Agilidade escrita por Diane


Capítulo 29
Capitulo 29 - Asas de Galinha... er, falcão




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Perspectiva de Rosie

— Sem chances — Christine cantarolou e voltou os olhos para o livro sobre física quântica.

— Isso é injusto — Rosie reclamou e se segurou para não bater o pé. Bater o pé é infantil, e ela não queria parecer infantil — Vou perder minhas férias por causa de vocês!

Ela tinha sugerido ir na montanha russa. Sério, ela estava no Hotel Nova York, o hotel que tinha uma montanha russa enorme que dava para ver Las Vegas inteira, e ela passava o dia inteiro presa no quarto. Ela só saia quando Christine, Idia ou Damien a acompanhavam. Tudo culpa daquele maldito monstro que a atacou.

— Baby, pode ir se quiser — Idia falou e se espreguiçou no colo de Damien — Mas não reclame se algum bichinho de Trivia almoçar você. O estômago de uma coisa dessa seria um péssimo túmulo.

— Não entendo por que vocês se preocupam comigo — Rosie reclamou e se jogou no sofá com um estrondo — Sou apenas uma mera mortal.

Christine estava parou de ler o livro e riu.

— É, eu também achava que era mortal. Mas aí um grifo louco invadiu minha cozinha na madrugada e tentou me fatiar.

Rosie fez uma careta.

— E agora você é uma feiticeira superpoderosa, sei. Mas vocês confirmaram que eu sou definitivamente mortal. Não entendo por que o animal enlouquecido me atacou.

Damien parou de jogar o videogame com um suspiro.

— Trivia quer você por algum motivo. Não vamos entrega-la e dar alguma vantagem para ela — ele falou.

— Que lindo. Virei barganha em uma luta que não é minha.

— Pelo que me lembre, a casa dos seus tios foi invadida e eles sumiram — Idia falou — Acho que essa guerra também é sua.

Foi insensível da parte da gata. Dias atrás, O Campo de Treinamento mandou uma equipe para vasculhar a casa. Nenhum corpo, mas ninguém estava lá, simplesmente sumiram. Havia marca de garras, vidros quebrados e até mesmo um pouco de sangue. Rosie só tinha concordado em ficar presa ali por que eles prometeram que iriam achar seus tios.

— Você acha que eu pedi para que isso acontecesse comigo?

— Ninguém nunca pediu que uma feiticeira louca surtasse — Damien disse.

— Só louca? — disse Christine — Trivia é uma assassina, psicopata, imbecil, vaca, loira oxigenada... Louca é muito pouco.

— E ela arruinou minhas férias — Rosie completou — Espere, Christine, você não quer ir na montanha russa comigo?

A morena fez uma careta.

— Eu quero, tipo, só terminar meu livro em paz.

Era tão típico de Christine. Estar em um dos hotéis mais conhecidos de Las Vegas e ficar lendo física quântica. Rosie se surpreendia com o modo que as pessoas conseguiam ser nerds.

— Eu posso ir — Damien falou — A Idia unhou os fios do videogame, e não tem nada para fazer.

Por isso ele parou de jogar. Os fios que ligavam o controle até a TV estavam roídos e caídos no chão. E veja só, as lacerações nos fios pareciam muito com as marcas da unha de uma certa gata...

Idia sorriu inocentemente.

— Não é minha culpa — Claro que não, nada é culpa da Idia.

Rosie suspirou. Finalmente iria ter um pouco de liberdade. E ela amava montanhas russas.

Ela olhou para Damien sentado no sofá. Ele era definitivamente muito bonito, principalmente os olhos verdes. Rosie sempre achou garotos morenos de olhos verdes bonitos.

Ele se levantou do sofá, quase como se tivesse sentido o peso do olhar dela sobre ele.

— Então, vamos?

E quando eles atravessaram a porta, ouviram Christine falar rindo:

— Êêe Damien esperto. Sempre soube que ele adorava ruivinhas esquentadinhas.

De longe dava para ouvir Idia gargalhando com sua risada felina.

Claro que isso deixou os dois constrangidos ao máximo. Rosie evitou olhar para o lado, senão ele iria ver que a cara dela estava um pimentão. Ah, ela iria matar Christine e Idia. Só precisava descobrir como se mata uma bruxa ninja e uma gata que vira onça.

É, talvez fosse melhor deixar para lá.

— Elas são sempre tão... excêntricas? —Rosie perguntou.

— Sempre.

A montanha russa ainda parecia legal de perto. Mas a fila quilométrica não parecia tão divertida. Pessoas filhas das mães, resolveram ir na montanha russa ao mesmo tempo que ela, por que parecia que quase todos do hotel haviam saído e estavam lá.

Rosie se sentiu tentada a pedir para Damien gerar um incêndio por perto, só para fazer a multidão se dissipar. Claro que ela não fez isso, não precisava de outro garoto bonito achando que ela era louca.

Para mencionar, ela supôs que ficou cerca de duas horas na fila. Sério, era bom que a montanha russa fosse realmente boa, por que esperar esse tempo todo por nada... era sacanagem divina.

Outra sacanagem divina era o cheiro de sândalo que Damien emanava. Garoto bonito e cheiroso, ela anotou mentalmente. As vezes você podia ser quase assassinada por um morto-vivo e depois atacada por um leão mutante, mas se as forças divinas estão colocando um garoto bonito do seu lado, talvez ela esteja querendo compensar as tragédias.

Obrigada, forças divinas.

Finalmente chegou a vez deles na montanha russa. O grande aglomerado de metais pintados de vermelho que se estendia metros acima parecia um gigante metálico e vermelho.

— A vez de vocês — O guarda que ficava administrando a entrada da montanha russa apontou.

E eles entraram no carrinho sobre os trilhos. Rosie fez questão de certificar que os dois cintos de segurança estavam funcionando, por que cair de uma altura daquelas seria um final muito idiota.

— Então, você gosta de altura? — Rosie perguntou.

Não deu tempo para ele responder, por que o carrinho deu uma guinada para cima e o vento calou qualquer resposta.

Ah, Rosie amava montanhas russas. Aquela sensação inebriante do vento batendo no corpo dela e a velocidade acelerando. Aquela por ser mais alta e longa era ainda maior. Se ela olhasse para baixo, iria ver Las Vegas inteira, com os letreiros piscando à distancia.

O carrinho parou perto de um decline que levava á metros e metros abaixo.

— Isso é normal? — Damien perguntou com as sobrancelhas franzidas.

— É, sim, as vezes o carrinho para e desce mais rápido depois.

Ele sorriu. E ele ficava dez vezes mais bonito quando sorria. E o cenário era perfeito: Las Vegas inteira abaixo deles. Daquela altura dava para ver tudo; os prédios, os cassinos e as pessoas pareciam formiguinhas abaixo deles.

— Os seres humanos não aproveitam a vida — Damien disse, pensativamente.

— O quê?

— É, eu acho isso. As crianças querem crescer rápido. Quando crescem e são adolescentes, elas se preocupam e sonham com a faculdade. E na faculdade elas sonham com o emprego. Mas quando estão trabalhando, as pessoas sonham com a aposentadoria. E quando enfim se aposentam, elas não podem fazer mais nada que faziam antes e... morrem. Os seres humanos vivem o futuro.

Rosie não sabia se sentia irritado com ele, ou se achava fofo o momento de filosofia. Mas o que ele disse era verdade. E no fim de tudo, as pessoas não aproveitavam a vida.

— Ok, admito, você está certo — Ela disse — Mas e vocês, os seres superpoderosos e quase imortais, aproveitam a vida?

— Claro que sim — Ele respondeu sorrindo.

Damien se inclinou ligeiramente na direção dela, aos poucos quebrando a distancia entre os dois.

Ele vai me beijar!, ela já estava pensando.

Faltava apenas alguns centímetros para os lábios dos dois se encontrarem quando um barulho alto ecoou no céu.

Quintos dos infernos.

E adivinhem só o que tinha lá no alto? O batman? Não. Um morcego? Não. Uma fada benéfica do amor? Não. Um avião? Não. Mas se você disse :”Ah, tem um monstro e enlouquecido lá”. Parabéns você acertou.

Rosie queria ter uma metralhadora na mão. Aí ela iria atirar naquela coisa até virar pó de animalzinho intrometido.

Para comentar, o animalzinho intrometido era uma espécie morcego albino misturado com um lobo de pelagem dourada. E ele era três vezes maior que um lobo normal.

E Rosie percebeu que ele soltava lâminas afiadas pelas asas assim que uma quase acertou seu braço.

O animal maldito não podia apenas se contentar com as presas e as garras, tinha que soltar lâminas também.

E quando ela olhou para baixo, viu que as pessoas na fila quilométrica não estavam mais lá. Em plena nove horas da noite, parecia que o hotel Nova York tinha todos os seus hospedes dentro dos quartos.

Aquilo não apenas cheirava á emboscada. Era uma emboscada.

— Eu devo ter feito algo muito cruel na minha vida passada para merecer isso — Damien praguejou.

É, Rosie também deve ter sido muito má.

Não deu para eles discutirem planos por que o monstro veio rosnando na direção deles.

Uma saraivada de lâminas passou voando direto na direção deles. Damien ergueu a mão e as lâminas pararam á dois centímetros de distancia deles. Rosie sentiu seu estômago gelar quando viu todas aquelas lâminas paradas na sua frente.

Então as lâminas giraram e voaram na direção o monstro.

Toma, bicho idiota!

Mas o fato era que o bicho idiota tinha reflexos excelentes e conseguiu se desviar de todas as lâminas.

É, além de ter asas, garras, poder lançar lâminas pelas, a coisa ainda tinha reflexos ninjas.

Aquilo era tão injusto.

O lobo voador rosnou depois que viu as lâminas serem jogadas contra ele. Acho que nunca na vida dele, suas próprias lâminas voaram na sua cara.

Aí ele decidiu que seria melhor atacar do modo antigo: Dentes e garras. Nunca diga que um animal (até um mutante alucinado) é irracional. Eles são bem espertos quando convém.

Parecia que os segundos foram desacelerados. Rosie não podia fazer nada, praticamente, exceto se jogar do carrinho, mas não seria uma boa ideia virar uma poça de carne humana no chão de Las Vegas. Certamente não seria uma boa ideia.

Para o crédito dela, ela não gritou.

Isso mesmo, se iria ser assassinada por um morcego loucão, ela não ia morrer gritando. Para falar a verdade, isso estava na sua lista de mortes que ela nunca imaginou que poderia acontecer com ela. Rosie sempre se imaginou morrendo aos oitenta e poucos anos, em uma cadeira de balanço. Ou caindo das escadas, já que sempre foi desastrada.

Mas morta por um ser meio lobo, meio morcego...Bom, não ela nunca ia pensar em um final desses.

Ela podia sentir o ventinho das asas de morcego gigante na sua cara. E então o bicho soltou um silvo agudo e se desequilibrou. As asas dele se chocaram contra os ferros da montanha russa e o mais surpreendente de tudo: Ele caiu.

Lá embaixo, uma onça gigante esticou as garras e dilacerou o lobo ao meio. De longe, Rosie tinha a impressão que Idia estava sorrindo.

Ela olhou para Damien. Ele parecia um pouco pálido.

— Foi você que fez isso?

— É. Magia de ar, sempre muito útil.

Então o ferro partiu. Tipo, partiu mesmo e eles começaram a despencar.

Era até irônico. Um monstro gigante não os matou, mas a queda provavelmente faria isso. Ok, era patético.

— Eu não quero morrer! — Rosie gritou.

Não seriam ultimas palavras inteligentes. Pelo que ela sabia, grande parte das pessoas não queriam morrer.

É claro que ela não esperava que Damien criasse asas, literalmente. Penas cor de ferrugem e de dourado surgiram nas costas dele e se abriram. Embora estivesse caindo, Rosie pode ver isso. Talvez fosse uma alucinação pré-morte. As vezes isso podia acontecer.

Ele mergulhou na direção dela e a segurou. Normalmente, ela sentiria o estomago dar reviravoltas ou suaria frio, mas isso não fez muita diferença por que: 1- Ela já estava suando frio graças à queda e 2- Ela tinha certeza que iria vomitar quando chegasse ao chão, o que também era culpa da queda.

Eles planaram até o chão e Christine e Idia os estavam observando. Christine tinha um sorrisinho do tipo ”Ah, eu sei de tudo, criaturas” e Idia tinha um olhar estranho... fome?

— À proposito, belas asas de galinha — Christine falou. Os olhos dela estavam prateados e ela segurava uma adaga ensanguentada.

— São asas de falcão — Damien corrigiu.

— Nunca comi asas de galinha... falcão — Idia disse, dando um olhar cobiçoso para as asas.

Damien engoliu em seco e as asas desapareceram.

Perspectiva de Mary.

Mary conseguia sentir seu corpo, mas não conseguia se mover.

Estava presa em uma espécie de lugar pós-guerra. Sangue estava espalhado pela grama que estava tão morta quanto os corpos empilhados. E ela estava dando o seu melhor para não olhar os corpos.

Uma risada cortou o silêncio e ela a viu.

Se viu.

Ela usava uma armadura dourada em um estilo delicado e preso ao corpo. Pequenas flores estavam entalhadas nas placas de metal que se assemelhava à ouro. O cabelo loiro estava mais longo e cacheado.

Mas ela não parecia ela.

Tinha um ar cruel nas feições do rosto e os olhos dela eram frios. E por algum motivo, ela achava aquela cena de destruição engraçada.

— Morreram como ratos — Outra voz feminina falou ao lado dela.

Só então ela mudou a atenção para outra garota. Os olhos dela eram dourados âmbar e o cabelo era quase branco. Trivia.

Ela estava andando ao lado de Trivia como se fossem amigas!

Isso só pode ser um sonho louco!, ela falou para si mesma.

— Tão fracos... — A outra Mary falou com deleite.

Então ela percebeu onde estava. Era o Campo de Treinamento. A grama que cobria a entrada estava cinzenta e morta. O castelo tão lindo por sua arquitetura não podia ser mais visto. Era apenas pó e sangue.

Aquilo não podia estar acontecendo.

Não, não, não.

Mary não era burra. Ela sabia que essa outra Mary estava aliada à Trivia, caso contrario a feiticeira já teria a decepado.

Ela nunca se aliaria á Trivia. Nunca, nunca.

Se aquilo era um sonho, quando acordasse, a primeira coisa que ela faria seria ir até um psiquiatra. Sonhos assim não são normais. Talvez ela estivesse desenvolvendo algum complexo gerado por estresse?

Mary percebeu que um daqueles que estava caído no chão não estava morto. Ele se arrastava lentamente até a outra Mary.

— Mary, por favor...

A voz estava fraca e quase irreconhecível. Apesar de estar ensanguentado e coberto de sujeira, Mary reconheceria aqueles olhos verdes e o cabelo rebelde em qualquer lugar.

Sam.

Ele estava lá, e estava machucado. E o pior de tudo, ela não conseguia se mover. Queria dizer para ele se fingir de morto, dizer que aquela garota que tinha o rosto dela não era confiável.

Mas nenhum som saiu da sua garganta quando ela gritou.

— Sam — A outra Mary também o reconheceu, mas ela não mostrava preocupação, apenas uma frieza.

— O que você fez, Mary? — Ele perguntou, e os olhos dele estavam cheios de lágrimas.

— Apenas isto — A ninfa loira pegou a espada da bainha e com um único golpe, atravessou o coração dele.

Ela queria gritar. Aquela cena que se passava diante dos seus olhos... não podia ser verdadeira.

Ela nunca se tornaria uma traidora. E em hipótese alguma, mataria Sam. Mas vendo aquela cena se passar diante dos seus olhos, ela não pode ter tanta certeza, de repente, parecia que ela não podia confiar mais nas próprias mãos, nem em si mesma.

Não vou me tornar um monstro, ela se assegurou, isso é uma ilusão para me confundir.

É uma visão ou parte do futuro? Tem certeza disso, pequena ninfa?

Perspectiva de Sam.

Sam descobriu que algo estava errado assim que viu as chamas.

De repente a floresta desapareceu, o mundo ficou escuro e então ele estava lá. Chamas avermelhadas subiam no ar a mais de sete metros e deixava um rastro de fumaça. Era até bonito de se ver, claro, se você ignorasse o fato da fumaça estar acabando com o ar.

Demorou um tempo para Sam descobrir que aquilo era uma pira. Uma pira funerária.

Descendentes de deuses não enterram seus mortos, Sam nunca soube o porquê disso, talvez fossem raízes Greco-Romanas ou então eles eram orgulhosos demais para aceitarem a ideia de ficar em decomposição abaixo da terra. Mas Sam agradecia pelo fato deles não usarem o método funerário egípcio, pois monte de múmias seria estranho.

Olhando ao redor e para longe das piras funerárias, Sam viu três pirâmides. Por um instante, ele pensou que estava no Egito e aquelas eram as pirâmides de Gizé, mas ele tinha certeza que não havia árvores e nem cachoeiras no Egito.

Ele voltou a olhar para as piras e reparou que tinha um homem ao lado dele. E o mais estranho de tudo, é que ele tinha quase certeza que o cara não estava ali antes.

— Quem é que está na pira? — Ele perguntou, por fim, e sentiu um arrepio percorrer seu corpo.

O homem se virou e sorriu. Ele devia ter uns vinte e cinco anos e Sam se mataria para ter a aparência daquele cara: Cabelos sedosos e dourados, olhos cor de âmbar, pele pálida, traços perfeitos e um corpo definido. Mas tinha algo cruel por trás dos olhos dourados.

— Sua mãe e seu pai — Ele riu — Você foi fraco demais para protegê-los... Você sabe como é, sempre foi fraco em tudo.


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Notas finais do capítulo

E o que acharam? Eu morri de rir enquanto escrevia a parte da Idia babando nas asinhas do Damien.