Dias de Liberdade escrita por Eagle Wings


Capítulo 2
Capítulo 1: Pois é, cheguei.


Notas iniciais do capítulo

Agradeço muito a o pessoal que mandou um feedback logo no prólogo, o que eu fato não esperava. O tamanho do capítulo é mais ou menos o que eu pretendo que seja dos outros também, então já podem ter alguma ideia.



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Droga. Droga Droga Droga.

Era tudo o que eu pensava enquanto ouvia vagamente o barulho abafado do despertador. Não dava para acreditar que as férias já tinham acabado. Simplesmente não dava. Coloquei a mão em baixo do travesseiro, peguei meu celular e esperei meus olhos se ajustarem a luz do visor. O relógio dizia ser 6 da manhã. Por que as aulas tinham de começar tão cedo? Gaúchos de merda.

Permaneci cerca de quinze sonolentos minutos fitando o teto do meu novo quarto até que foram necessárias todas as minhas forças para que eu finalmente levantasse da cama. Liguei a luz ainda tentando se ajustar à claridade, e olhei para a camiseta de uniforme que jazia sob a cadeira da escrivaninha. Até que não era tão ruim. Azul-marinho, larga o suficiente para ser confortável e com o não-muito-chamativo logotipo do colégio no centro.

Embora jamais fosse admitir em voz alta, uma pitada de nervosismo passava sobre mim. Primeiro dia em escola nova nunca é fácil, ainda mais no último ano. As aulas na minha antiga escola somente começariam em uma semana, mas mesmo assim me perguntei como tudo estaria sendo diferente se estivesse me arrumando para mais um primeiro dia lá. 70 ou 80 novas mensagens no WhatsApp e discussão em tempo real com as minhas amigas quanto aos fashion looks (que eu fingia gostar) para o primeiro dia, já que não havia regra de uniforme. Ou não. Depois de tudo que aconteceu no final do ano passado, provavelmente não estaria sendo muito diferente daqui. Por que eu tinha um dom tão especial pra estragar as coisas, por quê?

Já faziam 3 meses. 3 longos meses longe de qualquer tipo de festa, bebida alcoólica ou estimulante. Seria uma grande mentira dizer que não sentia falta. Mas também não estava em desespero. Talvez eu tivesse um pouco mais de controle do que julgava. De qualquer forma, assim que meus pais desistissem desse castigo ridículo, algumas pessoas que conheci no Tinder já haviam prometido me levar pra conhecer os melhores points. Mal podia esperar. Percebendo a pequena voz no meu subconsciente que ainda acredita nas minhas melhores ações, suspirei e fui colocar o uniforme.

Sem muito ânimo pra toda a interação social que teria de acontecer, me contentei vestindo um tênis vans surrado que não usava a quase um ano, calça jeans, a tal da camiseta que era obrigatória para todos os dias e uma touca beanie para não precisar perder muito tempo arrumando o cabelo. Embora liso, ele adorava insistir com o frizz. Pra não dizer que não estava nem um pouco interessada em me arrumar, também pus um colar com cordão de couro que na verdade caia muito bem. Aquilo provavelmente seria uma prévia do que eu usaria o ano todo. Simples e com uma leve cara de desleixo. O que era basicamente eu, mesmo que até agora poucos soubessem disso.

Essa era minha nova – e única – meta para o ano. Se eu me vestisse menos sobre as regras da moda atual e mais com o meu estilo pessoal, talvez não tivesse de esconder tanto o meu comportamento e assim não causaria tantas surpresas como no ano passado. De quebra, eu ainda poderia fazer alguns amigos mais a ver comigo, certo? Não tinha nada pra dar errado, a não ser o óbvio. É mais difícil de encontrar gente de acordo com estilos pessoais que gente que ama a moda. Ainda mais em uma cidade menor e possivelmente mais ultrapassada onde eu não conhecia quase ninguém.

Enquanto pegava minha mochila nova sem muito cuidado, coloquei nela um caderno novo que havia comprado no dia anterior, uma lapiseira e uma caneta. Se alguma outra coisa fosse estritamente necessária, daria um jeito depois. Mas provavelmente não seria. Qualquer outro tipo de coisa pode-se pegar emprestado com algum colega. Eu só precisaria causar uma boa primeira impressão a algum deles.

–--//---

“Bom dia”. Limpei minha garganta e disse enquanto aparecia na cozinha, para alarmar minha presença.

“Bom dia, Natalia.” Meus pais responderam. Eles estavam escorados sobre a mesa, tomando algo de suas canecas. Tive a impressão que os peguei no meio de alguma conversa importante, pois pareciam um pouco desconfortáveis de repente. Engraçado como se adaptar a casa nova estava sendo difícil. Os cômodos eram tão grandes e espaçosos que se fazia impossível escutar as conversas alheias, por causa da distância.

Enchi uma caneca com leite e achocolatado e tomei em dois goles. Meus pais continuavam em silêncio. Resolvi puxar assunto.

“Gostei da camisa. É nova?” Perguntei pro meu pai.

Ele soltou um leve sorriso e rearrumou a manga da polo listrada que estava usando. Eu não estava mentindo. Aquela roupa o deixou... estiloso. O que era esquisito de admitir se tratando do meu pai.

“É... tipo isso. ” Respondeu.

E o silêncio reinou novamente. A situação entre nós ultimamente sempre parecia desconfortável.

Quando eu finalmente desisti de permanecer na mesa encarando os dois, me levantei e me dirigi a sala de estar. Minha ideia era de ir a pé para o colégio, já que ainda faltava pouco mais de meia hora pra o inicio da aula e a distância não era muito maior que um quilômetro. Mas essa não era a mesma ideia dos meus pais.

“Aonde vai?” Minha mãe perguntou, tendo de elevar um pouco o tom de voz pra que eu pudesse escutar.

“Hm... Pro colégio?”

“Sozinha? A pé?”

“Por que não?”

“Porque você ainda está de castigo. ” Ela respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

“Até pra ir pra aula?” Retruquei.

“Como eu vou saber que você vai de fato pra aula?”

“Caramba, mãe. Credo. O que deu em vocês? Até quando vão continuar com isso? Parece que não me conhecem mais. ” Devo admitir que aquilo me preocupou. O controle deles estava... anormal. Não fazia nem sentido, já que eles sempre me deixaram beber e nunca pareceram dar muita bola, mesmo quando eu chegava em casa depois de amanhecer. Senti como se estivesse perdendo alguma informação ali. Eles sempre tiveram muito confiança em mim, e naquele momento eu quis bofetear a minha cabeça umas quinhentas vezes por ter estragado isso.

“Sem discussão. Eu vou te dar uma carona. ” Meu pai levantou e girou a chave do carro nos seus dedos.

“Tá bom então, chefia. ” Suspirei. Pelo lado bom, eu não chegaria soada no meu primeiro dia.

Desci as escadas da sala estar até a garagem, me escorando na parede enquanto esperava meu pai chegar. Assim como todo o resto da casa, o espaço era grande. Vaga para 4 carros, embora só duas estivessem ocupadas. Tanto a CR-V do meu pai quanto o Elantra da minha mãe brilhavam de tão limpos. Aquilo me lembrou de novo o lado bom de termos nos mudado. A nova proposta de emprego do meu pai era realmente ótima. Como um engenheiro chefe, ele trabalharia menos e ganharia mais. Muito mais. Além do mais, eu agora dormia em uma suíte muito maior do que eu esperava e o bairro era incrível. Não que eu fosse admitir, mas Porto Alegre estava tirando o meu fôlego. A cidade era tão linda que eu mal podia esperar pra ver como ficaria no inverno. Pelo que fiquei sabendo, a night também era variada. Tantas novidades me fizeram esquecer de São Paulo tão rápido que acredito que não voltaria mesmo se meus pais permitissem.

–--//---

Meu pai não disse sequer uma palavra até a metade do caminho. Eu também não. Fiquei com a cabeça mergulhada na janela, enquanto ouvia alguma musica do Green Day tocar no rádio. Eu não era muito fã da banda, mas a voz do vocalista era bem reconhecível.

“Então... a sua mãe vai sair agora de manhã pra uma entrevista de emprego na Zona Norte e não deve voltar até a tarde.” Ele pareceu hesitar. “Será que você pode voltar a pé? Ela quer que eu te dê carona no intervalo do escritório, mas é um pouco longe...”

Olhei pra ele com uma cara um pouco confusa, mas depois relaxei. Aquele ainda era o meu pai, pelo menos.

“Tudo bem, eu acho... Ela não vai ficar brava não?”

“Não se ela não souber. ” Ele me lançou uma piscadela.

“Perfeito.” Sorri.

Seu tom ficou sério de repente.

“Mas eu realmente preciso que você volte, certo? Direto. Posso confiar em você ? ”

“Pode pai, pode sim. Prometo. ” Desta vez, eu não menti.

Assim que paramos no cordão em frente ao Colégio Luterano, suspirei e desci do carro. Aquilo seria interessante. O prédio da escola tinha 4 andares, oque não era muito grande comparado a onde eu costumava estudar, mas o pátio com certeza. Dois ginásios, uma quadra de futebol em tamanho semi-olímpico, uma espécie de praça arborizada com um quiosque no meio (que julguei ser o bar), e uma igreja. Assim que entrei, percebi que a maioria dos alunos já haviam chegado e estavam fechados em seus grupinhos, no pátio. Não era muita gente, porém. 300, talvez 400 jovens.

A designação das turmas estava colada em um mural logo na entrada do prédio. Percebi que um pessoal que estava conversando por ali olhou pra mim, mas não dei muita bola e comecei a procurar meu nome pelos montes de papéis espalhados.

Depois do que pareceram mais de dez minutos, grunhi de frustração. Não conseguia achar meu nome em lugar nenhum. Uma linha no topo de cada lista dizia a qual série ou ano a turma se referia, mas nas duas turmas de 3 ano, ambas as quais as listas estavam lado a lado no mural, não havia nenhuma Natalia. Estava prestes a desistir quando uma voz falou alguma coisa ao meu lado.

Me virei e vi um garoto alto, de talvez 1,90 m , olhando pra mim.

“Han?” Foi tudo o que consegui dizer. Ele me tirou de um momento de concentração.

“Muitos nomes.” Ele apontou pro mural. “As vezes é difícil de encontrar o teu. Quer ajuda? ”

Olhei em volta. Só eu e ele estávamos ali.

“Sim, eu acho. ” Dei de ombros.

Ele riu. Era loiro, mas de olhos castanhos. Reparei numa tatuagem com o símbolo do Blink 182 bem a mostra no seu braço. Nada mal. A banda era boa.

“Me nome é Lucas, e eu tô no 3 ano. ” Ele estendeu a mão. Apertei sem muita confiança.

“Natalia. Terceiro, também.” Respondi.

“Ah, legal. É bem difícil entrar gente no terceiro. Provavelmente você é a única desse ano. ”

“Provavelmente. ” Não sei bem por qual motivo, mas lancei uma piscadela assim que respondi.

Ele deixou sair um sorriso leve.

“Então, qual é o teu sobrenome? ”

“Meu sobrenome?”

“É. Sabe, pra... ajudar a procurar.” Ele apontou pro mural de novo. Fiquei um pouco sem graça.

“Miller. Natalia Miller.”

“Tudo bem então, Natalia Miller.”

Ficamos em silêncio por um ou dois minutos, vasculhando entre os nomes nas listas até que ele apontou pra uma das inferiores. Como pensei que era de alguma outra série, não havia checado aquela. Parecia que havia três, e não dois terceiro anos. Meu nome estava ali.

“Ah, certo. Eu não tinha visto essa ai.” Soltei uma risada de leve.

“Sem problemas.” Ele riu. “Parece que não vamos ficar na mesma turma, mas eu posso te apresentar alguns dos seus colegas. ” Ele me dá uma piscadela.

Não sei por quê, mas naquele momento já deduzi que ele era bem legal. Não que eu estivesse interessada ou alguma coisa, mas fazer alguns amigos já de cara seria ótimo.

Assenti e deixei que ele me acompanhasse até o pátio. Quando vi, estava no meio de uma roda com 8, talvez 9 pessoas. Eles sorriram assim que o Lucas disse que eu seria sua colega, e pediram pra que eu me apresentasse. Isso vai ser interessante, pensei.


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Notas finais do capítulo

Agradeço a você que chegou até aqui ;)
O capítulo não está muito detalhado, mas acho que consegui introduzir um pouco do novo ambiente.

Criticas e sugestões são muito bem-vindas, desde que feitas com respeito. Feedback me faz muito feliz, então sintam-se a vontade para opinar.



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