Como odiar o amor escrita por TheGhostKing


Capítulo 12
O reencontro


Notas iniciais do capítulo

Obrigada pelos comentários :3



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Ele já tinha acordado, só não estava afim de abrir o olho, mesmo. O momento de desespero na hora de despertar já havia cessado: depois de um tempão se debatendo e gritando, ele notou que ninguém o ouvia, não onde ele estava. Por falar nisso, onde ele estava? Quer saber, não fazia diferença, contanto que ele saísse dali. Suas mão estavam presas para trás, naquela maldita algema apertava que machucava toda vez que ele se mexia. Se ele pudesse ver, checaria se os pulsos estavam sangrando, mas apostava que sim, depois de todo o esforço inútil que ele tinha feito. Ela estava presa à parede com uma corrente ou algo do tipo. Até viajar nas sombras havia falhado. Depois de dar uma boa analisada (também inútil, devido à escuridão) ele resolveu tentar dormir de novo.

Não conseguiu, é claro. Ele estava com o peito apertado pelo desapontamento, ódio e, acima de tudo, confusão. E esse último sentimento ficou ainda mais forte quando ele ouviu, de algum lugar, algo abafado. Era como se estivesse chegando aos seus ouvidos depois de passar por uma grossa parede, mas, se ele se concentrasse, conseguiria entender.

Isso se o som não parecesse um gato morrendo.

Não, não, era um choro. De uma garota. Não se surpreendeu. Ela falava algo repetidamente, como se quisesse convencer alguém. Nico estava quase perguntando a ela o que tinha acontecido quando entendeu o que dizia:

“Não quero fazer isso”

Mas que diabos isso significava?

O som foi ficando cada vez mais próximo, mas sem nunca ultrapassar a tal parede que ele tinha imaginado. E ele ouviu outra voz:

– Nem eu – era Scott. E o gato morrendo provavelmente era Jill – mas a gente precisa. Você sabe, né?

Ela fungou.

– Ótimo. Vamos entrar.

O que estava acontecendo?! Ele não entendia mais nada. A confusão estava atingindo seu auge. E parte dela estava se transformando em uma irritação.

Relaxou e fingiu dormir. De repente, a escuridão total da sala se transformou em um clarão, e ele tentou não reagir aos olhos irritado, mas não funcionou muito bem:

– Sabemos que já está acordado – Scott cutucou-o com o pé, a voz seca.

Ele abriu os olhos. Estava em um lugar com o tamanho entre uma sala pequena e um armário, definitivamente desconfortável. A porta estava escancarada, e a poeira que ela havia levantado o fez tossir. Era como se o quarto nunca tivesse entrado em contato com uma vassoura. Ou com a luz do dia.

– Onde está a Jill? – ele perguntou, notando que a menina não estava presente.

Scott revirou os olhos e deu um risinho.

– Você ainda se importa com isso? – e vendo a expressão de Nico, acrescentou – ela está do meu lado, não tem porque ela estar ferida. Relaxe. Se alguém vai sair machucado, amiguinho, não é ela.

– Antes de mais nada – Nico quis mudar de assunto - você pode ao menos me explicar o que está acontecendo? Por favor?

– Mas é claro – ele se abaixou, devagar, e sentou-se no empoeirado chão, bem na frente do menino – é bem simples: o plano que eu contei para vocês não funcionaria, simplesmente, porque eu contei para Eros – ele fez questão de dar ênfase no nome – o que aconteceria. O plano real é um pouco diferente. Eu e Jill vamos te entregar diretamente nas mãos de Eros para que ele possa te matar facilmente – ele sorriu – isso se ele não quiser te torturar um pouco antes.

Nico sentiu-se profundamente traído.

– Isso significa que Jill também foi enviada por ele? – ele preguntou – ele enviou a filha dele só para que eu me apaixonasse e sofresse por isso?

– Não. Na verdade, ele não queria que Jill fosse para o acampamento. Ou pelo menos, que ela conhecesse você. Mas, já que conheceu, ele bolou esse plano brilhante para ter a sua mais doce vingança sobre você.

– Vingança? – Nico indignou-se – eu sofro e ele quem quer vingança?

Ele viu um flash passar pelo rosto de Scott, como um ator que esqueceu a fala, mas ele logo voltou com o provocador sorriso maldoso.

– Amiguinho, entenda uma coisa. Ninguém desafia o amor como você. O amor bate em você, pisa, despedaça e cospe em cima, e dali a pouco já está você correndo para o segundo round – Nico nunca havia parado para pensar no que ele estava dizendo. Soava ridículo - Ele nunca foi com a sua cara. Você tinha um amor irracional por Bianca, e nunca sofreu nos braços dela. Ele não apoia isso. Para Eros, amor e dor são sinônimos. Para amar, tem que sofrer.

– Nunca sofri por Bianca?! – ele se debateu, fazendo a corrente que o prendia contra a parede fazer um som ameaçador. Notando que ele não poderia usar as mãos, deu um chute no queixo de Scott, que caiu para trás.

– Não foi o que eu quis dizer – ele disse, levantando-se, com a mão no local atingido. – é só que seu amor por ela era demais para ele. Ele mal conseguia controlá-lo. Você amava ela o que a maioria das pessoas ama a família inteira, mais os amigos e objetos marcantes, juntos.

– Isso porque ela era tudo o que eu tinha, literalmente – ele interrompeu, mas o menino o ignorou.

– E ela não havia te machucado nem uma vez sequer – continuou – Ele acredita que o sofrimento é importante. Era como um desafio, uma ofensa ao trabalho dele, ele estava de olho em você. – Nico passou a prestar atenção no discurso - Por isso, quando ela morreu, ele o viu sofrer. E a teoria de que é necessário sofrer para amar – Scott parecia estar repetindo essa frase de diversas maneiras – foi comprovada. E foi como uma vitória grandiosa. E, é inevitável, todos gostam de vencer.

Nico abriu a boca para dizer algo, mas foi interrompido.

– Mas, de qualquer maneira, lá está você, se apaixonando tão profundamente por tudo que o machuca, como se notasse o divertimento dele e zombasse, pedindo mais. Foi a gota d’água quando se apaixonou pela própria filha dele, não concorda? Por isso ele me chamou. Estava cansado do ciclo mantido entre vocês. Queria rompê-lo – os olhos dele brilharam – matá-lo.

– E vocês estão me levando para que ele possa me matar? – adivinhou Nico.

– Sim senhor, amiguinho.

O silêncio que se permaneceu da sala fez os pensamentos do garoto parecerem gritos ao eco. Nada estava confuso agora. Claro como cristal, na verdade. Mas era tão incompreensível o sentimento de traição dentro dele... Como o Cupido – seu pensamento também fez questão de enfatizar o nome – tinha convencido Jill a fazer parte de tão terrível plano?

E por qual motivo a garota não havia entrado?

Ele não devia se preocupar. Não, depois de tudo que ela tinha feito, era quase um crime se preocupar. Mas ele queria saber.

Ele ouviu passos. De salto.

Um barulho confortável repetido na madeira chegava cada vez mais perto. E ele apareceu na porta.

De primeira, parecia apenas um vulto, por causa do contraste com a luz. Mas, ao ir se aproximando, ele pôde enxergá-la melhor. Quase não dava para dizer que era mesmo Jill.

Ela usava botas de couro com saltos gigantes, uma short jeans escuro, rasgado, curto e talvez um pouco revelador demais e uma camisa justa com um decote generoso. Por cima, ela havia jogado uma jaqueta de couro aberta.

– Que tal estou? – ela perguntou, dando uma volta. Nico não foi capaz de responder.

Mas você não gosta de botas, ele pensou, nem de salto, nem de shorts curtos, nem de camisas apertadas, nem de decotes e muito menos de jaqueta de couro.

Era verdade. Às vezes ela pedia para que o menino tirasse a própria jaqueta de couro. “E agora?” ele costumava dizer, e a resposta dela era “queime-a”. E eles riam.

Estava sempre a rir das metidas filhas de Afrodite quando elas passavam com aquele visual.

– Diferente - ele sussurrou, finalmente respondendo.

– Não estou melhor?

– Não – ele tomou coragem de responder.

Ela simplesmente riu e se abaixou para ficar com o rosto perto do de Nico. Na verdade, ela abaixou somente o tronco. Ela também estava de maquiagem, ele notou, mas não do tipo um batonzinho, e sim do tipo rímel, delineador, base, sombra, blush, corretivo e bilhões de outros nomes que ele não saberia nem pronunciar, e antes ficava feliz ao pensar que ela também não.

– Pois eu acho que estou – ela sussurrou, com a voz rouca. Levantou-se – vamos?

– Aham. Agora – respondeu Scott – trouxe?

– Sim – ela levantou um machado. Simples assim, um machado: como ele não tinha visto aquilo na mão dela antes?

Assustou-se e recuou, encolhido, quando ela desceu o instrumento com tudo na corrente, cortando-a ao meio. O garoto se recuperou rápido e levantou do chão, olhando para a parede que o prendera: a corrente estava entre o cimento seco dos tijolos. Ainda estava preso por uma parte dela, entretanto, junto à algema, e foi por onde Scott segurou e o levou para fora, como um cachorro.

– Nem tente viajar pelas sombras, esse material não permite – avisou Jill. Nossa, era estranho chamá-la de Jill.

– Já descobri isso, obrigado – ele respondeu, com os olhos ardendo devido a claridade do lugar onde estava.

Era uma cidade. Olhou para trás. Esteve preso em uma padaria abandonada, mas ainda tinha muita gente circulando ao redor. Como não tinham notado seus pedidos por ajuda?

Maldita névoa.

– Vamos – Scott chamou – você na frente.

Nico obedeceu e começou a andar. O menino ainda segurava a corrente que o prendia, e do modo em que estava, não tinha como puxar a espada. Sim, a droga da espada estava lá durante esse tempo todo, apenas a centímetros do alcance de Nico.

Tinha aproximadamente um metro de distância entre ele e os ex-amigos, e ele conseguia escutar tudo o que eles diziam. Não podia olhar para trás, entretanto, ou Scott o ameaçava. Apenas ouvia, atentamente, a conversa que eles tinham.

– Quanto tempo falta? – ele atreveu-se a perguntar, virando em uma direita que Jill havia indicado.

– Não muito, na verdade. Ansioso? – ela respondeu, sarcástica.

– E como – ele murmurou, voltando a andar. O sol estava alto e forte: ele começara a suar. Tinha decidido aproveitar o tempo que tinha para pensar no que faria. Infelizmente, isso significava obedecer às ordens tanto do menino quanto da menina, mas valeria a pena. Talvez. Se ele conseguisse pensar em algo.

Andaram por talvez mais uns vinte minutos até se depararem com um palácio branco e vermelho. Ele estava ficando enjoado dessas cores.

O lugar era imenso, exageradamente. Como os mortais não viam aquilo, sinceramente? Às vezes, a névoa era mágica demais para Nico. Quer dizer, a cidade tinha acabado de ser atravessada por dois meninos e uma menina machucados e armados com espada (Nico), adaga (Scott) e um maldito arco e flecha (Jill), indo em direção a maior e mais ofuscante construção do mundo. Ah, isso sem comentar que um estava algemado para trás, nas mãos dois outros dois. E todo mundo agia como se fosse uma cena de rotina.

De qualquer maneira, os portões abriram e eles entraram, e Nico ainda tinha a mente vazia.

Na verdade, ela estava cheia, mas de pensamentos confusos. Ele não entendia porque, uma vez que já havia tido uma explicação completa de tudo que aconteceu. Mas para ele, de algum modo, era como se não fosse verdade. Mas soava tão real. O jeito como ele sorriu ao falar sobre a morte de Bianca. Como parecia se divertir ao dizer que Nico morreria. O modo como Jill entrou na sala, se mostrando. As conversas que eles tinham sore Nico como se ele não estivesse ali. Era tão verdadeiro, tão amargo.

Mas ele só conseguia se lembrar do flash que ele viu no olhar de Scott. Foi por menos de um segundo, ele mal conseguiu ver a sua expressão, mas, sei lá... era confuso interpretar o motivo pelo qual ele pensava daquele modo.

Eles haviam atravessado o jardim enorme e chegado, finalmente, às portas do palácio, que abriram-se com um simples toque de Jill. E quem estava os esperando não era ninguém menos do que o Cupido.

Isso não o impressionava, mas outra coisa sim:

Ele não havia mudado desde que se viram pela última vez. Nem um pouco. Nem ao menos de roupa.

– Nico – ele sorriu – enfim.

Quando o menino pensou em reagir, as portas pelas quais tinha atravessado fecharam-se e ele sentiu alguém segurar seus braços, os torcendo levemente.

– Tenta – Scott sussurrou ao seu ouvido – que eu quebro.

Ele torceu um pouco mais, só para mostrar que tinha coragem, e Nico cerrou os dentes, mas não emitiu som.

Scott empurrou-o para baixo, fazendo com que ele caísse de joelhos, mas sem soltar seus braços.

– Então – Nico falou entre pesadas respirações de raiva – como vai ser? Vai me matar de uma vez ou ficar enrolando?

– Quer saber, eu estava planejando enrolar – o deus respondeu – mas agora, acho que vou mata-lo de uma vez – o sorriso maldoso dele abriu-se ainda mais – não vejo como eu poderia fazê-lo ultrapassar o sofrimento que você já está sentindo.

– Então anda logo! – ele esbravejou, o ódio fazendo-o tremer.

Nico olhou para Jill, talvez em uma última esperança de ajuda da menina, e a encontrou olhando para Scott.

– Pai, eu trouxe o arco – ele abriu os braços como se fosse envolve-la em um abraço – mas eu estive me perguntando... será que eu não podia usá-lo?

A cara de Cupido fechou.

– Como assim?

– É que eu acho que morrer em suas mãos seria uma morte repleta de dignidade e, não sei, honra, mas nas minhas...

– De modo algum! – ele gritou, fazendo a menina tropeçar para trás. Com o momento de distração, Nico tentou escapar, mas Scott foi mais rápido e torceu seu braço com mais força, e foi inevitável gritar de dor, ainda que brevemente.

As atenções voltaram para Nico, enquanto ele comprimia a boca e apertava os olhos, tentando resistir à dor do braço.

– Sabe o que com certeza não seria nada digno? – Scott sugeriu – matá-lo com a sua própria espada.

O Cupido levantou uma sobrancelha, como se avaliasse a proposta. E essa expressão voltou para o sorriso cruel.

– Tire a espada dele – ordenou. Jill andou até o menino e puxou a espada da bainha, levando-a ao pai.

Nico queria chorar. Não se daria ao luxo, é claro, mas estava com tanto ódio que chagava a ser inacreditável. Ah, as coisas que ele faria com esse deusinho se fosse poderoso o suficiente...

– E parece que você perdeu, não é, di Angelo? – o Cupido zombou, servindo apenas para alimentar a raiva do garoto – como é que você se sente? – ele apoiou a parte chata da espada nas costas do menino.

Ele tremeu, respirando com dificuldade, tentando se controlar. Não podia demostrar medo, não entregaria isso de bandeja.

– Melhor impossível – ele respondeu, seco.

– Ótimo – Cupido levantou a negra espada – tente sorrir ao encontrar a sua irmã.

Nico pressionou os olhos e se preparou para o golpe enquanto o deus gargalhava.

– Eu não tenho medo de você – ele sussurrou, mas alto o suficiente para que o deus pudesse escutar.

Era quase como se ele pudesse contar o tempo que demoraria para morrer.

Simples assim.

Três.

Dois.

Um.

– Espere! – gritou Jill – eu tenho uma sugestão.

E, antes que qualquer um pudesse reagir, ela mirou a flecha e soltou, com a pontaria sempre perfeita.


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Notas finais do capítulo

Amo fazer vocês sofrerem