Tudo tinha sido um borrão diante de seus olhos.

Depois que aquela bala atravessou o crânio de Beth as coisas aconteceram como em um quadro expressionista. Sem forma, sem cor definida.

O corpo jovem foi enterrado diante de uma cerimônia bonita, improvisada pelo Padre. O choro de Maggie, depois de seu silêncio por tanto tempo, cortava o coração de Carol. Ela lembrava de si mesma… A ideia de que Sophia estava perdida, mesmo que morta, muito mais fácil de lidar do que a visão de um cadáver.

Então, meio que sem se entender ou se definir uma rota, todos estavam novamente na estrada. Após a gasolina do caminhão de bombeiros acabar, iam todos a pé. Alertas, sob o sol escaldante. Sem um plano… Sem esperança.

Mas, o que a preocupava ainda mais era o silêncio de Daryl. Há muito tempo não o via assim… Nem mesmo depois de Merle ele ficou daquele jeito. Caminhando, ao lado de Rick, para frente, como um walker. Na noite anterior, ele não dormira, sabia disso. Apenas sentou ao seu lado, encostado na lateral do caminhão. Perguntara a ela se estava confortável e pediu que deitasse com a cabeça em seu colo, para descansar as costas. Carol queria fazer-lhe companhia, mostrar que estava ali, mas estava tão cansada que adormeceu. Despertou com a mão dele deslizando suave por seu cabelo. Despertou, mas não se moveu. No breu da noite, ele não viu seus olhos abertos. Carol ficou quieta, até que adormeceu novamente, acordando com o sol aquecendo sua pele.

Comeram alguns biscoitos e beberam águal. Daryl não comeu. Estavam caminhando desde o início da manhã e já devia ser depois do meio dia. Carol sentia as costas doerem, seu braço pesava e, com certeza a luxação na perna direita ainda não havia curado. Sentia dor em todo o corpo, mas não queria ser um estorvo, não mais. Na verdade, se sentia meio culpada, pois talvez fosse ela quem devesse ter morrido. Beth ainda tinha tanto para viver… Afinal, não era a própria Carol que não se sentia mais parte do grupo? Porque tinha sobrevivido, então? Que plano misterioso e místico era esse que a mantinha viva?

Uma pequena pedra em seu caminho a fez pisar em falso. Sua perna protestou, e não foi rápida o suficiente para conter o gemido fraco. Imediatamente as expressões preocupadas de Rick e Daryl, que estavam bem à sua frente, se voltaram para ela.

- Carol, você tá sentindo alguma coisa? - Foi Rick quem perguntou.

- Eu tô bem… - e ela percebeu que todos pararam. Daryl já estava de um lado, e Tyreese do outro.

- Claro que ela tá sentindo alguma coisa - a voz de Daryl veio baixa, mas firme - Não teve tempo de se recuperar direito…

- Devemos parar um pouco. - Tyreese completou.

O local de descanso foi um galpão abandonado, no meio do caminho. Sem walkers, sem suprimentos. Apenas um teto para cobri-los. E ela se sentiu péssima por ser o motivo do atraso deles.

Mas, se bem que… atraso para quê? Não sabiam para onde iam. Rick sentou-se com Abraham, Michone e Rosita. Eles falavam baixo, talvez estivessem traçando algum plano. Carl tinha Judith em seu colo (como Beth fizera tantas vezes), Tyreese ao seu laod. Tara sentara-se ao lado de Eugene, Glenn tentava fazer Maggie dormir e o Padre, este estava sentado em um lugar mais distante, com suas mãos em oração. O menino de Atlanta… Noah, estava encostado a uma parede. Seus olhares se encontraram, e ela tentou lhe sorrir, mas percebeu o quanto isso estava difícil naqueles dias.

Perto da porta, Daryl estava sentado, sua besta ao seu lado. Ele olohava para o nada e parecia não ter interesse no que acontecia ao seu redor.

Carol levantou-se com calma e foi até ele. Sentou com dificuldade ao seu lado e esperou por um olhar em sua direção. Olhar que não veio. Esperou alguns segundos antes de, finalmente, perguntar.

- Você tá bem?

- Yeah.

- Não, você não tá...

- Você tá bem?

Ela respirou fundo e ignorou o fato de ele ter cortado sua frase ao meio.

- Tô.

- Não tá.

- Parece que ninguém tá.

- É. Ninguém.

Após algum tempo em silêncio, sentiu que ele se levantava, segurou na parede e imitou sua ação. A tarde estava caindo, dando lugar a uma noite de lua cheia.

- Eu estou indo caçar alguma coisa - foi o que ele disse enquanto abria um pouco a porta. Ela foi atrás dele.

- Daryl… - Ela chamou. Ele virou-se - É perigoso lá fora…

- É perigoso em qualquer lugar. - e deu dois passos para fora, seguido de Carol. - Volte para dentro, você precisa descansar para ficar boa.

- Não. Por favor, fale comigo. Fale sobre o que você está sentindo - ela suspirou - Deixa eu te ajudar.

- Eu não acho que falar sobre essa merda vai me ajudar.

- Então, não saia agora… Ao menos fique até amanhecer…

- Eu tenho que ir. Eu preciso ir.

Disse isso e virou-se em direção as árvores.

- Tenha cuidado - ela disse baixo.

- Eu vou.

Carol retornou para dentro do galpão, encontrando Rick que vinha em sua direção.

- Onde ele foi?

- Caçar… Ficar sozinho.

- Não é a hora de caçar...

Carol impediu Rick de ir atrás de Daryl, colocando uma mão em seu ombro.

- Deixe. Ele vai ficar bem.

*****