A Fantástica Fábrica é invadida. escrita por dayane


Capítulo 20
Capítulo 19




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Willy Wonka, muito antes de conhecer Charlie Bucket, se sentia um monstro. Mais do que sentir, ele era. E mais do que ser, ele se julgava e também gostava de ser, modéstia parte, um monstro.

Contudo, tudo não passava de uma tentativa de proteger-se da falsidade da humanidade e dos espinhos que lhe fincaram ao roubar diversas fórmulas de doces. Ninguém quer ficar perto de um monstro. Ninguém sente que pode sobreviver perto de um monstro ou sobreviver a sua ira.

— Você não é mais um monstro, Willy Wonka! - Ele resmungava enquanto caminhava. - Não precisa mais ser e nem tem motivos pra ser!

Naquela noite chuvosa, quando qualquer vestígio de esperança tinha sido sugado de Charlie, Willy acordou. Precisou levar uns tapas, mas acordou. Ele finalmente tinha se tocado que Lane só tinha feito coisas boas para a fábrica e ele só tinha feito coisas ruins para ela, e a todos os outros, desde que ela invadiu o lugar.

O medo é o único despertador universal para todos os tipos de monstros humano. Só que é um despertador que nos deixa cego e ensurdece por um tempo indeterminado.

— Droga William! Por que você é tão burro? - O chocolateiro rosnou quando saltou o último degrau da escada do porão.

Então veio a vergonha que lhe travou com as chaves da cela na mão. Ele poderia, e devia, enfiar a chave na fechadura e destrancá-la. Devia pedir desculpas para a moça que estava lá dentro, machucada e arrependida e logo depois pedir desculpas para Dóris. Mas a vergonha é, quase sempre, movida pelo orgulho que nunca queremos ferir. Willy Wonka suspirou, deu meia volta e foi se encontrar com Dóris.

 

Ϣ.Ϣ.

 

Para falar com a Oompa Loompa foi mais fácil. Talvez por já conhecer ela ou por ela já conhecer ele.

Wonka bateu à porta da criaturinha, que saltou da cama e abriu a portinha de sua cabana. Eles se encararam, conversaram com os olhos tristes e arrependidos de todas as atitudes que tiveram durante aquela guerra curta e, por fim, se abraçaram.

Se desculpar com Dóris, fora bem mais fácil. Pois Willy Wonka aprendeu que não precisa usar palavras para se desculpar com os verdadeiros amigos. Você só precisa olhá-los e deixar que o coração sussurre o arrependimento.

Então, se a amizade for verdadeira, irão se abraçar da mesma forma como Willy e a Oompa Loompa se abraçavam. Irão sentir o coração do outro pulsando em mesma sintonia, independente da diferença de idade; deixarão que as lágrimas de alívio saltem de seus olhos e que a alegria saia em forma de uma frase: eu te amo.

Foi por isto que Willy se viu, novamente, diante da cela de Lane. A chave presa na mão, o coração martelando o peito e a insegurança lhe envolvendo os ombros.

“Você consegue, Willy”. Ele respirou fundo e engoliu a saliva. “Ou não”. Gemeu em pensamentos.

Apertou a chave contra a mão enluvada e olhou para a fechadura. O braço não se mexeu como ele queria, não fincou a chave naquele buraquinho e muito menos destrancou a cela.

— Senhor Wonka? - Houve um arrepio alucinante, quando Lane falou. A voz dela estava baixa e rouca, como se ela estivesse acabado de acordar. - Eu sei que é o senhor, senhor Wonka. Qualquer um, que não o senhor, já teria entrado ou se anunciado.

Willy permitiu que o corpo sentasse sobre o terceiro degrau da escada com as pernas longas e esguias cobrindo os outros dois degraus. Voltou a respirar fundo, tentando achar o que falar ou fazer naquela situação.

— Eu sei que é bobeira, senhor Wonka, mas quero te pedir desculpas.

Ali embaixo, era impossível escutar o barulho da chuva. Talvez da cela desse, mas o chocolateiro não se lembrava de ter colocado uma janela que desse acesso para fora da fábrica. Enquanto Lane ficava em silêncio, Willy ignorou o pedido de desculpas e caçou o projeto daquelas celas.

Tinha colocado um ou dois buracos em cada uma das duas celas, que eram interligados por um cano que levaria ar fresco. Logo, Lane não sabia que tinha chovido aquela noite, nem que tinha trovejado ao ponto de acordar Charlie. Também era impossível ela saber a hora, já que Willy tinha confiscado seu relógio de bolso – nunca imaginou ver um ser humano na atualidade, carregando um que verdadeiramente funcionava. Achava que era o único ser do mundo que ainda gostava de relógios de bolso.

— Não me arrependo de ter invadido seus sistemas, senhor Wonka. - Lane continuou pouco depois de uma pausa. - Nem de ter invadido sua fábrica.

Então, pensou Willy, agora curioso; do que ela tinha se arrependido?

— Mas – Lane tossiu e ficou quieta por um ou dois minutos.

Willy aguardou. Aguardou cada segundo do tempo que ela precisou usar para formular uma nova frase. Aguardou, pois, Lane era a única criatura que podia fazê-lo pedir desculpas e arrancá-la daquela cela. Era a única que tinha a paz para o coração e para a mente de Willy. Ela tinha começado aquela história, carregando assim por consequência, a obrigação de encerrá-la.

Wonka aguardou pacientemente, completamente concentrado naquela mulher que estava quase enlouquecendo-o.

— Senhor Wonka, se eu soubesse que você ia ficar cego ao ponto de machucar as pessoas que ama, eu nunca invadiria a fábrica e nunca deixaria que alguém o fizesse. Eu viveria para isto. Para impedir que alguém estrague a harmonia deste mundo único e fantástico. - Uma pausa. - Me desculpe, senhor Wonka, por ter destruído a harmonia do seu mundo. É só disso que eu me arrependo.

 

Ϣ.Ϣ.

 

Lane olhou para o telhado e aguardou os passos de Willy anunciarem a partida do chocolateiro. De seus olhos nascia um caminho fino e brilhante que, outrora, fora o guia das lágrimas que saíram em silêncio. Agora, tinha pedido desculpas à Wonka, mas sabia que nunca se perdoaria por ter feito aquela asneira. Destruir a vida de alguém era imperdoável, não era? Mesmo que tivesse todos os melhores motivos deste mundo, ainda se tornaria imperdoável, não é?

A porta se arreganhou com força e ela nem escutou o barulho da tranca. Quando girou a cabeça, para ver o que tinha feito a porta gritar eufórica, foi agraciada por Willy Wonka.

Um Willy Wonka, vestido com fraque e calça social, sapatos que brilhavam até no escuro e o cheiro de amendoim completamente viciante. Um Willy, que tinha olhos apavorados, como uma criança que descobre algo fantástico demais para o cérebro assimilar. Um Wonka, que estava correndo em sua direção.

Lane fechou os olhos com força, só para abri-los e ter certeza de que não estava sonhando. Então, foi parabenizada com um abraço quente, confortável e delicioso. Foi agraciada com um sopro quente que saía das narinas dilatadas de Willy e acariciava sua nuca. Foi, sabe-se lá por qual motivo, amada.

Nada daquilo deveria fazer sentido.

Assim como aquela fábrica e aquele chocolateiro.

“Chocolate é mágico, não precisa ter sentido” Charlie anunciou um dia, poucos anos depois de ser oficializado sua herança. “A vida pode imitar o chocolate em algumas coisas. E imita. Veja o amor. Ele é único para cada um e nunca faz sentido”.

Lane sentiu o coração derreter e vazar por seus olhos. Estava em forma de lágrimas e de um suspiro de paz.

— Obrigado, estrelinha. - O chocolateiro lhe sussurrou ao pé do ouvido. - Por ter amado minha fábrica, como Charlie e eu amamos.

Ele se afastou para arrancar as algemas dela. Tinha preparado um quarto e um roupão para que ela pudesse tomar um banho e verdadeiramente descansar. Depois, um Oompa Loompa cuidaria de sua alimentação e de seus machucados.

Willy tinha muito o que se arrepender, ainda. Muito por se desculpar. Mas, depois de observar todos os hematomas de Lane e antes de enviá-la para o quarto dela, ele precisou dizer:

— Seja bem-vinda, Lane Kenneth, ao meu mundo.

 


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