Doce Fruto de um Passado Amargo escrita por XxLininhaxX


Capítulo 3
POV Camus/ POV Milo


Notas iniciais do capítulo

Pessoas lindas da minha vida T-T
Peço mil perdões pela demora XD!!
Acontece q minha vida tá uma correria que nem dá pra acreditar...
Trabalho de segunda a sábado sem horário fixo de saída (setor comercial é isso aí), comecei a fazer pós-graduação, faço aula de canto e estou começando um negócio... Isso porque existe a possibilidade de que eu comece outra pós ainda esse ano ¬¬
Estou sem tempo pra respirar XD!!
Mas eu não esqueci de nenhuma das fics, nem essa e nem a que estou fazendo com a Sarinha Myuki...
Só peço que tenham paciência, por favor XD
Um dia sai XD

Bom, sem mais delongas, espero que gostem do capítulo XD
=**
Boa leitura



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Claro que eu não esperava que ele fosse me aceitar de primeira. A situação era complicada demais para que eu pensasse que tudo se resolveria facilmente. Mas a declaração dele me deixou um tanto atônito. Por que raios eu seria o culpado pela morte de Natássia? Ela me enganou, me afastou do meu filho e eu que era o culpado? Não fazia o menor sentido. Claro que agora eu entendia as razões de Natássia, mas isso não quer dizer que eu concordasse. Tudo poderia ter sido diferente se ela tivesse confiado em mim. Eu era a vítima nessa história! Por que estava sendo acusado então?

– Hyoga, não diga isso. Eu já lhe falei que...

– Nós já conversamos sobre isso, vó. – Hyoga interrompeu a senhora Valéria.

– Espera um pouco. A culpa não foi...

– Não quero parecer grosseiro, senhor Milo, mas aconselho que não se intrometa. – Hyoga interrompeu meu marido que estava prestes a rogar por mim. – Eu não tenho nada contra você, afinal, você meio que foi inserido nessa situação por acaso. Mas esse assunto não lhe diz respeito. Por mais que você seja casado com meu pai, não lhe dou o direito de interferir. Você não sabe nada sobre o que aconteceu. Não creio que será capaz de apresentar um argumento imparcial.

Milo ficou calado. Eu fiquei sem reação. Aquele era meu filho? Aquele garoto arrogante e frívolo era meu filho e de Natássia? Aquilo seria um problema. Eu detestava moleques atrevidos como ele estava se mostrando ser. Quem ele pensava que era para falar assim com Milo e com a mulher que ele mesmo chamava de avó? Falta de respeito era algo que eu não toleraria de maneira nenhuma.

– Em primeiro lugar, meu jovem, não permito que fale assim com meu marido e com Valéria. São duas pessoas a quem você deve respeito. Em segundo lugar...

– Quem você pensa que é para me dar sermão? – ele me interrompeu. – Não ouviu o que eu disse? Apesar de termos laços sanguíneos, não vejo porque lhe tratar diferente de um completo estranho. Você não foi meu pai, não estava lá quando mais precisei. Não me venha dar ordens como se já fossemos extremamente próximos. Se eu estou aqui é porque não tive escolha. – ele continuava falando sem demonstrar o mínimo de respeito ou sentimentos.

– Pois está sendo injusto. Se eu não estive lá foi porque fui privado disso. – respondi.

– Privado? Não me faça rir! Eu ouvia muito bem minha mãe falando sobre o quanto vocês se amavam. Mas eu nunca entendi isso. Se você a amava tanto quanto ela dizia, por que a deixou partir? Por que não foi atrás dela?

Ele tinha um ponto. Eu realmente não cheguei sequer a procurar por ela. Fiquei tão magoado com o que ela fez, que não tive forças ou coragem para ir atrás dela. Eu não tinha desculpas para dar. Mas eu também não tinha como adivinhar que aquilo aconteceria. Nem sabia que ela estava grávida. Se eu soubesse, claro que teria ido atrás dela. Afinal, não seria mais um problema só meu ou só dela, seria um problema de nossa nova família. Era uma situação muito delicada para haver culpados e inocentes. Eu tive minha parcela de culpa e Natássia teve a dela. A questão é que nosso filho, inocente, foi quem teve o maior prejuízo. Isso eu tinha que admitir. E agora o que eu poderia fazer para compensar todos esses anos? Como eu me aproximaria do meu filho? Eu não estava lá para ver seus primeiros passos, suas primeiras palavras, seu primeiro dente nascer, seu primeiro dia de aula; nada! Eu não poderia voltar no tempo e, talvez, recuperar o que foi perdido seria impossível. O que eu realmente poderia oferecer para aquele jovem?

– Hyoga, meu filho, as coisas não são tão simples assim. – disse a senhora Valéria me tirando de meus devaneios. – Sua mãe não agiu de forma correta.

– Eu não disse que concordava com o que minha mãe fez, vó. Mas também não me conformo do meu pai tê-la deixado ir embora. Não é possível que ele simplesmente aceitou que ela fosse embora sem querer tirar uma única satisfação. Isso não se encaixa com toda aquela história melosa que minha mãe e você me contavam. – agora ele usara um tom debochado, o que me tirou do sério.

Você não tem o direito de falar nada sobre meu relacionamento com a sua mãe. Você não sabe de nada! – falei um pouco alterado.

E o que você sabe sobre o que aconteceu depois que ela partiu? Coloque-se no meu lugar! Não foi você quem a viu morrendo!

Ele também falou um pouco alterado e voltou minha atenção para um ponto que eu não havia considerado. Natássia morreu em um naufrágio e Hyoga estava com ela naquele dia. O que realmente aconteceu? Ele a viu naufragando junto com o navio? Se esse fosse o caso, então...

O silêncio se fez no recinto por um tempo. Eu apenas fiquei encarando meu filho sem saber o que dizer. O que eu diria naquela situação? O que eu poderia fazer para reparar toda a dor que ele carregava? Realmente eu não sabia de nada. Quando Natássia me abandonou, foi escolha dela. Por mais que tivesse doído na ocasião, eu ainda desejei que ela fosse feliz. Eu sabia que ela estava partindo da minha vida, mas continuaria vivendo. Eu não conseguiria imaginar a dor que eu sentiria caso, no momento que disse adeus, eu soubesse que ela morreria. E eu já era um adulto. Hyoga viu a mãe morrendo quando tinha por volta dos seus 4 anos. Uma criança não tem condições de suportar algo assim. E ele se viu sozinho em um momento tão delicado e sofrido. Apenas a senhora Valéria estava lá por ele, mas ela não era da família. Mesmo que ele a considerasse, ainda sim faz diferença na cabecinha de uma criança. “Onde está meu pai? Por que ele não está comigo?” Consigo ver perguntas como essas passando pela cabeça do meu pequeno filho. E eu não estava lá. Aquela revelação doía tanto quanto ter perdido Natássia naquele dia. Era como se a dor, há muito esquecida, estivesse voltando.

Senti a mão de meu marido em meu ombro. Ele olhava preocupado para mim. Pelo menos eu tinha em quem me apoiar dessa vez.

– Será que vocês sabem ser cordiais e nos levar até nossos quartos?! Não sei se vocês lembram, mas minha avó tem a saúde debilitada e a viagem foi bastante cansativa. Ela precisa descansar. – disse Hyoga.

Eu olhei para Milo e ambos estávamos confusos. Aquele garoto nos tratava como grandes estranhos, mas exigia determinada cordialidade e hospitalidade de nossa parte. Tinha algo errado com aquele jovem. Ele parecia agir de maneira forçada. Eu sequer sabia explicar. Eu queria poder conhecê-lo melhor. Será que ele era realmente detestável daquela maneira? Um filho meu e de Natássia? Não era possível que ele fosse assim. Ainda mais tendo tido Natássia como exemplo. Mesmo que tenha sido por pouco tempo, Natássia era uma mulher bondosa, carinhosa e extremamente educada. Não era possível que o filho dela fosse um moleque mimado e sem educação como aquele. Mas eu ia relevar. Claro que eu ia relevar! Tudo aconteceu de repente. Até mesmo eu não sabia como agir naquele momento. Tantas coisas a serem conversadas, tantas coisas a serem resolvidas. Nossas vidas mudariam completamente dali em diante. E a última coisa que eu queria era já começar aquela nova fase brigando com meu filho.

Resolvi dar ouvidos ao jovem e apenas deixar as coisas acontecerem devagar. Eu o colocaria na linha mais cedo ou mais tarde. Só precisava esperar a poeira abaixar um pouco.

– Muito bem. Vou levá-los até os respectivos quartos. Como não esperávamos por isso, espero que não se importem caso esteja um pouco desarrumado. Amanhã nós colocaremos tudo em ordem para que vocês se instalem permanentemente aqui. – disse já me virando. – Por favor, sigam-me.

Comecei a andar em direção às escadas, sendo seguido por Milo e os dois novos integrantes da família. Eu olhava para trás de soslaio, às vezes, e podia ver o cuidado que Hyoga tinha com a senhora Valéria. Nem parecia a mesma pessoa atrevida e arrogante de minutos atrás. Ele deu o braço a ela e ajudou-a a subir as escadas, mesmo que tivesse o corrimão para segurar. O jeito que ele olhava para ela demonstrava um carinho quase palpável. Dava para ver que ele a amava como uma avó mesmo. E não era para menos, já que ela o criou desde que Natássia morrera. Mesmo assim eu me surpreendi com aquele cuidado excessivo. Não era qualquer adolescente que, naquelas circunstâncias, teria aquele tipo de atitude. Parecia muito contraditório. Vendo-o daquela forma, eu me lembrava muito de Natássia. Ela sempre teve um cuidado extremo com o próximo. Sempre justa e amável. Sorri tristemente. As coisas poderiam ter sido diferentes. Mas dizem que não podemos escapar do destino. E após conhecer Milo, não tinha como negar que fomos destinados um ao outro. Só me entristecia o fato de que, para ficarmos juntos, essa tragédia teve que acontecer. Natássia não precisava ter passado por nada disso. Mesmo que ter um filho fosse algo que Natássia e eu planejávamos, Hyoga não precisava ter nascido para viver algo como aquilo. Eu só esperava que, de alguma forma, o destino parasse de brincar com nossas vidas e nos deixasse viver em paz a partir daquele momento.

Abri a porta do quarto de hóspedes. Como nós recebíamos visitas sempre, tínhamos dois quartos de hóspedes. Decidimos fazer mais um por conta dos amigos de Milo que volta e meia vinham dormir aqui em casa pelos motivos mais variados possíveis. O quarto não estava muito desarrumado, mas precisávamos dar mais alguns toques para que ficasse adequado e confortável. Hyoga entrou com a senhora Valéria e cuidadosamente a fez se sentar na cama. Ele colocou a bolsa dela em cima do criado ao lado da cama e fez questão de tirar os sapatos que ela usava. Aquela cena me alegrava. Até que de boca fechada aquele garoto parecia ser descente.

– Será que poderia me mostrar meu quarto? Preciso achar o remédio da minha avó dentro da minha mochila e já quero deixar algumas coisas arrumadas. – ele disse.

– Eu mostro. – disse Milo. – Camus, você fica aqui com a senhora Valéria.

Olhei para meu marido atônito. Milo tinha algo em mente. Eu o conhecia bem. Mas achei melhor não comentar nada. Até porque ele viria me contar depois. Apenas assenti com a cabeça e vi os dois saindo do quarto. Fiquei em pé apenas olhando para a senhora Valéria, que parecia encantada com o quarto.

– Qualquer coisa que precisar, pode falar comigo ou com o Milo. Não precisa sentir-se acanhada. Queremos que se sinta em casa. – falei tentando iniciar uma conversa.

– Vocês são muito gentis. Eu nem esperava que vocês fossem me acolher. Até comprei minha passagem de volta para a Sibéria. – ela falou sorrindo docemente.

– Permita-me repor esse valor. Não quero que tenha nenhum tipo de prejuízo, não mais. – eu falei sério e ela começou a rir de leve. – Algum problema?

– Perdoe-me. É que você é exatamente como Natássia descrevia.

– Espero que isso seja uma coisa boa. – falei com a expressão mais suave e me sentando ao lado dela.

– Ah! Claro que é. Natássia sempre falou muito bem de você. Do jeito que ela falava, fiquei até um pouco nervosa de te conhecer. – ela falou rindo da própria fala. – Você sempre foi o “homem entre os homens” para ela.

– Ela também foi a “mulher entre as mulheres” para mim. Não me envolvi com nenhuma outra, nem antes e nem depois dela. – falei com certa nostalgia.

– Fico muito feliz em ouvir isso. Natássia era como uma filha para mim e eu me sentia muito mal em ver que ela estava se sacrificando daquela forma. Mas agora, ao te conhecer, sei que não foi em vão. Sinto-me mais aliviada. – ela falava com um sorriso sereno no olhar. – É uma pena que ela não tenha vivido o suficiente para desfrutar desse amor. Só espero que pelo menos o desejo dela se torne realidade.

– E qual seria? – se ela tinha um desejo, eu queria poder realizá-lo.

– Que você e Hyoga pudessem se tornar realmente pai e filho.

Fiquei em silêncio. Lembro-me muito bem de Natássia falando sobre querer uma família e que ela me daria um filho. Eu nunca tive muita vontade de ser pai, já que o meu não tinha sido muito presente em minha vida. Mas ela falava com um brilho tão forte nos olhos que eu faria qualquer coisa apenas para vê-la sorrir. Por um lado eu ficava feliz por ter dado a ela o prazer de ter sido mãe, mesmo que por pouco tempo. Mas por outro me arrependia de não ter dado a família que ela tanto queria.

– Talvez seja pedir muito para você. – a senhora Valéria continuou, tirando-me de meus devaneios. – Você perdeu grande parte da vida de Hyoga e sequer sabia da existência dele até o dia de hoje. E para completar, ele ainda está com aquela idéia fixa na cabeça. Conhecendo-o do jeito que conheço, ele realmente não vai facilitar para você. Mas acredite! Ele é um bom garoto!

Não fiquei surpreso com o apelo dela. Claro que ela queria que nos déssemos bem. E óbvio que eu também queria. O problema era toda aquela tragédia que vinha por trás da nossa história. Não era algo fácil de ser esquecido. Natássia sempre foi importante em minha vida e eu imagino o quanto Hyoga devia ter sido apegado a ela. Nosso relacionamento sempre seria assombrado pelo fantasma de Natássia. Era até estranho pensar nela como um fantasma que assombrava, quando, na verdade, ela se parecia mais com um anjo da guarda. De qualquer forma, do mesmo jeito que ela era o que nos separava, também era aquilo que nos unia. Isso eu podia dizer com certeza e teria tempo para mostrar para meu filho.

– Não se preocupe, Valéria. Eu não pretendo dar as costas para meu próprio sangue. Imagino que esteja considerando que, pelo fato dele não facilitar as coisas, eu acabarei desistindo. Mas eu não sou esse tipo de pessoa. Creio que Natássia deve ter comentado, mas eu sou uma pessoa muito correta e não fujo de minhas responsabilidades. Se Hyoga é meu filho, eu irei criá-lo a partir de agora. E não existe nada que ele possa fazer para mudar isso.

– Oh! Fico tão feliz em ouvir isso! Eu realmente me preocupava com fato de você não aceitar. Estou muito velha e doente, logo, logo vou morrer. E Hyoga ficaria sozinho. – ela falava com os olhos marejados.

– Não diga que irá morrer. Você cuidou por muitos anos do meu filho, agora é minha vez de cuidar de vocês. Não se preocupe! Farei o que for necessário para que você possa viver por muito mais tempo.

Ela me sorriu com aquela declaração e me abraçou de repente. Eu fiquei um tanto sem graça no começo, pois não sou o que chamam de pessoa carinhosa. Porém, senti que de alguma forma precisava assegurar aquilo que acabara de falar. Abracei-a em retribuição.

~//~

POV Milo

Eu levei aquele moleque até o quarto dele. Graças aos céus estava tudo arrumado. Eu tinha que parar de deixar que Aiolia dormisse lá em casa. Ele sempre deixava tudo desarrumado e depois eu que tinha que ouvir de Camus. Enfim, eu ficava olhando para aquele projeto de Camus a minha frente. Era tão similar que chegava a doer. Um Camus já era difícil de lidar, dois seria quase impossível. Mas alguma coisa naquele garoto era diferente. Hyoga parecia ser mais sentimental que Camus. Talvez por influência da mãe, não sei. Mas alguma coisa me dizia que ele tinha algo enorme guardado dentro de si. E isso me assustava um pouco. Não sabia se Camus estava preparado para ser pai. Lembro que ele nunca foi muito de crianças e de adolescentes, então, tinha pavor. E, por ironia do destino, Hyoga estava se apresentando tudo que Camus mais detestava em um adolescente. Eu tinha que fazer alguma coisa. Eu era o campo neutro naquela história. Se alguém poderia mediar a relação dos dois, esse alguém era eu.

Hyoga, logo que entrou no quarto, já colocou a mochila na cama e foi tirando as coisas de dentro. Ele era muito organizado. Suas roupas estavam devidamente dobradas e assim elas permaneceram em cima da cama. Não consegui evitar o sorriso. Eu sentia que nós nos daríamos muito bem. Mas, antes de ter certeza, eu tinha que criar uma abertura.

– Pretende mesmo agir dessa forma? – comecei. Ele olhou para mim, curioso.

– Não foi o que eu disse? Quer que eu desenhe para ficar mais claro? – ele respondeu sem me dar muita confiança, continuando sua tarefa.

– Olha o respeito, moleque! Tenho certeza que essa não foi a educação que você recebeu. – eu falei sério, mas cauteloso.

Ele olhou para mim com uma expressão indecifrável. Fiquei até um pouco sem graça com a profundidade de seu olhar.

– Você está achando que será meu outro “pai”? – ele me perguntou de braços cruzados e com uma sobrancelha erguida. Tive que segurar para não rir, era idêntico ao meu marido.

– Não estou achando. Eu serei! – falei com firmeza.

Ele sorriu debochado e, logo depois, voltou a mexer com suas coisas.

– Interessante. Gosto da sua autoconfiança. – ele falou sem muita expressão no rosto.

– Você verá! Logo, logo estará me chamando de pai!

– Não duvido. – sua declaração me surpreendeu. – Acho mais fácil chamar você de pai do que Camus. Afinal, não tenho nada contra você e você parece ser alguém divertido de se socializar.

Fiquei meio sem saber o que responder. Não era bem essa a minha intenção. Eu apenas queria que ele soubesse que também gostaria de ganhar um espaço naquela família. Mas nunca pensei que ele pudesse me elevar a algo maior que Camus. Não entendi aquela mágoa dele. Ele parecia ser um garoto inteligente. Será possível que ele culpava mesmo o Camus por tudo que aconteceu? Será que ele não entendia que tudo não passou de um mal entendido?

– Você acha mesmo que Camus tem culpa da sua mãe ter morrido?

Ele parou e olhou para mim. Senti uma tristeza profunda naquele olhar. Ele parecia lutar contra algo dentro de si. Partia-me o coração ver alguém tão jovem com aquela carga negativa.

– Achei o remédio da minha avó. Vamos voltar porque preciso que ela tome no horário certo.

Ele começou a andar em direção à porta, mas segurei seu braço instintivamente.

– Você não me respondeu. – falei sério.

Ele me olhou profundamente, mas não aparentava estar intimidado ou sem jeito. Muito pelo contrário, seu olhar era firme.

– Eu não acho que preciso responder essa pergunta. Se você tiver um pouco de sensibilidade, com certeza terá a resposta que deseja.

Eu não entendi sua colocação, mas de alguma forma a resposta veio a minha mente. Não. Ele não culpava Camus. Eu sentia mágoa em sua fala, mas não sentia que ele estava acusando Camus de nada. Então por quê? Por que ele estava arredio daquela forma? Por que estava lutando em aceitar Camus? Não seria fácil decifrar aquele garoto. Eu teria que conquistar sua confiança, primeiro, para depois entender o que se passava naquela cabecinha.

Soltei seu braço e nos guiamos até o quarto onde estava Camus e a senhora Valéria. Ele não disse mais nada e sequer olhara em meus olhos novamente. Não senti que ele ficara magoado ou irritado com minha atitude. Só estava completamente indiferente ou, pelo menos, aparentava estar. Entramos no quarto e ele foi logo até onde a senhora Valéria estava. Sentou-se ao lado dela e mostrou o remédio.

– Está na hora, vó. Eu chequei a diferença de fuso para que você continuasse tomando no mesmo horário. – ele disse estendendo o remédio para Valéria.

– Deixe-me ver isso. – Camus tentou pegar a caixa do remédio da mão de Hyoga, sem sucesso.

– O que quer saber? – ele falou de forma ríspida.

– Apenas quero conferir a medicação para ver se é adequada. – Camus respondeu paciente até demais.

– Você não sabe de nada! Nem sabe o que ela tem!

Camus respirou fundo. Eu tinha certeza que se Hyoga continuasse agindo assim, Camus logo perderia a paciência, que já era pouca.

Escuta aqui, moleque! Você pode duvidar de mim no que você quiser, mas não permitirei que duvide da minha competência como médico! Quem não sabe nada aqui é você!

Camus pegou o remédio das mãos de Hyoga bruscamente. Eu senti que a senhora Valéria ficou um pouco desconfortável com aquilo. Achava que seria melhor se ela se acostumasse, porque, pelo visto, aquilo seria algo recorrente. Ambos ficaram olhando para Camus um tanto quanto surpresos. Eu já estava mais que acostumado com isso. Camus levava seu trabalho muito a sério e detestava ser questionado por quem não era do ramo ou quem não levava o trabalho com a mesma seriedade que ele.

– Esse remédio não é eficaz. Vou receitar outro para a senhora que será muito melhor. – Camus colocou o remédio na escrivaninha e pegou o remédio da mão da senhora Valéria, delicadamente.

– Baseado em que você está falando isso? Fez algum exame nela? Ao menos sabe qual é o problema de saúde que ela apresenta? – Hyoga falava um pouco mais recluso agora, mas ainda em tom desafiador.

– Sua avó não precisa de um remédio forte desses para o coração. Tudo que ela precisa é algo de controle. O problema maior é a pneumonia que ela adquiriu. Isso pode agravar rapidamente e ainda pode afetar o problema coronário de forma a fazê-lo piorar. – Camus falava friamente, em seu tom médico usual.

– Pneumonia? Ficou louco! Minha avó não tem isso! – Hyoga se alterou um pouco mais.

– Hyoga, ele está certo. – a senhora Valéria se manifestou.

– Como assim, vó? – Hyoga agora estava confuso. – Seu médico não me disse nada com relação à pneumonia.

– Eu pedi para que ele não lhe revelasse nada.

– Por quê?

– Porque o remédio para pneumonia ficaria mais caro e ainda teria que continuar com remédio para o coração. Não tínhamos condições de comprá-los, a não ser que eu parasse de guardar dinheiro para essa viagem. Eu sabia que você jamais aceitaria que eu não tomasse o remédio adequado, mesmo que tivéssemos que para de juntar dinheiro. Então pedi para que o médico não lhe contasse nada e deixasse as coisas como estavam.

Hyoga parecia pasmo. Camus e eu apenas nos entreolhamos com compaixão pela história daquela senhora. Era impressionante a que ponto ela chegou para cumprir a promessa que fizera à Natassia. Chegava a ser loucura.

– Você não devia ter feito isso, vó! É claro que eu não permitiria essa loucura se eu soubesse! O que aconteceria se você tivesse morrido?

– Eu não morreria. Não antes de cumprir o que prometi a sua mãe. – ela falava determinada.

Hyoga ficou calado. Sabia que não adiantaria discutir com ela.

– Quanto é o remédio para tratar da pneumonia dela? – ele virou-se para Camus, agora cabisbaixo.

– Isso não importa. Eu vou acompanhar o caso dela de perto e tratarei de pagar por qualquer coisa que seja necessária. – Camus respondeu.

– Eu não quero lhe dever nada.

– Não estou fazendo isso por você. É o mínimo que a senhora Valéria merece após ter se sacrificado dessa forma.

Camus levantou-se da cama e dirigiu-se até a porta, onde eu estava. Ele abraçou minha cintura e virou-se para Hyoga.

– Venha, meu filho. Sua avó precisa descansar agora. Logo trarei o novo remédio para ela.

Hyoga nada falou. Deu um beijo na testa da avó e saiu do quarto de cabeça baixa. Logo em seguida saímos todos do quarto.

– Obrigada. – Hyoga falou bem baixo, apenas para que Camus ouvisse.

Ele nem esperou uma resposta e já saiu em direção ao quarto, batendo a porta. Camus suspirou e eu lhe abracei.

– Relaxa, Camye. As coisas vão se acertar. Ele só está se fazendo de difícil. – falei.

– Assim espero. Nossas vidas já são muito conturbadas por si só para que tenhamos que lidar com um adolescente rebelde.

Continua...


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