Como ele poderia regredir ao estado de indiferença depois do ano que haviam passado juntos, depois de conhecê-la, conhecer seu coração, sua genialidade, suas peculiaridades? Hermione estava começando a fazer parte dele, assim como sabia que também estava começando a fazer parte dela.

Levantou-se frustrado deixando de lado a carta que fazia à Seção Financeira da Catedral. Poderia pedir para que Tina fizesse aquilo. Deu-se conta do quão tarde era, apenas quando regressou ao seu quarto e visualizou o relógio em cima da lareira. Era estranho não ter Hermione ali. Enfiou-se em sua calça de algodão tentando fazer com que a rotina do seu pré-cama fizesse algum efeito sob os músculos ainda tensos de seu corpo.

Quando já não havia mais luz, sentia o conforto de sua cama, suas cobertas pesadas, seu travesseiro de penas e era obrigado a escutar o irritante barulho distante da eventual movimentação que ocorria nos corredores do outro lado da porta de seu quarto, se pegou encarando o teto. Seus músculos ainda estavam tensos e Draco sentia o sono muito longe de alcançá-lo. Tentou fechar os olhos uma ou duas vezes, mas sua cabeça não o libertava dos pensamentos que o mantinham acordado.

Sua cama era fria sem o calor do corpo de Hermione ao seu lado. Havia se acostumado a dormir com ela. Não era como se estivesse em algum acampamento ou em algum outro Forte a milhares de quilômetros de casa. Era completamente estranho deitar em sua própria cama, em sua casa e não ter o corpo de Hermione ao seu lado. Ela era parte de sua cama, parte de sua casa e chegava a ser incômodo não tê-la ali.

Sentia que precisava dela. Não somente porque parecia faltar algo quando ela não estava ali, mas porque ela sempre tinha uma estratégia para inconscientemente fazê-lo acabar dormindo quando ele tinha uma mente turbulenta. Hermione sempre sentia quando pensamentos demais zuniam em sua cabeça. Bastava somente ficarem no completo escuro debaixo da coberta e minutos depois ela sempre perguntava em uma voz sonolenta o porquê ele ainda estava acordado. Draco dizia que estava pensando e ela sempre retrucava dizendo que era normal que os pensamentos que guardava tanto para si se revoltassem contra ele e não o deixasse dormir, por ficarem sempre tão trancados em seu cérebro. Ele achava graça que Hermione nunca insistisse para que contasse nada a ela, mas encontrasse sempre uma forma ridícula de criticá-lo por não fazê-lo, assim que enxergava uma oportunidade.

Acabava sempre abrindo a boca para colocar para fora suas dúvidas, seus ressentimentos e suas opiniões eventualmente. Na maioria das vezes era algo relacionado à guerra, ou a Catedral, ou ao seu exército, ou a grande conspiração na qual ele havia a metido. No silêncio e no escuro, Draco despejava para ela uma montanha de informações tão cansativas que sempre apostava que Hermione acabaria caindo no próprio sono antes mesmo que ele chegasse a metade. Mas ela nunca dormia. Colocava-se em cena perguntando seus “por quês” ou expondo uma opinião sempre quando julgava necessário. Draco gostava de quando se permitia que passassem por esses debates noturnos. Costumava lhe trazer o sono que ele esperava que não chegaria. Também admirava Hermione por ser capaz de abrir a boca com facilidade para dizer algo que normalmente ele levaria dias para considerar em colocar para fora.

No momento em que ele se viu ali no silêncio, no escuro, com os minutos passando lentamente e percebeu que seu sono não chegaria nunca, sentou-se colocando as pernas para fora da cama e passou as mãos pelo cabelo. Lembrou-se que a última vez a qual suas preocupações não haviam o deixado dormir fora logo quando havia se casado com Hermione, quando os Dementadores haviam desaparecido e ele precisou barganhar com Harry Potter o retorno deles. O medo e a incerteza de que Potter não fosse a solução para aquele problema o manteve acordado assim, com o peso de ter que carregar um colapso de Brampton Fort nas costas caso os Dementadores não regressassem.

Levantou-se e com os pés descalços, vestido somente em sua calça de algodão, abriu a porta da varanda passando para o lado de fora, esperando que o frio acalmasse um pouco de sua mente atormentada. Não estava frio o suficiente ao olhar para a infernal imprensa amontoada em seu portão. Aquilo revirava ainda mais suas entranhas. Voltou para o lado de dentro soltando o ar já completamente impaciente. Draco precisava dela. Precisava de Hermione. Queria que ela estivesse ali, deitada na cama deles, onde ele poderia colocar para fora pelo menos um de seus pensamentos. Eles discutiriam até que finalmente se sentisse cansado e acabasse dormindo com o som baixo e melodioso da voz dela sussurrando ao seu lado.

Saiu do quarto e no momento em que se deparou com uma curandeira cruzando silenciosamente o corredor, se lembrou de que havia mais pessoas ali além dele e de Hermione. Isso o irritava e ignorou a presença da mulher, passando por ela como se não tivesse a visto, nem visto que ela ficara vermelha dos pés a cabeça.

Não sabia quais dos quartos Hermione estava, mas se fora ela quem havia escolhido onde passaria a noite, Draco tinha em mente um que ficava no corredor oposto ao quarto deles. Ele cruzou o caminho passando pelo mezanino com vista para uma das salas do andar de baixo que ligava a área externa dos jardins, e então, encontrou o lugar com a porta aberta. Passou à lareira, que estava acesa exatamente como ela gostava. Havia uma curandeira drenando seu sangue para fora do corpo e no exato momento em que os olhos dourados dela voltaram-se para ele, Draco notou o quanto estavam opacos e pesados. Pensou que talvez não tivesse sido uma boa ideia ir até ali, mas assim que concluiu esse pensamento, Hermione abriu um sorriso fraco, porém bonito e receptivo.

– Pensei que estivesse dormindo. – ela disse com a voz rouca. A curandeira finalmente notou a presença dele e recuou corando violentamente, enquanto informava que aquele já era o último tubo de sangue.

– Pensei que você estivesse dormindo. – ele retrucou.

Hermione abriu um pouco mais o sorriso.

– Eu não posso dormir. Na verdade, não conseguiria nem se tentasse. – disse e mostrou a mão com uma agulha que estava ligada novamente a uma bolsa com um líquido cintilante.

Ele apenas se aproximou e observou a curandeira tirar o último tubo. No momento em que o serviço dela acabou ali, a mulher moveu-se para mexer em uma válvula próximo a bolsa ligada à Hermione e então se apressou para sair do quarto, fechando a porta.

– Ela vai voltar? – Draco acabou perguntando.

Hermione franziu o cenho, curiosa pela pergunta, mas respondeu:

– Dentro de uma ou duas horas. Talvez.

Ele colocou as mãos nos bolsos e observou a mão que recebia a agulha.

– Isso a machuca? – ele perguntou.

Hermione deu de ombros.

– Um pouco. – respondeu. – Os efeitos que causam no meu corpo incomodam mais do que a agulha.

Draco pôde notar que o rosa nas bochechas dela começava a reaparecer. Talvez fosse o líquido na bolsa que estivesse fazendo o efeito de reanimá-la. Seus olhos gradualmente ganhavam brilho novamente.

– Que tipo de tratamento é esse?

Ela encarou a bolsa com o líquido logo acima dela e acomodou-se mais confortavelmente em seu divã.

– Um dos bebês está recebendo mais nutrientes do que o outro. Eles querem consertar isso. Também temem que o que aconteceu comigo possa afetá-los daqui para frente, portanto precisavam me deixar no melhor estado em que um ser humano saudável deve estar. Seria melhor que fizessem isso de forma gradativa, mas eu não tenho todo o tempo do mundo para ficar em casa com esse monte de estranhos. Receber doses altas de nutrientes de uma vez só me colocaria em um estado que eu poderia ser capaz de conduzir por mim mesma nos próximos dias até tudo voltar ao normal, mas precisa de um intenso monitoramento. Não é a melhor escolha porque é cansativo e um pouco doloroso, mas prefiro que as coisas voltem ao normal logo.

Draco tirou as mãos do bolso e sentou-se no divã próximo às pernas dela. Apoiou os cotovelos em cada joelho e encarou o desenho do tapete que estavam sobre.

– As coisas nunca mais vão voltar ao normal. – acabou comentando.

Hermione ficou em silêncio por um tempo o observando. Estendeu uma mão, não muito tempo depois, e tocou uma de suas pernas com cuidado.

– Você parece mentalmente exausto. – ela usou sua voz baixa para comentar. Ele tinha que confessar que se surpreendia todas as vezes que sua esposa notava seu estado de espírito com uma facilidade que nem mesmo sua mãe tinha. Com uma dificuldade ainda aparente, Hermione se sentou, continuou o encarando e passou a mão por suas costas uma única vez, como se tentasse de alguma forma lhe passar um conforto rápido, mas muito consciente de que aquilo era invasivo e não fazia parte de quem eles eram. Draco gostava da sensação da mão dela em contato direto com sua pele, mesmo que fosse rápido. Às vezes quando faziam sexo as mãos dela o tocavam e percorram seu corpo, braços, troncos e rosto como se ela estivesse lendo palavras gravadas em sua pele. Eles se tocavam muito mais agora e não era mais tão intimidador como antes. – Às vezes eu acho que todos os pensamentos que guarda para você um dia irão te matar.

Draco sorriu, já sabendo que ela soltaria algo parecido com aquilo. Também se surpreendia com o quanto Hermione o fazia sorrir em momentos que nem mesmo se sentia descontraído.

– Estamos trabalhando para tomar um edifício em York para montar acampamento semana que vem. – ele começou ainda encarando os desenhos no tapete. - Apresentei ao Conselho a ideia que havia dito sobre consolidar um acampamento na zona da Ordem e ir expandindo até que tirássemos a área deles. O Conselho achou loucura, desperdício de forças, tempo e dinheiro, mas eu insisti. Agora são as zonas que não estão convencidas da tentativa.

– Convença-as, então. – ela disse confiante.

– Estou tentando. – aquilo foi o suficiente para que ela entendesse que ele não estava tento muito sucesso.

Hermione ficou em silêncio apenas alguns minutos, como se estivesse processando toda aquela situação e fazendo seu cérebro trabalhar com a eficiência de sempre.

– Já considerou que alguém do Conselho esteja interferindo na opinião do seu exército?

– Eles sempre tentaram interferir na opinião do exército, mas nunca tiveram tanto sucesso. As zonas reconhecem o trabalho que eu faço e o quanto luto contra o Conselho para tomar minhas decisões.

– E você acredita que dessa vez o Conselho esteja ganhando seus homens?

– Talvez. – Draco ainda acreditava que a nova estratégia apenas soava diferente demais para ser aceita com a rapidez que ele precisava.

– Isso é ótimo. – ela o pegou de surpresa ao dizer aquilo. Ele ergueu os olhos para ver um sorriso brando em seus lábios. Ficou confuso. – Não consegue ver a chance à sua frente?

Não. Pensou imediatamente.

– O que quer dizer?

– Você sempre quis derrubar o Conselho, Draco. Ele te segura, te atrasa e é sempre um elemento que você tem que saber manipular para vencer seus jogos. – Hermione disse e aquelas palavras acionaram um ‘clique’ em seu cérebro suficiente para conseguir fazê-lo enxergar finalmente o que estava na sua frente. Ele piscou e cerrou os olhos ao analisar tudo aquilo com muita rapidez. – O que Voldemort disse sobre o novo plano?

– Ele disse que ficará do meu lado caso tudo acorra como o esperado.

Ela abriu o sorriso um pouco mais. O Conselho fora criado logo que Draco assumira a guerra e o cargo de General. Algumas cabeças duvidosas e maliciosas não confiavam muito que um simples garoto tivesse a mente brilhante de vencer toda uma resistência e ganhar um império para Voldemort, o que causou conflito o suficiente dentro do círculo interno para fazer com que o Lorde criasse um Conselho que supostamente deveria guiá-lo, para conter os ânimos daqueles que queriam voar em seu pescoço por alcançar a cadeira ao lado do trono do grande Lorde das trevas.

– Eu estive presente em todas as reuniões do Conselho em que você insistiu que o método convencional que haviam usado para vencer a guerra não funcionaria agora que a Ordem não parecia tão frágil quanto aparentava. As duas tentativas foram falhas e agora o Conselho também está contra você porque está tentando um método diferente. Draco, se você tiver sucesso, pode usar isso contra o Conselho e também poderia facilmente fazer a opinião de suas zonas para que se revoltassem contra ele. – Hermione tinha muita razão. – Voldemort não pensaria duas vezes em desfazer o Conselho, se você provar a ele quem realmente está o impedindo de consolidar seu império. Você ganharia um ponto com o mestre e ainda se viria livre do Conselho, o que te faria, de uma vez por todas, comandante direto do exército. Ninguém mais iria te segurar ou limitar seu poder.

Draco cerrou os olhos não acreditando que não havia enxergado aquilo antes. Encarou as próprias mãos e acabou por sorrir e tornar a encarar Hermione.

– Eu te treinei bem. – disse com seu sorriso.

Ela riu um riso fraco, mas significativo.

– A verdade é que me surpreende que não tenha visto isso antes. – ela disse – Sei que existe algo a mais o incomodando porque normalmente teria visto essa chance antes mesmo que ela existisse.

Ele tornou a encarar o tapete. Sim, existiam milhões de outras coisas que o incomodava. O fato de estar ali com ela, tendo a certeza de que nem se estivessem fazendo sexo estaria se sentindo tão bem, era uma delas.

– Você me deu um bom susto aquela noite. – optou por dizer.

Hermione sorriu gostando de ouvi-lo dizer aquilo.

– Estou bem agora. – sua voz foi doce, mas foi informação o suficiente para fazer com que ele entendesse que Hermione sabia que não era aquilo que realmente o incomodava.

– E o fato de serem duas crianças...

Ela riu baixo.

– Também estou processando essa parte. – sussurrou.

Sorriu com ela, mas não conseguiu mantê-lo quando percebeu que suas mãos suavam. Precisava dizer a ela. Precisava que ela soubesse. Isso o consumia. Por que precisava que ela soubesse? Uniu suas mãos sentindo que precisava se livrar do suor e respirou fundo. Hermione acompanhava aquilo com os olhos, em silêncio e obviamente na expectativa de entender qual era o problema.

– Draco? – ela usou um tom baixo e incerto para chamar sua atenção.

Ele puxou o ar mais uma vez e usou seu tom mais neutro para dizer:

– Fiz sexo com Pansy hoje.

O silêncio o seguiu. Hermione não seu moveu, nem mesmo desviou o olhar dele. Segundos depois ela apenas afastou a mão que estava em sua perna. Draco esperou pelo momento em que ela fosse perguntar o motivo dele estar dizendo aquilo, embora soubesse que Hermione seria muito mais inteligente do que aquela pergunta previsível, primeiro porque ela não iria demonstrar ciúmes ou nada relacionado, segundo porque ela já sabia que ele estava se permitindo externar aquilo que o incomodava. Ela apenas engoliu a saliva como se estivesse engolindo uma navalha e fez sua voz sair rouca e confusa:

– Por que isso está o perturbando?

Ele deu de ombros, mostrou as mãos e negou com a cabeça.

– Não sei. – o silêncio o seguiu novamente e Draco massageou sua mão tentando se distrair do quanto ele o incomodava. O que será que estava se passando pela cabeça dela naquele exato momento, depois de ter escutado o que ele havia dito sobre Pansy? Será que sua mulher estava tendo a sensação que ele tinha? A sensação de que havia quebrado um laço importante? De que havia feito algo estúpido? De que depois disso não havia como voltar atrás, não havia mais como consertar o que ele havia secretamente destruído entre eles? – Eu não toco em nenhuma outra mulher que não seja você faz um bom tempo, Hermione.

Ela uniu as sobrancelhas um tanto surpresa.

– Não?

Draco a encarou.

– Como eu poderia? Eu tenho você. Surpreendentemente me tem sido o suficiente e também... somos casados e... - sua voz morreu não sabendo exatamente como terminar seu pensamento.

– Somos casados e você não quer se sentir como seu pai. – Hermione fez o favor de concluir. Ele se viu obrigado a desviar seu olhar do dela, tornando a encarar suas mãos. Ainda não entendia como o cérebro dela trabalhava tão perfeitamente, como ela conseguia captar tudo tão rápido, como conseguia compreendê-lo, entende-lo, enxergar sempre à frente. – Draco, eu não sou sua mãe e você não é seu pai.

– Mas estamos na mesma situação que eles aqui, nesse casamento.

– Não, não estamos. Você não é o centro do meu universo. Eu não vivo por você.

– Minha mãe não vive pelo meu pai.

– Mas ela o ama e eu não amo você, Draco. – a voz de Hermione saiu confiante pela primeira vez. Aquilo fez com que ele se lembrasse daquela manhã quando ela se vira obrigada a dizer que o amava para que uma simples curandeira ouvisse. Draco a encarou se lembrando de como Hermione se enfurecera com aquilo. Ela levava aquilo a sério. Ele apenas achava que ele próprio não. Apenas achava. – Essa é a diferença. – a voz dela normalizou-se, mas Draco conseguia enxergar o ressentimento no fundo de seu olhar. Por mais que ela estivesse começando a ficar boa em esconder suas emoções como uma Malfoy deveria, o olhar de sua esposa era sempre um livro aberto, ou talvez ele apenas tivesse aprendido a lê-la o suficientemente bem. Estendeu sua mão para tocá-la, mas Hermione se afastou. Havia sim, um tipo de ressentimento naqueles olhos dourados. Como se estivesse decepcionada, mas não com ele, com ela mesma. – Nós dois sabemos que esse casamento é apenas um documento com nossas assinaturas e nada mais do que isso. Desde o começo sabíamos que não precisávamos ser fiéis um ao outro. Eu não espero que seja fiel. Nunca esperei. Não é necessário que se perturbe por ser apenas quem é só porque está ligado a mim agora. Pensei que havíamos deixado isso claro entre nós desde o começo. – surpreendentemente a voz dela fora fria e seca, embora ainda tivesse um tom calmo.

Hermione terminou seu discurso com os olhos fixos sobre ele, como se esperasse pelo momento em que Draco fosse discordar de algo ali. Ele não discordava, eles haviam deixado aquilo bem claro desde o começo, mas o começo era diferente. E a forma como se tratavam agora? E a filha que haviam perdido? E a forma como faziam sexo, como se tocavam, como se olhavam? Ele se importava com ela agora, não se importava com ela antes. Será que Hermione não se importava com ele agora? Será que ela continuava a não se importar com ele como antes?

– Hermione, nós vamos ter dois filhos. Dois filhos com os quais nós dois iremos nos importar. Eu cresci achando que tinha uma família perfeita, que meu pai era algum tipo de herói inteligente e esperto demais para esse mundo e que minha mãe era sortuda por tê-lo como família, por me ter, por ter todo o luxo que temos e ser parte de um sobrenome que já tem um legado na história do mundo. Você não tem ideia do quanto foi perturbador ver toda essa fantasia que eles criaram desmoronar.

– Nós não vamos mentir para os nossos filhos, Draco. Eles vão crescer entendendo nosso relacionamento. – a voz dela ainda estava fria, como se estivesse jogando palavras que era obrigada a dizer.

– Nenhuma criança quer viver em um lar com uma mãe e um pai que se suportam pelo bem de um documento e uma linhagem, Hermione.

Ela se calou o encarando dessa vez, como se estivesse entendendo o que se passava na cabeça dele, como se estivesse enxergando que aquele era um problema que Draco carregava consigo desde a infância, como se estivesse entendendo finalmente em qual terreno eles estavam pisando.

Draco não havia sido enganado pelos pais a vida inteira. Qualquer pessoa, sendo ela criança ou não, com discernimento e razão o suficiente para diferenciar frio e calor, saberia que seu pai e sua mãe viviam atrás de uma fachada. Draco apenas se recusara a enxergar, olhar a ferida e lidar com ela por muito tempo. Esperou até que alguém fizesse isso por ele. Esperou até Voldemort.

– Você nunca falou sobre isso antes. – ela foi cuidadosa.

– Porque não gosto de falar sobre isso.

– Não. – Hermione foi clara. – Não fala porque te machuca.

Draco soltou o ar e se levantou achando aquilo demais.

– Não seja ridícula.

– Você sabe que eu estou certa.

Foi até a janela e a escancarou, precisando do vento gelado contra seu rosto ao invés do irritante calor da lareira que Hermione tanto gostava. Ele não gostava de pisar naquele terreno. Não gostava daquele assunto. Não se sentia confortável nem consigo mesmo quando pensava sobre ele.

– Eu não quero parecer como o meu pai para os meus filhos. – disse depois de sentir vento o suficiente contra o seu rosto capaz de congelar pelo menos um pouco de seus pensamentos.

– Então não pareça.

– Não é tão simples assim.

– Por quê?

Draco soltou o ar já farto daquilo.

– Esse assunto vai acabar aqui, Hermione.

– Nós estamos falando dos nossos filhos. Do nosso futuro. Não pode acabar aqui. – ela estava surpreendentemente fria e não havia nada do acolhedor ao qual ele era acostumado.

Vai acabar aqui. – ele voltou-se para ela, mostrando que não tinha o menor interesse de continuar com aquilo. Ela recuou, talvez tivesse percebido que ele havia falado demais sobre coisas que normalmente nunca sequer haviam saído de sua boca alguma vez na vida. Cruzou os braços encarando a figura que Hermione era ali sentada naquele divã. Absolutamente linda mesmo em seu estado mais pobre. Ela era invasiva e esperta. Sabia como fazê-lo abrir a boca da maneira mais sorrateira possível. Talvez Pansy estivesse certa sobre o jogo dela. Cruzou os braços. – Ameaçou Pansy na Cerimônia de Inverno?

Hermione uniu as sobrancelhas estranhando a pergunta.

– Por que eu ameaçaria Pan... – deixou sua voz morrer. Um segundo ela permaneceu em silêncio, e então, sua expressão mudou como se estivesse lembrando-se de algo importante. – Oh. – ela desviou o olhar por mais um segundo e depois tornou a encará-lo. – Sim, eu a ameacei. – falou como se não conseguisse acreditar no que estava admitindo.

– O que disse a ela?

Hermione franziu o cenho.

– Eu não me lembro exatamente, Draco.

– Então tente se lembrar agora. – ele foi frio também.

Ela se aborreceu com o tom.

– Eu não me lembro! – foi decidida. - Eu estava com raiva, ela me segurou pelo braço como se tivesse me pegado no flagra durante um assalto. Como se eu estivesse roubando algo dela porque havia me visto com você. Eu queria apenas que ela me deixasse em paz.

– Não faça novamente. – Draco foi claro.

– Eu fiz o que um Malfoy faria. O que você me ensinou, o que sua mãe me ensinou!

– Não faça com Pansy.

Hermione uniu as sobrancelhas, realmente aborrecida dessa vez. Inclinou a cabeça e o tom que usou mostrou sua indignação:

– Acaso isso machucou sua princesinha, Draco? – finalmente Hermione parecia estar usando o tom que queria. - Ela se sentiu ferida e foi chorar no seu colo, é isso? Chorou o suficiente para que voltasse para casa, olhasse para sua patética esposa e ordenasse, como se eu fosse um de seus homens, que não ousasse mais mexer com ela.

– Não se faça de vítima aqui, Hermione! Estou apenas dizendo para não fazer novamente. Pansy é meu problema, não seu!

– Ela é meu problema sim, Draco! – Hermione se levantou, ele lutou contra a urgência de ir até ela ajudá-la. – Aquela mulher me persegue e me culpa por algo que eu nem mesmo me importo! Ela acha que eu jogo o mesmo jogo que ela, que a minha vida se baseia em te ganhar. Eu não preciso que você me ame ou me queira. – ela se aproximou. - Eu a quero fora do meu caminho sim, onde eu não vou precisar gastar minha paciência com ela! Parkinson me odeia porque consegui tudo que ela queria sem fazer esforço algum e não se engane pensando que ela queria você. Pansy não o queria e continua não o querendo. O que ela realmente sempre quis foi o título do seu sobrenome e o homem que você é na cama, porque se ela realmente o quisesse, quisesse você, Draco Malfoy, a pessoa que você é, ela se importaria em realmente te conhecer e pelo pouco que ela se gaba em te conhecer, me faz pensar que talvez eu, em um ano, tenha aprendido mais sobre você do que ela aprendeu em todos os anos que vocês dois estiveram juntos. – Hermione puxou o ar, cansada. – E, por favor, não crie o hábito de me contar das mulheres com quem tem sexo. Já me fiz clara uma vez quanto a não ter o menor interesse de saber onde e quando as mãos que você usa para me tocar resolvem também tocar outras mulheres. Não gosto de me sentir um objeto mesmo sabendo que sou um, mesmo sabendo que tipo de relação nós dois temos.

Ela finalizou como se tivesse vomitado tudo que tentara engolir, mas que não lhe caíra bem. Até mesmo sua respiração estava acelerada.

– Você não é um objeto. – a verdade é que Draco sentia que Hermione havia sido a única mulher que não fora um objeto, porque todo o resto fora, até mesmo Astoria havia sido um quando ele a usara para tentar ser algo que não era. Hermione nunca havia sido algo de interesse dele para ser usado e, no momento em que ela começara a fazer parte de sua vida, ele se vira completamente desarmado com o quanto ela o envolvera numa atmosfera completamente diferente da qual era acostumado, sem que nem mesmo pudesse ter notado essa mudança claramente. Como Hermione havia feito isso? Como ela havia conseguido administrar as circunstâncias, manipulá-lo, fazer com que tudo parecesse ter tanto significado? Draco não gostava de como sua esposa havia conseguido se enraizar, de como ela havia conseguido entrar tanto e tão profundo onde ele jamais imaginara que alguém pudesse alcançar. Aproximou-se dela unindo as sobrancelhas ao perceber o quanto era difícil não querer tocá-la. Como Hermione havia conseguido fazer com que ele chegasse a esse ponto? O que ela havia feito para que ele não a resistisse? Olhou bem em seus olhos. – Qual é o seu jogo, Hermione?

Ela pareceu confusa, como se aquela pergunta fosse completamente inesperada. Aquilo deveria fazer parte do jogo dela.

– Eu não tenho um jogo, Draco. – sua voz soou incerta, não sabendo realmente se era aquilo que deveria responder, se era aquilo que ele estava mesmo perguntando. Deveria ser mesmo parte de seu jogo.

– Todo mundo tem um jogo.

– Que jogo? Para que finalidade? Com que propósito? Do que você está falando? Eu não tenho um jogo, Draco. – ela gesticulou rapidamente com as mãos, como se quisesse apagar o que quer que estivesse tentando colocar no lugar em sua cabeça. – Quer saber?! Esqueça! – ela foi severa dessa vez. – Apenas saia. Volte apenas quando resolver agir normalmente.

Hermione deu as costas, dando por encerrado aquela conversa e Draco a segurou pelo pulso impedindo que ela fosse muito longe. Obrigou-a se virar para encará-lo. Ele se aproximou bem para fitar fundo em seus olhos, conseguia ler os olhos dela. Hermione resistiu usando seu melhor olhar frio para a condição em que se encontrava.

– Eu vou descobrir qual o seu jogo, Hermione.

Ela se livrou da mão dele em seu pulso.

– Você é doente. – ela ainda parecia incerta por mais que sua voz fosse forte.

– Talvez... – foi tudo que Draco retrucou, antes de serem interrompidos por uma curandeira.

Ela entrou pedindo mil desculpas e falando da forma mais formal e educada possível o quanto sentia muito por precisar tirar mais um tubo de sangue de Hermione, esta, que por sua vez apenas concordou como se já esperasse por aquilo.

– Acaso o senhor pretende ficar? – a curandeira voltou-se para Draco.

– Não, ele já está de saída. – Hermione fez o favor de apressar-se para responder. Olhou para ele sorrindo amavelmente, embora Draco soubesse que fosse falso. Os olhos dela não brilhavam e as maças de seu rosto não apertavam o canto de seus olhos quando ela falsificava um daqueles. – Draco teve um dia cheio hoje e terá outro cheio amanha, ele precisa descansar. Só quis realmente saber como eu estava lidando com tudo isso, não é mesmo querido?

– Sim. - Ele foi obrigado a concordar, usando o vocabulário menos extenso e mais apropriado para o momento. A curandeira sorriu, como se achasse aquilo um exemplo para uma geração. Draco aproximou-se de Hermione, segurou seu queixo e selou seus lábios rapidamente nos dela. – Tenha uma boa noite, querida. – Sabia ser um bom ator. Atuava diariamente dentro de Brampton Fort. Havia se especializado naquilo.

– Boa noite. – ela respondeu. Havia um sorriso doce em seus lábios, mas faísca em seus olhos.

Seguiu seu caminho de volta para o quarto julgando-se estúpido por ter saído de lá, em primeiro lugar. Sua própria respiração denunciava o quanto se achava o pior dos estúpidos. A verdade era que se sentia encurralado e não sabia como havia chegado até aquele beco. Ele a queria. Queria voltar para Hermione naquele exato momento e dizer o quanto ela fazia sua cabeça ir à loucura e o quanto não conseguia suportar a vontade de senti-la a todo o momento, que fosse apenas o calor de seu corpo ou um simples toque displicente em seu braço ou o cheiro doce e cítrico que vinha de sua pele ou até mesmo a agonia de seus corpos buscando por alívio debaixo das faíscas selvagens de centenas de arfadas entre beijos, toques e sabores que o fazia sentir-se inteiramente dela.

Mas Draco não faria isso, primeiro porque sabia que não seria verdadeiro. Ele não era movido por emoções, nunca havia sido. Emoções eram meras projeções de sentimentos que iam e vinham num piscar de olhos. Emoções eram um campo de incertezas e ele não apostava em nada incerto. Segundo porque Hermione não era exclusiva. Não poderia ser. Não ela.

Trancou-se em seu quarto, como se quisesse que nem mesmo o oxigênio pudesse passar para o lado de dentro. Pegou uma garrafa de qualquer bebida forte ao seu alcance e jogou-se no sofá diante da lareira apagada. Ele não dormiria. Queria tanto que as coisas voltassem a ser como sempre haviam sido. Pois bem então, ali Draco ficaria na companhia de sua garrafa sendo perturbado por todos os pensamentos em sua cabeça até que o dia amanhecesse e ele fosse segui-lo como deveria. Exatamente como sempre havia sido, sem Hermione, sem a paz que a voz dela tinha, sem a chance de ver o sono lhe alcançar. Ele realmente esperava que ela tivesse um jogo. Ela tinha que ter um. Ela precisava ter um. Não era lógico que não tivesse.


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Notas finais do capítulo

Vixeeee... eu sabia que aquele mar de rosas do Draco não ia durar muito tempo. Eu sabia que tava ficando muito perceptível ele e a Hermione. Eu sei que muitos de vocês devem esta querendo enfiar um faca nele agora, mas entendam que o Draco nunca sentiu isso na vida dele. Nada mais justo do que ele recuar, afinal, além de ser um campo completamente novo e inexplorado, Draco Malfoy é um sonserino. Ta no sangue dele ser cuidadoso, se previnir e blablabla. Vamos entrar um pouco no mundo dele e tentar entender o que ele está passando no momento. Ele acabou de descobrir que vai ser pai, não de um, mas de dois filhos/as, está enfrentando problemas na Catedral, a guerra, Hermione nesse estado, a mídia amontoada na porta de sua casa... Por mais estável que a mente racional de Draco tenha conseguido ficar todos esses anos, não acho que ele iria agir perfeitamente bem ao abrir os olhos para os sentimentos que ele tem desenvolvido pela Hermione. Principalmente quando esses sentimentos são completamente desconhecidos e tenham o "atacado" tão sorrateiramente. Ele precisa culpar a Hermione, ele precisa acreditar que isso de alguma forma foi um trabalho dela, porque por mais que os sentimentos sejam por ela, ela foi para ele uma figura detestável por muito mais tempo do que as novas formas que ele tem começado a enxergá-la. Não fica crível que esse ódio simplesmente evapore e desapareça só porque alguns sentimentos com relação a ela começaram a surgir, por mais fortes e intensos que eles sejam. Mas faz parte do processo, entendam. Hermione também precisa se decepcionar, não com ele, mas com ela mesmo, por chegar a acreditar e deixar se envolver com o Draco que ele vinha sendo nos últimos meses. Isso tudo faz parte da construção sincera em que a relação deles deve chegar. Eles são dois cabeça-dura. Personagens com muita força de espírito. Sem contar que o Draco é um grande mistério. Cheio de mimimi, de segredinho aqui e ali, de ninguém pode saber da minha vida pra lá e pra cá, de eu tenho probleminhas. hahahaha
Sejam compreensivos! hahaha
Pessoal, muito obrigada pelos comentários, pelo apoio, por estarem favoritando e acompanhando a fic!
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