Acordei muito cedo na manhã seguinte, os primeiros raios de sol entravam no quarto e Hans ainda dormia profundamente. Virei para o lado e tentei voltar a dormir; não consegui. Levantei e me arrumei, resolvi caminhar pelo castelo.

Às vezes encontrava com criados nos corredores, mas eles não perguntavam nada, apenas me cumprimentavam. Continuei caminhando, olhando as pinturas nas paredes, até que me deparei com uma que me fez voltar para olhar melhor. Era da família real das Ilhas do Sul, todos os treze filhos (Hans devia ter uns 5 anos) mais o rei e a rainha. O rei tinha cabelos loiros, mas muito escuros, olhos cinzas e algumas sardas .A rainha tinha cabelos ruivos claros e olhos verdes escuros. Ambos aparentavam ter mais de 40 anos.

Percebi duas coisas, Hans era o único dos filhos de olhos verdes e cabelos ruivos, e na moldura havia algo escrito:

"Arbor ex fructu cognoscitur."

Dei mais uma olhada na pintura e fui ler na biblioteca. Ela era grande, mas nada exagerado, escolhi um livro e ao procurar um lugar para sentar, achei o Duque das Ilhas do Sul lendo em um canto.
– Duque... Jorunn, não é? O quê faz aqui tão cedo?
– O mesmo pergunto da senhora, majestade.
– Acordei cedo hoje, não consegui voltar a dormir.
– Eu sempre acordo ao raiar, normalmente tenho muito trabalho, mas hoje estou aproveitando um dia de folga.
– Que bom. Hum, posso te perguntar uma coisa?
– Claro, Majestade.
– Há quanto tempo trabalha aqui no castelo? - perguntei, tentando puxar conversa.
– Desde que meu pai morreu, e isso já faz bastante tempo. Não sou muito novo, sabe? - ele riu - Vi todos os nascimentos do quarto príncipe em diante.
– É mesmo? E como era o relacionamento deles? - sentei-me ao seu lado.
– O rei e a rainha eram muito... "sérios", eles que me desculpem, mas nunca deram atenção aos filhos. Mas os meninos eram unidos, como irmãos devem ser. Exceto por Hans...
– O quê há com Hans, afinal?

Ele me olhou com um certo ar de tristeza.
– O rei e a rainha tentaram onze vezes ter uma menina. Mas vieram apenas filhos homens, e depois de alguns anos se passarem, tentaram de novo, e nasceu o Hans. Eles não aceitaram, ele era um inútil, o que era para ser e não foi. No entanto a rainha tinha um pouco de afeto por ele devido a ser o único com a cor do seu cabelo e olhos. Mas o rei não se conformava com isso...
– O quê aconteceu? - questionei, ansiosa.
– Ele arrumou outras mulheres, isso acabou com a rainha. E o que ela sentia de amor por Hans se esvaiu de vez, culpava ele por ter nascido menino e acabado com o casamento deles. O rei e a rainha se "reconciliaram" um tempo depois, mas tudo havia mudado. Ele era só um garoto! Um garoto tímido e ingênuo, que não conhecia o amor. Eu tentei ajudá-lo, mas um amigo não é o mesmo que pai ou mãe...
– Tentou ajudá-lo?
– Sim. Como quando Hans tinha 15 anos eu lhe dei Sitron, seu cavalo, para ser um companheiro para ele. Não sei se ajudou tanto, mas fez uma diferença.
– Foi muita bondade sua. - falei com sinceridade.
– Gostaria de ter podido fazer mais. Talvez nada disso tivesse acontecido... - o Duque começou, mas eu o interrompi.
– O passado está no passado.
Ele sorriu e olhou para baixo. Alguns segundos depois, recomeçou.
– Eu sinceramente espero que a senhora não tenha este destino, majestade.
– Eu? E por que teria? - ele deu de ombros.
– Nunca se sabe, tomara que Hans não seja igual ao pai...
– Ele não é!
– Certo, certo. Só não se esqueça do que eu disse, viu? Até mais. - ele levantou e saiu.

Fiquei atônita, tinha acabado de descobrir mais do que deveria. E ainda por cima ele sugeriu que Hans fosse igual ao rei! Que absurdo! Claro que não...

_____________