A Peregrina escrita por Bleumer


Capítulo 4
Clareira Sob o Céu Estrelado


Notas iniciais do capítulo

Se aproxime e deixe-me contar a história, amigo leitor...



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*Narrativa em Terceira Pessoa*

O sol nasceu e trouxe consigo um novo dia para a Sociedade do Anel, todos os integrantes estavam prontos e esperando na entrada de Valfenda. Os pequenos Hobbits estavam arrumando melhor as mochilas nas costas, tentando se acostumar com o peso da bagagem e conferindo se tinham comida suficiente, afinal isso era a maior preocupação deles. Boromir e Gimli conversam distraidamente em um canto. Peregrina estava o mais distante possível do grupo, olhando para todos por breves segundos e depois voltando a olhar os arredores, era como se seus olhos não quisessem perder nenhum detalhe. Legolas estava parado esperando pacientemente Mestre Elrond dar seu adeus, enquanto olhava discretamente pelo canto do olho para Peregrina, era como se ela quase se fundisse a paisagem, seu corpo ficava imóvel e a única coisa que se mexia eram seus incríveis olhos verdes.

Depois de pronunciar algumas palavras de encorajamento, Elrond finalmente deu sua bênção e adeus para o grupo, todos começaram a sair pelo portão sem olhar para trás, mas Peregrina percebeu uma curiosa troca de olhares entre Aragorn e a elfa Arwen... Depois que passaram pelo portão a viajante olhou interrogativamente para o rosto de Aragorn em busca de uma reposta para o que tinha visto, ele balançou a cabeça em um gesto afirmativo e logo depois desviou o olhar, um pouco constrangido por ter sido pego no flagra. Peregrina ficou um pouco confusa, Aragorn amava uma elfa, mas aquele amor era aceitável? Ela achava que não era possível amor entre duas raças diferentes. Então percebeu que era um amor proibido, secreto, escondido, por isso a troca de olhares tão discreta. Acabou dando um pequeno sorriso diante daquela descoberta, mesmo que ninguém tenha visto seu sorriso por causa da máscara que lhe cobria o rosto.

Todos estavam caminhando em fila indiana, ainda tentando se acostumar à ideia de viajar juntos, de serem companheiros de armas. Alguns iam mais rápidos e outros mais devagar, fazendo a fila ficar desorganizada, até que algumas horas depois todos tinham sincronia nos passos, todos sabiam o ritmo que o companheiro andava e podiam seguir com perfeição. Eles tinham encontrado o ritmo do grupo. Mesmo que ninguém soubesse, ali começava a base da confiança que acompanharia a Sociedade até o final.

Peregrina andava atrás, muito afastada do grupo, há uns bons vinte metros de distância da Sociedade que caminhava com determinação. Aragorn virou o pescoço para confirmar se o grupo estavam bem e se deparou com a cena de todos andando sem maiores problemas, mas também viu que Peregrina estava distante do grupo, na mesma hora mandou que todos parassem a fim de esperar que a viajante conseguisse chegar mais perto.

Talvez estejamos indo com um passo muito rápido para ela acompanhar, ele pensou.

Quando todo o grupo parou e olhou para trás, Peregrina também parou e discretamente tentou olhar por cima do ombro, sem entender o motivo de todos terem parado e ficado olhando para ela, como se esperassem que ela fizesse algo. Alguns instantes se passaram sem que ninguém se mexesse. O grupo esperando Peregrina aproxima-se para continuar e Peregrina esperando que eles voltassem a andar para poder segui-los. Estavam em um impasse bobo.

_Hã... Peregrina, não vai andar? - Aragorn quebrou o silêncio incômodo.

_Claro que vou. - Se passou mais alguns instantes sem que ninguém se mexesse. Todos esperando. Boromir já estava ficando irritado com aquilo, com aquela perda de tempo, mas respirava fundo tentando manter a calma.

Gimli que não tinha nenhum interesse de manter a calma perguntou.

_Então? O que estava esperando? Que nós te carreguemos?

_Prefiro morrer a ser carregada por alguém e de qualquer forma acho que você nunca conseguiria me carregar, anão. - Peregrina não tinha intenção de soar rude e ofender o mestre anão, mas foi isso que acabou acontecendo e só piorou quando Gimli viu o sorrisinho de deboche que Legolas esboçava as suas custas.

Gandalf viu que aquilo estava prestes a ser transformar em mais uma discussão e resolveu dá um basta.

_Nem comecem Legolas e Gimli! E Peregrina você está cansada e por isso fica para trás ou não quer caminhar perto de nós?

Agora foi a vez de Peregrina esboçar um sorriso.

_Estou longe de ficar cansada, Gandalf. Posso andar por muito tempo antes de isso acontecer. Apenas prefiro não me aproximar mais que o necessário e por isso fico para trás.

_Você nos despreza tanto assim pra nem querer caminhar conosco?! E ainda quer que a aceitemos na Sociedade?! Não me importa o que Mestre Elrond diga! Eu nunca vou aceita-la aqui. - Aquilo foi à gota d'água para Boromir, ele carregou cada palavra com toda sua raiva e saiu andando em frente sem olhar para ver se os outros o acompanhavam.

Mesmo que não quisesse demonstrar, aquelas palavras tinham magoado Peregrina. Claro, não era nenhuma novidade ela não ser bem vida nos lugares, sempre foi assim durante toda sua vida, mas mesmo assim ainda magoava ouvir aquele tipo de palavras. Ela suspirou e tentou esconder a mágoa dos seus olhos da melhor forma possível e achou que tinha feito um bom trabalho, ninguém percebeu que ela ficou triste.

Mas Peregrina estava errada, Legolas percebeu a sombra de tristeza passando pelos olhos dela, além do próprio Gandalf perceber também. O mago já sabia de uma parte da história dela e não ficou nada satisfeito com a forma que Boromir a tratou. Peregrina já sofrera demais, e no que dependesse dele, ela não sofreria na Terra-Média.

_Ás vezes a raiva nos deixa cegos, surdos e dizemos palavras terríveis... Não se deixe levar por esse caminho, Boromir. Peregrina tem os motivos dela. Não cabe a você julgar.

Boromir parou e olhou para Gandalf.

_O que eu disse é a verdade no meu coração. É isso que eu sinto e não pretendo mudar de ideia. - E voltou a caminhar.

_Então lamento que seja assim, filho de Gondor.

O resto do grupo olhava toda aquela cena sem dizer nada e sem saber o que fazer. Frodo se sentiu profundamente incomodado pelo tratamento que Peregrina teve. Embora o pequeno hobbit não tivesse dito para ninguém, ele se achava um pouco parecido com a misteriosa viajante. Os dois estavam presos a um destino que claramente não queriam e tinham uma enorme missão para cumprir... O que Frodo não sabia era que Legolas também tinha ficado incomodado com isso, mas por outros motivos. O elfo não achava certo tratar uma mulher assim, mesmo que ela fosse irritante.

_Vamos! Continuem andando. - Gandalf disse e todos seguiram jornada. De tempos em tempos Pippin ou Merry se viravam para verificar se Peregrina ainda estava acompanhando eles. Ela sempre estava. A vontade deles de andar ao lado dela e perguntar sobre seu mundo, pedir que contasse uma ou duas histórias, só crescia a cada dia.

Três dias já haviam se passado, o grupo só parava a noite para dormir e comer um pouco e logo depois voltavam à caminhada. Não havia mais brincadeiras ou canções dos Hobbits, eles estavam cansados demais para isso. Os integrantes mal conversavam entre si. Mas ao longo desses dias era frequente ver Gandalf andando lá atrás e conversando com Peregrina. Os dois passavam horas conversando, só não se sabe o que exatamente, já que o resto do grupo nunca conseguia ouvir uma palavra, nem mesmo Legolas ouvia, era como se existisse uma magia impedido isso. E embora Peregrina não quisesse admitir, ela gostava da parecença do velho mago, ouvia com atenção seus conselhos e sentia-se confortável em conversar com ele.

Quando o sol já estava quase se pondo no final do quarto dia de viagem, a comitiva encontrou uma clareira onde poderiam passar a noite sem problemas. A clareira era pequena e incrivelmente redonda, sem nenhuma falha, grama verde cobria todo o chão formando um lindo tapete natural e algumas flores azuis e vermelhas cresciam nos arbustos. Era deslumbrante aquele lugar e ele parecia causar um efeito bom, os ânimos de todos melhoraram.

Sam logo foi preparar o jantar de Frodo e dos demais. Aragorn e Legolas foram inspecionar os arredores para ver se era realmente seguro ficar ali. Gimli foi para a floresta e voltou com os braços carregados de vários galhos para fazer uma fogueira e espantar a escuridão, Boromir rapidamente acendeu o fogo e cuidou para que ele não apagasse. Gandalf sentou em um tronco caído e pegou seu cachimbo, tentava relaxar enquanto Merry e Pippin o enchiam de perguntas.

Agora Peregrina estava há uns dez metros de todos, embora quisesse ficar mais longe, mas não tinha espaço na clareia para isso. Ela relutante sentou-se em uma pedra, apoiou o queixo nas duas mãos enquanto observava os demais e descansava. Um singelo sorriso acabou se formando nos lábios de Peregrina ao ver os dois hobbits que ficavam ao redor do mago. Aqueles dois eram capazes de deixar qualquer um louco.

Seu sorriso logo sumiu quando avistou Legolas voltando a clareia, seguido de Aragorn. Nem ela entendia porque tanta aversão ao elfo... Claro, ele é idiota, arrogante e irritante, mas não era uma má pessoa, pelo menos Peregrina não achava isso.

_O lugar é seguro, não vimos nenhum inimigo por perto. Podemos passar a noite aqui sem problemas. Além de que achamos um pequeno lago onde podemos nos banhar.

Todos ficaram felizes quando ouviram a notícia de Aragorn. Mesmo só tendo viajado por quatro dias, já se sentiam sujos. Era melhor aproveitar a oportunidade e tomar um bom banho. Afinal quem sabe quando teriam outra chance?

_A comida está pronta! Podem vir! Aqui, senhor Frodo, seu prato. - Sam parecia bastante orgulho de ter preparado o jantar com pouquíssimos ingredientes. Ele distribuía os pratos para todos. Peregrina só observava de longe, como sempre.

Todos já tinham um prato na mão e comiam quando Legolas percebeu que novamente Peregrina não se aproximava da comida.

_Peregrina, não vai comer nada?

_Não, obrigada. - Não era como se ela não quisesse comer. Estava com um pouco de fome, seu corpo era mais resistente que o de um humano normal, mas mesmo assim não podia ficar um longo período sem se alimentar, só que não podia aceitar a comida deles. Ela não era aceita na Sociedade, não fazia parte do grupo, como Boromir já tinha deixado claro, então não podia comer a comida deles. Não seria justo se ela fizesse isso, a prioridade era sempre eles e por ultimo ela própria. De forma alguma queria que faltasse comida para os integrantes da Sociedade porque eles tinham dividido o alimento com ela.

Peregrina se amaldiçoou mentalmente por não ter pensando direito e ter dado toda sua comida para Ella. Não se arrependia de ter ajudado a menina, longe disso, mas preferia ter pensando melhor e ter pegado comida com Elrond. Agora não adiantava reclamar, de qualquer forma ela ainda estava bem, podia aguentar a fome por mais algum tempo.

_Então você sabe dizer obrigada e ser educada de verdade. - Legolas deu um sorrisinho torto ao falar isso. Claramente querendo provocar a viajante.

_Não tem nada melhor para fazer, elfo?

_Na verdade, não tenho. Mas diga-me, porque não quer comer? - Legolas podia ser insistente quando queria e Peregrina estava descobrindo isso.

_Não tenho fome. - Ela virou o rosto para o lado, como uma criança birrenta e se recusou a olhar naqueles olhos azuis.

Legolas resolveu se aproximar dela pela primeira vez. Já que todos iam viajar juntos por tanto tempo, era melhor que se dessem bem ou pelo menos tentassem. Ele sentou na pedra ao lado dela. Todos da Sociedade olhavam para o gesto ousado do elfo, afinal ninguém tinha tentando se aproximar dela, ao que parecia o único que Peregrina parecia tolerar era Gandalf, por isso todos mantinham distancia até aquele momento. Ela arqueou as sobrancelhas e o fitou sem entender a súbita aproximação.

_Não acredito nisso. Eu tenho observado e você não come nada há três dias, quatro com esse. Está tudo bem, você pode pegar a comida, tem o bastante aqui. Eu não preciso de muita comida para ficar bem, posso dividir o meu com você. - Legolas estava sendo verdadeiramente gentil e sincero na sua declaração. E aquela situação dela não comer nada o estava incomodando. A ideia que ele tinha dela no inicio já começava a mudar, talvez estivesse mesmo errado quando achou que Peregrina era irritante ou pior, uma inimiga.

_Não preciso que você acredite em mim e nem preciso que divida nada comigo, elfo. - A insistência e boa vontade dele estavam deixando Peregrina nervosa, ela não sabia como se portar e acabava por ser grossa. Afinal ninguém a travava bem sem ter segundas intenções, sem querer algo em troca.

Imediatamente Legolas fechou a cara. Ele estava certo, Peregrina era irritante e ele fora um tolo por tentar ser gentil com essa garota. O elfo levantou do seu lugar sem dizer mais nenhuma palavra, colocou seu prato perto de Sam e andou para dentro da floresta. Estava furioso demais para dizer qualquer coisa.

Os outros observaram a tudo, mas não conseguiram ouvir nenhuma palavra do que os dois disseram, então não entenderam o motivo de Legolas estar tão irritado.

Gandalf ainda fumava seu cachimbo e ria internamente daqueles dois. Ele não precisava ter o dom da visão para saber que eles ainda se dariam bem...

Todos terminaram de comer e Legolas ainda não tinha retornado da floresta.

Pippin estava morrendo de vontade de ouvir uma história do mundo de Peregrina, então tomou coragem e se aproximou da pedra onde ela ainda permanecia sentada. Chegando perto pode perceber que ela admirava o céu estralado acima de suas cabeças. Seus olhos brilhavam tanto quanto as estrelas. Pippin achou aquilo incrível. Como podia sentir-se amedrontado por uma pessoa que tinha tanta luz no olhar?

Munido de mais confiança do que nunca, parou em frente da viajante. Ela demorou alguns segundos para olhar para ele, era como se estivesse presa na beleza daquele céu.

_Olá! Acho que não fomos devidamente apresentados. Meu nome é Peregrin Tûk, mas pode me chamar de Pippin! - O hobbit sorriu e esperou que Peregrina dissesse algo.

_Eu sei quem você é, Peregrin. - Para surpresa de Pippin o tom de voz da viajante foi suave e doce, quase musical.

_Bom, você pode conversar comigo se quiser, eu sei como é difícil achar uma companhia decente por esses lados! E ainda mais um cavalheiro! Mas por sorte, eu sou os dois, digo, decente e cavalheiro! – Enquanto ele falava arrumava a sua roupa, tentando de fato parecer um cavalheiro.

Nesse memento Legolas retornou da floresta, um pouco mais calmo. E ficou surpreso ao ver Pippin tão perto da viajante e conversando animadamente com ela.

_Ora, já percebi que você é um cavalheiro, diferente de alguns outros por aí... - Peregrina disse isso olhando diretamente para Legolas. Sabia que ele podia ouvir. Em resposta, o elfo bufou. Ela deu um pequeno sorriso ao ver que também tinha conseguido provocar ele.

_Se não for pedir muito... Será que não gostaria de contar uma história? - Pippin sentou na pedra que antes Legolas tinha estado e ficou olhando esperançoso para Peregrina.

_Uma história?

_Sim! Do seu mundo! - O hobbit quase pulava no lugar tamanha excitação de ouvir uma história sobre outro mundo.

_Ah, eu não sei...

_Por favor! Só uma história! - Peregrina olhou para aquele rostinho tão alegre... Não conseguia dizer não.

_Tudo bem, mas apenas uma história.

_Merry! Frodo! Sam! Venham para cá! Peregrina vai contar uma história! - Não foi preciso outro convite para os hobbits se aproximarem. Todos sentaram envolta dela e esperaram a história. Claro que os outros membros da Sociedade também tinham ficado curiosos para ouvir algo. Aragorn chegou um pouco mais perto e se apoio em uma árvore, Gimli orgulhoso não quis chegar muito perto, mas estava atento a voz de Peregrina. Boromir não se mexeu um centímetro para ouvir. Gandalf permaneceu no mesmo lugar, já sabia de algumas histórias sobre a viajante e Legolas foi se aproximando aos poucos, vencido pela curiosidade.

Olhou para todos ali ávidos para ouvir algo e suspirou.

Odeio plateia, ela pensou.

_Então... Hã... Vou contar um pouco de onde vim, vou contar sobre meu mundo, sobre Pandora. Meu mundo já viveu a Era de Ouro, todos eram felizes e havia fartura pra todas as pessoas, ricas ou pobres, nada disso importava, pois todos eram iguais. Ninguém ficava doente. Ninguém sentia fome. Não havia medo. Nem guerras. Só paz e tranquilidade. E acima de tudo existia amor por todas as formas de vidas. Essa Era Dourada começou quando o Grande Viajante chegou ao nosso mundo e com isso tudo mudou para melhor... - Peregrina fechou os olhos enquanto contava a história.

Sua voz foi aumentando sem sua permissão e logo podia ser ouvida por todos. Era uma voz etérea, encantada, mágica. Era o tipo de voz que faz você esquecer de tudo e só prestar atenção nela. Ao mesmo tempo em que era doce e musical, era grave e forte. Era tudo e nada. Era a voz de um mundo inteiro e a voz de Peregrina em uma só. Nunca nenhum deles ouvira voz mais bela e harmoniosa. Legolas não conseguia parar de admirar Peregrina. Não conseguia parar de ouvir aquela voz. Poderia ouvi-la por toda eternidade e ainda seria pouco.

A voz de Peregrina era transcendental.

Era sublime.

Era celestial.

Era perfeita.

_Mas o Mal seguiu o Grande Viajante e As Trevas caíram sobre nós... - Ela continuou.


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Notas finais do capítulo

Olá, se você chegou até aqui deixe um comentário para Peregrina.
Comentários são sempre bem-vindos. :3
Até breve.