Bem, aqui estou para vos contar um dos capítulos mais estranhos de minha vida, talvez um dos mais complicados também, mas adiante...

Era dia de Natal, minha época preferida do ano, os candeeiros ganhavam uma cor especial e aconchegante, as luzes de natal eram como estrelas cadentes que se prendiam aos telhados e as restantes decorações pareciam ter aquela vida que só o Natal lhes dá. E numa dessas ruas, cheias de neve e montras enfeitadas, lá estava eu distraída com o que haveria de desejar, como todos os anos fazia, então, após me perder em pensamentos, me lembrei do quão só eu era. Uma lágrima escorreu pela minha face, nem eu sabia o porquê, afinal, eu já estava habituada… Sentia-me vazia, como se algo faltasse, o que me fez esquecer de algo importantíssimo, esqueci-me totalmente de atravessar na passadeira, e ao atravessar a estrada, ouvi uma buzina de um carro, ao olhar para o meu lado esquerdo vi duas luzes que se aproximavam de um modo assustador, me paralisando. Pensei que a minha vida iria acabar ali, e talvez fosse o melhor, assim não iria incomodar ninguém e nunca mais me iria sentir sozinha, mas foi aí que ela apareceu. Enquanto o ser saltava pareceu-me ver uma fénix, tão esbelta, tão ágil… Mas não consegui reparar em muito mais, pois perdi os sentidos. Não me perguntem porquê, talvez por medo, mas não me lembro de mais nada.

……

Voltei a mim estava numa cama de hospital, conseguia mexer-me, mas todo o meu corpo doía. Olhei em redor e notei numa garota desconhecida, devia ter a minha idade e estava lindamente vestida, com um pormenor, ela tinha rasgado aquele seu vestido de cauda branco que me lembrava minha salvadora. Apenas consegui perceber o que ela estava dizendo quando se apresentou após eu ter aberto os olhos:

— Finalmente acordou. Eu sou a Blue. – Ela disse com um sorriso e uma voz serena e amigável.

— Sou a Yellow… - Respondi assustada com o comportamento tão amigável daquela estranha.

—Estas bem, Yellow? O que deu em você para passar assim a estrada sem olhar? - Pergunto-me com uma voz reconfortante, mas preocupada.

—Eu...Apenas... Quero ir para casa… - Disse a ignorando, enquanto me tentava levantar, mas após uma dor imensa na perna acabei caindo no chão.

—Não a posso deixar ir sozinha para casa nesse estado, esse arranhão na sua perna necessita de ser desinfetado. - Ela disse carregando-me ao seu colo, me assustando.

— Mas a minha casa é longe… - respondi estranhando o comportamento tão amigável desta.

—Então é melhor pormo-nos a caminho, não acha? - Respondeu novamente com aquele sorriso deslumbrante e uma piscadela brincalhona.

Eu não consegui responder, a sua face me hipnotizou, sendo que eu apenas me deixei levar pelos seus braços fortes até minha casa, que não sei como, ela sabia onde era.

— Obrigada, a partir daqui eu fico bem. – Eu agradeci quando ela me pôs no chão.

— Ora essa, eu entro com você, não pode ficar sozinha, você foi atropelada. – Ela riu entrando comigo, não a expulsei.

— Você sabe o que aconteceu? – Perguntei estranhando um pouco.

— Claro. Não me diga que não me reconhece? – Ela sorriu.

— Para ser sincera… Não… - Fiquei um pouco envergonhada.

— Oh! Pois, se calhar você não me viu… Eu sou aquela que te salvou lá na estrada, lembra? – Ela esclareceu.

— Você? – Me passou um flash back pela cabeça – Pois! Faz sentido…

— Onde você tinha a cabeça? Quase morreu ali. – Ela disse preocupada, me fazendo sentar no sofá e depois se sentando do meu lado.

— Eu estava pensando… É que sabe, é Natal e… - Eu tentava explicar.

— Você vai passar o Natal sozinha, não é? – A garota anteviu o que eu ia dizer.

— Está escrito na sua face que você se sente sozinha, qualquer um poderia ver isso. – Uma de suas mãos começou a acariciar minha face, mas eu estava tão perdida em meus pensamentos que nem reparei.

— Mas ninguém viu… Só você. – Eu confessei.

—Talvez porque eu tenha reparado em você como ninguém antes. Talvez eu até goste de você de um modo que nunca ninguém gostou. – Ela seduziu.

— Como assim? Você não me conhece de lado nenhum! – Eu estranhei.

— Aí é que se engana. Eu tenho estado a observá-la já de há muito… Desde aquele dia na aula de ciências. Você estava tão bonitinha naquela bata branca… Tão fofinha… - Ela corou um pouco.

— Hum, estou vendo… - Comecei a sentir um certo desconforto.

— E foi numa das vezes em que te observava que descobri que o teu maior desejo era ter companhia este Natal. – Ela esclareceu.

Eu estremeci, era verdade, o meu desejo de Natal era aquele…

— Eu posso ajudar a realizar esse desejo. – Ela sorriu para mim de novo, com um sorriso bem brilhante.

— Sim? Como? – Eu meio que sabia como, mas queria saber o que ela faria…

— Deste jeito… - Ela se chegou um pouco para a frente me beijando nos lábios – Eu ficarei aqui com você, assim, não ficara mais sozinha.

Eu fiquei um pouco perplexa, mas senti uma sensação de conforto muito agradável. Eu não acreditava em amor à primeira vista, mas depois daquele momento… Era como se fosse possível, então me agarrei ao seu pescoço e devolvi o beijo, agora mais profundo e a abracei com muita força.

— Não tenha problemas, eu vou estar sempre aqui. – Ela lembrou.

— Não me deixe… Por favor… - Eu me aconcheguei em seu peito.

— Nunca, Yellow… Eu nunca faria isso… Eu vou estar aqui sempre. – Ela esclareceu acariciando meus cabelos morenos.

“Devemos sempre ter fé nos nossos desejos, pois se forem fortes, o destino vai encarregar-se de os realizar, por vezes, do modo mais estranho possível.”