Contos Que Eu Invento Quando Estou Com Vontade escrita por Amgis Carlus


Capítulo 4
Afogado - Parte 3 – Possibilidade




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Eu poderia dizer que tinha sido apenas um sonho. Uma espécie de doce pesadelo onde eu me encontrava aparentemente perdido. A sensação de estar me relacionando com alguém desconhecido depois de tanto tempo, era algo quase novo para mim. Mas tudo bem. Eu não iria me deixar levar tão facilmente. Se fosse para realmente estabelecer uma nova relação, fosse de amizade ou até amor com alguém, seria bem devagar. Bem edificada. Pois só o fato de ainda imaginar que aquilo ainda poderia ser uma mentira e tudo uma farsa muito bem elaborada, eu enlouquecia de fúria. Mas tudo bem. Eu não cometeria o mesmo erro de antigamente. Eu agora havia criado um provérbio de proteção contra as pessoas:

‘As pessoas que mais conhecemos

São as que mais desconhecemos

Pois quando desconhecemos alguém

Sabemos que ele é um desconhecido

Mas quando conhecemos alguém

Ficamos cegos, pois achamos que o conhecemos’

Era uma frase que, para muitos, não havia sentido algum. Mas para mim, era um ensinamento. Algo que havia aprendido com o tempo, após tantas decepções e surpresas com as pessoas que eu julgava conhecer e que eu acreditava que eram minhas amigas. Com ela, nunca mais confiei em ninguém totalmente e sempre esperei algo novo de todos. Afinal, quase tudo é possível. Às vezes até o que normalmente é impossível de vir de outra pessoa, acaba vindo. Por isso, não duvido de mais nada.

O dia seguinte veio. Eu achei que talvez a garota nem viesse mais falar comigo, apesar d’eu ter dado a ela aquele poema. Talvez ela tenha se sentido machucada com a minha reação. Quando chegou, ela foi para o lugar de sempre, na frente. Mas no intervalo, infelizmente, ela veio falar comigo. Até tentei fugir, mas ela definitivamente sabia meus movimentos. Então, não consegui nem sair da sala.

– Prefere ficar na sala ou conversar lá fora?

– Sala.

Assim, ficamos na sala de aula. Voltei para o canto e ela se sentou ao meu lado.

– Os outros não vão perceber o que você está fazendo? – Perguntei casualmente.

– Ninguém liga. É como eu disse, todos ficam distantes de mim. Eu é que tento me aproximar um pouco dos outros. – A frase dela soou um pouco triste.

– Entendo... – Fiz uma pausa para pensar o que perguntar para ela. – Porque fazem isso com você?

– Nem eu sei direito. Apenas ficam longe de mim. Talvez seja meu estilo, digamos que, alternativo.

– Parece ser algo diferente. Bem, isso não importa para mim. Desde que você não me prejudique, eu não te tratarei como elas.

Minha voz soava de forma tão natural que parecia que eu já a conhecia havia mais tempo. Enquanto eu pensava, eu não via o quão próximos estávamos ficando um do outro. Quando percebi, ela estava em cima de mim e eu estava colado na parede.

– Ei, o que você está tentando fazer? – Eu fiquei assustado naquele momento.

– Apenas analisando uma possibilidade. – Respondeu calmamente ela.

Ela veio mais para cima de mim e quando eu pensei que fosse acontecer algo, ela se voltou para trás e não fez mais nada. Eu continuei encarando ela, assustado com aquilo, e sem reação eu voltei aos poucos, a ficar na cadeira normalmente.

– Talvez outro momento seja melhor para isso ser feito.

– O que quer dizer com isso? – Eu agora demonstrava raiva dela e ela podia ver isso em meus olhos.

– Nada. É como eu disse. Apenas testei uma possibilidade.

Momento de silêncio.

Em seguida, olhei para ela. Eu não tinha o mesmo charme para fazer o mesmo com ela, apesar de estar com uma grande vontade. Eu fiquei observando-a e no fim, voltei a olhar para a mesa, em busca da resposta para a dúvida que pairava em minha mente naquele momento. Deveria eu fazer aquilo mesmo? Daria certo? Ela rejeitaria? De qualquer forma, o momento havia passado. E mais uma vez, a clima se esvaiu.

Droga! Como eu sou idiota.

O sinal tocou. Aos poucos, todos começaram a voltar para a sala e assim, ela também foi para o lugar dela. Quanto a mim, o dia havia acabado ali. Voltei a me sentir como antes, como das outras vezes. Voltei a sentir raiva de mim mesmo, por sempre pensar demais e por nunca fazer nada. Por sempre acabar perdendo todas as chances que tenho só porque tenho medo da reação dos outros. Por ser tão medíocre a ponto de nunca mudar, mesmo isso me machucando tanto assim. Com esses pensamentos acabei dormindo no meio das aulas e quando acordei, não havia mais ninguém na sala de aula, apenas ela, novamente sentada ao meu lado.

– Você não dorme em casa direito?

Eu levantei os olhos para ela. E me arrependi na mesma hora. Quando vi, estava chorando.

– Não chore. Eu entendo como é este sentimento. Você realmente é tão frágil emocionalmente como eu. Só que mais covarde.

Chega!

– Covarde? Não me chame de covarde! Não ouse! Você não sabe por que eu sou assim, ok? Você não me conhece! Aliás, o que você quer de mim? Quer que eu me mate, é isso?! Você deve ser igual aos outros deste lugar, que só sabe julgar sem nem conhecer antes! Porque você não me esquece? Porque você não desaparece? Aliás, porque você não se mata?!

Ódio, fúria, dor, rancor, tudo de ruim de mim saiu ali, naquele momento. Se aquilo era um jogo e eu estava perdendo de 2 x 0, agora eu tinha deixado tudo igual em 2 x 2. E estava prestes a virar o jogo ao sair da sala quando ela me puxou. Eu a empurrei de volta, mas ela me atirou no chão. Eu nunca havia batido em uma mulher, mas naquele momento eu queria muito. Mas se eu ainda tinha uma regra que seguia desde sempre era não bater em mulher. Então tudo o que eu queria era apenas sair daquela sala de aula. Mas a garota ficou em cima de mim de tal forma que eu não consegui nem me mover. Então eu simplesmente me entreguei. E com isso, ela me beijou.

3 x 2.

– Eu sei como é se sentir afogado em sentimentos. Acredite, estou igual a você Amgis. Mas prometo que se você me amar além d’eu te ajudar a sair deste oceano de emoções, você também poderá me ajudar. Mesmo que no fim, os únicos que nos salvar, somos nós mesmos. Só você pode se salvar e eu também. Depende apenas de cada um. Eu estou pronta. E você? Vai me ajudar, ou vai me abandonar?

As lágrimas nos olhos dela me fizera ficar com remorso. Apesar de tudo, eu simplesmente ainda não entendia porque ela havia escolhido a mim. Mas eu não tinha escolha. Até porque, aquele momento ficaria marcado na minha vida para sempre.

– Tudo bem. Eu tentarei por você.

Ficamos ali deitados por algum tempo. Depois nos demos conta de que ainda estávamos na escola, então nos levantamos e mesmo depois daquilo tudo, eu saí normalmente como se nada tivesse acontecido. Apenas acenei para ela e fui embora.

Possibilidades podem se tornar reais? Podem. Geralmente, não comigo. Mas ainda assim podem. E aquela possibilidade havia se tornado realidade. O que restava saber agora era aonde e como aquilo iria acabar. Provavelmente seria de forma trágica. Mas pelo ao menos uma vez na vida estava na hora de tentar fazer algo, sem ter medo algum. E se fosse por aquela garota, talvez valesse a pena. Mesmo que no final, eu acabasse me afogando mais ainda e realmente morresse afogado. Tanto por dentro, como por fora.


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Notas finais do capítulo

O meu pensamento a respeito das pessoas estranhas é estranho, por isso criei aquela frase sobre pessoas desconhecidas. Hoje em dia, nem tento mais conhecer as pessoas, só para evitar mais decepções. Não sejam como eu.



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