“E foi isso que aconteceu, Sol.” Havia contado tudo desde o dia da festa para ela. Aquilo estava me sufocando, precisava desabafar com alguém e ela era a melhor pessoa para me confortar.

“K, isso é muito sério.” Ele suspirara. “Mas eu tô aqui pro que der e vier, amiga.”

Eu estava realmente mal com tudo isso. Pedro, Zé... Eu não sei se aguentaria mais. Foi então que Sol, parecendo que lera meus pensamentos, iniciou.

“When your day is long
And the night, the night is yours alone
When you're sure you've had enough of this life
Hang on.

Olhei-a, com meus olhos marejados e logo algumas lágrimas caíram.

Don't let yourself go
'Cause everybody cries
And everybody hurts, sometimes.

Ela limpara as lágrimas que ousaram cair, acarinhando-me.

Sometimes everything is wrong
Now it's time to sing along
When your day is night alone
If you feel like letting go
If you think you've had too much of this life
Hang on.

Eu fungava, tentando sorrir algumas vezes para ela.

'Cause everybody hurts
Take comfort in your friends
Everybody hurts sometimes, sometimes...”

Ela terminara e não proferimos nenhuma palavra, apenas a abracei, agradecendo por aquilo.

********************

Alguns dias depois...

“E desde quando vocês estão...juntos?” Meu pai parecia confuso, não era para menos.

“Desde a festa, não é mesmo, K?” Zé mentia com facilidade, todos pareciam acreditar nele, menos o seu Gael.

“É, é sim, pai.” Já eu, tinha uma enorme facilidade para não passar credibilidade. Meu pai olhara-me desconfiado.

“E acredito que você veio até aqui pedir a mão da Karina, acertei?”

“Exatamente, mestre.” Como Zé conseguia levar aquilo adiante mesmo estando diante do seu “mestre”?

“Karina, você tem certeza disso?” Meu pai encarava-me.

“Te-tenho, pai.” Minha voz saiu trêmula.

“Então...Felicidade ao casal. Vou deixar vocês a sós, mas estou de olho!” Disse um pouco contrariado. Ele fizera um gesto típico, que em outros tempos me faria rir. Não hoje.

Meu pai percebera que algo estava errado, eu nunca iria ficar com algum cara da academia. Confesso ter sido apaixonada por um deles – o Duca – mas hoje ele é namorado da minha irmã, então não há nenhuma possibilidade de interesse maior. Meu medo era que ele descobrisse não do namoro falso, mas sim das fotos.

“Meu pai tá desconfiado!” Eu falava o mais baixo possível.

“Pois trate de se fazer o mais convincente possível, ele não ia gostar de ver aquelas fotinhas...” Ele rira, irritando-me. “E vá se arrumar, hoje vamos sair para jantar.” Impôs.

“Você só pode estar brincando...” Revirara os olhos.

“Karina, eu estou com cara de quem está brincando? Pois então vá se arrumar. Ah! Fique o mais gata possível.”

Respirei fundo, contei até dez, levantei-me e fui para o banho. Aquilo estava me martirizando, mas eu tenho que ser forte. Eu sei que vou virar o jogo e me livrar dessa chantagem. Pelo menos eu espero.

********************

POV PEDRO

“Pedro, para de andar de um lado para o outro. Vai abrir um buraco no chão.” Tomtom já estava irritada com a minha impaciência.

“Maninha, ela sumiu!”

“Agora você sabe como ela se sente. Você também sumiu por um tempo, lembra?”

“Mas foi diferente, era por causa do acordo.”

“Ela deve ter seus motivos, ué.” Dizia enquanto deitava em sua cama.

Meu coração disparara, o celular vibrara indicando uma ligação. Corri para atender, sem antes olhar quem era.

“Nossa, graças a Deus você deu sinal de vida!” Eu estava afobado para falar com ela.

“Tava com tanta saudade assim, Pedrinho?” A voz de Vicky inibira qualquer exaltação em minha voz.

“Ah, é você... O que você quer?”

“Paz, trégua, essas coisas. Preciso falar com você, podemos nos encontrar daqui a pouco?”

O que ela queria? Desistir do acordo? Muito bom para ser verdade! Mas não iria ficar perdendo tempo imaginando o que ela queria. Concordei com o pedido, anotei o endereço e arrumei-me o mais rápido. Não queria perder mais tempo.

Encontrei-a na entrada do bistrô que combinamos, ela falava ao telefone e quando me viu aproximar, tratou de desligar. Fizemos os cumprimentos e entramos. Nunca havia ido à um bistrô antes – mas bares eu conheço todos – e confesso ter gostado do ambiente. Tinha uma decoração despojada, com peças alternativas feitas com caixotes e garrafas. A música era boa, quando adentrei tocava Wave do Tom Jobim, um clássico.

Vicky conversava com um rapaz que acredito ser um garçom, que logo nos direcionava para uma das mesas. Fomos caminhando até o lugar indicado, próximo à mesa de um casal. Quanto mais próximos estávamos da mesa, mais longe eu queria estar. O casal que estava a nossa frente não era um casal qualquer, era quem eu não imaginava que estaria ali. Eles estavam se beijando, meu estômago revirara com a cena. Não podia ser verdade, eu não queria estar ali. Eu tremia de raiva, minha vontade era de quebrar a cara daquele infeliz. Cerrei os punhos, parei de frente para o casal.

“Karina!” Ela virou-se assustada e ele com uma cara vitoriosa.

“Pedro...” Ela disse visivelmente confusa.

“Que porra tá acontecendo aqui?”

“Pedro, não tá vendo que ela tá com o namoradinho?” Vicky disse num tom debochado.

“Você – apontei para Vicky – cala a sua boca que eu não tô falando contigo! Karina, o que tá acontecendo?”

“Fala pra ele, K.” Agora Zé que pronunciou-se.

“Eu-eu tô num jantar com o meu...o meu namorado.” Karina disse por fim.

“Namorado?”

“É, cara. Na-mo-ra-do! Agora, se nos dá licença.” Aquele cara me irritava profundamente.

Encarei-a pela última vez antes de ir com Vicky para a mesa que nos aguardava.

********************

“Não é possível, tantos lugares pra ir e eles aparecem aqui.” Disse a Zé, enquanto sentávamos novamente.

“Coincidências acontecem, amor.” Revirei os olhos, aquilo era patético.

Meu celular vibrara, rapidamente olhei e era uma mensagem de Pedro.

Pedro

Me encontra em copa assim que acabar ai. Posto 6. (21:13)

Olhei para ele e fiz com que sim, retornando minha atenção para Zé.

“Quem era?” Ele estava ocupado demais comendo.

“A Sol, vou encontrar com ela mais tarde.” Ele deu de ombros, deixando-me aliviada.

Pouco mais de uma hora depois nós havíamos terminado o jantar e iríamos embora. Zé pagara a conta, eu insistira para dividir, mas ele não deixou. Pedro havia ido embora uns minutos atrás com Vicky, a essa altura já estaria chegando em Copacabana. Apressei-me com a despedida, alguns beijos indesejados e lá estava eu em meu carro, indo encontrar-me com Pedro.

A noite a praia não ficava muito cheia, estacionei o carro próximo a orla e segui para o local combinado. Retirei a rasteirinha que calçava assim que pisei na areia, avistando Pedro sentado olhando o mar. Uma brisa leve, a lua refletida no mar, tudo dava um toque um tanto quanto melancólico. Respirei fundo, fui me aproximando e ele parece ter percebido a minha presença.

“Sabe Karina, quando eu era mais novo meus pais me traziam aqui a noite. Era o momento mais calmo para eles me trazerem, porque trabalhavam o dia todo.” Sentei ao seu lado, olhando para o mesmo lugar que ele, apenas escutando-o. “E muito tempo depois esse ainda é o meu local preferido para vir e pensar na vida. Escutar as ondas se quebrando, sentir essa brisa... Isso me traz uma calmaria incomum.” Ele suspirara e finalmente virou-se para mim, com os olhos vermelhos e marejados. “O que tá acontecendo, K?”

“E-eu...” Deveria ou não conta-lo toda a verdade? “O Zé...” Eu estava enrolando demais, tentando encontrar as palavras certas. Suspirei por fim. “O Zé me pediu em namoro e eu aceitei.” Tentei ser o mais convincente possível.

“Mas e nós?” Ele estava visivelmente abalado e isso cortara o meu coração. Mas eu não podia conta-lo a verdade, isso tudo é culpa minha. Se eu não tivesse o levado para casa...

“Não tem nós, Pedro. Tem Eu e Zé, Você e Vicky.” Eu precisava machuca-lo, fazer com que ele não quisesse mais nada comigo.

“Mas...” Sua voz saiu como numa súplica.

“Mas o que? Eu não vou ficar esperando você resolver suas coisas com ela. Não vou ficar criando falsas esperanças.” Cada vez mais eu proferia palavras sabendo que o atingiria.

“Não fala isso, Esquentadinha...” A dor em sua voz fez com que um nó se formasse em minha garganta.

“Eu falo sim, Pedro. Essa nossa conversa não vai nos levar a lugar algum, assim como nosso casinho também não. Então, vê se me esquece.” Reforcei a parte do casinho com desdém.

“Karina...”

“Porque eu vou esquecer você.” Disse já levantando e caminhando para a orla. Sem olhar para trás. E o nó que se formara agora dera lugar a soluços. Em minha cabeça, eu fizera o certo, mas o meu coração dizia outra coisa.

Caminhei lentamente até o carro, entrando e sentando-me. Minha respiração era irregular, os soluços agora eram altos. Olhei uma última vez para Pedro, ainda sentado na areia. Coloquei uma música no aleatório, o universo às vezes conspirava contra – ou a favor – e enquanto a música iniciava, eu dera a partida no veículo, dirigindo sem rumo mais uma vez, apenas escutando atentamente a canção.

“Your fingertips across my skin
The palm trees swaying in the wind
Images
You sang me spanish lullabies
The sweetest sadness in your eyes
Clever trick.

I never want to see you unhappy
I thought you'd want the same for me.

Goodbye, my almost lover
Goodbye, my hopeless dream
I'm trying not to think about you
Can't you just let me be?
So long, my luckless romance
My back is turned on you
Should I've known you'd bring me heartache?
Almost lovers always do.

We walked along a crowded street
You took my hand and danced with me
Images
And when you left you kissed my lips
You told me you'd never never forget these images, no.

But I never want to see you unhappy
I thought you'd want the same for me.

Goodbye, my almost lover
Goodbye, my hopeless dream
I'm trying not to think about you
Can't you just let me be?
So long, my luckless romance
My back is turned on you
Should I've known you'd bring me heartache?
Almost lovers always do.

I cannot go to the ocean
I cannot drive the streets at night
I cannot wake up in the morning
Without you on my mind
Now you're gone and I'm haunted
And I bet you're just fine
Did I make it that easy to walk right in and out of my life?

Goodbye, my almost lover
Goodbye, my hopeless dream
I'm trying not to think about you
Can't you just let me be?
So long, my luckless romance
My back is turned on you
Should I've known you'd bring me heartache?
Almost lovers always do.”

Flashes dos nossos poucos momentos juntos passavam em minha cabeça. As palavras que eu preferira a ela fazia-me chorar cada vez mais. Ele foi sem dúvida o meu “almost lover” como a música diz. Suspirei, a música traduzira tudo o que eu estava sentindo naquele momento. Por fim, resolvi pegar o caminho de casa e sem pensar duas vezes, iria para cama. Precisava digerir tudo o que acontecera hoje a noite. Esquecer Pedro não seria fácil...