Save me escrita por Vany Myuki


Capítulo 14
Oceano sem fim


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoas que ainda me atura ;)
Pois então, mais um capítulo fresquinho pra vcs.
Não garanto a qualidade, principalmente por que não consegui revisar o capítulo.
Mas, fazer o quê, vamos ao que interessa: vamos ler!!!



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P.O.V Autora

_Pela sua expressão deve ser bem pior do que aparenta._comentou Bellamy olhando Jasper, a testa do mesmo franzida de preocupação.

Jasper analisava atentamente a pele envolta ao corte no ombro do amigo.

A cor ao redor não tinha a tom vermelho escarlate de outrora, agora, dois dias depois de ser golpeado, o ombro de Bellamy estava levemente inchado, o corte camuflado por uma densa camada de pus que dava toda uma aparência mais catastrófica ao machucado.

_Está infeccionado. Isso é claro._disse Jasper, os olhos tentando não expressar seu enjôo pelos líquidos estranhos que circundavam o corte.

_O que tem em mente?_questionou o Blake, enquanto encostava-se no tronco de uma robusta árvore, a face fechada pela dor lancinante que perpassava seus músculos.

_Eu realmente queria entender algo de machucados e infecções, mas sabemos quem manda nesse território._suspirou Jasper, a face atrelada entre o desânimo e a falta de esperança.

Bellamy engoliu em seco.

Sabia que Jasper falava de Clarke e, mais claramente: sabia que ele estava certo que aquele era o ponto final em que chegariam, uma vez que o Blake não aguentaria andar muito mais quando a infecção se alastrasse de forma mais arrebatadora.

Os olhos da garota viajaram a alma de Bellamy, seu sorriso ficando distante, enquanto a impotência de um simples machucado causava toda uma frustração dentro do rapaz.

Num salto doloroso, que tirou todo o seu fôlego por segundos, Bellamy se pôs de pé, enquanto via um Jasper confuso se erguer junto, os olhos interrogativos voltados para o Blake.

_Não vou deixar que um simples arranhão me impeça de encontrá-la._garantiu o rapaz, seu rosto obstinado, embora a dor ainda permanecesse vívida no mesmo.

Jasper se pôs na frente do amigo, seu corpo lânguido interrompendo que o mesmo avançasse enquanto cavava a própria sepultura.

_Você não deve, Bellamy. Devemos esperar que você esteja suficientemente bem para andar e lidar com os terras-firmes._aconselhou o rapaz.

O rosto de Bellamy estava coberto por uma espessa camada de suor. Enquanto seu corpo tentava manter-se de pé a todo custo.

_Não posso perder tempo.

_Você não pode é perder a vida._emendou Jasper.

Bellamy suspirou, ajeitando a postura em seguida. Seus olhos negros dirigiram-se ao amigo com tamanha profundidade que Jasper quase recuou.

_Você faria a mesma coisa se pudesse salvar Maya.

Bellamy sabia que aquele era o ponto fraco de Jasper, a única coisa que faria sua postura desabar diante das palavras do Blake.

_Não é a mesma coisa._falou o rapaz, a voz um murmúrio indistinto.

_Eu sei._tornou a falar Bellamy, a face cansada_Mas preciso salvá-la.

Jasper assentiu devagar, enquanto alinhava a própria mochila nas costas e endireitava a arma nas mãos.

_Só não diga que não lhe avisei._falou entre os dentes, enquanto tornava a caminhar na frente do Blake.

_Vou estar morto, de qualquer jeito._brincou Bellamy, a frase não passando de apenas uma ironia mal criada e formulada, pois, lá no fundo, o rapaz sabia que não existia chance alguma de morrer, não enquanto não a encontra-se.

***

Abby observava a noite em sua mais cruel apresentação, o coração palpitando de pavor ao encarar os três corpos sem vida à sua frente, estirados como sacos plásticos sob a terra lamacenta.

Ela reconheceu dois dos soldados mortos, o terceiro não era nítido em sua mente, mas a evidencia de sua vida se mostrava pulsante no sangue seco em suas roupas.

_O que eles querem?_balbuciou para si mesma, a confusão lhe golpeando gradativamente, enquanto imaginava qual o verdadeiro motivo os terras-firmes tinham para causar mortes inocentes e depois entregá-las como triunfos de sua vitória.

_Acho que a pergunta deve ser direcionada a pessoa certa._falou Lincoln ao seu lado, enquanto manuseava os corpos com perspicácia, procurando sinais de tortura.

As pessoas ao redor dos corpos olhavam abismadas para os rostos contorcidos e sem vida, tentando imaginar qual destino seria pior: morrer no espaço, ou ser assassinado brutalmente na Terra?

A resposta a pergunta estava estampada em cada olhar apavorado e molhado de lágrimas.

A Chanceler tentou tirar o peso de seu coração e repousar na razão e nos acontecimentos.

_Quem você têm em mente, Lincoln?_perguntou, sua voz mais seca do que o normal.

O ex-terráqueo tinha as feições fortes, os músculos tensos de preocupação, mas até mesmo sua vulnerabilidade parecia exalar um medo sem igual nos que os rodeavam.

_Quatro dos soldados foram checar o perímetro_Abby assentiu rapidamente, um sinal para que ele continuasse_quatro deles também retornaram._concluiu ele, enquanto via a compreensão se estabelecer nos olhos da líder.

_Onde ele está?

Lincoln indicou o interior da Arca, ficando para trás enquanto Abby disparava para dentro do casulo de metal.

A Chanceler não fez questão de ser educada, adentrou o cômodo em que Marcus estava frente à frente com um soldado sem nem ao menos bater.

_Um interrogatório deve ser feito na presença da Chanceler, caso não saiba, Marcus._salientou com frieza, enquanto se aproximava do soldado sentado em uma cadeira.

Marcus suspirou exasperado, mas não emitiu nenhum som.

Ao que parecia estava muito incomodado para dar início a uma discussão com Abby.

A Chanceler se posicionou frente ao jovem soldado, tentando lembrar-se do nome dele, mas falhando miseravelmente no processo.

_Como se chama, soldado?_viu-se obrigada a perguntar.

O rapaz, mesmo com o braço enfaixado e pequenas escoriações cobrindo-lhe o rosto, se pôs de pé em indiscutível respeito sem vacilar nem um milímetro.

_Chanceler._saldou com seriedade_Me chamo Kilon, Cal Kilon._apresentou-se com a voz em perfeito equilíbrio, sem deixar a máscara de tranquilidade um segundo sequer.

Abby olhou para Marcus com as sobrancelhas erguidas, uma pergunta oculta tingindo seus olhos.

_Preciso saber o que houve na floresta e, mais do que isso,_ela pausou, para que as palavras surtissem efeito em Cal_preciso saber como escapou com vida.

Cal assentiu sem pestanejar, sua face calma e serena.

_Partimos para vasculhar o perímetro como o combinado, nos dividimos em duplas e marchamos por caminhos diferentes._contou ele, enquanto Abby e Marcus ouviam a história com curiosidade exacerbada.

Cal fez uma pequena pausa e continuou assim que percebeu que não tinham intenção de interrompê-lo.

_Não foi difícil ver os rastros na areia, eram recentes e muitos para serem discretos. Gun e eu fomos os primeiros a perceber que não se tratava de falta de sutilidade, era uma armadilha das boas.

Abby prendeu o fôlego, enquanto os braços de Marcus se apertavam sobre o peito.

_Quando percebemos que as pegadas eram apenas para atrair-nos para o outro lado já era tarde: o grito de nossos colegas chegou primeiro do que qualquer aviso. Estava feito. Houve apenas um silêncio desconfortável e uma adaga raspou a lateral do meu rosto_disse indicando o corte superficial sobre a bochecha_Gun não teve tanta sorte. Eles foram rápidos e logo o sangue jorrava da boca dele._o rapaz parou, engolindo em seco, mas ainda bastante focado nos fatos para se entregar a exaustão ou a confusão que se tornara sua vida.

_O que houve em seguida?_pressionou a Chanceler, capaz de sentir o próprio sangue bombear, tamanho era seu desespero pelo desfecho.

Cal ergueu um pouco o rosto, um rubor de vergonha tingindo sua pele, mas ele continuou de queixo erguido, incapaz de submeter-se ao fracasso.

_Fui golpeado também. Achei que seria o fim quando apaguei, mas não foi. Acordei com o ombro deslocado, manchas e escoriações cobrindo-me o corpo. Mas ainda estava vivo.

_Os corpos...?_incentivou Abby, sua mandíbula trincada.

_Acordei em cima da pilha de cadáveres.

Abby sufocou um grito, enquanto Marcus levava a mão ao rosto.

_Não havia ninguém?_questionou Marcus, apreensivo.

Cal negou, o olhar perdido em algum ponto de suas lembranças.

_Não havia ninguém, mas..._ele parou, concentrado em suas memórias. Quando seus olhos retornaram à Abby e Marcus, os verdes já não eram mais translúcidos, tornaram-se enegrecidos, escuros pelas sombras da morte e da noite em que quase fora a presa._Era um aviso. Tenho certeza que era.

_Por quê diz isso?_a voz de Marcus era segura, embora seus olhos parecessem assombrados.

Cal suspirou baixo, mas ficou de costas com algum esforço.

Quando começou a erguer a camisa, expondo as costas nuas, nem Abby e nem Marcus emitiram nenhum som. Não era preciso. O silencio era sufocante o bastante para qualquer palavra que fosse.

No centro das costas do rapaz, circundando toda a extensão até a base, três linhas retas se estendiam uma ao lado da outra, enquanto uma única cortava as mesmas na horizontal.

Os olhos de Abby, olhos treinados para se ater à machucados e feridas, mal viam o sangue que ainda gotejava das cicatrizes de Cal, tudo que ela via era um futuro incerto e tempestuoso.

_O que isso significa?_perguntou voltando-se para Marcus, o qual estava igualmente abalado.

Não foi Marcus quem respondeu, mas uma voz calma e serena, embora castigada.

_Eles estão vindo. Me marcaram para morrer. Todos estão marcados.

Cal falou com confiança o suficiente para Abby sentir os pêlos de seus braços se eriçarem, enquanto o mundo a sua volta girava.

Marcus dispensou Cal com um agradecimento formal, alegando que receberia os devidos cuidados e segurança redobrada.

O rapaz assentiu e foi se esgueirando como uma sombra até a porta, tão silencioso quanto.

Marcus tocou o ombro de Abby e viu o medo despontar dos cantos dos olhos da mulher.

_Nós daremos um jeito._prometeu, embora suas palavras não soassem confiantes nem para si mesmo.

Abby não assentiu, apenas observou o outro lado da sala, seus olhos não vendo nada além de sombras escuras e deformes.

_Espero que esteja certo._finalizou com uma prece silenciosa, enquanto a presença de Marcus pairava protetora ao seu lado.

***

A cabana estava escura, iluminada apenas pelo pequeno fecho de luz de uma solitária vela.

Tristan adentrou o espaço quieto, tomando cuidado para não chamar a atenção dos demais aldeões.

Clarke vinha à sua espreita, tão silenciosa quanto sua própria sombra.

Ela adentrou o pequeno cômodo devagar, tentando não topar com nenhum objeto oculto à sombra da noite.

Seus olhos tentavam se acostumar com a escuridão obscura, mas nem mesmo seus meses na Terra haviam lhe preparado para o momento em que só haveria escuridão.

Com um tremor inquietante na ponta dos dedos da mão, Clarke tateou uma parede qualquer, até estar sentada no chão, as costas eretas sobre a madeira que pressionava a mesma.

Tristan havia sumido no interior da cabana, sem emitir ruído algum. Morava tempo demais naquele lugar para não se acostumar aos objetos e móveis espalhados por todo o cômodo.

Com os joelhos na altura do queixo, os cabelos cercando os ombros como cortinas de proteção, Clarke tentou se aninhar dentro de um pequeno quadrado inexistente, tentando não ser um estorvo maior do que já sabia ser.

Um pequeno ponto luminoso apareceu à alguns metros da garota, chamando sua atenção num salto.

Mais adiante Tristan percebia o medo nos olhos da garota dar lugar a um alívio profundo, enquanto ele acendia outras duas velas.

_Por quê o susto? Não está acostumada ao escuro?_perguntou o rapaz tentando soar irônico, mas falhando ao atentar para a nota de preocupação em sua voz.

_Eu só estava distraída, apenas._apressou-se em falar, corando por um breve momento. O rubor nas bochechas da garota fez algo fervilhar dentro de Tristan, e o calor que preenchia seu estômago e peito eram reconfortantes.

_Está com fome?_perguntou, tentando não afastar Clarke.

A garota negou com um breve aceno. Os cabelos cacheados iluminado à luz das velas, enquanto o azul de seus olhos ardiam por todo o pequeno espaço.

_Bom..., já que não está com fome você deve ir dormir. Amanhã de manhã teremos uma longa conversa com Lars._falou Tristan de mau humor, tentando não pensar em imagens dele mesmo levando suas mãos ao pescoço do amigo.

Clarke o olhou confusa.

_Boa noite, então._falou indecisa.

_Não acha que vai dormir aí, certo?_perguntou ele ofendido, enquanto via a pequena figura da garota se espremer entre as paredes de sua cabana minúscula.

Clarke levou um tempo para responder, uma vez que a pergunta principal ainda pairava em seus pensamentos.

_Acho, sim.

Tristan se aproximou dela e lhe ofereceu a mão, uma deixa maltrapilha para sentir os dedos cálidos e suaves da garota entre os seus.

Clarke continuou olhando para a mão sem entender, sem mover um único músculo sequer.

_Deixe de ser teimosa. Você precisa dormir._insistiu o rapaz, se sentindo envergonhado pela aproximação.

_Onde que quer eu durma, afinal?_a pergunta saiu ríspida, como sempre acontecia quando Clarke perdia a pouca paciência que lhe restara.

Para seu azar, ou de ambos, o rapaz também não era nenhum um pouco paciente. E mostrou-se ainda menos cavalheiro quando a ergueu do chão e a jogou sobre o ombro, colocando-a sobre um colchão de palha, com lençóis limpos e suaves sobre suas mãos.

Clarke não teve tempo para detê-lo ou para pensar, logo estava sentada sobre o colchão miúdo e perfeito para seu corpo, mas que deveria tornar-se um ponto no nada para Tristan e seus músculos de aço.

_Você vai dormir onde?_questionou aborrecida, ainda incapaz de formular uma frase coerente para denotar sua pequena raiva.

Tristan agarrou um cobertor velho e empoeirado, uma bola de tecido em suas mãos ágeis.

O cobertor parou no chão, longe o bastante de onde estava o colchão de Clarke, mas perto o bastante para impedi-la caso tentasse fugir na calada da noite.

Sem dizer uma única palavra, Tristan arrancou a camiseta por sobre a cabeça, exibindo músculos de tirar o fôlego que, infelizmente, não pareceram surtir efeito nenhum na garota.

Com um estralo maior do que o normal, seu corpo bateu contra o piso de madeira, o cobertor formando um moinho confiável como travesseiro.

_Boa noite._falou seco, incrivelmente irritado.

O colchão de Clarke silvou sobre seu peso, enquanto a mesma se aprumava.

_Boa noite, Tristan._devolveu, a voz calma, uma outra versão da menina irritadiça de outrora_E obrigada._finalizou, levando a barra do cobertor até os ombros, enquanto se envolvia no calor do tecido.

O rapaz deu um suspiro frustrado.

Esperava, realmente esperava, que ela o xingasse e devolvesse insultos, assim o sono, combinado com a raiva, fariam da noite de Tristan uma calmaria de tranquilidade e sonhos. Mas, agora que ela ressonava baixinho, envolta em sua própria bolha de felicidade, agradecendo mentalmente Tristan por concede-lhe uma noite de sono digna, agora ela mal sabia que havia roubado todo e qualquer sonho que o rapaz pudesse ter. A simples presença da garota do outro lado da sua cabana era motivo o suficiente para Tristan perder o sono.

Com os olhos ardendo de cansaço, enquanto a mente girava feito um pião, Tristan amaldiçôo Clarke Griffin por se infiltrar em seu lugar mais íntimo e pessoal: seus sonhos.

***

Monty e Raven estavam sentados em uma mesa velha e quebradiça do lado de fora da Arca, o amanhecer começava a dar seus primeiros sinais de vida.

O lugar estava deserto, com exceção dos soldados que vigiavam os portões, tudo estava silencioso.

_Eu não entendo. Achei que depois de Mount Weather o exército de Lexa nos deixaria em paz. Livres para viver do nosso modo._a voz de Monty era um assobio no nada, seus olhos passeavam por perguntas, enquanto tentava obter uma resposta digna.

Raven se remexeu na cadeira, seus olhos presos na mesa, tão absorta em questionamentos quanto o próprio amigo.

_Eu não faço idéia do que eles querem. Mas nos deixar viver, com toda certeza, não é o objetivo deles._falou com rancor, encarando Monty.

Uma movimentação pelo canto do olho fez Raven encarar sua esquerda, onde uma figura se andava devagar.

_Quem é aquele?_perguntou a morena, sua atenção presa na figura do estranho.

Monty acompanhou o olhar de Raven.

_Eu não o conheço._ admitiu o rapaz.

Cal mal percebeu que era objeto de estudo, estava concentrado demais na floresta à sua frente, principalmente na cerca elétrica que gritava o aviso de seu isolamento.

Ele precisava sair do acampamento.

Precisava arrumar um jeito de adentrar na mata, sem ser visto ou levantar suspeitas.

_Precisa de uma ajudinha?_a voz de Raven irrompeu qualquer plano que estivesse se formando na cabeça do rapaz.

Cal virou a tempo de ver Raven e Monty ao seu lado, os cenhos franzidos em concentração.

_Pareço precisar?_a retórica incomodou Raven e deixou um Monty ainda mais confuso.

_Acho que sim, principalmente para alguém que está tão concentrado no lado de fora do acampamento._argumentou a morena, os olhos faiscando na direção de Cal.

O rapaz não respondeu nada, seus olhos sugavam a raiva de Raven com contentamento. Ela era esperta.

_Eu nunca o vi por aqui. Já nos conhecemos?_perguntou Monty, os olhos estreitos tão concentrados quanto os da colega.

Cal olhou o rapaz e esbanjou um sorriso de canto.

_Acho que não. Você estava em Mount Weather._lembrou, como se fosse óbvio.

Monty se calou, um rubor surgindo em seu rosto.

_Ele poderia estar em Mount Weather, mas eu estava bem aqui._lembrou Raven, uma expressão felina surgindo em seu rosto_E, que coincidência, eu não me lembro de você._retrucou.

Se Cal se abalou, não deixou que percebessem.

_Você estava ocupa, operando a coluna, estou certo?_salientou ele, os grandes olhos verdes contrastando com os cabelos castanhos e criando uma aparência pertubadoramente demoníaca.

Raven engoliu em seco.

_Estou dispensado do interrogatório?_suscitou, o ar não mais amigável.

Raven abriu caminho para que Cal passasse, seus sentidos gritando que algo estava errado.

_Acha que devemos nos desculpar?_perguntou Monty, um pouco incomodado pelo espetáculo que causaram.

Raven negou, seu olhar ainda permanecendo sobre a figura de Cal.

_Não devemos desculpas para um mentiroso, Monty.

_Mas ele disse...

_Ele mentiu._esclareceu, encarando o amigo.

Monty era uma máquina de confusão, enquanto tentava desesperadamente alcançar o raciocínio da amiga.

_Como você pode saber?_questionou atônito.

_Eu não tenho provas, mas convivi a minha vida toda com mentirosos e os últimos meses não foram diferentes; Ele está mentindo._afirmou, recebendo um aceno de cabeça de Monty.

_O que fazemos então? Contamos a Abby ou Marcus?_perguntou o garoto ao lado de Raven, enquanto Cal desaparecia dentro da Arca.

_Por hora vamos ficar de olho nele, Monty.

O rapaz assentiu, enquanto sentia o alerta de Raven chegar até si e ali se estabelecer.

Eles precisavam tomar cuidado.

O máximo que pudessem.

***

P.O.V Clarke

Meu corpo todo relaxava, apreciando a maciez do fino colchão de Tristan.

A sensação era agradável em demasia, quase pude sentir todo o peso nos ombros caindo e tornando-se apenas uma lembrança desconcertante e desnecessária.

Quase.

A porta irrompeu e pus-me de pé, enquanto a figura de Tristan se revelava entre os pequenos raios do amanhecer.

_O que foi?_perguntei apreensiva, enquanto via a expressão no rosto de Tristan se intensificar.

_Não sabemos ainda. Mas toda a aldeia está em alerta. Temo que tenha algo a ver com o seu povo.

O vazio, que tanto pude sentir durante todas essas semanas longe, começara a preencher-se de perguntas e aflições.

_Eles estão aqui?

Minha voz estava sufocada, hesitante, mas ao mesmo tempo esperançosa, ansiando pelo encontro, pelo momento em que um rosto conhecido apareceria na multidão.

Tristan enrijeceu, seu rosto tornando-se carrancudo.

_Não sabia que queria tanto vê-los._comentou com sarcasmo, enquanto pendurava uma velha mochila no ombro.

_Você não sabe de nada._comentei aborrecida.

Seus olhos azuis me analisavam, duros feito gelo ao mesmo tempo que queimavam com uma raiva desenfreada.

_Você deve estar certa. Quem sou eu? Não é mesmo?_o tom irônico parecia estar marcado na voz de Tristan, inconfundível.

_Vai me dizer o que houve?

Ele fingiu não me ouvir, enquanto arrumava suas armas por todo o corpo, preparado para qualquer perigo que pudesse se apresentar.

_Eu falei com você.

Seu rosto finalmente virou-se para mim, concentrando ali sua atenção.

_Eles não estão aqui. Não ainda._rugiu.

Aquela informação deveria ter me enchido de pânico: por eles me encontrarem e por eles morrerem por isso, mas a única coisa que fiz foi ilustrar um sorriso em meu rosto, tamanha era minha felicidade.

Do outro lado da cabana Tristan virou o rosto, suas feições contorcidas de raiva.

_Vou precisar sair. Montar guarda._avisou ajeitando uma adaga na bota_Não encontrei Lars em lugar algum, portanto você vai ficar sozinha, o que quer dizer uma coisa: não ouse tentar fugir, porque se for pega, em meio a esse alerta de intrusos, nem eu nem Lars vamos poder evitar sua morte.

O aviso de Tristan era claro, mas seus olhos eram a grande gravidade da situação: demonstravam que a morte, rápida e indolor, não era o método da aldeia Condor.

_Entendi._assenti firme.

_Eu espero que seu tempo na Terra tenha lhe ensinado nossos costumes, portanto não tente nada absurdo._enfatizou.

Mais uma vez assenti, enquanto dedos ágeis novamente me prendiam a cordas.

Quando Tristan saiu eu me encolhi numa brecha entre uma pequena mesa com livros e um armário, ocultada pelas sombras da cabana.

Naquele momento, enquanto eu sentia todo o meu corpo achatado entre paredes de móveis, me dei conta de algo, algo que eu jurava ter morrido dentro de mim: o medo da morte ou, mais especificamente, o medo do caminho até a mesma.

***

P.O.V Tristan

Me aproximei da roda de guerreiros, enquanto vários olhos repousavam sobre mim.

Em meio a todo o caos o rosto de Lars se fez presente ao lado de Selenia, tão concentrados quanto qualquer outro guerreiro.

Caminhei até o centro da roda, sendo observado de perto, com um respeito que nem eu mesmo havia percebido ter conquistado.

_Callen está desaparecido há quatro dias, não há sinal dele por toda a floresta. Suspeitávamos que ele havia saído em mais uma de suas buscas sutis, mas com essa nova movimentação na floresta, creio que algo tenha lhe ocorrido.

O rosto de todos estavam sérios, ouvindo minhas palavras com atenção e gravidade.

_O que faremos, Tristan?_perguntou Hans, um dos soldados da tropa pessoal de Callen.

_Por hora vamos nos comprometer em vigiar o perímetro e continuar ocultos pela floresta. Quando as coisas de acalmarem, partiremos atrás de Callen.

Eu não tinha um plano coerente, mas isso era o mais próximo de uma estratégia que eu poderia formar.

_Não podemos abandonar as buscas, Tristan. Callen é essencial aqui na aldeia._contestou Milah, amiga e escudeira de Callen.

Cravei meus olhos na figura firme e doce da garota.

Callen era muito estúpido se realmente não havia notado o que a maioria já tinha como verdade.

_Nós não podemos arriscar nosso povo, Milah. Essa é a questão principal._expliquei, recebendo alguns murmúrios em concordância.

_Se fosse você ele o procuraria, não importava o que fosse.

Me calei.

Ela estava certa, afinal.

Callen reviraria toda a floresta para achar qualquer um dos seus homens, fossem eles quem fossem. Mas também não arriscaria os mesmos por sua causa.

_Se ele estivesse aqui ele nos chamaria de inocentes por trocar a vida de dez pela dele. Você sabe que sim.

A dor que passou pelo rosto de Milah era intensa, algo fora do comum. Mas, mais visível que a dor era a declaração da verdade, quando a garota percebeu que era exatamente assim que Callen agiria: nunca o salvar, sempre pensar no bem do povo.

_Vamos vigiar o lado sul._exclamou Declan, sendo seguido por mais dois do bando.

_Eu, Selenia e Karen vamos ficar de olho no lado oeste._declarou Lars.

Assenti, vendo outros se manifestarem em prol do lado leste.

_Fico com o Norte, Kate e Rilian irão comigo. Os demais permaneçam com suas atividades normais, os olhos atentos a tudo._instrui, com Rilian e Kate já ao meu lado.

O povo brandiu em concordância, as facas e foices levantadas de modo respeitoso.

Milah se aproximou de mim, os grandes olhos cinzas marejados.

_Deixe-me ir atrás dele._pediu baixo, sendo o centro das atenções.

Milah era tão pequena e indefesa, suas mãos mal conseguiam segurar o cabo de uma adaga, quanto mais de uma espada.

Em minha consciência eu via mil formas diferentes dela sendo torturada e morta, capturada por clãs hostis ou pelo próprio povo do céu.

Não poderia deixar que nada disso ocorresse com ela.

_Não posso permitir, Milah. Sinto muito.

O olhar perdido dela exprimia todos os sentimentos mais profundos que se pode imaginar, quase me vi afagando seu ombro, mas isso a destruiria ainda mais, então me contive.

A mãe de Milah contornou o grande grupo e trouxe a filha para si, afastando-a do grupo.

Lá ao longe minha cabana parecia se destacar na multidão, envolta em sua obsecuridade, enquanto escondia o segredo que poderia me destruir, mas, ao lembrar da dor refletidas nos olhos de Milah, eu percebi, finalmente, que agora já não importava mais. Clarke era meu Callen, e isso parecia se mostrar cada vez mais irrefutável a medida que meus pensamentos corriam como loucos até ela.

Nesse sentido, deixei todos os problemas de lado e marchei rumo a floresta, sendo seguido pelos demais.

Se Clarke era tão importante para mim como Callen era para Milah, então não me havia outra opção a não ser garantir que ninguém a encontrasse, principalmente seu povo.

***

P.O.V Bellamy

Respirar se tornara uma questão complicada.

Meus pés mal se arrastavam, mais ainda assim se moviam, crentes que a encontrariam.

Obstinados em sua busca incansável.

Ao meu lado Jasper se mantinha calado, ajudando quando o necessário e atento a qualquer movimento suspeito.

A cada momento eu percebia que tudo estava prestes a desabar.

Jasper parecia saber a mesma coisa, mas se mantinha na sua, sem questionar ou reclamar.

No fim de tudo, Jasper era o único que podia entender minha dor, por mais que não se igualasse em sentido algum a sua.

E tal percepção era o que o mantinha andando e aguentando o calor, o frio, a sede e o cansaço dos dias na floresta.

Eu seria eternamente grato à ele, seja qual fosse o resultado de nossa busca.

A noite caiu tão rápido quanto amanhecera.

Em algum lugar dentro de mim a esperança ainda crepitava devagar, quase mórbida, mas ainda suficiente para me manter de pé.

Quando paramos para descansar, Jasper acendeu uma fogueira e ajudou a trocar os panos que circundavam meu ombro.

A dor não havia passado nenhum centímetro, pelo contrário, só parecia aumentar de forma incontrolável, como se mil facas transpassassem meu corpo gradativamente.

_Você parece mal._comentou Jasper preocupado.

O riso que saiu dos meus lábios parecera um grasnado.

_Eu me sinto mal._garanti ainda sorrindo, tentando aliviar a tensão.

Jasper não pareceu acreditar, na verdade seu pesar aumentara, principalmente após algumas horas, quando os tremores e frio começaram.

Lá longe eu só ouvia o barulho do pano sendo espremido em água e depois repousando sobre o meu rosto.

Um manto velho e cinzento foi colocado ao redor do meu corpo, mas eu não sabia destinguir quem o havia colocado e nem quando.

Tudo estava cinzento e desbotado.

Eu só conseguia sentir.

E sentir a agonia era o que me manteve, o que não deixou que a inconsciência me atingisse por completo.

Não sei quanto tempo a febre tomou conta do meu corpo, mas, assim que tudo havia ido embora, eu consegui visualizar a figura cansada de Jasper, enquanto vigiava meu sono.

_Vai dormir, amigo. Eu me encarrego daqui.

_Diz o cara que quase morreu durante boa parte da noite._brincou ele, se aconchegando a um tronco de árvore.

_Obrigado._falei sincero, vendo a satisfação nos olhos de Jasper.

_Você fez o mesmo por mim.

Arqueei uma sobrancelha, tentando recordar do episódio.

_Você era um carrasco quando chegamos aqui, mas mesmo assim fez de tudo para manter os outros afastados, enquanto eu quase morria com uma lança no peito._Jasper riu, recordando-se de um fato que a muito tempo havia tornado-se apenas um lembrete dos momentos difíceis que ainda passaríamos.

_Isso não é toda uma verdade. Eu fui o primeiro a achar que deveríamos matá-lo._lembrei desgostoso, incomodado com a postura que adotei durante boa parte do tempo.

Jasper olhou em minha direção, seus olhos incrédulo me estudando.

_Não. Você apenas queria que pensassem que você achava melhor me matar. Garanto que, mesmo com a Clarke, Octavia, Monty e Finn me protegendo, ainda assim você me salvou. Se quisesse me matar, se realmente desejasse o fazê-lo, eu não tinha a mínima chance. Você me salvou. Apenas estou retribuindo o favor.

As palavras sumiram da minha boca, em parte por culpa da febre que retornava sutilmente, mas também por culpa das palavras de Jasper e das verdades que ali se apresentavam.

Parte de meu caráter foi despedaçado quando Octavia foi presa, destinada a morrer como uma delinquente na Terra. A coisa só piorou quando o sangue do Chanceler manchou minhas mãos. Nesse momento eu já sabia: não havia restado esperança para mim.

Foi aí que eu mudei. Que eu assumi uma liderança que não sabia ter. Que aprendi o sentido de proteger aqueles com quem se importa. Dê doar-se da melhor forma, de corpo e alma.

Ela me ensinou grande parte disso.

_Quando acha que se apaixonou por ela?_a voz de Jasper irrompeu meus pensamentos, enquanto um sorriso presunçoso se apoderava do rosto do mesmo.

Era uma pergunta difícil.

Talvez tenha sido desde as primeiras farpas que trocamos.

Mas, quando penso nisso, apenas me lembro de momentos que ela alcançou fundo em minha alma: quando abdicou de sua vontade e deu a paz à Ethan, quando deixou claro a importância de cada vida ali presente...

_Eu não sei. Eu..._um lampejo passou por minha mente, trazendo à tona um momento a muito esquecido.

_O que foi? Lembrou de algo?

_Sim._sorri a lembrança_Quando fomos resgatá-lo, havia uma armadilha no chão, uma em que Clarke escorregou na pressa de salvá-lo._eu sabia que meus olhos estavam distantes e que, muito provavelmente, um sorriso nostálgico pairava sobre meu rosto_Ela caiu, mas eu fui rápido. Foi no momento em que segurava minha pior inimiga, aquela que ditava a regra a um rebelde, que percebi que não queria deixá-la cair. Foi a primeira vez que reparei na vulnerabilidade dos olhos dela. Acho que foi aí que tudo começou a mudar._confessei com um meio sorriso.

Jasper, do outro lado, ria.

_Como pretende contar isso à ela?_brincou, seu senso de humor revigorado.

Se pudesse dar de ombros eu teria o feito, mas me limitei a apenas murmurar aquilo que tanto me afligia.

_Não faço idéia.

E eu realmente não fazia.

Não sabia o que esperar na reação dela.

Não sabia dizer se ela me aceitaria ou se sairia correndo em pânico.

Sua recusa era meu maior medo, um que me cegava e fazia nós estranhos se revirarem na boca de meu estômago.

_Acho que não irá precisar de nada tão memorável para convencê-la._disse Jasper com um gesto abrangente de mãos.

_O que quer dizer com isso?_questionei.

Jasper sorriu e deitou-se sobre a relva, fechando os olhos devagar, deixando-se levar pelo cansaço.

_Ela também sente o mesmo._garantiu num ressonar baixo, antes de cair num sono profundo e avassalador.

_Espero o mesmo, amigo._falei para o nada, enquanto os grunhidos inconstantes de Jasper rompiam madrugada a dentro.

***

P.O.V Milah

O dia transformou-se em noite, enquanto os sentinelas faziam seus turnos, a espada em mãos pronta para arremessar-se em uma batalha em busca de sangue.

Em nossa velha cabana, enquanto minha mãe ressonava baixo à luz de um pequeno lampião, meus pensamentos corriam para Callen de forma surpreendente.

Nós éramos amigos de infância, sempre presente na vida um do outro.

Callen era sereno, inteligente e honesto. Capturava sempre o melhor das pessoas e servia a seu povo com todo o fervor.

Quando seu pai, Hugh, morrera, o filho estava pronto para tomar seu lugar e servir do jeito que melhor necessita-se aos propósitos de sua aldeia.

Hugh havia treinado seus filhos para liderar, tanto Callen quanto Tristan eram perspicaz e com um senso de justiça indiscutível.

Callen era o mais velho, tendo três anos de vantagem sobre o irmão menor, quando chegara a hora ele assumira seu papel, ajudando, auxiliando e dando tudo que podia por seu povo.

Embora seu posto na aldeia fosse o mais elevado o possível, ainda assim Callen não deixara de se importar com nossa amizade um segundo sequer.

Éramos companheiros de aventuras e piadas, apenas.

Callen parecia não perceber que eu ansiava por mais que mera amizade.

Quando ganhei confiança o bastante para falar-lhe sobre meus sentimentos já era tarde, uma nova bomba eclodira em nosso meio, tirando a atenção e sono de todos: o povo do céu surgiu.

Os novos seres eram semelhantes á nós, possuidores de tecnologia e inteligência incomum. Por outro lado tínhamos a força física à nossa favor, mas eles detinham o poder de armas de fogo: rápidas e inconfundivelmente mortais.

Aquilo assustou nossa aldeia, principalmente por sabermos ser o mais pacífico dos clãs, se havia um lugar a qual eles procurariam prejudicar seria o mais fraco. Condor, nesse sentido, se alinhava à todas essas características.

O pesadelo começou assim que boatos se espalharam.

O medo tornou-se parte integrante de nossa aldeia. Impresso em cada rosto e olhar.

Callen viu-se perdido entre o dever e sua moral.

Foi exatamente nessa época que seus sumiços ficaram cada vez mais frequentes. Ninguém parecia notar muito, principalmente por ele ser muito engenhoso quanto suas escapulidas, mas eu, que sempre estivera ao seu lado, sabia identificar o momento em que sua cabeça maquinava algo. E Callen estava maquinando à muito tempo algo grande, algo que não quis me contar, apenas executar por si mesmo.

Agora seu sumiço era a prova de que planejava algo e que, por mais estratégico que tenha sido, não dera certo.

Tristan tinha razão ao falar que o irmão jamais assumiria a responsabilidade de dar a vida de outros em prol da sua. Mas Callen não era apenas o líder, era o único irmão de Tristan, a família que lhe sobrara, ele deveria ter feito algo, ao invés de seguir um código de princípios.

Com essa idéia em mente deixei meus pés escorregarem para o lado de fora do colchão e seguirem caminho até a cabana de Tristan.

O ar da noite estava frio, mas não me importei, Callen estava em perigo e isso era tudo que importava.

A cabana de Tristan estava escura, iluminada apenas por uma centelha de luz, que parecia encher todo o ambiente.

As batidas na porta foram sutis, mas logo meu punho tomava controle de si mesmo e, praticamente, esmurrava a porta.

A velha madeira cedeu as batidas, entreabrindo-se cautelosamente.

Meus pés adentraram o cômodo devagar, sabendo que ali era território particular e que eu não tinha o mínimo direito de invadi-lo.

_Tristan?_chamei em meio ao breu total.

Um vulto passou por mim tão rápido que não tive tempo de fazer qualquer movimento.

Logo uma pequena faca de caça estava em meu pescoço, arranhando o mesmo e fazendo-me sentir o frio inconfundível da lâmina.

_Qualquer palavra e você morre._advertiu a voz, distintamente a de uma mulher.

Me senti estúpida por sair no meio da madrugada sem nenhuma arma em punho, principalmente sobre risco iminente de estranhos pela floresta.

Mãos fortes puxaram meus braços para as costas, enquanto uma corda atava minhas mãos, impedindo qualquer movimento.

O trabalho foi feito de forma hábil, em menos de um minuto eu já estava no chão, encolhido em um dos cantos da cabana frente a frete com minha raptora.

A mulher era alta e esguia, com curvas acentuadas e cabelos loiros emoldurando um rosto fino e olhos extremamente azuis.

Sua beleza era nítida, mas sua ferocidade era ainda mais chamativa.

_Quem é você?_perguntou, a faca apontada para mim sem maiores precedentes.

_Milah._em algum lugar minha voz entoou fraca, confinada pelo medo.

A mulher respirava rápido, apesar de sua figura ameaçadora, ainda assim ela deixava uma coisa transparecer, algo que, de algum modo, fez-me sentir mais aliviada: ela estava com medo também.

_Por quê está aqui?_rugiu, o peito subindo e descendo constantemente.

_Tristan. Precisava falar com ele.

Ela pareceu relaxar a medida que minha pouca estatura e olhos assustados ficavam mais visíveis.

_Quem é você?_perguntei sem querer, amaldiçoando-me em seguida, sabendo que minha cabeça estava em xeque.

A garota olhou-me uma vez e foi até a porta, espiando pelas frestas, certificando-se que eu estava sozinha.

_Ninguém que você deveria ter conhecido._garantiu transtornada.

_Você é do povo do céu.

Não era uma pergunta, mas a garota limitou-se a assentir, antes de deslizar da parede até o chão, a alguns metros de distância.

_Por quê está aqui? Tristan sabe disso?

Minha voz não continha acusação, apenas uma curiosidade insaciável, mas mesmo assim a garota me olhou alerta.

_Não o meta em confusão. Ele não tem culpa de nada._reforçou, a faca apontada, enfatizando sua fala.

_Eu não diria nada. Gosto de Tristan.

Ela assentiu, mas seu rosto ainda não cultivava a certeza de minhas palavras.

_A quanto tempo está aqui?_tornei a fazer perguntas.

Se Callen estivesse aqui seus olhos estariam duros em minha direção, repreendendo-me por ter a língua tão solta, ao invés de refrear as palavras.

_Não faço idéia. Talvez..._ela pensou um instante, perdida em números_Muito, apenas._esclareceu com um dar de ombros, os olhos cansados analisando-me com cuidado.

_Tristan a capturou?

Ela riu abertamente, embora tenha sido um riso contido.

_Digamos que sim._assegurou ainda achando graça.

_Há mais alguém que saiba de você?

_Isso é um interrogatório? Porque se for, eu que deveria fazer perguntas._disse suscita, embora sua voz não cultivasse a mesma rispidez de outrora.

Me remexi um pouco desconfortável, ganhando um olhar objetivo da garota, o que me fez estagnar no mesmo lugar.

_Callen sabe sobre você?_me vi perguntando, o coração disparado no peito.

A pergunta a pegou de surpresa.

_Callen? Quem é esse?_perguntou interessada, embora seus olhos deixassem claro que não fazia idéia de quem se tratava.

_Não sei se devo contar à você.

Ela arqueou uma sobrancelha, um sorriso de canto materializando-se em seu rosto.

_Seu namorado, suponho.

_Como...?_exclamei boquiaberta.

_Fique tranquila, não o conheço e, sinceramente, não desejo conhecer mais ninguém._sua voz vinha incrustada de veracidade.

Um tempo se passou até que uma das duas interrompe-se o silêncio.

Minha língua rápida não deu-me alternativa e logo me vi falando novamente:

_Ele não é meu namorado. Somos amigos, apenas.

Talvez tenha sido a pontada de ressentimento em minha voz ou apenas intuição feminina, mas a garota percebeu do que se tratava.

_Se apaixonar por um amigo sempre é um problema, normalmente temos medo de estragar a amizade e acabar afastando aquele que queríamos apenas como colega._comentou atrapalhada. Parecia que dar conselhos, ou o que quer que fosse que estava tentando fazer, era complicado para ela, talvez mais complexo do que imaginara.

_Você já...?

_Sim. Não foi legal, eu lhe garanto.

_Ele está com outra?_em minha cabeça eu via a cena mais cômica do mundo: eu conversando amigavelmente com minha captora, enquanto uma faca dava toda a ênfase a cena.

O olhar da garota ficou longe, enegrecido pelas sombras de um passado recente.

_Ele morreu.

_Eu sinto muito.

Ela deu de ombros, enquanto se dava conta de toda a situação.

_Foi melhor assim. Eu não suportaria machucá-lo. Não quando meu coração já tinha dono._mais uma vez a aura de angustia se apoderou dela, acendendo algo obscuro.

_Sinto muito por ele também.

Ela me olhou com um olhar questionador.

_É fácil entender sua expressão. E, aliás, você não tem muita sorte com namorados.

Mais uma vez o aviso de que deveria ter mantido minha boca fechada se fez presente, mas o que aconteceu não fora o esperado: a garota começou a rir, seus olhos pinicando, enquanto pequenas lágrimas escorriam.

_O que estou fazendo?_perguntou pra ninguém em questão, dando um pulo enquanto postava-se de pé.

Dois passos foram o suficiente para ela me alcançar.

Por incrível que parecesse eu não senti medo e percebi que realmente não havia motivo para sentir o mesmo, em instantes as cordas soltaram-se de meus pulsos.

_Sinto muito por isso._esclareceu, ajudando-me a me colocar de pé.

_Você é estranha._completei sorrindo e recebendo um sorriso com igual fervor.

_Alguém já comentou isso._garantiu_Agora vá. Não há porquê mantê-la aqui.

_Não tem medo? De que eu conte?_surpreendi-me ao perguntar, novamente incapaz de emudecer.

Ela deu de ombros.

_Você vai contar?

Apressei-me em negar com veemência.

_Então não há com o quê me preocupar._admitiu.

_Confia numa estranha?_questionei rindo, enquanto rumava até a porta.

_Você não é a primeira.

Não pude evitar rir de alívio e graça, enquanto deixava a cabana, a adrenalina muito viva por todo o meu corpo.

***

P.O.V Autora

_Você fez o quê?_gritou um Tristan atônito.

_Ela não me parecia uma pessoa ruim, além do mais, trabalho com meu sexto sentido.

Tristan olhava a garota com incredulidade lívida.

_Griffin, confiei em você armada para não permitir que ninguém a visse. Como pode chegar até mim e falar com naturalidade sobre seu encontro com Milah?!

Clarke não tinha a intenção, mas se viu rindo ao tom acusatório de Tristan.

_Você deveria ter mais senso de humor.

_E desde quando você tem senso de humor?!_questionou ele com os olhos esbugalhados.

Clarke respirou fundo, olhando-o de má vontade.

_Estava vendo alguém irrompendo pela porta? Há algemas nos meus braços ou facas apontadas em minha direção?_brincou ela, se sentindo um pouco renovada e, certamente, muito mais livre.

_Acredite: eu estou com vontade de algemá-la._garantiu o rapaz, incapaz de superar tamanho deslize da garota.

_Você não confia nela?

_Sim, mais do que em muita gente. Mas, ainda assim, foi a coisa mais estúpida que você já fez na sua vida.

_Acho que valeu o risco._admitiu Clarke, os olhos brilhando com algo indecifrável.

_O quê...?

A frase de Tristan morreu no segundo em que a porta se abriu e Milah adentrou o cômodo com uma pequena cesta de frutas na mão.

_Achei que gostaria de algo além de pão para comer._falou deixando a cesta sobre a mesa de Tristan e postando-se ao lado de Clarke.

_Como ficou a roupa?_perguntando analisando os trajes de Clarke.

Tristan permitiu-se notar que as roupas de Selenia haviam sido substituídas por calças justas e blusas lisas, adequadas ao tamanho da Griffin.

_Bem mais confortáveis do que as anteriores._garantiu Clarke com um olhar agradecido em direção à garota.

_Quando você veio aqui?_irrompeu o rapaz aturdido.

_Enquanto você descansava na cabana de Lars._falou Milah com naturalidade_Aliás, bom dia Tristan._disse sorrindo de forma terna.

Tristan levou a mão ao rosto, incapaz de processar tudo.

_Até ontem..._ele suspirou fundo, vendo um sorriso brincalhão aparecer no rosto tranquilo de Clarke._você tinha uma queda para o suicídio, além de um desprazer em fazer novas amizades.

_As pessoas mudam._sugeriu Milah.

_A situação muda, mais precisamente falando._informou Clarke.

Tristan concentrou-se no rosto de Clarke, deixando Milah de lado.

_O que você tem em mente?_perguntou ele, incapaz de sentir o mal presságio de sua pergunta.

A garota endireitou a postura, sua imponência tão clara quanto Tristan lembrava-se na luta de Mount Weather.

_Vou voltar para o meu povo, Tristan. Devo isso à eles. Devo isso à mim também._encerrou, os olhos brilhando com o novo objetivo.

Milah percebeu a tensão no rosto de Tristan tornar-se uma angústia profunda.

De alguma forma ela enxergou aquilo que estava tão escondido.

_Você não pode._a voz de Tristan era calma e forte, embutida de uma frustração sem igual.

Clarke o olhou incrédula.

_Você não pode me impedir._retrucou a garota desafiadoramente.

_Eu posso._garantiu ele engolindo em seco.

_Acho que devem conversar sobre o assunto com calma._assegurou Milah, retornando até a porta e se despedindo de Clarke com um aceno.

A garota tornou a olhar Tristan, seus olhos faiscando.

_Vai me manter aqui para sempre?_questinou amarga, a leveza de antes perdida no tempo.

_Se for o preço para mantê-la viva._salientou Tristan se aproximando da garota e envolvendo-a em seus braços.

Clarke sentiu o sangue gelar com a aproximação.

Mal percebeu as cordas.

Foi um gesto rápido e preciso. Não era a toa que Tristan era considerado um grande guerreiro.

Em segundos Clarke estava novamente presa e amordaçada, enquanto se debatia em fúria.

_Não posso permitir que se machuque.

A resposta de Clarke foi um grunhido abafado pelo pano em sua boca.

Sua última visão foi a de Tristan batendo a porta, enquanto a deixava no chão atada as cordas.

***

P.O.V Bellamy

_Ouviu isso?_Jasper parou, interrompendo a caminhada.

_Só consigo ouvir o som do meu coração latejando na minha cabeça._confessei cansado, o suor pingando por toda a parte do meu corpo.

Jasper voltou-se para mim, os olhos esbugalhados em atenção.

_Prepare-se Bellamy, não estamos sozinhos._advertiu baixo.

Logo em seguida um grupo de três pessoas irrompiam das árvores, velozes como o vento, precisos como mísseis.

Jasper atingiu a garota com um tiro, mas o segundo foi mais rápido e o atingiu com o cabo da espada, fazendo com que o rosto de Jasper se transformasse numa máscara de sangue.

Tentei ser o mais rápido que meu ombro permitisse, mas o cansaço estava por todo o meu corpo, impedindo-me de suportar muito mais.

Meu alvo errou metros, enquanto minhas próprias pernas me enganavam, tropeçando uma a outra.

Fui de encontro ao chão, grunhindo de dor ao sentir o solo de encontro ao meu ombro.

Não demorou para que uma pancada me leva-se a escuridão certa, aquela que tanto temia antes de reencontrá-la.

Meu último pensamento se concentrou em O e Clarke, minhas responsabilidades.

***

P.O.V Autora

Lars correu de encontro à Karen, enquanto o sangue em seu braço ensopava toda a extensão de sua camisa.

_Precisamos levá-la a Declan._gritou à Selenia que prontamente se pôs em ajudar a garota.

Callen permanecia ao lado do corpo de Bellamy, olhando-a com interesse redobrado.

_Desde quando estão perambulando por aqui?_perguntou à Lars, olhando na direção em que Jasper encontrava-se inconsciente.

_Desde quando você sumiu. Achamos que eram os responsáveis pelo seu desaparecimento.

_Eu realmente espero que o alarde sobre minha "suposta" morte não tenha sido exagerado._reclamou Callen colocando-se a arrastar Bellamy pelos calcanhares.

Lars imitou o gesto, puxando Jasper com igual rapidez.

_Todos estavam preocupados. A comoção foi geral._informou Lars.

Callen respirou fundo, estressado por imaginar as centenas de perguntas que teria de responder.

_Estou vivo, como você bem pode ver._comentou seco, interrompendo qualquer pergunta que Lars tinha em mente.

Na entrada da aldeia, sobre uma densa camada de árvores, estava Tristan e outros guerreiros aguardando.

Callen soltou Bellamy de qualquer jeito e instruiu seus homens a levamos para dentro, no intuito de aprisioná-los para darem início ao interrogatório.

_Onde você estava?_grunhiu Tristan.

Callen respirou mais uma vez, tentando manter a calma que a tanto perdera.

_Estava numa missão.

_E não podia ter recrutado homens? Tinha que manter essa cabeça dura e partir sem olhar para trás?

Callen dispensou Lars com um olhar, enquanto ficava a sós com o irmão.

_Você não entenderia se eu falasse. Achei que o simples fato de saber como governo era o suficiente para você confiar em minhas escolhas.

_Você poderia ter morrido!

_Teria sido por um motivo louvável, acredite._garantiu Callen, quebrando a distância até Tristan e envolvendo seus ombros.

_Fica tranquilo, irmãozinho. Não vai se livrar de mim com tanta facilidade.

Tristan bem poderia ter aliviado sua tensão num soco, um que acertaria com precisão a cara de Callen, mas, a única coisa que fez, foi devolver o abraço com igual veemência.

_Vamos, temos um interrogatório para fazer._alertou Callen, sendo seguido pelo irmão.

_Quem são?_perguntou Tristan.

_Vamos descobrir._garantiu o outro, marchando firme em direção à aldeia.

***

_Não acredito que ele fez isso!

Milah estava de frente para Clarke, enquanto a desamarrava, uma carranca perpassava por todo o seu rosto.

_Eu não vejo a hora de ter uma boa conversa com ele._o sangue pulsava nas órbitas de Clarke,tamanha era sua fúria.

_Ok, eu entendo. Mas, agora, você terá de se preocupar com outra coisa._advertiu, ajudando a Griffin a pôr-se de pé.

Clarke esperou que ela continuasse, sem entender o tamanho da gravidade das palavras que Milah estava prestes a proferir.

_Dois rapazes do seu povo foram pegos no perímetro da aldeia. Estão aguardando para interrogatório.

As palavras cruzaram o ar com rapidez, atingindo Clarke com um precisão surpreendente.

_Como...?_as palavras travaram em sua garganta, enquanto seu corpo parecia não entender o comando básico de sua existência.

_Eu não sei ao certo. Fiquei sabendo e corri para contar à você. O que ouvi foi que estão com algumas escoriações. Mas mais do que isso realmente não sei._desculpou-se com um olhar triste.

Clarke assentiu, emudecida com a notícia.

_Eles..., o quê eles farão?_viu-se dizer esbaforida.

Milah entendeu a pergunta de Calrke, mesmo que a mesma tivesse saído desconexa.

_Nosso povo tem o costume de interrogar, em busca de informações importantes.

_E...?_insistiu Clarke, sabendo que o método não seria assim tão simples.

Milah corou de vergonha, mas tornou a continuar.

_Há...métodos de se obter informações.

_Tortura?_sucintou Clarke, o ar denso ao seu redor, impossível de se respirar.

Milah assentiu envergonhada com a própria brutalidade humana.

_E no fim? Qual é o fim deles?_implorou Clarke, mesmo tendo a resposta estampada nos olhos de Milah.

_Execução.

Não houve planejamento.

Clarke rumou para a porta, imaginando quem estaria em perigo, imaginando qual rosto conhecido estava prestes a contorcer-se nas mãos dos terra-firmes.

Milah brecou sua saída.

_Você não pode!

_Eu preciso! Não sacrifiquei tanto para vê-los morrer, enquanto me escondo feito um rato!_rugiu Clarke.

_Há outro modo, Clarke!_sibilou Milah, ganhando a atenção da Griffin.

_Do que você...?

_Vire-se._instruiu a garota, enquanto amarrava cordas no pulso de Clarke.

Milah passou a mão pelas madeixas de Clarke, prendendo-as em um coque no alto da cabeça.

_Tente parecer assustada._instruiu.

_Eu estou!_garantiu a Griffin.

_Não. Você está com raiva, com o sangue feito brasa sobre sua pele. Temo o que faria com uma arma em mãos.

_Conselhos?

_Apenas torne-se vulnerável. Pareça uma mosca perto de todos. Mesmo se reconhecer os prisioneiros você precisa se manter temerosa.

Clarke teve vontade de rir.

_E por quê devo fazer isso?

_Porque isso lhe garantirá o passaporte para libertar a si e aos dois rapazes de seu povo.

_Por quê parece tão certa disso?_questionou a Griffin, atônita com as instruções de Milah.

A garota limitou-se a sorrir.

_Ninguém desconfia de uma garota ingênua, acredite._salientou, enquanto abria a porta e marchava com Clarke como prisioneira.

***

P.O.V Tristan

As duas balaustras de madeira estavam lado a lado, em ambas um corpo se segurava para não despencar ao chão.

O rapaz magricela, o rosto coberto pelo próprio sangue, já estava sem camisa, pronto para receber os castigos, caso não fosse útil.

Na outra balaustra a cabeça do homem pendia para frente, um corte extenso e infeccionado cobria grande parte de seu ombro, enquanto o corpo do homem tentava manter-se de pé.

Engoli em seco, tamanha era a gravidade a qual tratávamos intrusos.

_Ele parece mal_murmurrou Lars ao meu lado, enquanto encarava o segundo homem.

_Não durará muito._comentei.

Lars expirou forte, uma veia em sua testa pulsando forte.

_O que foi?

_Não acredito que somos tão desumanos._falou entredentes, a amargura corrompendo sua bondade.

_Não podemos negar quem somos._murmurei a contragosto, entoando a frase que tanto Callen tentava convencer-se.

_Poderia ser ela ali.

Não precisou que Lars falasse o nome. Eu sabia de quem ele estava referindo-se.

_Não permitiria isso._soltei sem pensar.

Lars cravou seus olhos em mim, enquanto tudo parecia se encaixar em sua mente.

_Não me diga isso, Tristan._implorou ele, os olhos esbugalhados encarando algo.

_Eu não conseguiria. Não poderia deixá-la morrer._confessei a contragosto, odiando que Lars visualizasse a parte que a tanto tentava esconder.

_Então temos um problema muito grande, amigo.

Não compreendi as palavras de Lars até vê-la.

Milah trazia Clarke amarrada, enquanto a mesma tropeçava em seus próprios pés.

Senti todo o meu corpo reagir a choque.

Os olhos de Clarke encontraram os meus e neles vi vulnerabilidade e medo, tudo aquilo que ela tanto esforçava-se em esconder.

Seus olhos me abandonaram tão rápido quanto me acharam.

E o resultado não foi nada agradável.

***

P.O.V Bellamy

A luz da lareira era a única coisa realmente nítida.

O restante se movia como um borrão, enquanto gritos cortavam a noite, ecoando um pedido por justiça, um pedido de morte.

Não compreendi a comoção de vozes assim que ela iniciou.

Estava cansado demais para olhar, mas a voz de Jasper me despertou como um alarme.

_CLARKE!

Meus olhos devoraram a multidão, recuperando o restante de força que ainda detinham.

O azul encontrou os negros e tudo finalmente se encaixara.

***

P.O.V Autora

Clarke sentiu centenas de olhos sobre si, analisando-a com cuidado.

Do outro lado, Tristan e Lars prendiam a respiração, os corpos tencionados.

_CLARKE!

A voz de Jasper, tão conhecida quanto a garota lembrava-se, se fez presente, atraindo-a como um imã.

Gelo correu pelas veias de Clarke, paralisando-a por instantes.

Seus olhos correram para a figura ao lado.

Ônix contra o oceano.

Misturando-se.

Fundindo-se.

As mãos de Milah não foram o suficiente para detê-la.

Clarke correu como se não houvesse dezenas de espadas e lanças prontas para perfurá-la.

Ninguém a deteve.

Não precisava.

Todos estavam vendo o destino para o qual a garota corria: a morte.

Mas isso não a deteve.

Bellamy puxava suas amarras com fervor, algo arrebatador dando-lhe forças a muito perdidas.

Clarke livrou-se da corda frouxa de Milah.

Nada a deteria.

Naquele momento sua vida era um nada prestes a tornar-se tudo.

A garota agarrou-se à vida no momento em que seus braços circundaram o corpo do rapaz.

Bellamy teria sentido o impacto em seu ombro, mas estava ocupado demais recuperando aquilo que sempre fora seu.

Clarke levou as mãos ao rosto do Blake e deixou sua testa encosta-se a do rapaz, deixando que lágrimas molhassem seu rosto.

_Não chore, princesa. Vamos ficar bem._garantiu Bellamy, amaldiçoando as cordas que prendiam suas mãos.

Clarke assentiu, o rosto próximo ao dele como jamais imaginara estar.

_Por quê?_questionou fungando.

Bellamy não havia planejado a resposta, mas a mesma escapou de seus lábios com uma facilidade incrível.

_Porque minha alma e coração são inteiramente seus._confessou, o rosto retorcido em sofrimento.

Naquele momento, de frente com a morte, com expectadores ávidos por sangue, Bellamy sentiu que havia tomado a decisão certa ao abandonar tudo e todos.

No minuto em que os lábios da princesa se fundiram aos do rebelde tudo fez sentido.

Tudo estava bem.


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Notas finais do capítulo

Gostaram?
Odiaram?
Deixem sua opinião ;)
Bjs ;*