Colorful escrita por Isabelle


Capítulo 2
Capítulo 1 - Noah.


Notas iniciais do capítulo

"Eu acho que deveria ter um pouco mais de confiança
Em mim
Na minha pele
Me leve, me leve pra casa"

— Daughter



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Seus cabelos estavam agora presos em um coque que ela havia feito simplesmente com seu próprio cabelo. Essa era uma coisa feminina que eu sempre quis saber como era feita. Como bolsas, é uma coisa mágica, cabe de tudo dentro daquilo e parece que nunca tem fim. O universo feminino realmente é algo criado para bagunçar nossas mentes.

Seus pés estavam juntos enquanto ela batia os dentes uns nos outros. Seus olhos estavam vidrados no ambiente a fora, e desde que tinha entrado no carro ela não tinha parado de fazer pergunta sobre coisas aleatórias.

― Posso ligar a sirene? ― Seus grandes olhos focaram em mim.

― Não, você não pode ligar a …

O barulho da sirene estourou ao nosso redor, enquanto ela sorria encantada.

Meus olhos se locomoveram para ela e tentei parecer bravo, mas um sorriso tentava brotar no canto da minha boca. Ela era tão espontânea, tão natural. Ela tinha aquela eferverscência diferente.

― Ops. ― Ela sorriu mais ainda, e eu revirei os olhos. ― Posso apertar os outros?

― Sim, claro. ― Eu disse. ― Se você quiser passar o resto da sua vida numa cela, com vários caras ou mulheres usufruindo dessa sua cinturinha fina. ― Disse quando ela estava prestes a apertar o botão da frequência policial.

― Minha cinturinha fina?

― Sim, e dos seus peitos. ― Eu disse.

― Meus peitos? ― Ela disse me olhando de lado. ― O que tem eles?

― São peitos olháveis.

― Peitos olháveis? ― Ela me olhou diretamente. ― É policial, não devia ficar me secando.

― Sou homem, é da minha natureza, e você está usando essa camisola que é praticamente transparente. ― Eu disse virando uma esquina.

― Ela não é nada.

― Olhe por si mesma. ―Eu abri o espelho que havia no quebra-sol.

Seus olhos dilataram quando eu ligue a lanterna e ela viu que era verdade. Imediatamente seus braços se enroscaram envolta dos peitos, e eu soltei uma risada fraca.

― Não se preocupe em tampar. ― Eu disse e ela me olhou desconfiada. ― Estou falando, não precisa se preocupar.

― Eu estou usando uma camisola transparente, como não vou me preocupar? ― Ela perguntou.

― Não precisa se preocupar, porque eu já vi tudo que tinha que ver. ― Dei de ombros.

Ela me olhou como se tivesse insultada e me deu um tapa de leve no braço.

― Tudo bem, tudo bem. Eu não olho. ― Fechei os olhos por alguns segundos na rua em que eu já tinha analisado bem.

― Você é louco? ― Ela começou a puxar meu braço. ― Vai matar a gente.

Meu sorriso brotou no canto dos lábios, e eu abri os olhos.

― Então concorda que eu posso ficar com os olhos abertos?

― Sem olhar para meu corpo? Sim, você pode.

― Não prometo nada. ― Sorri, e ela fez uma careta.

Passamos por uma ponte escura em que o carro tremeu um pouco, e em alguns segundos toda a atmosfera do carro se modificou. Ela pareceu se calar completamente. Seus olhos focaram a escuridão como se alguma coisa terrível estivesse escondida, preste a atacá-la. Sentia seu coração pulsar mais rápido enquanto ela continuava fitando aquela rua, como se seu pior pesadelo estivesse prestes a se realizar.

La estava sua respiração abafada, como se ela estivesse tendo um ataque de pânico. Suas mãos começavam a suar e ela a passava lentamente pela camisola numa tentativa falha de esconder. Tudo a sua volta parecia estar petrificado, e aquilo me assustou mais que tudo.

Minhas mãos começaram a suar também, mas de preocupação.

― Você está bem? ― Eu perguntei, mas ela não respondeu.

Ela parecia estar petrificada, travada da mesma maneira, e só pude ter certeza que ela não estava quando lentamente ela fez um movimento com a garganta. Como se estivesse engolindo um cascalho doloroso. Seus olhos brilhavam, com lágrimas acumuladas.

― Ei, você tá bem? ― Eu foquei meus olhos nela.

A atmosfera ficou mais lenta, e ela encostou a testa lentamente no painel de instrumentos.

― S-s-sim. ― Ela gaguejou. ― Eu- eu estou bem.. ― Ela disse duvidosamente.

― Você tem certeza? ― Eu perguntei, mas ela não respondeu mais nada.

Seu corpo foi locomovido para a outra ponta do carro, e ela encostou a cabeça na soleira da janela. Seus olhos pareciam estar perdidos em um universo próprio, um universo muito obscuro. Não sei porque aquilo me intrigou. Eu era policial, deveria manter assim, uma carreira solo. Sem ter ela ali para me preocupar. Além do mais, já tinha meus próprios problemas.

Andamos mais alguns metros com uma avenida totalmente despida de carros ou qualquer tipo de automóveis. O céu estava acinzentado, com as estrelas todas cobertas por um véu, e mesmo assim isso parecia tomar a atenção de seu universo.

― Pare o carro aqui. ― Ela disse subitamente e eu parei.

Era em algum lugar muito escuro. No meio do nada. Não havia nenhum prédio, nem casas, somente um terreno baldio. Aquilo parecia muito estranho. O matagal estava mais ou menos a quase dois metros de altura, e havia alguns becos escuros mais para o fundo. Não parecia um lugar seguro, para uma menina como ela, vestida naquelas condições, parar.

― Você tem certeza? ― Eu perguntei analisando o lugar.

― Só preciso tomar um pouco de ar. ― Ela disse descendo do carro.

Seus pés descalços tocaram aquele chão totalmente preenchido de barro, mas ela não parecia ligar. Parecia que estava havendo um distúrbio em sua cabeça e em poucos minutos, todo seu mundo desabaria.

Aquela pele estava com as veias azuladas ressaltadas, seu cabelo tinha começado a desprender, e seus olhos parecia querer pular para fora de seu rosto. Sua respiração parecia estar presa, e ela realmente precisava de um hospital.

― Quer que eu te leve a um hospital ou alguma coisa? ― Eu perguntei sério.

― Não, eu estou bem, é só, é normal. ― Ela passou a mão pelo cabelo que caiu em mechas lentamente por seus ombros, deslizando até a cintura. Era uma confusão de cachos. Eu não tinha notado o quanto seu rosto ficava bem enquadrado naqueles cachos.

― Normal? ― Eu passei a mão pelos braços erguendo um pouco as mangas do uniforme. ― É algum tipo de ataque do pânico?

― Não, não é nada disso. ― Ela suspirou. ― É só uma tontura, umas coisas que me dão, tudo bem? ― Ela passou levemente por mim, e entrou no carro novamente.

Eu segui seus passos, e quando estava prestes a entrar também, um barulho chamou minha atenção em meio aquele matagal. Parecia um grito sufocado, o que me fez sentir uma dose de adrenalina.

Corri de volta para o carro e peguei a lanterna, esquecendo por um segundo que a garota continuava comigo. Meu coração disparava e eu sentia os passos dela atrás de mim. Junto com as folhas batendo contra meu rosto.

O cheiro de terra molhava se ampliava, e eu conseguia escutar os pequenos abafos e gritos entrecortados. Mas ela parou e eu tive que parar. Seu rosto estava sem cor, e suas mãos cravaram as unhas no meu braço, como se precisasse de mim. Os olhos dela estavam assustados, e eu nem percebi o quanto ela devia estar desesperada comigo correndo de um lado para o outro em busca de um possível assassino.

― Você tem certeza do que tá fazendo? ― Ela perguntou sussurrando. Seu coração parecia disparado, e mesmo morrendo de medo, ela ainda demonstrava coragem.

― Acho que sim. ― Eu disse, e ela assentiu lentamente.

Nós dois percorremos no mínimo um quilômetro, no que não nos levou a nada. O suor desliza sobre nós, e aquilo parecia ter acalmado muito os nervos dela. Sua camisola estava toda grudada no corpo quando nós voltamos ao carro, e eu tive que me esforçar muito para não ficar encarando descaradamente.

― Acho que me fizeram andar no meio do mato a toa. ― Ela disse no seu tom antigo, anterior a sua mini crise.

― Eu jurava que tinha alguma coisa. ― Disse meio desolado.

― Ei, tinha um coelho, aquilo foi bem produtivo. ― Ela entonou sarcasmo, para me fazer rir, mas não funcionou.

― Me desculpe por ter te arrastado, poderia ter sido perigoso. ― Eu passei a mão no cabelo e dei ignição no carro.

― Que isso. ― Ela deu de ombros. ― Qual a graça da vida sem um pouco de perigo? ― Ela levantou as sobrancelhas.

― Acho que tenho que te levar pra casa.

― Três esquinas para frente, e duas ruas descendo a esquerda. ― Ela disse por fim, e eu evitei ficar encarando-a.

― Então, ― Comecei a movimentar o carro. ― O que faz da vida?

― Estou no terceiro ano de design na UFU, e trabalho nos fins de semana. ― Ela disse focada a frente.

― Como zeladora do térreo de um prédio? ― Eu perguntei. ― Ou como antena a cabo?

― Cala a boca. ― Ela revirou os olhos e bufou lentamente.

Desci pela rua que ela havia informado, e ela me fez parar em uma casa meio rosada com um muro extenso também meio rosado, mas fiquei confuso entre vermelho e rosa por já estar bem escuro. Haviam dois portões um menor, e um bem maior que era marrom, com alguns arabescos por ele todo.

Os olhos dela encararam a casa como se ela não estivesse nenhum pouco feliz de ter chegado ali.

― Não sei se vai ser um incomodo, com certeza sim, mas pode por favor, dar mais uma volta no quarteirão? ― Os olhos dela pareciam tão suplicantes que não havia como dizer não.

― Claro. ― Comecei a andar com o carro novamente.

Ela soltou um suspiro aliviada.

― Então, qual sua história de vida?

― Bem, tinha catorze anos quando fui vendida no mercado de escravo, depois disso fui adotada por uma mulher mexicana, morei lá por alguns anos, depois voltei para o Brasil me reencontrando com minha família verdadeira, e vivendo feliz para sempre. ― Ela disse e sorriu.

― Oh, a minha é bem parecido, mas meu corpo foi explorado quando tinha catorze... ― Ela não me deixou completar.

― Quem não exploraria um corpo desse. ― Ela disse e revirou os olhos. ― Eu iria em cana de boa, se você fosse o guarda que ficaria na minha cela.

Nós dois começamos a rir.

― Academia, e barras de cereal. ― Eu pisquei. ― Mas sua camisola, acho que deveria ser padronizada, toda mulher deveria sair de casa com uma camisola no estilo da sua. ― Eu sorri de lado.

― Você é um idiota.. ― Ela colocou novamente as mãos nos peitos.

― Sou policial, posso te colocar algemas agora, e te jogar na parte de trás daquele carro.

― Por que eu acho que isso não soou como uma ameça de policial?

― Porque não foi uma. ― Eu ergui as sobrancelhas.

Parei o carro novamente em frente a casa.

― Bem, fica pra outro dia. ― Ela colocou a mão na maçaneta. ― Obrigada pela carona seu guarda.

― Não foi nada, cara suicida.

― Não estava tentando me matar, já falei, que a única pessoa que quase matou alguém aqui foi você. ― Ela abriu a porta.

― Se cuide. ― Disse e olhei para aquela imensidão verde dos seus olhos.

― Tente não jogar meninas de prédios com muita frequência. ― Ela desceu do carro e sorriu.

― Vou tentar, mas não prometo nada, principalmente se elas estiverem com essa camisola.

― Acho que você gostou muito dessa camisola, se você quiser posso ter passar o nome da loja, e você compra uma igual.

― Sim, ai nós dois fazemos uma festa do pijama juntos o que você acha? ― Eu me inclinei para ver melhor seu rosto.

― Vou pensar no seu caso.

― Isso mesmo, pense com muito amor. ― Eu dei uma piscadinha.

― Estou entrando. ― Ela falou por fim. ― Obrigada mesmo pela carona.

― Não foi nada mesmo. ― Disse sutilmente.

Ela começou a andar em direção ao portão e tirou uma chavezinha de um dos bolsos que eu nem havia reparado que havia naquela camisola. Seu corpo estava bem delineado por conta da luz do poste, e eu sentia como se tivesse esquecido alguma coisa muito importante. Alguma coisa que ficava martelando nada minha cabeça.

Abri a porta do carro, e desci rapidamente, indo até ela.

― Esqueci uma coisa. ― Eu disse e ela me olhou assustada.

― Não, você não esqueceu, a gente nem se conhece.

― Exatamente, qual o seu nome? ― Eu disse, e ela sorriu de lado vendo que realmente nós dois haviamos esquecido aquela formalidade.

― Eu sou Sarah. ― Ela deu um breve sorriso. ― Mas me chamam de Sally.

― Eu sou o Noah. ― Eu olhei meio de lado. ― Mas me chama de Noah.

Ela sorriu.

― Por que diabos te chamam de Sally?

― Apelido de infância. ― Ela deu de ombros e passou os braços envolta do corpo se restringindo do vento gelado.

― Boa Noite, Sally.

― Boa Noite, Noah. ― Ela sorriu e abriu o portão.

― Ei, mais uma coisa, ― Eu estava um pouco nervoso. ― Preciso do seu telefone, caso precise pro trabalho..

Ela pegou a caneta do meu bolso, e anotou no meu pulso.

― Não gosto de comida chinesa. ― Ela sorriu e fechou o portão.

Sorri, e olhei para meu pulso com a letra borrada.

Sally B.

Nunca pensei que me envolveria em um problema tão gigantesco, apenas por salvar uma menina, que nem mesmo ia se matar.


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