Sol da Meia-Noite escrita por Manuela Freitas


Capítulo 1
Boneca de porcelana




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Eu estava desesperada. Não conseguia pensar, muito menos respirar. Era como se sentisse farpas em meu coração, uma angustia dominava meu corpo. Era como a morte. E perder quem eu amava, me parecia o pior que morrer.

-Querida? A voz suave e acolhedora de Esme me acalmou. –Teve um pesadelo? – Ela parecia um tanto apreensiva.

-Como sempre – Minha voz soou rouca. Sentei-me na cabeceira da cama.

-Pior que o último? –Sua expressão já mudara.

Balancei a cabeça. Quase não conseguia manter os olhos abertos e me manter sentada - Muito clichê. Não acha? – Especulei

Ela sorriu. -Ouvi sua respiração acelerada, quis ver como você estava. Fiz seu café da manhã, acho que estou começando a ficar boa nisso. Como uma mãe de verdade deveria fazer

-Melhor agora com você aqui. Pode acreditar - Respondi enquanto ela acariciava meus cabelos. –Não precisa ter o trabalho de fazer o meu café todos os dias.

-Shiu! Amo você querida. Todos nós amamos – Sua voz ficara mais baixa conforme ela saia do quarto.

Levantei da cama, estava chovendo forte. O chão parecia estar mil vezes mais frio que minha pele. Meu cabelo bagunçado, de um jeito no qual não sabia como tinha acontecido. Enquanto escovava os dentes pude ouvir Alice fazendo planos de qual roupa eu usaria no primeiro dia de volta as aulas.

“Que tal aquele casaco que você deu pra ela no inverno passado? Afinal, está um pouco frio” - Contestou Rosalie. Tentando falar baixo, na expectativa de que eu não as ouvisse.

“Até você Tia Rose?!” – Gritei do banheiro do meu quarto.

“Não era pra você estar ouvindo! A ideia era te obrigar!”. – Tia Alice não iria desistir, então não pensei em contrariá-la.

Desci as escadas. Não pude recusar o tão amoroso café da manhã de Esme. Ela sorriu, enquanto esfregava as mãos uma na outra. Feliz por ter usado a cozinha para algo que não seja enfeitar a casa.

Alice estava eufórica. Cantarolava enquanto colocava sapatos alinhados, possivelmente dando-me, pela primeira vez, a opção de escolher qual eu gostaria de calçar. Óbvio, somente com a sua permissão.

-Ela não vai se casar, não precisa de tanta preocupação. –Ria minha mãe. Papai segurava suas mãos. Pude ouvir risos baixos, quase impossíveis de escutar, para não insultar o furacão, chamado Tia Alice.

-Qual é, último ano, Renesmee, formatura – Ela nos olhou enfurecida – Olá?! Só eu me importo?

Todos riram.

-Será que é por que não é tão importante?! Abaixei a cabeça no intuito de amenizar meus risos.

-Calados! Qual ponto da parte em que precisa estar divina, você não entendeu? Coloquei a mão na cabeça, igual um sargento diante de seu general.

–Esse é o espírito Ness. – Ela fechou uma das mãos e soltou um leve sorriso.

-Sim senhora.

Alice bufou. Segundos se passaram e ela já voltara a me importunar com a questão das echarpes.

Assim que eu comecei o colegial decidimos nos mudar para um pouco mais longe da cidade de Forks, pouco mais longe de nossa antiga casa. A nova era maior. Cada cômodo parecia uma casa própria.

Carlisle havia mudado seu consultório para Seatlle, ele temia que em Forks, após sete anos, suspeitassem de seu não envelhecimento. Raramente ele e Esme iam a Forks. Os outros, já não viam um problema em visitar.

Poucos de sabiam que Edward e Bella tinham “adotado” uma criança á sete anos, somente Charlie e os Quileutes. Então eu podia frequentar a escola sem suspeitas. Eu era conhecida apenas como a sobrinha do antigo médico da cidade, Doutor Carlisle.

-Hora de ir pra escola querida. – A voz de papai trazia tanta calma e soava tão gentil que eu apenas balancei a cabeça. Mamãe piscou e sorriu.

-Eu não posso ficar em casa? – Alice quase voou em meu pescoço e quase me queimou com seu olhar. –Está chovendo muito – amenizei

- Desde quando você tem medo de água? - A voz surgiu pela porta da frente.

-Jacob! –Corri e o abracei. Eu não o via a mais de três semanas por causa de uma viagem da matilha, preferi não perguntar sobre o que se tratava. Jacob estava frio por causa de sua jaqueta molhada pela chuva. Tia Rosalie revirou os olhos e franziu o nariz.

-Quanto você cresceu desde que eu saí? –Ele riu.

-Eu nem tanto. Por outro lado, sinto como se meu cabelo crescesse dez centímetros por dia.

-Está muito bonito, ainda mais do que de costume. –Tive que concordar, meu cabelo realmente estava lindo, comprido, mais escuro, com mais cachos e mais definidos do que eram.

-Tudo bem, deixemos os reencontros pra depois. Ness querida, agora, roupas, olá?! Ela bateu palmas apressadas. Arregalou os olhos como fosse levar-me a força se eu demorasse um segundo a mais.

-Eu vou levar você hoje – Eu quis questionar Jake. Mas com vários olhos me fuzilando, aceitei.

-Renesmee querida, não se esqueça de esterilizar seu carro depois deixar o cachorro entrar. – Tia Rose cruzou os braços e olhou para Jacob e sem querer acabou sorrindo, levemente.

-É um desprazer ver você também, loira – A rivalidade entre os dois não me assustava nem um pouco, pelo contrário, era até engraçada.

Apressei-me. Tia Alice me deu um pequeno empurrãozinho enquanto eu corria para o meu quarto. As roupas já estavam sobre a cama, dois sapatos encostados no guarda-roupa. Uma jaqueta bege, uma calça jeans, uma echarpe marrom-escuro combinando com os dois pares de sapatos. Escolhi a bota.

Peguei a mochila, o celular e voltei á sala.

-Pensei que seria pior - Mamãe me olhou dos pés a cabeça – Coisas tipo paetê, salto alto, coisas do tipo Alice. -

Alice sorriu empolgada e deu de ombros.

Fomos à garagem, parecia mais uma concessionária. Fora Tio Emmett, que fazia questão de ter três carros.

-Depois as mulheres ficam com raiva quando falamos – Fiz sinal com as mãos de que não tinha ideia do que Jacob estava falando. Ele riu e apontou para parede, com um leve racho, bem na vaga onde eu carro ficava estacionado.

-Qual é Jake! Só uma encostadinha, nada que arranharia o carro – Eu parecia despreocupada, mas corri para olhar a traseira do carro, não poderia pensar na hipótese de ter arranhado meu presente do último aniversário, um Volvo xc90.

–Não é o que a parede pensa – Ele riu ao ver que eu o fuzilava com os olhos.

Entramos no carro, estava novo, eu mal o tinha usado durante as férias.

Jacob parou. Passou uma das mãos em seu joelho esquerdo. Olhou em volta e me encarou por dois segundos. Suspirou. Tocou meu rosto, extremamente pálido. Ao segurar a minha mão, me surpreendi.

Ele nunca tinha feito isso antes, não com aqueles olhos. As nossas mãos se encostarem como se gelo e fogo se chocassem. Eu pude ouvir seu coração desacelerar.

-O quê? – Minha voz falhou

-Não é nada. –Franzi a testa e suspirei. Ele retribuiu com um sorriso que durou um milésimo de segundo. Ficou sério novamente.

–É que você está cada vez mais com esse lance de metade vampira. Parecendo-me cada vez menos frágil. – Jake não soube lidar com as palavras.

“Qual é Jacob, me prepara pra dizer algo, como se alguém tivesse morrido, pra me dizer que eu cresci?” Agradeci que ele não pudesse ler meus pensamentos.

-Sinto muito senhor lobo, meu inimigo natural, oposto de minha pele fria. Não quis insultá-lo por me parecer, mas não ser, uma frágil bonequinha de porcelana. Nasci assim – Ele riu ao ver minha ironia.

-Gosto disso em você.

-“Disso” – Comecei a rir. –Pode falar Jake, vamos lá –.

Ele ficou quieto. “Vampira!”

Jacob percebeu que eu tinha ficado sem graça, apesar das nossas risadas. Eu não tinha esse tipo de conversa com ele, conversa sobre o que eu sou. Sobre minha parte imortal. Conforme os anos se passaram esse tipo de conversa havia sido extinto. Ele dirigiu até a escola. Ficamos em silencio, eu mal me mexia.

Franziu a testa ao ver meus amigos em uma roda na porta da escola, como se quisesse me deixar presa no carro.

-Você deveria estar feliz de me deixar em um lugar com gente normal. – Abri a porta, mas continuei sentada, o encarando.

-Estou feliz Nessie. – Ele mentiu.

Incomodava-me o fato de eu parecer sempre desprotegida. Desci do carro sem ao menos me despedir, afinal, eu o veria depois.

-Seria mais fácil me deixar trancada em casa – Pensei em voz alta. Envergonhei-me ao olhar para trás e ver que o carro ainda estava lá e que ele tinha escutado.

Em questão de segundos, pude ouvir dois gritos ensurdecedores. Zoe Morgan e Gwen Thompson já correram ao meu encontro e me abraçaram.

-Nessie, senti sua falta, você só me ligou duas vezes. Como você está? – Zoe estava ainda mais radiante e bonita do que eu me lembrava – Na fazenda onde eu estava mal tinha sinal – Continuou –

Zoe, sempre pura e alegre. Seus longos cabelos loiros encaracolados, caindo perfeitamente bem a sua personalidade meiga.

Eu sorri para ela, colocando uma mecha de meu cabelo atrás da orelha. Dei de ombros.

-Deixemos as meiguices e saudade para Zoe. Agora pode me dizer quem era aquele ser dentro do seu carro? –

Gwen era mais expressiva. Sem filtro com as palavras. Mas, amável do mesmo jeito. Linda, por dentro e por fora, jogava seus cabelos para trás frequentemente, que destacavam seus olhos azuis.

-Muitas perguntas para uma pessoa sonolenta. – Sorri forçadamente quase implorando para que parassem com os interrogatórios.

Zoe riu, me puxando para entrar. Gwen andava enquanto reclamava que não estava bonita suficiente para o primeiro dia. Lembrou-me Tia Alice.

Era aula de biologia. O professor Jhones fuzilava Gwen, enquanto ela jogava olhares para o aluno novo Andrew, que para ela e Zoe, era perfeito.

Joguei-me, de leve, para a mesa de Gwen, ao lado da minha.

-É Jacob. –Sorri.

- Jacob? Hum – Ela fez uma cara irônica enquanto levantava uma de suas sobrancelhas.

-O amigo da família. Aquele que me trouxe. – Ela arregalou os olhos, ficou surpresa ao pensar que um cara tão jovem fosse denominado assim.

Jacob me buscou, eu estava com o humor melhor do que na viagem de ida. Talvez por ter ficado constrangida com o que havia comentado. Conversamos sobre o clima em Forks, sobre carros. Tanto ele quanto eu tentávamos manter o assuntos, com coisas que ficam melhores sem serem comentadas.

-Bem vindos de volta, crianças. – Esme sempre doce, abria a porta e apontava a mão para entrarmos.

Jacob se virou para mim ironizando o termo “crianças”. Eu dei um leve tapa em seu ombro, mas não consegui ficar séria.

-Alice, pare de sonhar. Ninguém gostaria de ir para o deserto – Mamãe ridicularizava as ideias malucas de Tia Alice.

Jake me olhou, levantou uma de suas sobrancelhas. Começou a dar passos silenciosos, no intuito de que não nos escutassem. Assim ele poderia saber do que estavam discutindo.

-Eu tenho uma ideia melhor – Murmurei - Do que vocês estão falando?

Tia Alice saiu correndo para a cozinha, Jake estranhou.

- Onde está a sua naturalidade Alice? –

-Nada importante amor. –Se mamãe tivesse mentindo, eu não perceberia. Ela estava incrivelmente calma, sentada na poltrona ao lado de Esme, Rosalie sentada no braço do sofá e Alice gritava da cozinha, como se fosse necessário.

-Ah! –Tia Alice deu um grito de espanto, colocando as mãos sobre o rosto. Jacob deu um pulo e a encarou, dando um passo para frente. – Renesmee Carlie Cullen, onde está o seu echarpe? –

Bufei, me virei e fiquei de frente para Jake. Revirei os olhos, ele deu um sorriso torto.

Tia Rosalie ria. Ergui minha bolsa, indicando que estava ali. Alice fez uma cara de desaprovação e enquanto voltava para a cozinha deu um tapa no ombro de Rose.

-Onde estão o resto dos sanguessugas?

Olhei para o lado, Jacob ficou imóvel. Envergonhado.

-Onde você acha que sanguessugas fazem, cachorro? - Rose franziu a testa e tentou esconder um leve sorriso. Mamãe olhou para nós dois e deu de ombros.

-Bom, eu tenho que ir até Seatlle buscar umas coisas pro meu velho – Jake tentava fugir dos olhos da vampira loira que o fuzilavam – Você vem Nessie?

-Não, minha cabeça tá doendo um pouco. Vejo você depois? -

Ele sorriu e balançou a cabeça.

Enquanto ele saía pude ouvir os cochichos na sala, fui incapaz de entender do que falavam, mas sei que não quiseram que eu ouvisse.

-Sério? –Indignei – Agora temos segredos por aqui?

Minha mãe fez uma careta, enquanto Rose balançava a cabeça e não parava de rir.

-Vou faltar à aula de violão hoje – Eu passei a mão na cabeça. Mamãe não disse nada, apenas concordou. –Talvez dormir um pouco ajude.

Cada canto do meu corpo me fazia querer parar de andar e dormir e me deitar ali mesmo, nas escadas. Mas, minha mente me deixara prosseguir para o meu quarto.

Desmaiei em cima da cama, que fez um barulho de como se tivesse quebrado. Ouvi especulações na sala e quase não tive forças, mas gritei, dizendo não ter quebrado nada.

Dormi por horas, já estava quase anoitecendo, Carlisle, Papai, Jasper, Emmett e Jacob já haviam voltado, eu podia ouvir suas vozes ao assistir ao jogo de beisebol. Acordei meio desesperada, quando você não sabe onde está, mas mamãe chegou e só de vê-la, eu já me acalmara.

-Você está bem querida? – Ela sentou-se ao meu lado e pegou em minhas mãos – E a dor de cabeça, passou? –

-Sim. Parece que dormir por semanas.

Ela sorriu e logo mudou de expressão. Ficou séria.

-Parece estar acontecendo uma guerra lá embaixo. Deixe-me adivinhar: Jacob e Tio Emmett torcem pelo time contrário do resto?

-Quem consegue pará-los quando tem beisebol? –

Rimos.

-Então, o que era? Do que vocês falavam? – Ela fingiu não ter ideia do que eu falava.

Deu-me um beijo na testa. Então dei um sorriso, como se não quisesse obrigá-la a me contar. Ela segurou em minha mão e me puxou. Descemos as escadas e fomos até a sala.

Ela ficou em pé ao lado de papai, ele a puxou. Ela caiu em seu colo.

-Edward! – Ela gritou involuntariamente. Ele riu encantadoramente. Os dois se beijaram.

-Bom dia, dorminhoca. Pelo jeito você não vai ter sono de madrugada. – Ele me encarou – Ainda bem que eu trouxe vários filmes.

Eu sorri e me sentei ao seu lado.

-Não vou levar você á escola, só se você quiser.

-Obrigada Jake – Sussurrei. Ele abaixou a cabeça, começou a brincar com um chaveiro que estava pendurado e sua calça. Suspirei.

– Mas, se você quiser me levar. Aceito a oferta – Fiz um estralo com a boca, no intuito de chamar a atenção dele. Ele sorriu, me olhando surpreso.

-Que tal irmos de moto amanhã? A chuva parou –

Eu sorri, jogando uma mecha do meu cabelo para trás. Depois voltei a ficar séria quando percebi que Jacob não estava brincando.

-Moto? – O olhei como se ele fosse um louco, que acabara de sair do hospício. – Meus pais matariam você Jake. Sabemos que você não faz o tipo dos que andam devagar – Suspirei ao ver a expressão sarcástica em seu rosto - Além do mais, estão nos ouvindo – Continuei.

-Estão ocupados demais com o jogo. – Ele tinha razão. Parecia que iriam devorar a televisão a qualquer momento. – O que me diz? -

Sacudi a cabeça. Ele levantou a mão esquerda. Eu a olhei. Jake me encarou com seus olhos castanhos. Então ele pegou a minha mão e bateu contra a dele. Imediatamente vários olhos se voltaram contra nós. Como se o estalo de nosso cumprimento os despertasse de um sono profundo, chamado beisebol.


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