República Evans escrita por Carol Lair


Capítulo 23
A Despedida e o Flagra




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Capítulo 23 – A Despedida e o Flagra

Houve uma chuva de granizo muito forte durante o resto do final de semana. No domingo pela tarde, após uma intensa saraivada de pequenas pedras de gelo, Lily espiou pela janela e pensou que houvesse nevado. Mas até o início da noite, o gelo que cobrira o chão da tranquila rua de casas germinadas, na qual a república se localizava, derretera-se por completo.

Mas Lily não fora dar uma olhada na janela por conta do barulho da chuva. Ela tinha a intenção de investigar se James estava voltando para casa. Mas James não retornara no domingo – tendo, provavelmente, passado o dia com Sarah. E ela só tornou a vê-lo de relance, na manhã de segunda-feira, no corredor da faculdade.

Quando o sinal finalmente soou pelo campus de Hogwarts anunciando o término das aulas naquele mesmo dia, Lily simplesmente desejou poder sair correndo, antes que os alunos das outras turmas de Direito abarrotassem o corredor. Mas, ao esticar o pescoço para ver pela porta entreaberta, ela percebeu que era tarde demais. O corredor já estava quase interditado.

— Hoje à noite eu não perco o treino por nada. E sabe por quê, Pamela? Porque hoje o James vai fazer os testes para encontrar o novo zagueiro! – a voz estridente de Violet chamou a atenção de Lily. – Na minha opinião, aquele tal de Benjy...

Sem nenhuma vontade de permanecer ali e ouvir a tagarelice de Violet, Lily decidiu sair e encarar o corredor cheio. Mas antes de mover qualquer músculo em direção à saída, ela resolveu encarar apenas seus próprios pés. Não queria que seu olhar se encontrasse com o de Potter novamente. Não queria receber dele aquele olhar ferido que recebera na festa, na república Whisky de Fogo. E ela tampouco queria que seu olhar se encontrasse com o de Louis, pois Lily decididamente não se sentia no clima para trocar beijos, carícias e flertes com ele.

Mas Louis estava esperando por ela no fim do corredor, ao lado das escadarias. Seu rosto se iluminou com um sorriso sincero quando a viu. Ele se desencostou da parede, ajeitou o cachecol cinza no pescoço e abriu os braços para recebê-la. Lily sentiu o rosto esquentar e, por alguns segundos, ficou completamente sem reação. Deveria abraçá-lo? Dar-lhe um beijo no rosto? Na boca? Ela realmente não soube.

— Como passou o final de semana? – Louis fechou os braços em torno de sua cintura, ainda sorrindo. Em seguida, ele selou seus lábios e passou a mão pelos fios de cabelo que caíam ao lado de seu rosto. – Eu quis te convidar para sair ontem, achei que a chuva passaria rápido, mas acabou ficando muito tarde. Prometo recompensar no próximo final de semana.

— Não se preocupe. – Lily sorriu e tentou dar um passo para trás, mas ele manteve os braços firmes ao seu redor. Ela não conseguiu compreender os motivos para se sentir tão desconfortável por estar envolta nos braços dele. – Eu aproveitei o frio para ficar estudando, debaixo das cobertas. Tenho prova quinta-feira.

Outros estudantes passavam pelos dois, lançando-lhes olhares curiosos. Lily pensou ter visto uma garota sussurrar algo semelhante a "eles voltaram?" para uma amiga, o que fez com que Lily tivesse ainda mais vontade de se soltar daquele abraço. Mas por que estava se sentindo tão incomodada? Afinal, ela não escolhera sair com Louis? Ela não estava havia meses cogitando a possibilidade de voltar com ele?

— Também tenho exames nessa semana. – Louis contou, recuperando sua atenção. – Aliás, já decidiu onde vai passar as férias de Natal?

Lily franziu a testa, pensativa. Será que ele pretendia convidá-la para ir à França, como fizera no ano anterior? Não, não era possível, afinal, haviam acabado de voltar a sair. Ainda não haviam conversado sobre reatar o namoro. De qualquer modo, Lily achou que precisava urgentemente de uma desculpa para que ele sequer cogitasse fazer o convite. Recusá-lo pela segunda vez seria cruel demais com Louis.

— Eu vou almoçar na casa da minha mãe no dia vinte e cinco. – Lily decidiu, embora sua mãe ainda não tivesse mencionado almoço algum.

Louis fechou um pouco o sorriso.

— Entendo.

— Falando em almoço, você já almoçou? – Lily apressou-se a mudar de assunto. Subitamente sentira-se péssima por ter mentido. – Eu estava indo para o Salão Principal agora.

— Eu não vou almoçar hoje. – Louis meteu as mãos nos bolsos das calças, finalmente soltando-a do longo abraço. – Combinei de treinar para os testes de zagueiro com dois amigos que vão tentar a vaga também.

— Ah, sim, os testes são hoje. – ela lembrou-se do que acabara de ouvir de Violet. Ao perceber que Louis estava abrindo a boca para voltar a falar, ela continuou: – Bom, então eu vou almoçar. À essa hora, a fila lá embaixo já está quilométrica e eu não quero me atrasar para o Fórum. – Lily passou por ele e avançou alguns passos na direção das escadas, olhando-o por cima do ombro. – Vejo você amanhã?

Louis afirmou com a cabeça e assumiu uma expressão intrigada, possivelmente reparando em sua súbita pressa para ir embora.

— Lily?

Lily havia acabado de lhe dar as costas, mas virou-se para olhá-lo. Louis tinha um semblante confuso. Inevitavelmente, Lily perguntou-se por que estava agindo daquela maneira tão estúpida. Ele decididamente não merecia que ela fosse tão negligente.

Mas ao notar uma expressão preocupada tomar conta das feições de Lily, Louis sorriu para tranquilizá-la.

— Eu não mereço nem um beijo de boa sorte?

Ele ajeitou o cachecol cinza e arqueou uma sobrancelha, charmosamente chateado. Lily voltou a se aproximar do rapaz, balançou a cabeça e abriu um sorrisinho, desculpando-se. Sem dizer mais nada, ela o puxou pelo cachecol e deu-lhe um beijo particularmente intenso, numa tentativa de compensá-lo por ter sido tão fria momentos antes. Uma das mãos dele voltou a pousar em sua cintura, enquanto a outra envolvia sua nuca. Os dedos dele entre seus cabelos causaram-lhe arrepios. Mas, quando o beijo terminou e Lily tornou a se afastar dele, a velha sensação de desconforto voltou a incomodar seus pensamentos.

—--

James havia desmarcado o treino noturno daquela segunda-feira para que pudesse realizar os testes para a decisão do novo zagueiro. Tendo dispensado os principais jogadores naquela noite, os jogadores reservas do time oficial, juntamente com James, se dividiriam em dois times para jogarem com os candidatos – os quais evidentemente assumiriam a posição de zagueiro – para que pudessem avaliar suas habilidades. Como havia voltado a chover forte, James precisara transferir os testes para o ginásio coberto da Universidade Hogwarts.

Antes que os candidatos terminassem de chegar, um grupo de garotas eufóricas adentrou o ginásio. Elas se sentaram na primeira fileira da arquibancada, perto de onde James estava.

— James! – chamou alguém.

Ele se virou e avistou uma garota loira sorridente, acenando.

— Sim?

— Só queria te desejar boa sorte!

— Catherine! – as amigas a repreenderam, risonhas.

James forçou um sorriso. Suspirando, ele tornou a espiar as horas no relógio de pulso, ansioso para que os testes começassem logo. Quanto mais cedo começassem, mais cedo ele poderia ir para casa. Após ter passado todo o final de semana fora, aquilo decididamente era o que ele mais desejava naquele momento.

Depois de mais dez minutos de espera, os candidatos restantes chegaram. Renoir era um deles e James lhe lançou um olhar firme quando o viu, imaginando qual seria a forma mais divertida de reprová-lo. Estava tão absorto em fantasiar tais hipóteses que não reparou na presença de Sirius, que aparecera ao seu lado de repente.

— O que você está fazendo aqui? – indagou ele, confuso. Afinal, James havia dispensado os jogadores titulares.

— Relaxa, James, eu não quero ser zagueiro. Aliás, estou muito satisfeito como atacante. Eu só vim para... – ele lançou um olhar significativo para o grupo de garotas risonhas na arquibancada. – Bom, você sabe.

Sirius terminou de falar e se juntou a elas na primeira fileira. Em seguida, James se postou diante dos candidatos para a vaga de zagueiro. Tirou um papel do bolso e o desdobrou.

— Vamos começar por ordem alfabética. – ele voltou a olhar para o papel. – Armstrong, Brian!

Um rapaz negro se levantou prontamente do banco.

Em pouco tempo, James percebeu que Brian Armstrong era habilidoso, mas provavelmente não treinava com frequência. Na verdade, James ficara tão satisfeito com o desempenho do rapaz que, quando o dispensou para chamar o próximo candidato dez minutos mais tarde, ele acreditou que o segundo se sairia ainda melhor do que o primeiro.

— Davenford, Paul!

Mas Paul era um absoluto desastre. Durante seu teste, os jogadores do time oficial trocavam olhares desanimados todas as vezes em que ele perdia a bola ou chutava-a para fora da área, sem qualquer estratégia. James não esperou nem cinco minutos para descartá-lo e chamar pelo próximo.

Durante uma hora, James testou vários candidatos que não estavam nem de longe no mesmo nível dos jogadores do time. Após dispensar um rapaz de sobrenome Harris, cujas pernas tremeram do início ao fim, James cogitou a possibilidade de nunca encontrar o jogador ideal para ocupar aquela vaga. Se pudesse ter sabido que Armstrong, o primeiro candidato, seria a única opção aceitável dentre os presentes, ele não teria perdido tanto tempo testando os demais.

— Jones, William! – James o chamou.

Bill se levantou nervoso do banco. Olhou para James, confiante, e se posicionou na quadra. Embora não esperasse grande coisa, James apitou e começou a jogar. Bill se saíra muito mal, tendo perdido a bola na pequena área e dado um gol de graça ao time adversário. Ao soar do apito ao final do teste, Bill foi direto para a saída do ginásio, notavelmente decepcionado.

Algum tempo depois, James chamou o antepenúltimo candidato. O mais esperado de todos.

— Renoir, Louis!

Renoir caminhou firmemente até o local que deveria ocupar. Àquela altura, os membros do time oficial, bem como James, já estavam consideravelmente cansados. Estavam correndo e jogando por quase duas horas e James temeu que o cansaço dos colegas facilitasse as coisas para Renoir. Mesmo que ele não fosse tão bom, a indisposição do time poderia oferecer a ele uma chance gratuita de destaque. Portanto, James decidiu jogar o melhor que podia para que Renoir se saísse tão ruim ou ainda pior do que os demais.

Mas Renoir não se saíra nada mal. Na verdade, ele se saíra realmente bem. Apesar dos esforços de James, fora bastante difícil invadir a área adversária pela lateral defendida por Renoir. Tanto que, quando James conseguira marcar o único gol da partida, ele o fizera ao driblar o zagueiro reserva do time oficial. Renoir não o deixara passar nem uma única vez.

— Finalmente alguém que sabe defender a área! – desabafou o goleiro, depois que o apito de James soou pela quadra. – Acho que ele foi o melhor, não acha, Potter?

Veremos. – James lhe respondeu, irritado. – Ainda temos mais dois candidatos.

Vinte minutos depois não havia mais ninguém aguardando no banco. James suspirou em uma mescla de alívio com pesar. Aliviado por ter finalmente encerrado os testes. Pesaroso porque internamente ele sabia que Renoir havia se saído melhor do que todos. Enquanto os outros jogadores do time se dirigiam ao vestiário para tomarem um banho, James foi até a sala adjacente à quadra para guardar as bolas usadas e o apito.

Renoir foi o único que ficara para ajudá-lo a guardar tudo. Pelo canto do olho, James viu as garotas da arquibancada assistindo-os de pescoços erguidos, suspirando.

— Hey, Potter... – Renoir começou, entregando-lhe a última bola. – Quando você vai anunciar o novo zagueiro?

James sentiu seus ouvidos arranharem com aquele sotaque francês. Não olhou para ele para responder:

— Quando eu decidir.

Renoir não moveu um músculo. James trancou a porta da sala e deu-lhe as costas para se dirigir ao vestiário. Achou-o extremamente insolente por ter ido questioná-lo, com aquele ar de pura segurança, como se a decisão de James fosse óbvia, já que ele havia sido o único candidato realmente considerável. Naquele momento, James decidiu que escolheria Brian Armstrong. Com um pouco de treino, o rapaz poderia se tornar muito melhor do que aquele francês petulante.

—--

Ao contrário do que Lily havia prometido a si mesma, ela evitou Louis pelo resto da semana. Todos os dias ela saíra mais cedo da última aula e encaminhara-se direto para o Fórum, sem sequer parar para almoçar. Quando as amigas perguntaram-lhe o que estava acontecendo, ela apresentou-lhes a desculpa de que tinha muito trabalho a fazer por conta da proximidade das férias coletivas de fim de ano. Anita e Lorens não pareceram desconfiar.

O último dia de aula antes das férias de Natal foi um dia cheio de despedidas pelo campus da Universidade de Hogwarts. Após se despedirem de alguns colegas, Lily, Anita e Lorens estavam andando por um corredor do primeiro andar, conversando sobre o que fariam nas férias.

— Minha mãe me ligou ontem para avisar que vai viajar com o meu pai e minha irmã para a Espanha. – Lorens contava, aborrecida. – Eu realmente fiquei com vontade de ir com eles, mas tenho a peça para apresentar durante as férias. E vocês também vão ficar na república, não vão?

— Eu vou. – Lily falou, desanimada. – No ano passado, o Natal na casa dos meus pais foi um desastre. Não pretendo repetir a dose.

— Eu também vou ficar. – Anita declarou. – Meus pais vão fazer um cruzeiro pela América do Sul e eu não fui convidada.

— Ótimo! Então vocês vão poder assistir à minha peça! – O rosto de Lorens se iluminou com um sorriso. – Os meninos também vão ficar?

— James e Remus eu não sei. Mas o Sirius sempre fica. – Anita disse. – Todo mundo sabe que ele não tem mais uma casa, só a república.

Elas se depararam com um Salão Principal bastante movimentado. Lily ficou internamente desesperada, temendo que qualquer homem loiro fosse Louis. Olhava inquietamente para todos os lados, a fim de constatar se ele estava por ali – e poder se esconder a tempo de ser vista.

— Meninas, eu acho melhor ir para o Fórum. – Lily resolveu insistir em sua decisão de evitá-lo até o fim. – Sexta-feira é sempre–

— Lily. – Anita parou sua caminhada e postou-se diante da amiga. Lorens fez o mesmo. – Você não almoçou a semana inteira.

— Ah, eu sei, mas eu tenho que arrumar um monte de coisas antes das férias... meu chefe está cheio de compromissos–

— Lily, chega! – Lorens a interrompeu. – Nós sabemos que você está fugindo do Louis.

— Hein? – Lily ofegou.

— Ele veio nos procurar ontem. – Anita esclareceu, cruzando os braços. – Disse que estava preocupado com você, perguntou se sabíamos de alguma coisa. O que houve entre vocês?

Mas antes que Lily pudesse responder, Lorens tomou a palavra.

— Se você não quer continuar saindo com ele, então avise-o de uma vez, Lily! Não seja infantil. Aproveite que a universidade está entrando em férias e você não vai precisar encontrá-lo nos próximos vinte dias! – ela rolou os olhos, resignada. – Se eu soubesse que você ficaria desse jeito, eu nunca teria arranjado aquele encontro...

— Não é culpa sua. Eu realmente queria sair com ele, Lorens. – Lily suspirou. – E foi bom, de qualquer forma. Pelo menos eu percebi que não era bem o que eu queria.

Lorens estreitou os olhos azuis em sua direção, provavelmente reprimindo inúmeras críticas sobre a insistente mania que Lily tinha de dispensar namorados ou rapazes interessados, sem qualquer motivo aparente.

— Então você vai falar com ele? – perguntou Lorens, por fim, decidindo por não iniciar uma discussão.

Lily murchou os ombros, derrotada.

Sim.

— Então vamos almoçar! – Anita puxou as amigas pelos braços. – Estou morta de fome.

Quando as três já estavam terminando de comer, minutos mais tarde, Alice surgiu no refeitório e seus olhos rapidamente encontraram a mesa na qual as amigas estavam acomodadas. Exalando uma animação inegavelmente contagiante, a jovem se aproximou da mesa e tomou fôlego para começar a narrar:

— Vocês não vão acreditar! Não vão mesmo, de jeito nenhum! – Alice abriu um enorme sorriso e desabou sobre a cadeira desocupada ao lado de Anita. – Bom, eu tinha decidido voltar para a casa da minha mãe para o Natal, vocês sabem, eu quase nunca a vejo, ela mora sozinha e no ano passado eu passei o feriado na república, com vocês, então nada mais justo, não é? Mas...

Houve um silêncio.

Mas... – Anita agitou as mãos, esperando a amiga continuar.

— Eu sabia que haveria um "mas". – comentou Lily.

— Conta logo, Alice! – Lorens mandou, impaciente.

— Mas eu acabei de mudar de planos. – Alice completou e fez mais uma pausa para admirar as expressões curiosas das amigas. – Por causa do Gideon. Ele me pediu em namoro há cinco minutos. E eu aceitei. Então resolvi ficar em Londres para passar o Natal e Ano Novo com ele. Minha mãe vai entender, eu espero. Enfim, não é demais?

Alice falara tudo tão rápido que as amigas levaram segundos para poderem compreender.

— Amiga! – Anita exclamou, finalmente. Levou as mãos à boca, para abafar um gritinho emocionado. – Parabéns! Isso é ótimo!

— Isso é realmente ótimo! – Lorens concordou, sendo contagiada pela alegria de Alice. – Isso significa que mais duas pessoas vão assistir à minha peça! Alice, se você vai ficar em Londres e não for me assistir será uma traição!

— Alice, isso é incrível! – Lily levantou-se de sua cadeira e contornou a mesa para abraçar a amiga. – Quero dizer, eu já esperava que isso fosse acontecer depois de ver vocês na festa de sábado...

Alice tinha um olhar sonhador.

— Gideon é muito legal.

— E você gosta dele? – Anita quis saber.

— Sim. Bastante. – Alice assentiu. – E como já saímos algumas vezes, por que não tentar, não é mesmo?

— Apoio totalmente. – Lorens virou-se para Lily. – Viu só? As pessoas costumam tentar antes de terminar.

— Mas outras pessoas tentaram e não deram certo. – Lily retrucou.

A fim de impedir que a discussão reprimida desde o início da conversa começasse a se desenrolar, Anita apressou-se a tomar a palavra para lembrar Alice de que agora ela teria de comprar um presente de Natal para Gideon. A loira deu seguimento à questão sugerindo um suéter Armani; Lorens, por sua vez, sugeriu uma garrafa de whisky envelhecido e Lily recomendou o livro "Só Garotos", de Patti Smith.

Quando Alice abriu a boca para recusar todas aquelas ideias absurdas, Marlene juntou-se às amigas à mesa.

— Que bom encontrar todas vocês aqui! – ela as saudou, em tom de alívio. – Vocês precisam me ajudar! Estou desesperada.

— Com o quê? – Alice indagou.

— Eu ainda não consegui decidir o que dar para o Sirius de Natal. – Marlene franziu o cenho, muito aborrecida. – Todas as opções que me ocorreram me parecem ou baratas demais, ou caras demais ou bregas demais. Não sei mais o que fazer.

Lorens arfou, um pouco zombeteira.

— E eu achando que fosse alguma coisa realmente grave...

— Mas é grave!

— Eu sugiro o livro "Só Garotos", da Patti Smith. – Lily palpitou. – Eu o li mês passado, é incrível.

Marlene arqueou uma sobrancelha na direção de Lily, incerta se a amiga estava falando sério.

— Acho que ele vai preferir uma garrafa de whisky envelhecido. – Lorens comentou.

— Vocês sugerem isso para todo mundo? – perguntou Alice, confusa. – Só falta a Anita sugerir o suéter da Armani agora.

Anita riu alto.

— Eu não faria isso, Alice! – ela voltou a rir e Lily achou que havia algo antinatural em sua risada. – Eu nunca sugeriria qualquer coisa da Armani como presente para o Sirius. Se bem que ele é um cara que costuma se vestir bem, então, uma peça de roupa seria uma ótima opção. De qualquer outra marca, é claro. – ela se virou para Marlene, que tinha uma expressão aturdida e completou: – Marley, você poderia dar uma jaqueta de couro nova para ele, por exemplo. A jaqueta de couro que ele tem e usa quase todos os dias já está um pouco gasta, não acha?

Marlene bateu palmas e levantou-se da cadeira num salto.

— É isso! Perfeito! – ela deu alguns passos para trás, absorta em pensamentos. – Ótimo. Vai ser uma jaqueta de couro! E preta! Obrigada, Anita!

E a morena se afastou tão rapidamente quanto se aproximara.

Mas antes que houvesse tempo para que as amigas a questionassem sobre sua sugestão, Anita aprumou-se em seu assento e dirigiu-se à Alice:

— E então, qual a banda favorita do Gideon? Já pensou em ingressos para um show?

—--

Quando o debate sobre o presente que Alice deveria comprar para Gideon finalmente chegou ao fim, Lily precisou se despedir das amigas para ir para o Fórum. Tentou não se demorar ao atravessar o refeitório, inconscientemente evitando ser vista, mas suas intenções foram completamente frustradas. Quando a ruiva estava a poucos metros dos portões do campus, atravessando o jardim quase congelado, ela ouviu seu nome ser pronunciado por um charmoso sotaque francês:

— Lily?

Ela se virou lentamente na direção da voz do rapaz e encontrou um Louis incrivelmente sério.

— Hey. – Lily endireitou-se, preparando-se mentalmente para ter a conversa da qual estivera fugindo até então. Agora não havia mais saída. – T-Tudo bem?

— Onde você esteve todos esse dias? – Louis foi direto ao ponto. – Você mal responde minhas mensagens, não atende às minhas ligações... Aconteceu alguma coisa?

Não! – Lily exclamou, sua voz saindo mais aguda do que deveria. – Claro que não! São só... os trabalhos finais. E o Fórum. Meus chefes estão me sobrecarregando demais por conta das férias coletivas de final de ano, sabe, e eu–

— Lily. – Louis a interrompeu, num tom muito sereno. Em seguida, ele deu um passo à frente e tomou suas mãos e as colocou entre as dele. – Quando encontrei com você, no início da semana, e você me contou que iria passar o Natal em Londres, eu também decidi passar o feriado por aqui. Cancelei minha passagem e avisei minha família. Mas, com o passar dos últimos dias, eu pude perceber que você claramente estava me evitando, o que significa que eu não tenho nenhum motivo para ficar em Londres para o Natal. Não é bem o tipo de feriado que as pessoas passam sozinhas, não é? – Louis a olhou nos olhos e Lily sentiu-se horrível ao captar a decepção estampada no olhar dele. – Enfim, eu só estou aqui para te avisar de que vou voltar para Lyon. Estarei de volta daqui a três semanas.

Lily sabia que precisava lhe dizer alguma coisa. Ela decididamente lhe devia uma explicação. No entanto, Lily não fazia ideia de como transformar seus sentimentos em palavras, uma vez que sentia-se totalmente confusa em relação a eles. Não conseguia nomeá-los. Não conseguia tomar uma decisão.

— Desculpe, Louis, eu... – e sua voz começou a morrer. Não sabia identificar o que estava sentindo.

Louis aguardou pacientemente por um longo e quase eterno minuto. Mas Lily não foi capaz de finalizar sua sentença.

— É só isso o que tem a dizer?

— Desculpe-me, Louis. – Lily repetiu, enrugando a testa e tentando manter o contato visual. – Eu... estou muito confusa com tudo. Eu não deveria ter evitado você, eu sei disso, mas eu simplesmente não consigo entender o que estou sentindo com toda essa situação. A nossa situação. As coisas aconteceram muito rápido e de forma não planejada, então a mistura de tudo isso me deixou um pouco atordoada. Desculpe por não ter te procurado antes.

Por um instante, o rosto de Louis foi tomado por uma estranha expressão surpresa, mas ele rapidamente a reprimiu e, em menos de um segundo, sua serenidade estava de volta. Lily sentiu um aperto forte no peito ao perceber que o havia magoado.

— Então você precisa de um tempo para pensar melhor, é isso? – perguntou ele.

Lily surpreendeu-se quando flagrou-se abrindo a boca para responder que não, ela não precisava de tempo. Naquele exato momento, Lily soube: ela não queria voltar a namorar Louis. Mas, por algum motivo desconhecido por sua razão, ela fechou a boca antes de dizer qualquer coisa. Os olhos azuis e brilhantes de Louis a miravam cheios de expectativa.

— S-Sim. – Lily disse, por fim. – Preciso absorver melhor tudo o que aconteceu.

Louis abriu um sorriso de lado.

— Acho justo. – falou, aproximando-se. Colocou uma mecha acaju de seus cabelos atrás de seus ombros. – Estarei esperando. Pense bem no que você vai decidir. Não deixe de me procurar, Lily.

Louis levou uma das mãos até a nuca de Lily e a outra acariciou de leve seu rosto. Ela sentiu um arrepio percorrer sua espinha, pois as mãos dele estavam muito frias. Ou talvez fosse por outra coisa. Mas antes que o frio das mãos dele chegasse a incomodá-la, Louis se inclinou lentamente e a puxou para um beijo de despedida absolutamente caloroso.

—--

James não havia mais conversado com Evans. A última vez que haviam se falado fora quando Evans lhe comunicara que não poderiam assistir ao filme, pois ela tinha um encontro com Renoir. Desde então, tanto na república, quanto no trabalho, os dois não haviam trocado palavra alguma.

Mas no fim da tarde daquela sexta-feira, James vira-se compelido a quebrar o silêncio ao reparar que Evans estava encarando a tela do computador com um olhar perdido havia muitos minutos.

— Evans, você já entregou aqueles processos para o promotor Moody?

Ela deu um salto da cadeira ao ouvir sua voz. Afinal, o expediente estava chegando ao fim e a sala havia jazido em silêncio durante o tempo todo.

— Eu... ainda não.

— Ele deve estar esperando. – James digitou algo em seu computador e virou-se para ela. – Já terminou de revisar?

— Quase.

Mas Evans permaneceu na mesma posição, fitando algum ponto perdido sobre sua mesa impecavelmente organizada. Após quase um minuto de silêncio, James se levantou e parou diante dela, a mesa ficando entre eles. Ela ergueu os olhos para olhá-lo.

— Manda imprimir. Eu levo para o Moody. – falou James.

— Não é necessário, eu já estava indo.

— Você já está dez minutos atrasada.

Evans franziu as sobrancelhas, indignada.

— Eu ainda não terminei, Potter. – ela voltou-se para o computador, irritada. – Estou terminando de revisar, em um minuto eu já vou mandar para a impressão.

James passou a mão direita pelos cabelos, bagunçando-os impacientemente. Evans continuou descendo a barra de rolagem, fingindo ler atentamente o processo aberto em sua tela.

Certo. — James voltou a falar. – Mande imprimir isso o mais rápido que conseguir e vá direto para casa. Vou ficar esperando pelo processo lá na sala de impressão e depois vou levá-lo ao gabinete do promotor. – Evans abriu a boca para protestar, mas ele prosseguiu: – Pode deixar comigo. Você parece cansada.

E sem dizer mais nada, James saiu da sala.

—--

Naquela noite, James, Sirius e Remus tiveram de comparecer ao último treino de futebol antes das férias de inverno, em Hogwarts. Portanto, Anita e Lorens resolveram aproveitar o momento raríssimo no qual a mesa de snooker estaria disponível para finalmente poderem jogar apenas as duas, sem terem de assistir às sessões de exibicionismo de James e Sirius. Lily sentou-se na parte superior do encosto do sofá para assisti-las e contou às amigas sobre a rápida conversa que tivera com Louis, mais cedo naquele dia.

Quando Lily terminou de narrar tudo, Anita e Lorens a olharam indignadas.

— Ele concordou mesmo em esperar você pensar? – Lorens indagou, voltando-se a inclinar-se sobre a mesa e a posicionar o taco na ponta dos dedos.

— Sim, Lorens. – Lily suspirou. – Foi isso o que eu disse.

A bola que Lorens tinha intenção de encaçapar não entrou na caçapa almejada, fazendo com que a morena soltasse uma exclamação nervosa.

— Mas como esse Louis é mole! – Lorens reclamou. – Depois de todos esses meses de enrolação, ele ainda aceitou esperar mais três semanas? Meu Deus, Lily, esse cara só pode ser muito apaixonado por você, porque não é possível, sério!

Lily sentiu as bochechas se tornarem vermelhas.

— É... complicado, Lorens.

— Complicado? – Lorens rebateu, impaciente. – Eu não te entendo, Lily! Para quê enrolar o cara mais três semanas se você já sabe que não quer mais sair com ele?

— Q-quem disse isso? – devolveu Lily, insegura. – Eu realmente preciso pensar.

Anita e Lorens trocaram um olhar significativo. Lily deu-se conta de que as duas muito provavelmente já haviam falado sobre o assunto quando ela não estava presente.

— Lily... – Anita começou, apoiando as duas mãos sobre a ponta do taco e, em seguida, apoiando o queixo sobre as costas da mão. – O que aconteceu entre você e o James?

A vermelhidão dominou o rosto inteiro de Lily. A ruiva sentiu o ar lhe faltar.

— O que você quer dizer com essa pergunta, Anita?

— Alguma coisa aconteceu, Lily, isso é óbvio. Todos da república já perceberam. – Anita continuou. – Desde que vocês voltaram daquela viagem, vocês estão diferentes. E desde que você saiu com Louis na semana passada, vocês estão se ignorando. O que aconteceu em Oxford, Lily?

Lily jamais contara às amigas sobre os imprevistos daquela viagem. Exatamente porque não queria que elas começassem a palpitar sobre as coisas que Potter lhe dissera no hotel e, principalmente, sobre a nova amizade flertante que haviam desenvolvido após aquele fim de semana. Lily sabia que, se Anita e Lorens soubessem de tudo, elas não a deixariam em paz e acabariam interferindo – assim como o haviam feito em relação a Louis. E o motivo pelo qual Lily quisera evitar tudo aquilo fora o fato de todos morarem sob o mesmo teto e possuírem uma relação incrivelmente boa. Lily não se atreveria a tentar um relacionamento cujo fracasso pudesse arruinar a harmonia na qual a república se mantinha. Ela prezava demais por aquela casa; seu lar.

E fora aquele pensamento que a levou optar por sair com Louis, em vez de assistir àquele filme com Potter.

— Lily? Você está bem?

Lily tomou fôlego e decidiu contar tudo de uma vez:

— Eu e Potter tivemos que dividir o mesmo quarto de hotel, em Oxford. No coquetel, um advogado milionário me ofereceu uma carreira de sucesso em troca de favores sexuais. Potter se mostrou um bom ombro amigo e conversamos a noite inteira. Perdemos o ônibus de volta e por isso chegamos mais tarde. Nos tornamos quase amigos desde então. Sexta-feira passada, Potter me chamou para assistir a um filme com ele e eu aceitei. Mas vocês marcaram aquele encontro com Louis e eu acabei saindo com ele. Potter não falou mais comigo desde então.

— O QUÊ? – Lorens estava de queixo caído.

— Por que você não me contou nada disso? – Anita perguntou; seu tom era uma mescla de choque com desapontamento.

— Vocês se pegaram naquele hotel?

— Por que você não nos avisou de que já tinha um encontro, sexta-feira passada?

Meninas, – Lily as interrompeu, elevando um pouco o volume da voz. Saiu de seu lugar e andou até a mesa de snooker. – Primeiro: não quis contar justamente porque imaginei que vocês iriam gostar demais da ideia, o que, aliás, acabei de comprovar. Segundo: não, Lorens, nada aconteceu naquele quarto, nós só conversamos. Terceiro: Anita, assistir a um filme com Potter na sala da república não era um encontro!

Anita finalmente largou o taco sobre a mesa, bagunçando a disposição das bolas sem lhes dar qualquer importância, e virou-se para Lorens.

— Agora tudo faz sentido.

— Exatamente! – Lorens encostou o taco junto à parede, também desistindo do jogo. – Então foi por isso que a Lily não convidou o Louis para a festa da Whisky de Fogo! Ela não queria que James os visse juntos!

— E por isso James não quis tomar a sopa que Lily fez, na quarta-feira. Quando eu falei que tinha sido ela quem preparou, ele de repente se lembrou de que já tinha jantado. Bem que desconfiei de que era mentira!

— Hey! Parem com isso! – Lily exclamou, surpresa com o debate que as amigas haviam iniciado. – Caso vocês tenham se esquecido, eu ainda estou aqui!

Anita e Lorens voltaram-se para Lily, ambas ostentando o mesmo olhar divertido.

— Desculpe, Lily, mas nós estamos especulando sobre tudo isso já faz um tempinho, sabe? – Anita explicou, um pouco desconcertada. – Havia algo estranho no ar, mas como não sabíamos de nada disso que você acabou de nos contar, não estávamos conseguindo identificar o que podia ser! – ela pigarreou, endireitando-se. – Então, você e o James...

— Não há nada, Anita. – cortou Lily.

Nada? – Anita repetiu, sarcástica. Ao seu lado, Lorens riu em descrença. – A quem você quer enganar? Nós moramos na mesma casa que vocês e já percebemos o climão. Já está ficando chato!

Lily cruzou os braços.

— Já está, é? Então imagina o climão que haveria se eu não tivesse saído com o Louis, mas com o Potter e, em menos de uma semana, nós tivéssemos uma briga desastrosa e terminássemos? Será que você iria preferir assim?

Lorens assumiu uma expressão absolutamente horrorizada.

— Como você consegue ser tão pessimista, Lily? Você nem beijou o James ainda e já está pensando em como seria se vocês terminassem? Céus!

— Veja bem, Lorens, eu não gosto de agir de forma impulsiva. Eu já planejei minha vida inteira nos próximos dez anos e esse planejamento não inclui uma mudança emergencial no meio do ano letivo. Até porque não tem nenhum quarto para alugar minimamente decente nessa época do ano. E também porque essa república é e sempre será minha casa, pelo menos pelos próximos três anos!

Lorens expirou e balançou a cabeça, desistindo da discussão. Lily arriscou olhar para Anita, já esperando pela continuação das críticas. Mas Anita a olhava com um ar maternal de compreensão.

— Eu entendo, Lily. – falou ela, num tom carinhoso. Lorens a olhou resignada. – Eu nunca fui muito além com o Sirius exatamente pelos mesmos motivos. Gosto muito de como todos nós nos damos muito bem por aqui, ao contrário da república da Alice, onde todo mundo se odeia, por exemplo.

Lily sentiu-se abraçada pelas palavras compreensivas de Anita. Aquela confirmação era tudo o que ela precisava ouvir.

— Ora, mas se a preocupação da Lily é só a possibilidade de instaurar um "climão" na república, então está sendo inútil, não é? – Lorens replicou, irritada. – O "climão" já foi instaurado, de qualquer forma! James e Lily nunca ficam no mesmo ambiente por mais de três segundos, James não janta mais em casa e Lily não sai mais do quarto quando ele está aqui! Já que é para ter "climão" de qualquer jeito, então por que você pelo menos não dá uma chance para ele?

Mas Lily possuía um argumento consistente para contestá-la.

— Potter falou comigo hoje, no trabalho. Esse climão vai passar, Lorens. O tipo de climão que nunca passaria seria aquele que teria se instaurado se eu tivesse, de fato, saído com Potter na sexta-feira e depois ele tivesse passado o final de semana inteiro com a Sarah, como todo mundo aqui ficou sabendo que ele fez. – ela respondeu, com firmeza. – E esse tipo de climão não vai acontecer porque nunca vou me envolver com ele, já que é óbvio que não daríamos certo. – Lily fez uma pausa para refletir sobre as palavras que acabara de proferir. Por que dizê-las em voz alta era tão doloroso? Lily interrompeu seus pensamentos ao sentir o olhar preocupado de Anita e Lorens sobre si. Resolveu, portanto, encerrar a questão: – Bom, eu vou tomar banho. Vejo vocês depois.

Quando Lily desapareceu escada acima, Anita encostou-se na borda da mesa de snooker, pensativa. Lorens permanecia com o olhar fixo no local onde Lily estivera, poucos segundos antes.

— Eu não entendo a Lily. – Lorens confessou, um pouco aborrecida. – Por que ela está sempre na defensiva? Como ela tem tanta certeza de que o James sairia com a Sarah no dia seguinte depois de ter saído com ela, sendo que ela sequer deu uma chance para ele?

— Bom, acho que Lily deduziu pelas atitudes dele, não é? Ele costumava sair com várias antes e realmente saiu com a Sarah um dia depois de ter chamado a Lily para sair. – Anita analisou, tentando ser imparcial. – James é um cara muito legal, um ótimo amigo e tudo o mais, mas ele e Lily têm concepções bem diferentes sobre relacionamentos. Entendo o lado dela de não querer arriscar, Lorens. Tenho certeza de que se não desse certo, um dos dois acabaria se mudando daqui e a briga acabaria afetando a todos nós, porque acabaríamos tendo que tomar partido de um ou de outro.

Lorens permaneceu quieta, imersa em pensamentos, todos envolvendo a dura personalidade de Lily Evans. Por que a amiga fazia questão de sabotar qualquer chance de ser feliz com alguém, antes mesmo de tentar? Por que Lily tinha tanta certeza de que não daria certo com James? Por que a ruiva possuía tanta dificuldade para confiar nas pessoas?

— Não sei se concordo com você. Quero dizer, claro que concordo que se eles começassem a namorar e não dessem certo, seria um verdadeiro desastre. – Lorens ponderou. – Mas não acho que James teria saído com Sarah se Lily tivesse ficado com ele, sexta-feira passada. Ele só fez aquilo porque provavelmente se sentiu trocado. Se Lily acha que eles não dariam certo por causa disso, ela está sendo muito radical.

Anita meneou a cabeça.

— É, talvez você tenha razão.

— Sim, talvez. – Lorens disse em tom de concordância, sua expressão era distante. – Mas Lily nunca irá saber, porque, mais uma vez, ela disse "não" antes mesmo de tentar.

—--

Marlene não conseguia entender o que estava havendo com Helena. Quando ela estava terminando de jantar, a amiga irrompera pela porta da cozinha e a convidou para ir assistir ao treino de futebol de Remus e Sirius, em Hogwarts. A questão era que fazia semanas desde que Helena lhe dirigira a palavra pela última vez e sua animação ao fazer o convite não combinava nem um pouco com o humor que ela adotara desde que Remus lhe pedira um tempo.

Mas Marlene decidira não fazer muitas perguntas, pois independentemente da estranheza de toda a situação, tudo o que ela desejara ultimamente era reatar sua antiga amizade com Helena. Portanto, após um breve momento de assimilação, Marlene aceitou acompanhá-la ao campus.

Enquanto sentia o vento cortante de inverno chicotear seu rosto ao passar pelos portões da Universidade de Hogwarts, Marlene finalmente cedeu:

— Helena, por que você decidiu ir assistir ao treino do Remus? Você sempre reclamou de ir e agora que vocês não estão mais juntos...

— Nós estamos juntos, sim, Marlene. – retorquiu a outra, impaciente.

Diante da resposta ríspida, Marlene preferiu não dar continuidade à conversa. Aprofundaram-se pelos jardins e caminharam até o estádio de futebol. Ao alcançarem a entrada do campo, Helena abriu a porta para que Marlene passasse. A morena pensou ter vislumbrado a sombra de um sorriso em seus lábios, ao passar por ela. Mas o que estava acontecendo? Até uma hora antes, Helena sequer a olhava nos olhos, então por que estaria sorrindo para ela daquele jeito, sem que tivessem feito as pazes?

— Helena? – Marlene arriscou mais uma vez. – Por que você me convidou para vir aqui?

— Ué, você não está com o Black? – Helena respondeu prontamente, fechando o portão atrás de si. – Então! Achei que iria gostar de me acompanhar, assim eu encontro meu namorado e você encontra o seu!

Marlene abriu a boca para explicar-lhe que Sirius não gostava do termo "namorado", mas tomou juízo antes de cometer tal erro. Helena certamente poderia recomeçar a discussão que as fizera brigar e Marlene não estava disposta a ouvir as críticas da amiga.

O vento gélido não incomodava tanto dentro do perímetro oval do estádio universitário. Nas arquibancadas, alguns grupos de pessoas espalhados assistiam ao treino. Marlene procurou por Sirius no campo, mas não o encontrou jogando.

— O treino já deve estar acabando. – Helena concluiu, olhando para o relógio de pulso e sentando-se ao lado de Marlene.

— Acabando? – Marlene repetiu, confusa. – Então por que viemos agora?

Helena respirou fundo e colocou-se de pé em um pulo. Virou-se para Marlene e, mais uma vez, um sorriso estranho iluminou seu rosto habitualmente sério. Seus olhos escuros brilharam.

— Marlene, eu só quero fazer algo pelo seu bem. – disse ela, sombriamente. – Você pode esperar um pouco aqui, enquanto eu vou checar uma coisinha? Eu já volto!

Antes que Marlene pudesse questionar ou manifestar qualquer reação, Helena deu-lhe as costas e dirigiu-se às escadas entre as divisões das arquibancadas. Marlene viu-a chegar à primeira fileira e abordar um rapaz uniformizado, mas não pôde fazer leitura labial do que diziam. Aborrecida com toda situação, Marlene encostou-se no espaldar da cadeira, cruzou os braços na frente do peito e virou o rosto na direção do campo bem a tempo de ver James marcar um gol. Algumas garotas que assistiam à partida na primeira fileira vibraram e explodiram em palmas.

— Voltei! – anunciou Helena, alegre demais para ser normal. – Vamos ao banheiro comigo?

— Espera, Helena. Eu não estou entendendo! Você vai ou não ver o treino do Remus?

— Vamos ao banheiro primeiro.

Helena puxou Marlene pela mão e a conduziu para as escadas de onde viera. Contornaram o campo e encontraram os vestiários no momento em que um apito soou por todo o estádio. Ela pôde ouvir alguém gritar:

— Fim do treino! Comecem a guardar tudo!

Helena abriu a porta.

— Helena, esse aqui não é o vestiário masculino?

— Não!

— É, sim! Olha na porta, a placa...

Mas Helena decidiu ignorá-la e a empurrou para dentro do vestiário. Ouviu alguns sussurros vindo do fundo do aposento.

— Acho que ouvi o apito... – disse uma voz feminina e ofegante. – Esse lugar vai encher.

— Só mais um minutinho... – disse a voz masculina.

Marlene congelou. Aquela voz era muito familiar. Extremamente familiar.

Ela seguiu, em silêncio, a direção das vozes e encontrou Sirius aos beijos com uma garota, prensando-a contra a parede do último box. As pernas dela estavam enroscadas na cintura dele e ele a segurava pelas coxas.

Seu cérebro demorou dois segundos para finalmente processar e aceitar o que estava diante de seus olhos. Helena não entrara com ela no vestiário, tendo permanecido junto à porta, como se não precisasse ver para saber o que estava acontecendo. Marlene desejou simplesmente dar meia volta e ir embora dali, mas sua voz não a obedeceu.

— Sirius?

Sirius soltou a garota com uma rapidez surpreendente, virando-se para frente no mesmo instante. Ele parecia tão chocado quanto Marlene, cujos olhos involuntariamente haviam se enchido de água.

— O que você está fazendo aqui, Marlene? – foi o que ele conseguiu perguntar após o susto.

Marlene não tinha palavras. Queria gritar com ele, mas ao mesmo tempo sabia que seria inútil. Não queria parecer mais patética do que já estava se sentindo.

O que eu estou fazendo aqui? – Marlene conseguiu falar. Sua voz estava trêmula. – Ainda bem que estou aqui, não é? Quando você pretendia me falar sobre isso? Há quanto tempo você está...?

— Marlene, eu sei que isso não foi legal, mas nós tínhamos combinado que–

— Nós tínhamos combinado que você me contaria! E como você nunca me contou nada, eu pensei que você não me... – Marlene não conseguia dizer a palavra "trair". Embora ela soubesse que o termo não era o mais adequado, pois o relacionamento não era exclusivo, era assim que ela se sentia naquele momento.

Naquele instante, Marlene pôde ouvir os jogadores começarem a entrar no vestiário. O barulho dos recém-chegados cessou repentinamente ao darem-se conta da cena que estavam presenciando.

A primeira lágrima desceu por seu rosto e, pela primeira vez, Marlene desviou os olhos para conferir a garota, que havia permanecido imóvel até então.

— C-com licença. – pediu ela, percebendo o olhar ferido de Marlene sobre si. A garota se desencostou da parede e passou entre Sirius e Marlene, a caminho da saída. Nenhum dos dois a seguiu com os olhos; permaneceram se encarando.

Marlene não tinha mais nada a declarar e ficou internamente grata por Sirius não insistir, agora que havia tantas pessoas os observando. Sem dizer mais nada, ela lançou-lhe um último olhar magoado e virou-se para abrir caminho pela pequena aglomeração de rapazes uniformizados. Nenhum deles tentou impedi-la de passar.

No segundo seguinte, um silêncio desagradável dominou o vestiário. James resolveu se aproximar de Sirius e sua decisão incentivou os demais colegas a saírem do transe e darem seguimento ao que foram fazer ali, agindo como se nada tivesse acontecido.

— Sirius, não me diga que...

— Marlene viu. – Sirius adiantou, baixando os olhos para algum ponto perdido no azulejo. – Eu tinha decidido falar com ela nessas férias, eu juro que tinha, cara. Não entendo... como ela soube que eu estava aqui?

James automaticamente olhou para a porta do vestiário, ao lado da qual ele havia visto uma pessoa completamente inesperada, mas não havia lhe dado qualquer importância pois acreditara que ela estava ali para conversar com Remus. Lá estava o amigo, puxando Helena pelo braço e afastando-a da multidão. E, assim, James finalmente compreendeu.

—--

— Você não tem nada a ver com isso, não é? – Remus perguntou, soltando o braço de Helena, do lado de fora do vestiário.

— Ai, Remus! Isso doeu!

— Você tem alguma coisa a ver com isso?

— Claro que sim, Remus! Não seja idiota! – Helena afirmou, irritada, enquanto massageava seu braço. – Se eu não fizesse isso, seu amiguinho iria enganar minha melhor amiga para sempre!

Remus mirou-a por vários instantes antes de prosseguir.

— Você não deveria ter feito isso.

— E por que você acha que eu não deveria? Acha certo o que o Black estava fazendo? Queria que ele se desse bem para sempre?

As últimas duas horas de treino não o haviam deixado tão exausto quanto aquelas perguntas ilógicas de Helena.

— É claro que não, Helena! – respondeu ele, desanimado com a falta de empatia dela. – Mas você fez sua amiga ser humilhada na frente de um monte de gente, será que não percebe?

Helena revirou os olhos.

— Foi necessário!

— Não foi! Você poderia tê-la avisado de outra forma!

— E por que você acha que estávamos brigadas? Eu já tinha contado tudo para ela antes, mas ela não acreditou em mim!

— E por acaso você teve o mínimo de tato ao fazer isso? Nem precisa me responder, porque é óbvio que não teve. Como você esperava que ela fosse lhe dar algum crédito se você sempre se torna agressiva quando discute com alguém?

Ao captar a raiva nas palavras de Remus, Helena começou a chorar baixinho.

— Eu não pensei... – começou ela, entre os soluços. – Quando ouvi Marlene contando para a Alice que tinha comprado o presente de Natal para o Black, eu... eu senti pena. Ela estava cega, Remus! – Helena enxugou o rosto com as costas da mão. – Black não merecia presente algum dela!

— Não estou defendendo o Sirius. – Remus falou, com firmeza. – Passei os últimos dias convencendo-o a abrir o jogo com a Marlene. Ontem ele finalmente concordou e disse que iria contar tudo a ela. E então, caberia à Marlene, e somente a ela, decidir se iria querer continuar com um relacionamento aberto ou não. Você não precisava ter armado todo esse circo para Hogwarts inteira ficar sabendo!

Helena voltou a chorar.

— Pára com isso, Remus! Você quer me manipular, quer fazer com que eu me sinta culpada! – ela acusou, esganiçada, levando as mãos aos cabelos.

— Não. Eu só queria fazer você enxergar que haviam formas mais maduras de ajudar sua amiga.

Ao terminar de falar, Remus virou-se para entrar no vestiário, a fim de tomar banho e finalmente poder voltar para casa. Helena o impediu, colocando-se à frente da porta.

— Remus, sobre aquele tempo que estávamos dando... – ela fungou e buscou seus olhos com os dela, mas Remus não a olhou. – Vamos sair amanhã para conversar, vamos esquecer isso–

— Já esqueci. – Remus interveio, com frieza. – Para mim acabou de vez. Com licença.

Em seguida, Remus entrou no vestiário e a deixou chorando, decidido a não voltar atrás.


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Notas finais do capítulo

Er... Tem alguém aqui?

Gente, desculpa, MIL DESCULPAS pelo sumiço. Espero que o tamanho do capítulo amoleça o coração de vocês e vocês me perdoem por ter demorado tanto.

E aí, o que acharam? Felizes pelo Remus? Bom, sobre a Marlene... eu não a imagino fazendo barraco e dando piti, entendem? A Marlene que criei é uma mulher 100% fina, Sirius não merecia que ela se rebaixasse tanto a ponto de fazer um escândalo. Ela demorou um pouquinho, mas finalmente - e na hora mais importante, talvez - ela aprendeu a se valorizar. Preparem-se para mudanças drásticas agora!

Espero que tenham gostado do capítulo! E me contem o que acharam nos comentários, please!! ♥

Beijos,
Carol Lair (@carollairr)