Believe in Yourself escrita por Murasaki


Capítulo 26
Milímétrico




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/586364/chapter/26

A viagem durou pouco mais que um dia e meio. Apesar das viagens espaciais normalmente serem longas e perigosas, desta vez não havia nenhum obstáculo ou inimigo pelo caminho que atrapalhasse a ida de Tails, Amy, Silver e Brine à Mobius. Um regresso tranquilo, mas Tails passou a maior parte das noites em claro, porque não se acostumara com a ideia de que Pyro os havia deixado em paz - afinal, eles estavam com uma guardiã. O significado daquele silêncio roubava seu sono.

Em um instante, Mobius surgiu como uma bola de gude no horizonte azul-breu do universo. Brine, que admitira nunca ter saído de seu planeta, ficava horas e horas observando aquele pontinho azul crescendo à medida que o tempo passava. Amy repousava do seu lado e uma de suas mãos fazia uma leve cafuné na pequena. A ansiedade era crescente e a ouriça não sabia o que esperar de tudo aquilo. Imaginou muitos finais pra toda aquela busca. Tentava afastar os pensamentos mais sombrios e recheados de morte. Mas por mais que tentasse, não conseguiu visualizar uma maneira de salvar a todos e sanar todas as mágoas e atos inconsequentes. Entendia que precisava ser forte.

E era o que vinha tentando fazer há algum tempo.

Amy levantou-se e apoiou a cabeça de Brine em um travesseiro próximo. Saiu da sala de controle e caminhou até uma região pouco frequentada da nave. Foi preciso descer apenas algumas escadas para Amy encontrar o lugar.

A sala de treinamento físico.

Já que tinha quase plena certeza que teria de lutar o máximo que pudesse, Amy não teve outra alternativa a não ser aprimorar-se fisicamente e ganhar mais resistência. Queria pelo menos, alcançar o patamar de força de quando se sentia irada. Nesses poucos momentos, Amy já pôde fazer coisas extraordinárias e além de sua própria compreensão.

A ouriça foi até o canto direito da sala onde seu martelo especial repousava. Procurou proteger as mãos, joelhos e cotovelos. Um pequeno painel logo no início da sala - meio empoeirado - tinha um pequeno nome gravado.

SIMULADOR BETA.

Era uma das invenções mais engenhosas, de Tails, que simulava diversas situações de perigo em 3D, além de reconhecer os movimentos do usuário. Luta corpo-a-corpo, objetos arremessados, situações de camuflagem. Uma verdadeira máquina de treino pesado. Um breve aquecimento antes de começar deu à Amy uma oportunidade de focar seus pensamentos em seus princípios e objetivos. Um microfilme rodava em seu cérebro e nele, as imagens de Sonic, Blaze, Sallo, Lumina, Brine, e de tantos outros iam e viam numa repetição aleatória. Algumas vezes uma vaga escuridão surgia. Ela representava Pyro e todas os seus atos de destruição.

Foco, ok. - Pensou a ouriça antes de apertar a opção de objetos arremessados. Foi preciso pouco tempo para que a adrenalina surtisse efeito. Amy podia senti-la milimetricamente passeando pelo seu corpo. À medida que conseguia desviar, o nível subia automaticamente. A rapidez com que Rose desviava de cada obstáculo era tão absurda e veloz que tudo ao redor já não passava de um borrão. Ao fim, trocou para luta corpo-a-corpo.

Contudo, aqueles socos e chutes não lhe pareciam mais uma ameaça diante de tudo o que já havia enfrentado. Na verdade, lhe pareciam apenas o primeiro capítulo de um sombrio conto de terror. O nível subia, e com um pouco de esforço, Amy conseguia contra-atacar.

A ouriça nunca havia se dado conta de que, nos momentos que estava realmente focada em si mesma ou em algum objetivo maior, podia sentir um poder crescente e até mesmo descontrolado tomá-la inteiramente. Ela se perguntava se seria a herança de sua árvore genealógica. O sangue quente real e nobre que corria em suas veias. Sentia-se supersônica.

Amy só percebeu que estava passando dos limites quando foi parada por um soco virtual em seu nariz que a derrubou. A máquina não causava danos físicos, mas tratava de estimular o cérebro do usuário fazendo-o reconhecer que havia levado um soco. Também não havia dor, mas o susto e a imagem eram bem marcantes. No chão, deitada de barriga para cima, Amy estava ofegante. O relógio a acusara de passar do tempo permitido. Havia lutado por quatro horas seguidas, suas pernas pareciam frágeis. Sua memória trouxe à tona suas poucas lembranças de infância. A inocência, a fragilidade, e também o sofrimento de dias ruins. Mas em tudo Amy sentia prazer. Aqueles maus momentos também lhe fizeram forte. E agora eram apenas ecos de um passado sólido.

Se no treinamento o tempo havia voado, no seu devaneio ao descansar da fadiga intenso, os minutos decolaram. Apenas foi acordada quando a imagem de um raposo apareceu à sua frente, estendendo a mão. Não era uma imagem, mas o próprio Tails.

– Passou um pouco do tempo, né? - Disse, meio brincalhão.

Amy riu, revigorada. O raposo continuou, agora mais sério:

– Tome um banho e vá para a sala de controle, já estamos chegando em Mobius.

Um pequeno arrepio subiu pela espinha da ouriça. O frio na barriga era incontrolável, mas Amy soube disfarçar bem o temor do futuro. Balançou a cabeça afirmativamente e saiu, acompanhada de Tails, que desligou o simulador e as luzes.

Enfim, tudo vai acabar. - Pensou ela.

...

A pista de pouso do Cyclone ficava em Mystic Ruins, próximo ao local onde a ilha flutuante repousava. Pouco tempo depois da aterrissagem, os rostos conhecidos começaram a aparecer. Assim que a porta da nave se abriu e a luz do dia entrou nos aposentos, uma pequena coelha cor de creme aguardava solenemente ao pé do veículo. Segurava um colar de flores silvestres. Ao seu lado, um Knuckles pensativo estava com os braços cruzados. Cream correu ao encontro de Tails. Os dois se abraçaram.

– Tails! – A voz aliviada da coelhinha foi abafada pelo contato de sua boca com o pelo do raposo. O roçar de seus lábios nos ombros de Tails era suave, e durou pouco mais que alguns segundos. Silver, que saiu logo após, foi cumprimentado por Knuckles num aperto de mãos caloroso.

– E aí, garotão? – Um tapinha nas costas do ouriço estabeleceu um clima de cumplicidade e todos os outros que não estavam visíveis para os que estavam chegando, começaram a se manifestar. Rouge e Shadow foram os primeiros a entrar, seguidos pelos detetives Chaotix e Mighty. Pouco tempo depois, Big com seu fiel parceiro Froggy, e os Babylon Rogues. Até mesmo E-123 Omega e Shade estavam lá. Após os cumprimentos e abraços saudosos, Tails, tomou a palavra:

– Todos vocês... Vieram aqui nos ajudar... – As palavras faltaram por alguns segundos. A verdade era que o que ainda mantinha a causa de Tails de pé, era saber que não estava lutando sozinho – Saibam que tudo isso é muito importante pra mim? O que vocês estão fazendo, se sacrificando por Sonic e pelo nosso planeta não tem preço. Nós somos o alvo número um de nosso inimigo. Amy, – olhou pra ouriça rosa – traga Brine.

A ouriça rosa assentiu e caminhou a passos lentos até a nave e entrou desapareceu em uma sala mais próxima do primeiro corredor. Voltou poucos segundos depois com a pequena loba que estava de cabeça baixa. Talvez Brine estivesse assustada porque nunca tivesse sido observada por tantos de uma vez só.

– Esta é Brine. É a única peça que falta no jogo de Pyro. Eu peço a paciência de vocês para que possam ouvir acerca de tudo com o que lutamos agora e a gravidade da nossa situação. Amy me ajude se eu esquecer de algum detalhe, certo?

A hora seguinte foi recheada de palavras. Palavras de vários gêneros, tamanhos e significados. As palavras-chave foram "planetas", "Demolish", "Pyro", "guardião e "rosa negra". Os rostos dos ouvintes assumiam diferentes reações, e algumas poucas dúvidas surgiram, à medida que o tempo se passou. Ao fim, após uma pausa de quase um minuto, Tails completou:

– Mobius está em perigo. O Eixo Rosa Negra está em perigo. Um perigo maior do que os próprios Metarex. É algo que pode significar a destruição de tudo que amamos e vivemos por causa de poder. Por isso, amigos, que fiquem cientes, é uma batalha árdua. Não só por Sonic ou Blaze. Mas por nossas próprias vidas. Estão todos comigo?

Começou com Mighty, um dos amigos mais antigos. Deu um passo à frente e balançou a cabeça em sinal afirmativo. Aos poucos, todos repetiram o mesmo movimento, e assim, após o assentimento de todos, Tails por fim declarou:

– Vamos nos preparar.

...

– Senhor, estamos finalizando o conserto das turbinas para completar o procedimento padrão de invasão a um planeta. E o Raposo e sua tripulação aterrissaram há poucas horas em território firme.

–Excelente. Quero todo o nosso exército pronto até o amanhecer. Finalmente vou pôr as mãos naquela criança. – Pensou Pyro. Era chegada a hora de ter o que tanto desejava. Levantou-se silenciosamente e percorreu os corredores de sua nave. A brisa artificial era doce. Sim. Doce. Sinestesia era uma das vantagens de ser uma Presença. Pyro sentia o sabor de tudo, desde o vento oriental até a nota errante de um instrumento musical desafinado. Mas nada se compara a sentir o gosto do medo, da dor. Era algo completamente singular. E à medida que se aproximava da masmorra onde seus prisioneiros estavam ele podia sentir em cada célula de seu corpo o gosto adstringente da dor e ódio. Delicioso.

Ao entrar, se deparou com Quake, que ainda estava adormecido. Pyro sentiu com uma das mãos o pequeno medalhão de prata com uma pequena pedra preciosa cravejada. Estava em seu pescoço, havia sido fácil identificar em Quake o amuleto. Dentro dele, havia duas fotos: A avó de Quake e um de sua pequena filha. Isso reafirmava a suposição de que aquele pequeno medalhão era seu maior amuleto pessoal. E agora, Quake jazia em um sono profundo. Talvez ele mesmo estivesse em coma ao fim das contas. Mas isso não importava. Só era preciso que ele estivesse vivo. E ele estava. Pyro podia sentir o gosto das emoções do albatroz. Desespero. Sabor ácido. Talvez ele estivesse tendo um pesadelo.

Blaze apenas observava tudo. Nenhuma palavra saiu de sua boca desde o momento em que Pyro pisou na masmorra. Após alguns segundos em observação, ele percebeu que em Blaze o amuleto também era bastante aparente – até mesmo óbvio demais. Estava em sua testa. Para averiguar se de fato era a pedra, Pyro tirou medalhão do pescoço e aproximou ao encontro da jaula invisível de Blaze. Como esperado, aquela pedra pequenina reagiu. Sentiu em suas mãos que elas desejavam se encontrar, como ímãs. Blaze arquejou com a reação.

– Entregue-me.

– O quê? – Era um pouco inútil perguntar. Afinal ela sabia muito bem do que ele estava falando. Mas Pyro não lhe deu respostas. Apenas puxou o seu amuleto tão precioso. A jóia que sua mãe um dia lhe dera quando era criança, e sua única lembrança. Ela sentiu como se tivessem lhe arrancado um braço ou uma perna ou até mesmo sua honra. Segundos ou minutos depois – ela não conseguiu distinguir - sentiu Pyro lhe estrangulando, e lentamente o mundo foi escurecendo e logo, já não existia mais nada para lamentar.

...

De volta aos corredores, Pyro costumava pensar bastante em sua vingança. Que perfeita vingança. Ou quase... A verdade é que Pyro bem sabia que havia uma brecha naquele plano todo em que ele não podia lidar muito bem. Estava faltando um pedaço. Dois, na verdade. Dois amigos. Amy e Tails. Eles eram o problema. Eles que estavam com os amuletos. Mas Pyro não conseguia compreender como e por que, afinal o guardião de Mobius era Sonic, tinha certeza disso. De alguma forma seus avôs conseguiram esconder o amuleto dele para que pudessem proteger o planeta.

Entretanto, ele não podia deixar de admitir que capturar Sonic, fora uma ideia brilhante. Sim, os pequenos e indefesos amigos sem seu líder são como uma orquestra sem seu maestro. Eles não conseguiriam fazer muita coisa sozinhos. O maior de seus problemas agora era Brine, a pequena guardiã. Sua mãe, a guardiã antecessora, era uma poderosa loba das águas. Controlava o tempo como ninguém. E sua filha não sabia disso, nem mesmo o pai sabia que sua amada e saudosa esposa levava uma vida dupla. Brine não precisaria saber disso. Não. Era hora de agir. Entrou na sala de controles. A figura na escuridão disse:

– Meu lorde, o processo de otimização das turbinas-padrão está completo. Tudo está pronto.

– Excelente. Atacaremos amanhã, Eggman. Ah, avise ao meus invasores que eles podem realizar suas invasões.

– Sim, meu lorde.

...

As coisas não estavam necessariamente caóticas em Mobius, mas a agitação era evidente em todos que se dispuseram a ajudar na proteção do planeta. Havia muito que fazer. Knuckles, sempre perto da Esmeralda Mestre, aguardava silenciosamente sinais ou algum contato de Tikal. Cream e Amy e o raposo, que passavam a maior parte no laboratório, estavam de olho nos radares e computadores. Shadow fazia a guarda noturna, enquanto Silver assumia pelo dia. Os Babylon Rogues ficaram responsáveis por buscar outras esmeraldas do caos, para o caso de serem necessárias. Os Chaotix ficaram incumbidos de realizar um trabalho peculiar: Fazer uma convocação pública a todos os demais conhecidos que quisessem ajudar. Rouge acompanhou na tarefa, em virtude de seus muitos contatos.

No fim do dia, Tails, após deixar os radares e sinalizadores a postos, sentou-se na sacada de seu laboratório em Mystic Ruins. Amy, que fazia companhia a Cream e Cheese na cozinha, saiu um instante para descansar da agitação diária e respirar um pouco. Acabou por encontrar o raposo admirando o pôr do sol.

– Dia cheio, hein Tails?

Estava tão silencioso que suas respirações podiam ser ouvidas. O raposo balançou a cabeça em sinal afirmativo.

– Todo mundo está trabalhando tão bem. Mais do que eu esperava. Tô impressionado.

– Eu não. – Retrucou Amy. – Eu nunca desconfiei deles, sabe. Acredito que seja porque nunca observávamos o bastante pra perceber que eles sempre fazem um ótimo trabalho.

– É verdade. Hoje cedo, quando mostrei o plano para a hora do ataque, todos se mostraram muito prestativos e dedicados. Acho que fizemos nosso melhor.

– E Brine? Onde ela vai ficar?

– Eu não sei se vai ser uma boa ideia deixa-la. Junto de nós ela estará bem mais segura...

– Tails, lembre-se que ela é só uma criança!

– Criança? Olha pra nós! Nós somos crianças também. Cream não deve ser mais velha que ela e olha só o que ela já pode fazer. Amy... Não adianta querer voltar atrás. Ela viu o pai ser assassinado a sangue frio, já não é a mesma, a sua inocência já foi corrompida.

Era cruel, mas era verdade, e Amy sabia disso. Ela esperou um tempo para que toda a tensão se esvaísse antes de perguntar:

– E agora, o que fazemos, capitão? – Sorriu e brincou a ouriça, mas sem usar de deboche.

O raposo pôs-se a olhar pro céu antes de dizer:

– Agora é esperar. Pyro vai aparecer. Ele precisa de algo que só pode encontrar aqui. Algo que só nós podemos dar a ele.

Amy sorriu, e ambos entraram para descansar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Believe in Yourself" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.