Nós estamos juntos escrita por Joana Guerra


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Capítulo curtinho, mas espero ter um tempinho extra para compensar.
Essa música tem estado na minha cabeça, não acompanhando só este capítulo, mas sim a história toda. Quem tiver oportunidade vale a pena conferir: Miguel Araújo – Recantiga
“E era eu, um passarinho caído no ninho à espera do fim
E eras tu, até que enfim, a voltar para mim.”
Pura poesia.
Let´s get this show on the road.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/600595/chapter/4

Gambiarra, 2008

Davi encostou a bicicleta e entrou na garagem que agora lhe servia de quarto e escritório. Apesar da mesada generosa que Jonas lhe dava, o orgulho de Davi não lhe permitia aceitar uma vida de luxo, que entendia não merecer.

Ele fechou a porta esperando encontrá-la à sua espera, mas nem sinal dela:

– Megan, cadê você?

Não obtendo resposta, resolveu procurá-la na cozinha e foi aí que se deparou com sinais de uma inundação de proporções épicas.

Seguindo o rastro do crime, encontrou uma Megan com cara de culpada tentando freneticamente desligar a máquina de lavar roupa.

Megan já tinha sido engolida por uma camada apreciável de espuma, que se estendia à sua volta, recobrindo os bons 20 centímetros de altura de água que ameaçavam transformar a lavandaria de Rita numa belíssima piscina interior.

– Minha Nossa Senhora! Megan! – disse Davi, que já estava quase sem vocativos religiosos para usar com ela.

Oh shit! – disse ela eloquentemente.

Uma semana antes, Megan tinha sido solenemente despachada para casa de Davi.

Aos 13 anos, Megan conservava ainda muitas características da sua infância.

Com os seus cabelos artificialmente aclarados, mantinha-se naturalmente adorável.

Com a sua língua afiada, sentido de moda e ausência de sentido de comportamento aceitável em público era já um protótipo de it girl.

Só que o meio em que ela se movimentava não ajudava em nada. Com demasiado dinheiro e tempo livres nas suas mãos, Megan passava muito tempo em companhias muito pouco recomendáveis.

Era óbvio que a história não poderia correr bem.

Continuando a meter-se continuamente em encrencas que cresciam exponencialmente em complexidade e perigosidade, o seu grandpa Jack achou por bem meter-se no meio da situação.

Foi então que Jack e Jonas acordaram que Megan deveria passar uma temporada em casa de Davi (e fizeram Pamela torcer o braço e aceitar a situação). Talvez a convivência com o ajuizado garoto a fizesse tomar algum rumo.

E foi assim que Megan e as suas 8 malas tamanho Jumbo foram despejadas sem apelo nem agravo na porta de Rita e Dante.

A convivência com Megan nunca seria fácil, muito menos numa casa em que ela não tinha as mordomias a que estava habituada. Só que no processo Davi estava ficando doido.

Davi tinha agora 16 anos. De desenvolvimento tardio, só agora se começava a desenvolver e a abandonar o aspeto mirrado.

Um olho atento perceberia que ele tinha potencial para se tornar num homem muito bonito. Um olho atento, mas não o olho do próprio, que continuava a considerar-se pouco atractivo.

O seu azar é que a sua timidez continuava a impedi-lo de perceber a existência do sexo oposto.

Por outro lado, a convivência com os excêntricos Marra e as viagens que eles lhe tinham proporcionado, lhe tinham aberto os horizontes e o tornado mais capaz de se relacionar com o próximo.

Durante aqueles anos Davi tinha sido o segredo mundial mais bem guardado desde o terceiro segredo de Fátima.

A seu pedido, os Marra protelaram sucessivamente o anúncio público da paternidade de Davi e tinham permitido que Davi continuasse a viver a maior parte do ano na Gambiarra.

A liberdade que Davi tinha não tinha preço, mas ele se sentia obrigado a contribuir para a sua boa sorte da melhor maneira que podia. Por isso, com tão tenra idade, era já muito engajado como activista social, sendo monitor na PLUGAR e ajudando todos que na comunidade precisavam de auxílio.

Megan estava dando cabo da sanidade mental da família de Davi.

Começou pelo fato dela passar horas no banheiro que ela supostamente dividia com Davi e Matias. Mesmo com os dois garotos aflitos para usar o banheiro, Megan ignorava continuamente as necessidades básicas dos dois.

Rita não tinha visto inconveniente que Megan dormisse no colchão da garagem e Davi no sofá da mesma, já que Matias roncava como um trator, mas Davi descobriu que acordá-la era um esforço hercúleo:

– Davi, é de madrugada…- resmungava ela invariavelmente, virando para o lado.

Os trabalhos domésticos acabavam constantemente numa mescla entre comédia e tragédia.

Da primeira e única vez que Megan usou a cozinha, tentou fritar um ovo e quase fez explodir a casa.

– Mãe do Céu!- disse Davi, quando viu o caos.

– Sua tia vai ficar deitando faísca pelos olhos! – disse Dante, que tinha sido atraído à cozinha pelo cheiro a queimado.

Surpreendentemente Rita não ficou zangada. Por aquelas razões que a razão desconhece, Rita se tinha afeiçoado tanto àquela maluquinha, que mesmo do seu jeito um pouco bruto já a considerava Megan como uma filha.

Cada dia com Megan em casa resultava numa adrenalina equivalente à de andar de montanha-russa.

Como tinha sido o caso quando Megan resolveu utilizar uma máquina de lavar roupa pela primeira vez na vida.

Depois que Davi conseguiu desligar a máquina, aquilo que tinha sido a roupa de Megan jazia agora pelo chão da lavandaria, esperando um funeral condigno.

Roupa de alta costura, de um valor imoral, irremediavelmente estragada. Os deuses da moda estavam prestes a declarar guerra.

– Oh no, Davi. Meu casaco Givenchypoor thing. Meu vestido Missonii´m so sorry dear. – Megan se despedia amorosamente de sua roupa como quem se despede de um amigo defunto - Agora o que é que eu vou vestir?

– Megan, vê pelo lado positivo, você já estava chamando demasiado a atenção na rua com essas roupas.

Alright. So let´s go shopping!- disse já animada de novo.

– Megan, você sabe as condições do nosso pai. Cê tá de castigo. Isso significa sem dinheiro e sem cartão de crédito.

Boring. E o que é que eu faço agora?

–Eu te ajudo a limpar isso e depois te empresto umas roupas.

– Davi, boho-chic é tão dois anos atrás. E depois the colours baby boy, você nem sequer tem nada nude.

– Não tenho nada… ó pelo amor de Deus… bad girl , aceita a ajuda e começa a trabalhar com cores primárias: amarelo, azul…

Oh God, i´m screwed.- retorquiu ela, revirando os olhos.

Apesar daqueles anos de convívio era a primeira vez que Megan estava a passar tempo na Gambiarra.

Geralmente, quando ela vinha ao Brasil, ficava na mansão que os Marra tinham adquirido no Rio de Janeiro. Por isso, a experiência que ela estava a retirar daqueles dias tinha o seu quê de exótico para ela.

Querendo mantê-la afastada da imprensa, Davi apresentou-a ao pessoal da Gambiarra como uma estudante norte-americana de intercâmbio:

– Galera, essa é a Mmmm…. Margarete. - disse ele, sabendo de antemão que era um nome que ela odiava, quando a apresentou a todos da primeira vez que ela saiu à rua.

O olhar de ódio que ela lhe votou foi o suficiente para ele perceber que a retaliação dela não tardaria:

– Você tinha mesmo de escolher that name? You´re mean.- disse ela quando se encontraram a sós.

– Eu sou mau? Cê se lembra porque é que está aqui? Megan, você simulou que tinha uma bomba na sua escola pra não ter prova. Cê tem noção que nos Estados Unidos eles levam isso muito a sério. Sorte o Jonas ter abafado tudo ao oferecer uma biblioteca nova pra escola, mas o dinheiro não te vai livrar pra sempre das suas alhadas, bad girl.

Ele estava genuinamente preocupado com ela.

Ela pensou que sorte mesmo era a sua família não ter percebido que os problemas dela iam muito mais fundo do que eles tinham descoberto.

Sorte era eles não saberem que ela às vezes bebia às escondidas, sorte era não saberem que ela se dava com traficantes de droga e gente muito perigosa.

Sorte era os pais julgarem que só porque ela tinha 13 anos, ela continuava a ser a princesa deles.

Sobretudo a sorte dela foi que aquele ano de 2008, que tinha tudo para ser o ano em que ela se perdia, foi o ano em que ela se começou a encontrar. E tudo, ainda que ele não soubesse, graças a Davi.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Nesse capítulo só teve mesmo Megavi. No próximo espero encontrar mais caras conhecidas. Continuaremos em 2008 e no Brasil.
Um muito obrigada a quem tem lido e um agradecimento especial a quem tem comentado. Vocês são o motor desta história.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Nós estamos juntos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.