Sick escrita por Mia Elle


Capítulo 1
Capítulo Um




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O apartamento, apesar de sempre estar fechado, estava limpo e arejado. Isso graças ao ar condicionado e a mania de limpeza de seu ocupante, que dormia profundamente agora. Mas acordaria em alguns minutos. Enquanto isso podemos dar mais uma olhada no cenário.

Em geral era branco ou em cores claras. Isso por que ele achava que seria mais fácil ver a sujeira assim. As janelas eram todas fechadas, mas as cortinas todas abertas, e na maior janela, a da sala, você podia ver uma grande luneta montada. Não apontando para o céu, mas para a rua abaixo. Isso por que ele passava muito tempo sozinho e gostava de observar as pessoas.

Mas agora voltemos a ele, por que o telefone vai tocar e ele vai acordar. Agora.

- Mas que droga – disse com os olhos meio fechados meio abertos, esticou o braço e apertou o botão do viva-voz.

- Bom dia, Sr. Way – uma voz feminina disse animadamente do outro lado da linha. Ele não respondeu, mas acho que devia ser normal, por que ela prosseguiu ainda animada – Precisamos que você assine alguns documentos, será que podiamos mandar o menino...

- Ok, mande o menino. Mas me de meia-hora – desligou antes que ela pudesse falar outra coisa. Espreguiçou-se.

O pai de Gerard tinha uma empresa. Ele a herdou junto com o irmão, quando o pai faleceu. Mas por problemas de saúde ele nunca ia lá, quem cuidava de tudo era Mikey. Ele apenas assinava alguns papéis. Papéis que chegavam toda santa manhã.

Mal terminara de tomar seu café, o interfone tocou. Gerard não entendia por que toda santa manhã tinha que dizer ao porteiro que o estagiário da empresa podia subir com os papéis, mas tinha. Dois minutos depois, a capainha tocou.

O menino já sabia que não poderia entrar. Já sabia que o irmão Way mais velho era meio louco. Esperou ouvir a confirmação e passou a papelada pela portinhola ali instalada.

Gerard pegou os papéis, foi até a mesa e assinou ao lado de todas as marquinhas feitas a caneta por seu irmão. Confiava em Mikey, não precisaria ler.

Quando o menino ouviu os passos de Gerard de volta a porta, se preparou para pegar os papéis. Foi embora.

Pronto. Esse era todo o trabalho de Gerard Way. Assinar papéis de manhã. Sua parte do lucro da empresa seria depositada em sua conta no fim do mês. E não era pouco.

Mikey sempre dizia ao irmão que ele deveria se mudar para uma casa maior, com mais conforto. Mas Gerard gostava de seu pequeno apartamento. Ali, Margarida, sua vizinha de porta, já estava acostumada a verificar o seu correio e colocá-lo pela portinhola, o menino do supermercado do bairro já estava acostumado a trazer os mantimentos toda semana para ele, e nem reclamava de tirar os sapatos e lavar as mãos com álcool. Ali ele tinha uma empregada que não se importava com as manias de seu patrão e não cozinhava nada que lhe fizesse mal, apesar de isso acontecer apenas pelo salário gordo que ela recebia no fim do mês. Ali ele tinha conforto. Não precisava de mais.

Não se importava com o falatório da vizinhança sobre ele ser o ‘cara louco do quinto andar’ e não se importava em ser um cara de vinte e sete anos sem vida social, ou vida, por assim dizer.

Gerard Way era doente, ou assim achava apesar de nenhum médico confirmar isso. Nós podemos dizer que ele sofria de hipocondria e transtorno obsessivo compulsivo.

Gerard não podia ouvir falar de uma nova doença que já achava que a tinha. E isso a muito passara dos limites. Gerard não saía mais de casa, e submetia aqueles que entravam em sua casa a um verdadeiro ritual de limpeza, além de usar máscaras quando tinha alguém por perto. Para ele, as bactérias eram um grande problema.

Mas, fora esse pequeno problema, Gerard era um homem muito amável. Todos que o conheciam admitiam isso. Mikey, Margarida, o menino do supermercado, a empregada e o porteiro. Não eram muitas pessoas, mas o que você esperava de alguém que não saí de casa?

Gerard também não tinha uma namorada. Por vezes ele tentara, mas não fora bem sucedido. A verdade é que ele não gostava. Ele podia olhar uma mulher e dizer ‘que menina bonita’, e o mesmo com um homem. Mas nada mais que isso. Não tinha vontade de estar perto, de fazer coisas... Nada.

Depois que o pai dele morreu, e sua mãe entrou em depressão profunda e tirou sua própria vida, Gerard comprou aquele pequeno apartamento, e não saiu mais. Já fazia 5 anos.

Nesses 5 anos, ele arranjou formas de passar o tempo. Gostava de fazer palavras cruzadas, comprar livros pela internet e devorá-los em um único dia, desenhar nas paredes com giz para quadro negro e principalmente observar a rua com a luneta. Aquela que apontava para baixo, para a rua.

Gerard passava horas olhando as pessoas que passavam. Aquela não era uma rua movimentada. Tinha algumas casas do outro lado da rua, um alfaiate que atendia em um pequeno prédio comercial ao lado do que Gerard morava e um escritório de advocacia em cima. Um pequeno café em frente, freqüentado por jovens, em sua maioria.

Era dos jovens que Gerard gostava mais. Jovens saudáveis, que tinham uma vida toda pela frente. Sorrindo e se divertindo tanto... Jovens que tinham uma juventude como a dele, antes de descobrir todas aquelas doenças. Mas eles não tinham aquelas doenças, eles tinham futuro. E era disso que ele gostava, de olhar aquelas crianças, por que eram crianças, e imaginar o futuro que elas tinham. Sorria imaginando. Fazia-lhe bem. Se ele não tinha por que sonhar, então sonhava pelos outros.

Um dos jovens que Gerard mais observava era o garoto que morava em frente. Ele era muito bonito, e tinha muitos amigos. Esse deve ter uma vida muito boa pela frente, pensava e se divertia imaginando o futuro do menino.

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