Julieta era como todos os anjos, belos e difíceis de lidar. Mas ela tinha algo diferente, ela não tinha o ódio ou o medo que a maioria dos anjos tem dos seres inferiores. E isso facilitava a relação entre Julieta e Demônio.

–Me diga Julieta, por que você sai à noite sabendo que é tão perigoso? – Demônio perguntou quando pararam para descansar depois de um treino especialmente cansativo, tanto para Julieta quanto para Demônio.

Julieta aprendia rápido. A espada e a faca foram bem fáceis de aprender, agora já dominava as duas artes e podia atirar em qualquer monstro a uma distancia razoável. Mas ela ainda estava insatisfeita com sua velocidade, embora tivesse feito progresso, ainda não estava rápida como um relâmpago.

Julieta deu um sorriso para Demônio, provocando-o.

–O proibido é mais divertido – Ela piscou fazendo Demônio rir. Nesses últimos tempos ele tinha feito muito isso.

–Devo te ensinar técnicas proibidas para meros demônios?

Os olhos de Julieta brilharam antes de ela perceber que ele estava brincando. Ela riu e sacou a faca sem que demônio percebesse. Num pulo ela já o tinha preso sob seu corpo, a faca em seu pescoço.

–Se me ensinar você não terá a menor chance. – Ela brincou e voou para longe.

–Sua vagabunda, se eu te pegar você vai ver quem não tem a menor chance – Demônio tinha a respiração pesada, por um mísero momento ele teve um impulso de agarrá-la ali e beijá-la, mas ela voara para longe no mesmo momento.

–Se você conseguir me pegar. Nessa sua lerdeza, não chega nem perto. – Ela voou perto, mas longe do alcance das mãos perigosas de seu parceiro de treino.

–Você está muito brincalhona hoje.

–Estou animada – Ela sorriu. – E tive uma boa noite de sono, para variar.

–Animada?

–Amanhã... Digo, hoje, vai ter o desfile do dia de liberdade. – Então ela percebeu o que tinha falado. O dia de liberdade comemorava a expulsão dos anjos caídos do paraíso, comemorava a dominação angelical. – Me desculpe.

–Está tudo bem, Nós perdemos a primeira grande guerra. Também comemoraríamos se tivéssemos ganhado.

Ela sorriu se desculpando mesmo assim.

–Sabe, queria que você pudesse ir. Todas as cores, os anjos em suas melhores roupas, os arcanjos fazendo coisas impressionantes com suas magicas. É lindo De, lindo – Ela chamava Demônio de De, era um apelido que ela inventara para facilitar.

Demônio a imaginou voando pelo desfile, ignorando que seu superior havia lhe dito para ficar sentada e se comportar como uma boa anjinha. E ela estaria linda, as asas brancas brilhando ao sol, o vestido separado para aquela ocasião o faria imaginá-la sem ele. Sim, Demônio queria muito ver o desfile.

–Uma pena que não posso, iria ser muito legal.

Julieta sorriu triste.

–Queria que essa guerra acabasse. Temos sempre que nos encontrar escondido e a noite. O que eu mais quero é ser livre.

–O que é ser livre para você? Vocês tem o paraiso, por que querer algo mais?

–Eu não sou livre para ser quem eu quero, para conversar com quem eu quero, para voar para onde eu quero. Há sempre regras e mais regras. Não De, eu não gosto de viver assim.

–Se você pudesse reformular as leis, que mudanças faria?

–Acabaria com o horário de recolher...

–Para que anjos e demônios se encontrassem nas cidades? - Demônio a interrompeu – Anjinha, sabe que isso nunca daria certo.

–Deu certo para nós dois.

Demônio nunca esqueceu a primeira vez que viu Julieta. Ela estava encurralada pelos seus melhores garotos, mas não parecia assustada, apenas curiosa. Eles iam matá-la se ele n estivesse lá. E quando ela o viu, seus olhos se arregalaram ainda mais, ele sabia que ela podia sentir sua áurea, mas mesmo assim, continuou com os pés no chão. Como demônio, ele tinha que matar aquele anjo, mas como Demônio, filho de seu mestre, tinha uma missão a cumprir e Julieta era a única que ele conseguiria levar para dentro do inferno.

–Eu não sou como os outros.

–Eu sei disso. – Ela sorriu e passou a mão no rosto dele. – Mas aposto que anjos e demônios poderiam se dar bem.

Ambos sorriram um para o outro. Demônio a teria agarrado ali, naquela hora. Mas sempre tem algo para atrapalhar. E dessa vez foi um maldito incêndio que tinha começado na floresta.

Os animais corriam na direção deles a toda velocidade, os pássaros estavam em puro terror, o calor das chamas já os atingiam.

Julieta simplesmente estava lá, em pé, decidida, o vento balançando suas penas, mas as asas já eram forte o suficiente para mantê-la parada no ar. Os olhos estavam vermelhos do reflexo do fogo. Ela era uma caçadora, uma rainha, uma deusa.

Foi ali que as barreiras de Demônio caíram por terra.

Sim, ele tinha acabado de se apaixonar por uma anja. Um demônio apaixonado.