4 anos depois.

Aurora cortava rapidamente os ingredientes para o jantar. Alternava olhares ansiosos entre o relógio pendurado na cozinha e a tábua de carnes a sua frente. Travis já estava atrasado, e ela estava realmente precisando da ajuda do... Futuro marido. Sorriu largamente ao lembrar-se da noite anterior, quando depois de quase seis anos de namoro, Travis a pedira em casamento. Por isso, eles haviam convocado aquele jantar, aproveitando que Miles, Mark e a pequena Valerie estavam na cidade. Queriam contar aos amigos sobre o noivado e, seguindo a tradição, escolhê-los como padrinhos. Ela havia se segurado o dia inteiro, passando longe do telefone, pois temia cair em tentação e ligar para Rebecca, contando a ela antes da hora. Aurora mal conseguia conter o sorriso de animação. Lembrou-se dos anos passados, quando conhecera os amigos. Seus melhores amigos. Sua segunda família.

Lembrou-se com carinho e saudade quando viviam todos na mesma casa, passando todos os dias juntos uns dos outros. Com a vida adulta, as coisas mudaram, afinal, Mark e Miles moravam em New York, trabalhando como advogado e designer/promoter, respectivamente. Sem falar que ainda tinham todos os cuidados com sua pequena filha, Valerie, uma linda garotinha de pele negra e cabelos incrivelmente encaracolados. Rebecca e Peter, por sua vez, ainda moravam em Canby. Ainda se viam frequentemente, levando em conta que o pequeno Sam agora passava os dias com vovó Marise, pois Rebecca estava cursando Pediatria. Travis e Peter pareciam almas gêmeas. Os dois haviam terminado a faculdade de Educação Física e assumiram juntos os times de futebol e basquete da Canby High School. Aurora mais uma vez considerou a hipótese de fazer uma matéria sobre aquilo no jornal em que trabalhava. Quer história melhor para contar no dia da amizade do que aquela?

Aurora estava tão distraída pensando em seu passado que se assustou ao sentir uma pequena mãozinha puxando seu avental.

— Mamãe, será que você pode me fazer um favor? – o garotinho de quase quatro anos indagou.

— Tem que ser agora, meu anjo? Mamãe está atrasada! Preciso terminar o jantar antes que seus tios cheguem – Aurora respondeu, sorrindo docemente para o filho.

— Nós queremos ver de novo aquela foto do tio Louis – o garotinho murmurou e Aurora sentiu seu coração se acelerar. Observou a admiração que se formava nos olhos azuis de seu filho e sentiu que deveria fazer aquilo.

— Certo, vamos lá. – ela murmurou. Soltou a faca na tábua de carnes e lavou as mãos, tirando o avental em seguida. Pegou o filho no colo e caminhou até a sala sem dizer uma única palavra. Colocou-o sentado no sofá ao lado dos irmãos que aguardavam ansiosamente e dirigiu-se à prateleira, procurando pelo álbum de fotos da família. Ouviu barulho no portão e soube que Travis havia chegado do trabalho, mas ignorou este fato e seguiu dando atenção aos filhos. Assim que achou o álbum, Aurora respirou fundo, abrindo na página em que ela sabia estarem às fotos de Louis. Separou uma que havia roubado do casting de modelo do garoto anos atrás, e sorriu. Encarou de forma saudosa a foto, atentando-se no sorriso do garoto. Seu eterno amigo, cunhado, ex-namorado, primeiro amor. Viu Travis parado na porta, observando-a. Ele ainda usava o casaco do colégio e seus cabelos estavam colados em sua face, devido ao suor de mais um treino com o time. Aurora lançou a ele um olhar duvidoso. Travis assentiu, sorrindo, numa forma de encorajá-la. Ela então se virou para o sofá, encarando os filhos. Louis, Jonah e Kyle. Seus três lindos garotos. idênticos. A única coisa que os diferenciava, ainda que minimamente, era a covinha que Jonah possuía no queixo. Aurora sorriu observando os três pares de olhos azuis, herdados por Travis. Observou também as três cabeças cobertas por cabelos lisos e escuros, assim como os seus. Por último, observou aqueles três sorrisos. Um misto de ansiedade, curiosidade, excitação. Jonah desviou a olhar da foto, atraído por uma movimentação do pai na porta. Louis e Kyle fizeram o mesmo. Os três sorrisos se alargaram no mesmo instante, ao constatar que o pai já estava em casa. Aquilo significa futebol, eles bem sabiam. Aurora sorriu ao sentir sua mão tremer. Ela sabia que a “missão de recordar o tio Louis” fora adiada. Mas apenas por alguns segundos. Sabia que, não só os filhos, mas todos eles fariam o possível para manter a lembrança de Louis sempre acesa. Soube também que poderia atrasar o jantar em alguns minutos. Um rápido jogo de futebol e as risadas de seus pequenos valiam mais que uma mesa posta no horário combinado.

Dirigiu-se até a cozinha e desligou o fogo das panelas. Em seguida, procurou pela câmera fotográfica e saiu para o jardim, para o tão esperando jogo de futebol. Mas, ao invés do jogar bola, Aurora tirou fotos. De todos os sorrisos, caretas, pulos e risadas. De todos os ângulos possíveis. Ela sabia que, depois de muitos anos, além de todo o seu amor, ainda existiriam aquelas fotos.

“We keep this love in a photograph

(Nós mantemos este amor numa fotografia)

We made these memories for ourselves

(Nós fizemos estas memórias para nós mesmos)

Where our eyes are never closing

(Onde nossos olhos nunca fecham)

Hearts were never broken

(Nossos corações nunca estiveram partidos)

And time's forever frozen still.

(E o tempo está congelado para sempre)”