A resposta da alma escrita por Nany Nogueira


Capítulo 14
A marca da culpa




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A princesa francesa chegou ao Palácio do marido após dias de viagem. Os empregados estavam enfileirados para as apresentações. O marido dizia a eles que Amélia seria a nova senhora dali e que deviam obediência e submissão à ela.

Amélia sentia-se desesperada, era só uma menina assustada que nunca soube dar ordens para alguém, afinal, os empregados do seu Palácio cuidavam dela como a filhinha do governante.

A ama acalmou a jovem princesa, dizendo que cuidaria de tudo para ela quanto ao gerenciamento do Palácio.

Na noite de núpcias, Amélia estava desesperada, tinha vontade de abrir a janela e se atirar por ela, mas não conseguia. Fabiano entrava no quarto, sorrindo, e dizia:

– Não abra a janela. Está muito frio, vai acabar ficando doente. Deita na cama.

Amélia deitava-se, muito assustada, logo após pegar um terço no criado-mudo e ficar segurando. Fabiano deitava-se sobre ela e começava a beijá-la na boca e no pescoço, fazendo-a sentir nojo. A situação só piorou quando ele levantou a camisola dela e a penetrou. A jovem só conseguia sentir dor, chorava, segurava o terço e rezava, pois queria distrair seus pensamentos e não se dar conta do que acontecia.

Ele finalmente terminou, virou para o lado e dormiu. A pricesa saiu correndo pelos corredores do Palácio, desesperada. Encontrava Mariana e perguntava:

– Você sabe o que acontece na noite de núpcias?

– Não. Eu não sou casada.

Amélia abraçava a dama de companhia e chorava.

Via-se passeando pelo Jardim com Fabiano. Ele colhia flores, fazia um buquê e entregava a ela. Para Amélia o gesto dele lhe era indiferente, pegando as flores por educação. Ela ouvia o trote de um cavalo, virava-se e lá estava Gustavo. O cavaleiro havia cumprido a promessa e vindo atrás dela. Gustavo apenas sorria e acenava, só queria mostrar que estava por perto.

A princesa começou a esperar seu marido dormir para poder descer de mansinho todas as noites e se encontrar com Gustavo no Jardim. Sempre que ele a beijava, ela não resistia, entregava-se a ele de corpo e alma, ainda que no meio do mato.

Os encontros com Gustavo eram a única alegria da vida da princesa, que não suportava o seu casamento e sua nova vida, até a comida do Palácio do marido lhe era estranha e lhe revirava o estômago.

Mas, tudo mudou quando Amélia descobriu-se grávida. Fabiano estava não se aguentava de tanta alegria e ela também, afinal, nunca conhecera a mãe e agora estava tendo a oportunidade de ser mãe.

Ela não tinha muita certeza de quem era o bebê, mas sentia que era de Fabiano.

Via-se em frente ao espelho, com a barriga grande, Fabiano aproximava-se, abraçava-a por trás e lhe dava um beijo no pescoço, enquanto acariciava seu barrigão. Naquele momento, eram uma família feliz e Amélia decidiu que não queria mais se encontrar com o cavaleiro, pois teria uma família para preservar.

Amélia via-se em trabalho de parto, sentiu como se fosse morrer de tanta dor, até que sua filha nasceu e a mãe sentiu o maior amor do mundo. Quando a pegou nos braços teve a certeza de que a pequena era de seu marido, pois se parecia mais com ele, até os cabelos aloirados.

Fabiano ficou todo bobo ao conhecer a filha e deu a ela o nome de Annie. Presentou Amélia com joias e flores e disse palavras muito românticas. Ela estava sensível e conseguiu se comover pela primeira vez com o gesto dele.

Annie foi batizada pelo mesmo padre que realizou o casamento de seus pais, o irmão de Amélia na vida atual. O padre sorria satisfeito ao ver a felicidade nos olhos de Amélia. Isabela, irmã da princesa, batizou a sobrinha.

A menininha cresceu rápido e já tentava dar os primeiros passos amparadas pela sua ama, mas a mãe a pegava no colo com medo que caísse. Fabiano aparecia e dizia:

– Pare com isso, assim ela nunca vai aprender a andar. Coloque-a no chão, ela não vai se machucar.

Amélia colocava a filha no chão, temerosa. Abaixava-se e chamava Annie que caminhava desajeitada até a mãe. Os pais comemoravam, batendo palmas.

Fabiano viajava muito para resolver questões do reino e levava Amélia junto. Ela não gostava de se afastar muito tempo do Palácio, porque queria estar o tempo todo com a sua filhinha, que era a maior paixão da sua vida. Mas, a sua ama também cuidava de sua menina e, assim, ela ia mais sossegada. Porém, Amélia tinha problemas respiratórios e ficava doente com as viagens, já que eram muitas noites frias nas estradas. Preocupado com a saúde da esposa, Fabiano parou de levá-la consigo.

Certa noite, a princesa dormia sozinha no seu quarto quando acordou assustada ao ouvir barulho, olhou em volta e viu Gustavo, que havia escalado a sacada.

– Eu já te mandei embora, já disse que não quero mais te ver – dizia Amélia, nervosa.

– Eu não acredito – respondeu Gustavo, sentando-se na cama dela e a beijando com paixão. Amélia nunca resistia a isso.

Amélia e Gustavo fizeram amor na cama que ela dividia com Fabiano. A princesa não sentiu culpa. Na sua cabeça só se passava que o marido a comprou de seu pai quando era apenas uma criança, e que tipo de tarado se sente atraído por uma criança? Além disso, se pudesse escolher, teria se casado com Gustavo, não tinha dúvidas de que ele era o amor da sua vida.

Os encontros no Jardim voltaram a acontencer.

Apenas em uma noite Amélia não encontrou o cavaleiro, quando foi flagrada pela filha no meio da noite, na sala do Palácio. Ao ser questionada pela menina aonde ia, a mãe respondeu que a lugar nenhum, indo ao quarto da menina para dormir junto com ela.

No dia seguinte, o cavaleiro pediu explicações, mas Amélia afirmou que preferiu ficar com a filha, pois a amava mais que a qualquer um.

Haviam descoberto um lago, muito bonito e afastado de tudo, no meio da floresta. Apostavam que ninguém os veria lá. Mas, um homem loiro usando um chapéu verde com uma pena vermelha viu. Amélia pôde vê-lo correndo entre a mata.

No Palácio, Annie entrava correndo no quarto, já estava grandinha (por volta de 5 anos), e entregava flores para a mãe. A pequena tinha a mesma mania do pai. Amélia pegava a filha no colo e a beijava. Depois as duas rodopiavam juntas, riam e se jogavam na cama. Fabiano entrava no quarto, querendo participar da bagunça.

Annie pegava a mão do pai e depois a mão da mãe e os três juntos brincavam de roda. Os pais faziam tudo que sua querida pequena pedia.

A menina saía do quarto e Fabiano puxava Amélia para si, tentando beijá-la, mas ela se desvencilhava, saindo do quarto, dizendo que tinha muito o que fazer no Palácio.

Via-se tocando piano no salão do Palácio e cantarolando. Fabiano aproximava-se e cantava junto com ela ao mesmo tempo que a admirava.

Ele ouviu galopes de cavalos e latidos de cachorros. Eram os homens que iriam sair para caçar com ele. Ele ia até a esposa e a beijava nos lábios, dizendo:

– Vou caçar “ma cherie”, prometo trazer uma boa carne para o jantar.

Amélia sentiu-se feliz ao vê-lo saindo, gostava quando ele não estava em casa, tinha paz.

Ela começou a observar a sala a sua volta. Tinha muitas obras de arte, inclusive quadros de Leonardo Da Vinci e estátuas de Michelangelo. A princesa era fã de Da Vinci e julgava Michelangelo invejoso. Gostava de ensinar a sua filha sobre a arte renascentista, porque queria que ela aprecisasse a arte tanto quanto a mãe.

Ao final do dia, Fabiano voltou. Entrou possesso. Pegou Amélia pelo cabelo, puxando com tanta força que quase delocou seu pescoço.

– Traidora! Vadia! Vagabunda! - gritava Fabiano enquanto arrastava Amélia pelo braço, apertando muito, escada acima, até o quarto do casal.

Ele jogava Amélia na cama, estapeava o seu rosto, tirando sangue da sua boca. Tirava o cinto e começava a bater nas pernas dela, feriando-as.

– Por isso estava me evitando? Sua vadia! - batendo cada vez com mais força, descontando todo o seu ódio.

Quando cansou de bater, abaixou as calças e forçou a penetração em Amélia.

– Para, por favor – implorava Amélia sentindo muita dor, ele a estava machucando por dentro.

– Eu sou o seu marido! Posso te possuir quando, como e do jeito que eu quiser.

Ele terminava o ato, amarrava Amélia muito machucada na cama e saía. O tempo ia passando e a moça já não sentia mais seus pulsos. Tinha fome, sede, estava fraca.

A porta se abria, era Mariana para lhe salvar. A dama de companhia chorava ao ver sua senhora naquele estado e se apressava para soltá-la da cama. Amélia não conseguia nem ficar sentada de tão fraca. A dama a segurava em seu colo, chamava outras empregadas, pedia água e colocava aos poucos na boca da princesa. Depois, dava sopa.

Annie entrava no quarto e via a mãe, correndo para abraçá-la, debruçando-se sobre sua barriga:

– Mamãe! - chorando.

– Tirem ela daqui! Não quero que me veja assim. Não quero! - olhava de forma implorativa para Mariana, que obedecia à princesa, pegando a menina no colo e a tirando de lá.

Fabiano mantinha Amélia no quarto e ela mesma não tinha vontade de sair de lá, também não podia ver a sua filha, porque era um mau exemplo para ela e iria desgraçar a vida da menina como desgraçou a própria.

Via-se jantando com Fabiano. Uma mesa enorme que sempre estava vazia. Amélia não tinha vontade de comer e o marido percebia:

– Não quer comer comigo? - jogando tudo no chão – Não vai comer mais nada!

Annie aparecia seguida pela sua ama e corria para o colo da mãe, que a pegava. Fabiano arrancava a filha da esposa e entregava de volta à ama, pedindo que a levasse. Ele agarrava Amélia pelo braço e a arrastava para a torre, onde ela passaria a noite trancada, sentada no chão, com fome e frio, já que a janela do local mal fechava e a moça não tinha casaco, apenas seu vestido longo.

Amélia não suportava mais tudo isso. Contou o seu drama à sua irmã Isabela, quando foi lhe visitar, mas a mais velha a recriminou, dizendo que traição era pecado. Isabela vivia na igreja, ao contrário de Amélia, que ia por obrigação e estava revoltada contra Deus por tanto sofrimento.

A princesa resolveu fugir, porque a única coisa que a prendia no Palácio era sua filha, mas Fabiano não a deixava mais vê-la. Algumas vezes, Amélia conseguia fugir no meio da noite e apreciar o sono de sua menina, apenas.

Assim, resolveu ir atrás do cavaleiro. Sabia onde ele ficava acampado, no meio da floresta, com outros homens.

Quando chegou lá, viu, por trás das árvores, ele se gabando aos homens:

– Quem dorme com a mulher do rei sou eu.

Amélia ficou com raiva ao ouvir isso, sentiu-se como um troféu e não como a mulher amada que imaginava ser.

Gustavo viu Amélia e foi atrás dela, segurando-a no braço machucado e fazendo-a soltar um gemido de dor. Ele soltou e disse que estava brincando, que era comum aos homens do acampamento contarem mentiras, e que ninguém havia acreditado no que ele havia dito. Na sequência, ele beijou Amélia e, como sempre, ela não resitiu, entregando-se a ele ali mesmo, no meio do mato.

Depois disso, ela falou a ele que queria fugir e o cavaleiro concordou na mesma hora, começando a planejar a fuga.

Chegou o dia da fuga, Amélia pegou as suas coisas no meio da noite. Passou no quarto da filha, que dormia tranquilamente, beijou-a de leve e derramou algumas lágrimas, sentia muito por ter que deixá-la.

Quando estava prestes a sair do Palácio foi contida pelos soldados do marido, que havia descoberto tudo. Temia por Gustavo, imaginava que ele já poderia ter sido morto.

Fabiano não bateu nela como era esperado, apenas voltou a trancá-la no quarto. Amélia temia essa reação dele muito mais do que a reação agressiva, pois pensava que ele só podia estar planejando uma vingança.

Gustavo havia conseguido fugir. Jogava pedrinhas na janela de Amélia. Ela desceu e se encontrou com ele no Jardim. Ela pulou em seu colo e ele a rodopiou no ar, beijaram-se sem parar.

Ele afirmou que precisavam fugir imediatamente, pois não teriam outra chance. Amélia começou a chorar e disse:

– Eu sinto muito, não posso fazer isso. Não posso deixar a minha filha.

– Eu entendo. Uma pena que não tenhamos conseguido ficar juntos dessa vez. Mas, quem sabe um dia nos encontraremos novamente e poderemos viver a nossa história de amor. Eu te amo minha princesa e nunca vou te esquecer, eu juro.

– Eu também te amo meu cavaleiro e juro que nunca vou te esquecer.

Os dois se beijaram pela última vez.

– Até breve meu amor – disse o cavaleiro, montando no seu cavalo marrom.

– Ou não – falou Amélia para si, sentindo que nunca mais o veria.

Com o tempo, Fabiano permitiu que Amélia voltasse a conviver com a filha. No reencontro, Annie foi para o colo da mãe e a abraçou cheia de saudade, as duas não queriam mais se soltar. A menina ficou no colo da mãe até adormecer e a mãe velou o sono da filhinha.

Certo dia, Amélia desmaiou no salão do Palácio. Mariana, a dama de companhia, gritou e foi acudir sua senhora. Fabiano ficou desesperado e até esqueceu a raiva, pegando a esposa no colo e a levando para a cama. Ele queria chamar um médico, mas a princesa disse que não era preciso, havia sido um mal estar passageiro.

Amélia sentia-se mal e tonta muitas vezes até que descobriu estar grávida. Sentia que o filho era do cavaleiro. Temeu pelo seu bebê e escondeu a gravidez o quanto pôde. Mariana era a única a saber da situação e ajudava a apertar o espartilho da senhora.

– Não dá mais, minha senhora. A barriga está muito grande, não tem mais como esconder – dizia Mariana, quase arrebentando o espartilho de Amélia.

– Tem que dar! Aperta, vai!

– Não te como.

Fabiano descobriu a gravidez, mas passou a agir como se o filho fosse dele, quando Amélia sabia que ele deveria saber que não era. Imaginou que ele mataria a criança ao nascer.

Amélia entrou em trabalho de parto. A bolsa estourou, sentia contrações, a água escorreu por suas pernas. Annie via a mãe em seu desespero e perguntava o que estava acontecendo.

– Nada querida, não se preocupe, seu irmãozinho vai nascer. A mamãe te ama muito – dizia Amélia, contendo a sua dor para não assustar a filha.

– Eu também te amo muito mamãe – falava Annie, enquanto a ama a levava dali.

Via-se no parto, dizendo à dama de companhia que Fabiano mataria o bebê. Mariana garantia que protegeria a criança e não se afastaria nenhum momento, pedindo que a princesa fizesse força e segurando a sua mão.

Naquele momento, Amélia só tinha à dama de companhia, pois sua ama já havia falecido, embora ela desejasse que Beatrice estivesse ali naquele momento.

A parteira insistia para que a princesa empurrasse o bebê, mas Amélia não queria que o filho saísse de sua barriga, tinha medo de Fabiano. Ela começou a ter hemorragia, sentia uma poça de sangue em baixo de si.

– Eu tô morrendo – disse Amélia para Mariana.

– Não diga isso.

– Prometa que vai cuidar da minha filha.

– A senhora não vai morrer.

– Por favor, preciso que me prometa, só confio em você.

– Eu prometo, mas lute pela vida, por favor – chorando.

Amélia foi sentindo seu corpo mais leve, estava morrendo.

– Não, minha senhora! - gritou Mariana, caindo de joelhos no chão e segurando, ainda, a mão da princesa.

Amélia viu-se sair do corpo. Viu seu bebê, era um menino, moreno como o cavaleiro, e havia nascido morto.

Fabiano chorava no corredor do Palácio, abraçado a uma coluna. Amélia sentia prazer ao ver o sofrimento dele, queria que ele sentisse todo o mal que lhe fez.

Viu a ama de Annie contar a ela que a mamãe não voltaria e se revoltou ao pensar que sua filhinha cresceria sem mãe e não tinha nem idade para entender o que estava acontecendo. Pela primeira vez sentiu-se culpada por tudo o que aconteceu.

Sua alma não conseguiu ir para a luz, ficou vagando pelo Palácio.


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