Doce Fruto de um Passado Amargo escrita por XxLininhaxX


Capítulo 18
POV Shun/ POV Shaka


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas ^^/

Desculpem-me pela demora na postagem ú___ù
Infelizmente aconteceu algo muito chato comigo...
Eu já non estava muito bem e a algumas semanas atrás eu perdi a minha avó T-T
Fiquei muito arrasada e non consegui escrever durante um bom tempo...

Mas agora estou melhor e espero que consiga escrever mais XD
Non esqueci essa fic e faço questão de terminá-la, msm q demore anos XD
Bom, sem mais delongas, lá se vai mais um cap...
Espero q gostem...

Boa leitura XD

=**
^^v



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Eu tive que tirar o Seiya dali, senão meu irmão ia acabar trucidando ele. Eu sabia que ele merecia, afinal foi muita falta de noção falar daquela forma com o Hyoga. Mas eu não ia deixar meu irmão se encrencar com meus pais por causa de algo tão bobo. Além do que, Hyoga não parecia do tipo que precisava de alguém pra defender ele. De alguma forma eu até entendia o meu irmão. Ele tinha aquele jeitão tosco e grosseiro de ser, mas por dentro era alguém extremamente gentil e justo. Era visível que Hyoga não estava muito bem, diria até que estava péssimo. E meu irmão nunca gostou de ver alguém sofrendo perto dele. Com a história que tínhamos, não era de se estranhar que ele fosse assim. O problema é que ele não sabia como lidar com essas coisas, apenas tentava ajudar. Eu achava esse lado dele muito bonito. Eu admirava muito Ikki por toda coragem, força e altruísmo. Todos me conheciam muito bem para saber o quanto eu amava meu irmão. E tinha como ser diferente? Se eu estava vivo naquele momento, era porque ele havia feito de tudo para me proteger. Eu não sei o quanto eu teria sofrido se eu não tivesse meu irmão ao meu lado para me proteger. Eu devia a vida para ele. Mas também sabia que jamais seria capaz de compensá-lo por tudo que ele fizera por mim. E muitas vezes eu também não o compreendia muito bem, pois não tinha muita ideia de tudo que ele passou. Sim, eu estava lá o tempo todo, mas eu era muito pequeno. Não senti na pele muito do que ele sentiu. E nesse ponto, acredito, Hyoga seria de grande ajuda. Pelos olhos dele eu percebi que também era uma pessoa com muita bagagem. Talvez os dois pudessem se entender em meio a tanta experiência de vida.

Confesso que pensei muito em Hyoga desde que o vi pela primeira vez. Não negava; ele era muito bonito. Mas não era exatamente por isso que eu havia focado meus devaneios na pessoa dele. A verdade é que a história dele me comoveu muito. Seu Ikki se compadeceu de Hyoga, imagina eu com todo esse sentimentalismo que existia dentro de mim?! Mesmo tendo encontrado o pai, ele ainda parecia sofrer bastante. Eu até havia perguntado ao meu pai, Shaka, sobre a mãe de Hyoga, para tentar entender um pouco daquela tristeza que parecia tomar conta do olhar do loirinho. Do jeito que meu pai a descreveu, parecia até que um anjo tinha descido para a Terra a fim de dar a luz a Hyoga e voltar ao céu. Meu pai disse que ela era uma mulher muito guerreira e muito gentil ao mesmo tempo. Claro que ele era muito amigo dela, por isso eu sabia que ele jamais diria algo ruim. Mas ela com certeza era uma mulher especial, pois ela conseguiu cativar até meu padrinho, Camus. Não que isso fosse algo impossível, mas quem o conhecia sabia que ele era muito fechado e qualquer um que quisesse seu carinho teria que ser bastante paciente e persistente. Se ela era essa mulher magnífica que meu pai descreveu, com certeza deve ter doído muito quando Hyoga a perdeu. Eu não tinha condições de imaginar aquela dor, porque não havia conhecido minha mãe. Mas imaginava que deveria ser similar se caso Shaka ou Mu morresse. De qualquer forma, era algo que eu até preferia não saber. E tudo que eu poderia fazer para tentar ajudar Hyoga seria oferecer minha amizade.

Eu e Seiya descemos e fomos para a cozinha procurar algo para comer. Eu não estava exatamente com fome, mas fui obrigado a dar essa desculpa. Seiya também não parecia muito animado com a ideia. Mas se voltássemos pra lá, provavelmente ia dar briga. Eu tinha que pensar no que fazer. Senti meu celular vibrando no meu bolso e aproveitei o momento para dar uma conferida. Era uma mensagem de meu irmão. Estranho, ele estava logo ali. Ikki não era muito de mensagem de celular, então devia ser alguma coisa importante.

— “Shun, saí com o Hyoga. Vamos voltar em breve, isso é tudo que você precisa saber. Se algum dos adultos aparecer no quarto, apenas diga a verdade. Sei que você detesta mentir, então não se preocupe comigo. Apenas dê um jeito de enrolar o Seiya, porque ele é um idiota e pode dar com a língua nos dentes. Vlw!”

Saiu? Com Hyoga? Pra onde? Fazer o que? Droga! O Ikki sempre me metia nessas furadas. Será que ele não podia ter encontrado outro jeito de ajudar? Conhecendo meu irmão, provavelmente não. Suspirei pesadamente. Não adiantava ficar revoltado agora, provavelmente ele já tinha saído. E como eu ia enrolar o Seiya? Ele podia ser meio lento pra entender as coisas, mas eu não era exatamente a pessoa mais convincente do mundo quando se tratava de mentir. Olhei para Seiya e ele parecia entediado, olhando se tinha alguma coisa que ele quisesse comer. O que eu diria para ele quando a gente voltasse para o quarto e ele não encontrasse com Ikki e Hyoga? Talvez que eles deviam ter ido ao banheiro?! Mas juntos? Seiya não cairia nessa. Então o que? O que?

— Shun. – Seiya me chamou, tirando-me dos meus devaneios.

— Sim? – respondi, tentando ser o mais natural possível.

— Olha, eu não quero parecer chato com você, mas eu acho que não vou voltar pro quarto não.

— Jura? – eu falei um pouco empolgado demais, fazendo com que ele fizesse uma expressão de surpresa e desconfiança. Tentei disfarçar assim que percebi a mancada que tinha dado. – Por quê?

— Então, eu não fui muito com a cara desse tal Hyoga e se voltar eu vou acabar brigando com o Ikki. Meu pai disse que se eu aprontasse de novo eu ia levar a surra do século, então não tô a fim de criar confusão. Entende?

— Ah! Claro, Seiya. Se você prefere assim, tudo bem.

— Valeu por entender. Nem sei como você pode ser irmão do Ikki. Você é muito mais sociável que ele. Mas, enfim, a gente não escolhe parente, né? Vou nessa. Fui.

Ele saiu da cozinha e foi para a sala, onde todos estavam. Eu até gostava do Seiya, mas detestava quando ele falava do meu irmão. Mas não me importava, pelo menos eu não precisaria criar uma desculpa pra ele não ficar desconfiado com o paradeiro de Ikki e Hyoga. Nem quis ficar procurando por algo para comer, subi para o quarto e fechei a porta. Tudo bem que eu não precisaria mais enganar o Seiya, mas ficar sozinho dentro do quarto de alguém que eu mal conhecia também não era lá o que eu mais gostava de fazer. Sabe-se lá quanto tempo meu irmão ia demorar, então eu tinha que tentar arrumar algo para me distrair. Comecei a andar pelo quarto. Não devia ter muita coisa ali, afinal Hyoga acabara de chegar. Não que eu fosse do tipo que fica fuçando as coisas dos outros, mas eu não tinha muito mais o que fazer. Fui até a janela e olhei para a rua. Talvez eu pudesse vê-los chegando. O vento estava batendo nas folhas das árvores, trazendo um cheiro gostoso de natureza para dentro do quarto. A noite estava muito bonita. Se o objetivo de Ikki era distrair Hyoga, com certeza aquele era o cenário perfeito. Não tinha como não se encantar com aquela cidade, principalmente naquela região onde meus padrinhos moravam. Só esperava que eles não se distraíssem tanto ao ponto de perder a hora e demorarem muito para voltar.

Voltei-me para o quarto e deitei na cama. Senti que a fronha do travesseiro estava um pouco úmida. Será que eram lágrimas de Hyoga? Se fosse, com certeza ele havia chorado muito. Perguntava-me por que ele estava tão chateado. Quer dizer, apesar de tudo, agora ele estava com seu pai e Milo, que era uma pessoa excepcional. Ele deveria estar feliz por deixar todo o sofrimento que ele já tinha passado para trás. Eu sabia que não era tão fácil assim, eu tinha um exemplo em casa. Eu sabia que meu irmão ainda tinha pesadelos com tudo que nos aconteceu. Mesmo depois de tantos anos, ele ainda não tinha conseguido superar tudo. Claro que ele já tinha melhorado bastante, mas ainda tinha resquícios da dor que ele sentira. E já fazia anos que estávamos vivendo muito bem com Shaka e Mu. Ikki já acostumara com uma vida tranquila e cheia de amor e carinho. Hyoga nem tinha tido tempo de se adaptar ao novo ambiente ainda. E talvez demorasse mais do que todos imaginavam. Não sei por que eu tinha essa impressão, mas esperava estar enganado. Não só para o bem dos meus padrinhos, mas para o bem de Hyoga também.

Sentei na cama e fiquei olhando para o teto. Eu não gostava muito de ficar sozinho. Não sei se por que eu estava sempre com meu irmão, mas toda vez que ficava sozinho me dava uma sensação de vazio no peito. Será que era essa sensação que Hyoga sentiu a vida toda? Será que era essa sensação que Ikki sentira? Se fosse assim, com certeza eu não conseguiria suportar. E eu tinha que aplaudir quem conseguia lidar com aquilo. Era um sentimento de estar sendo sufocado e não haver ninguém para quem gritar socorro. Definitivamente, como dizia o ditado, fantasma sabe para quem aparece. Levantei da cama e ouvi o barulho de algo caindo. Abaixei-me e vi um colar no chão. Peguei-o e fiquei me perguntando de onde ele havia caído. Era um colar dourado, parecia ser uma joia, e tinha um pingente em formato de cruz todo trabalhado e com algumas pedras vermelhas e azuis cravejadas. Era um pingente um pouco maior que o normal e a cruz também tinha um formato diferente de um crucifixo comum; a parte de baixo era um pouco pontiaguda. Achei estranho. Não devia ser dos meus padrinhos, pois parecia um adereço religioso e nenhum dos dois era muito ligado a nenhum tipo de fé. Além do mais, parecia algo muito valioso para que estivesse guardado naquele quarto, seja lá onde aquilo estava. Então só podia ser de Hyoga. Era melhor que eu guardasse. Mas onde estava? Será que ele colocou embaixo do colchão? Provavelmente, já que caiu assim que eu me levantara da cama. Levantei o colchão para colocar o objeto de volta ao lugar, mas antes resolvi dar uma última olhada. De fato era algo muito incomum e bonito. Observei mais de perto para ver os detalhes da cravação e acabei percebendo algo estranho. Parecia que a cruz tinha uma abertura. Coloquei o colchão de volta e voltei minha atenção para o pingente. Puxei levemente a parte de baixo da cruz e algo soltou como se fosse uma capa. Terminei de puxar e surpreendi-me; uma lâmina.  Era como uma miniadaga. Por que Hyoga teria algo como aquilo? Quem teria dado um objeto tão peculiar para um adolescente de 14 anos? Era muito extravagante para que ele pudesse ter comprado por conta própria, além de ser perigoso, pois a lâmina parecia afiada. Coloquei o dedo na ponta, apenas para ter certeza, e acabei furando o dedo, que levei instintivamente à boca. Aquilo era realmente afiado. Coloquei a “bainha” de volta e levantei o colchão para colocar o objeto de volta no lugar. Porém, quando antes que eu o fizesse, ouvi a porta se abrindo. Rapidamente larguei o colchão e coloquei as mãos para trás, escondendo o colar.

— Shun? – era meu pai, Shaka, que estava acompanhado do meu padrinho, Camus. – O que está fazendo aqui sozinho?

— Onde estão Ikki e Hyoga? – tio Camus perguntou.

— Bem... é que... – vi meu pai cruzando os braços, já entendendo que algo estava errado.

— Shun, o que está acontecendo aqui? E nem pense em mentir, mocinho, porque você sabe que será muito pior pra você.

Minha boca secou na hora. Sim, eu estava ferrado. Muito ferrado. Meu pai já havia me avisado que eu me arrependeria se acobertasse essas coisas do Ikki de novo. Fiquei em silêncio, sem saber o que fazer; o que parece ter irritado meu pai.

Shun, eu não vou perguntar de novo! Acho bom começar a falar!

Suspirei pesadamente. Aquilo não terminaria bem.

— Ikki saiu com Hyoga. Não sei para onde eles foram, mas ele disse que voltaria o mais rápido possível.

O que? — foi a vez de o meu padrinho perguntar, com um tom de voz nada amigável.

— E você estava aqui, acobertando isso? Por que não foi me contar? – meu pai estava começando com as perguntas retóricas, o que era um mau sinal.

— É que... eu... b-bem... – eu comecei a gaguejar e meu pai suspirou.

— Ah Shun, quando você vai aprender que acobertar as coisas erradas que seu irmão faz não só prejudicam seu irmão como a você também?! – eu abaixei a cabeça e ele continuou. – Bom, mas não é hora pra isso agora. Quanto tempo faz que eles saíram?

— Já faz um tempinho, não sei ao certo. – respondi.

— O que pretende fazer, Camus? – meu pai voltou-se para meu padrinho. – Já peço desculpas antecipadas, porque sei que isso é coisa do Ikki. Apesar desse mau hábito dele de sair sem avisar nada, ele sempre volta. Quer esperar ou prefere ir atrás deles?

Pela primeira vez na minha vida eu estava vendo meu padrinho aflito. Ele suspirou pesadamente, passando as mãos nos cabelos, nervoso.

— Acho que não vai adiantar ir atrás deles agora, podemos nos desencontrar. Como parece que já tem um tempo que eles saíram, melhor aguardarmos.

— Também acho.

— Droga! Hoje não era um bom dia pra isso acontecer! Definitivamente não era! – meu padrinho estava começando a se alterar.

— Calma Camus. Tudo vai se acertar quando eles voltarem. – meu pai tentava acalmá-lo.

— A situação é um pouco mais complicada que isso, Shaka. Você nem imagina.

Meu padrinho virou as costas e saiu, provavelmente para tentar se acalmar. Meu pai suspirou cansado e logo voltou a atenção para mim, que continuava parado com as mãos para trás.

— Shun, Shun, Shun. O que eu faço com você? Pensei ter lhe avisado que se voltasse a acobertar seu irmão, não sairia impune.

Eu voltei a abaixar a cabeça. Era mais forte que eu, não conseguia trair a confiança de Ikki. Mesmo que isso significasse que eu ficaria encrencado com meus pais. Ouvi meu pai fechando a porta atrás de si. Olhei para ele assustado. Ele não ia fazer nada comigo ali... ou ia? Sentei na cama, minhas pernas ficaram bambas. Aproveitei para puxar o travesseiro atrás de mim e colocar o colar embaixo dele. Vi meu pai parado na minha frente com um olhar de decepção. Eu detestava quando eu sabia que era a causa daquele olhar. Mais do que as surras, vê-lo me olhando daquela forma já era um castigo.

Ele se sentou na cama ao meu lado e olhou bem dentro dos meus olhos.

— O que eu preciso fazer pra você entender que acobertar seu irmão é tão errado quanto as coisas que ele apronta? Assim, você me impede de tentar evitar qualquer besteira que ele faça. Imagina se, em uma dessas, seu irmão se machuca? Como você se sentiria? – ele dizia e eu abaixei a cabeça, pensando que era uma pergunta retórica. – Responda!

— Culpado. – respondi bem baixinho.

— Olha pra mim. – ele disse e eu obedeci. – Se você sabe disso, por que continua acobertando ele? Olha só a confusão que ele arrumou agora. Hyoga acabou de chegar e provavelmente já está encrencado com o pai. Entende que você poderia ter evitado isso se me contasse? Você se sente feliz com isso?

— Não.

Senti meus olhos marejarem. Droga! Não tinha pensado nisso. Dessa vez não era simplesmente meu irmão, tinha o Hyoga também. E eu sabia que, mesmo que ele estivesse muito triste, meu padrinho não abriria mão de discipliná-lo. Mas... Ikki provavelmente sabia disso também. Então por que insistiu nisso mesmo assim? Eu pensei que ele queria ajudar. Droga! Por que Ikki tinha que ser tão inconsequente?

— Meu filho. – meu pai me tirou de meus pensamentos. – Você sabe que dessa vez você não escapa, não é? Eu já tinha te avisado. – eu abaixei minha cabeça de novo e meu pai pareceu nervoso com aquilo. – Droga, Shun! Você sabe que eu odeio ter que fazer isso tanto quanto vocês odeiam que eu o faça. Eu amo você, meu filho! – ele segurou em meu rosto, firme, mas delicadamente. – Não importa quantas vezes eu tenha que dizer isso ou o quanto isso é clichê, mas dói mais em mim do que em vocês.

— Desculpa pai. – falei cabisbaixo e meu pai se levantou.

— Vamos resolver isso em casa. E eu espero, sinceramente, que essa seja a últi...

Ele nem terminou de falar, foi interrompido por um barulho que veio do lado de fora. Ficamos em silêncio e conseguimos ouvir uma conversa.

— Cuidado ou você vai acabar caindo. – era a voz de Ikki.

Vimos Hyoga entrando pela janela e logo em seguida Ikki também entrou. Vi que Hyoga ficou sem saber o que fazer e Ikki revirou os olhos.

— Eu tinha esperanças de que a gente voltaria sem que eles notassem nossa ausência. – ele disse, colocando os braços atrás da cabeça, de maneira despreocupada.

— Você tinha esperanças? Tinha esperanças? – meu pai já começava a se alterar.

— Ih! Lá vem. – Ikki revirou os olhos de novo.

Meu pai fez que ia começar a brigar, mas parou e respirou fundo, como que procurando a calma. Hyoga parecia atônito, completamente sem reação. Meu pai se aproximou dos dois e ficou olhando de um para o outro. Meu irmão parecia não se intimidar nem um pouco com o olhar severo de meu pai, o que acabou fazendo com que ele tivesse a orelha agarrada.

Ainda tem coragem de ficar com essa cara despreocupada?! Não tem noção do que faz não, moleque?!

— Solta pai! – Ikki falou, contendo a dor de ter a orelha puxada.

Meu pai soltou e voltou-se para Hyoga, enquanto Ikki massageava a orelha.

— E você? O que tem a dizer?

Hyoga pareceu se tocar do que estava acontecendo e encarou meu pai com um olhar bastante sério.

— Estamos errados, sinto muito por isso. – ele falou de forma muito polida.

Meu pai cruzou os braços e ergueu uma de suas sobrancelhas, tentando entender o que Hyoga estava querendo com aquela atitude.

— Será que eu posso conversar com você a sós? – Hyoga perguntou.

— Comigo? Não acha que deve conversar com o seu pai?

— Eu não tenho nada a dizer a ele. Pelo que ouvi falar dele, provavelmente não há nada que eu diga que justificaria o que fizemos de forma a não ser punido.

Fiquei olhando para Hyoga, curioso. Ele estava tentando fazer algum joguinho ou estava mesmo falando sério? Era uma postura muito estranha, contraditória, surpreendente. Se ele não ia tentar algo para evitar ser punido, o que ele teria para falar com meu pai em particular?

 

POV Shaka

 

Fiquei olhando para aquele jovem à minha frente. Eu já tinha visto aqueles olhos antes. Eram os mesmo olhos que Natássia tinha. Aquele olhar que dizia “eu sei que estou errada, mas preciso que escute o que tenho a dizer antes de me julgar”. Será que Hyoga era igual à mãe naquele sentido? Será que ele ia se justificar, mesmo sabendo que estava errado? Não parecia ser o caso. Ele mesmo afirmara que esse não era o objetivo.

— Tudo bem. Shun, Ikki, deixem-me a sós com Hyoga. – falei, sem tirar meus olhos do loirinho a minha frente.

— Mas...

Agora!— Ikki tentou dizer algo, mas eu o interrompi.

Vi Shun saindo do quarto, porém Ikki continuou ali, olhando para Hyoga com um olhar preocupado. Aquilo me surpreendeu. Meu filho não era o que poderia se chamar de sociável. Mesmo na escola ele não possuía nenhum amigo próximo, pelo menos não que eu conhecesse. Já havia perguntado a Shun sobre isso e ele me dissera que Ikki estava sempre sozinho ou junto a ele. Claro que aquilo me preocupava. Era importante que ele tivesse pelo menos um amigo para poder compartilhar coisas que, talvez, ele não se sentisse confortável em compartilhar comigo ou Mu. Além disso, não era bom que ele ficasse apegado ao irmão, pois isso acabava impedindo Shun de se relacionar com outras pessoas também, afinal Shun jamais deixaria o irmão para estar com outras pessoas. Aqueles dois eram muito ligados. Não que eu achasse ruim que fosse assim, mas achava melhor que eles também tivessem outros amigos. Seria mais saudável. De qualquer forma, senti que aquele olhar preocupado de meu filho para com Hyoga poderia ser o começo de uma mudança. Só não tinha certeza se Hyoga e Ikki juntos seria muito seguro. Eu não conhecia Hyoga ainda, mas como os dois tiveram vidas traumáticas, eu tinha receio que eles acabassem se identificando pelo lado errado. Ikki já não era muito consequente e responsável, se Hyoga entrasse no jogo dele, seria complicado para controlá-los.

Perdi-me em pensamentos e acabei me esquecendo de que Hyoga esperava para que conversássemos e Ikki ainda estava parado ali, como uma estátua.

— Você não me ouviu, Ikki?

— Ouvi, mas não estou com vontade de sair daqui. – e lá estava a petulância. Porém, antes que eu pudesse me manifestar, Hyoga resolveu intervir.

— Tudo bem, Ikki. Não se preocupe comigo. – ele disse calmamente.

— Quem disse que estou preocupado com você? Não acha que está muito confiante? – meu filho disse em tom provocativo.

— Ah! Se não é comigo que está preocupado, então é com quem? Acha que eu vou fazer algo com seu pai? Isso seria estúpido de se pensar, até pra alguém como você. – Hyoga falou sorrindo sadicamente, o que me chamou atenção.

Os dois ficaram se olhando de uma maneira estranha. Como se estivessem se desafiando. Eu não saberia dizer se eles estavam se entendendo ou apenas sendo indiferentes um ao outro. Mas não estava com tempo e nem com paciência para esperar que o joguinho entre eles terminasse.

— Anda logo Ikki! Não estou com paciência pra sua rebeldia gratuita.

Ikki desviou o olhar de Hyoga e olhou para mim de uma maneira que jamais pensei que aconteceria. Senti que ele me pedia para ser cuidadoso com Hyoga. Então ele voltou a olhar para Hyoga uma última vez, antes de deixar o quarto e fechar a porta. Aquela situação estava me deixando cada vez mais intrigado. Mesmo quando o irmão estava encrencado, ele não se atrevia a me pedir ou sequer demonstrar tal sentimento de preocupação. O que Hyoga tinha que fazia com que até meu filho se preocupasse daquela forma?

Voltei minha atenção para aquele loirinho. Vi que ele continuava olhando para a porta, dessa vez com um olhar triste. O que raios estava acontecendo afinal? Alguma coisa ali não se encaixava. Hyoga voltou o olhar para mim, ainda com uma sombra triste.

— Você deve estar pensando que eu e Ikki estamos construindo uma relação estranha, não é?  - aquela pergunta me surpreendeu.

— Não nego que isso tenha passado pela minha mente. Mas não é sobre isso que quer conversar, não é?

— Não. Na verdade eu queria te pedir um favor. Sei que nos conhecemos tem pouco tempo e admito que estou sendo abusado, mas gostaria que me escutasse pelo menos.

— Olha Hyoga, se for me pedir para conversar com o Camus sobre o que aconteceu, eu...

— Não é isso. – ele me interrompeu. – Não é um favor por mim que quero que faça.

— Então?

— Eu sei que você e meu pai são adeptos a métodos de disciplina muito similares. Por isso eu queria pedir para que, se pudesse, não punisse Ikki pelo que fizemos hoje.

Aquele pedido me intrigou. Por que Hyoga pediria algo assim por Ikki? Eles mal se conheciam. E tenho certeza que aquilo não era ideia de Ikki. Meu filho, apesar de ser inconsequente, sabia se responsabilizar pelos erros. Dessa forma, mesmo que ele não gostasse muito dos meus métodos, ele aceitava muito bem. Então por qual motivo Hyoga me pedia algo assim? Será que sair de casa tinha sido ideia dele?

— Por que me pede algo assim? Se você sabe que eu e seu pai somos parecidos nesse sentido, também sabe que dificilmente eu deixaria algo assim passar em branco.

— Eu sei, mas gostaria que pelo menos considerasse a possibilidade de não ser tão duro com ele.

— Está querendo me ensinar como devo educar meus filhos?

— Longe de mim, senhor.

— Então por que eu deixaria de disciplinar Ikki se o que ele fez foi errado?

— Porque ele não tem culpa de nada.

— Você o obrigou a sair com você?

— Bem, não. Mas...

— Então ele tem culpa sim. – o interrompi.

Sim, eu estava sendo rígido. Mas eu não podia aceitar um pedido daqueles sem que houvesse uma justificativa muito boa. Hyoga sabia disso, mas parecia não querer revelar o motivo de estar me pedindo aquilo. Eu estava disposto a ouvi-lo, mas ele teria que ser mais sincero que aquilo para me convencer do que ele pedia. Se eu fosse flexível, não conseguiria quebrar aquela resistência em ser introvertido.

Ficou silêncio por um tempo. Parecia que eu teria que ser um pouco mais drástico.

— Bom, se era só isso que tinha para dizer, já estou de saída. – virei e já ia dar o primeiro passo.

— Espera. – ele disse e eu parei, sem me virar para ele.

— Tem mais alguma coisa a acrescentar? – falei ainda de costas.

Ouvi-o suspirando pesadamente.

— Ele só queria me ajudar. – ele disse bem baixo e eu me voltei para ele.

— Ajudar? Levando você para sair de casa sem a autorização de seu pai? Não vejo como isso pode tê-lo ajudado.

— Amanhã faz exatos 10 anos da morte de minha mãe. – por aquela eu não esperava. – Você deve imaginar que não é uma data muito feliz para mim. Eu sempre fico extremamente deprimido nessa época. Por isso nem quis descer para ficar com Camus e Milo e receber as visitas. Ikki nem sabia disso. Ele apenas percebeu que eu não estava bem e propôs que a gente desse uma volta. Ele só estava tentando me ajudar, me animar. Eu sei que o jeito que ele encontrou pra isso não foi o melhor e nem foi de acordo com as regras, mas funcionou. Pela primeira vez nesses 10 anos eu consegui parar de chorar e sorrir nessa data. Pela primeira vez eu senti um calor no peito e não uma dor insuportável. Pela primeira vez eu senti que estava perto de minha mãe e não cada vez mais distante. Se você acha que ele não me ajudou, então não sei como ele poderia ter ajudado.

Fiquei em silêncio diante daquela declaração. Hyoga já estava com os olhos marejados e eu me senti abalado com aquela cena. Não conseguia imaginar o tamanho da dor que aquele jovem sentia ano após ano ao se lembrar da tragédia que vivera ainda pequeno. Eu poderia dizer que ele estava exagerando apenas para livrar Ikki da punição, mas ao olhar dentro daqueles olhos azuis cheios de tristeza, eu não tinha condições de desvendar qualquer sombra de mentira. Eu duvidava que ele fosse capaz de utilizar a morte da mãe para ajudar alguém que ele acabara de conhecer, por mais que eles tenham simpatizado um com o outro. E não é como se Ikki estivesse em uma situação terrível que necessitasse de uma ação mais drástica de Hyoga para tentar amenizar as coisas. Por isso não fazia sentido que Hyoga estivesse mentindo sobre seus motivos. E isso me deixou, por um lado, feliz. Ikki era sim inconsequente e, por conta de tudo que ele viveu na infância, tornou-se extremamente egoísta. Ele sempre fazia o que queria, quando queria e porque queria. Não costumava pensar em ninguém. Mesmo quando envolvia Shun, ele costumava ser mais cuidadoso, mas no final sempre fazia as coisas pensando só em si mesmo. E vê-lo fazendo algo pensando em outra pessoa, mesmo que tenha sido fora das regras, já era um grande avanço. Um sinal de que ele estava começando a ver a vida de uma forma mais saudável, mais leve. E isso já enchia meu coração de esperança de que as coisas pudessem melhorar.

Eu me perdi em meus pensamentos e nem percebi que Hyoga estava devastado à minha frente. Fiquei extremamente tocado com aquilo. Era como ver Natássia chorando e isso me deixava com o coração partido. Aproximei-me de Hyoga e limpei suas lágrimas. Ele olhou para mim, como que surpreso.

— Ver você chorando assim não me agrada nenhum pouco. – eu disse acariciando seus cabelos.

— Por quê? Você nem me conhece direito. – foi uma resposta um tanto quanto atravessada, mas eu sabia que ele não queria me ofender.

— Bom, eu tenho motivos pra isso, não é? Sua mãe era uma grande amiga minha e você, querendo ou não, é meu afilhado. É normal que eu me preocupe, não acha? – ele ficou calado e eu apenas sorri. – Você é exatamente como a sua mãe. Em um momento parece alguém maduro e seguro de si e no outro parece um menino precisando de cuidado e carinho. – eu me afastei um pouco, antes de continuar falando. – Vou atender ao seu pedido. Pegarei leve com Ikki, mas espero que entenda que sem punição não dá pra ficar. Você mesmo não conseguirá escapar do seu pai, então, não seria justo que Ikki ficasse impune.

— Tudo bem. Obrigado por me ouvir.

— Hyoga, quero que preste atenção no que vou lhe dizer. Sempre que você precisar de alguma coisa, qualquer coisa, não hesite em me procurar. Eu me sinto muito mal de saber que minha doce amiga não esteja mais entre nós e pior ainda porque ela partiu e eu sequer tive a chance de me despedir. Mas, também, fico feliz que ela tenha deixado pra nós alguém que manterá viva a memória dela. E eu farei o que for necessário para proteger você e ajudar para que você tenha a vida que Natássia gostaria que tivesse.

Ele não disse nada, apenas me olhava de maneira significativa. Aqueles olhos expressivos me fizeram divagar em lembranças de Natássia. Até que alguém entrou no quarto. Era Camus. Dei uma última olhada em Hyoga e achei melhor deixá-los a sós. Aqueles dois tinham muito o que conversar.

Continua...


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