A Peregrina escrita por Bleumer


Capítulo 3
O Mar Inteiro e o Céu Infinito


Notas iniciais do capítulo

Amigo Leitor? Você voltou! Que alegria! Venha, sente, deixe-me contar mais da história...


(Queria dedicar esse capítulo para LevelHard, ClaraMiKaElsOn e Gigicalove que foram as primeiras a comentar minha história. Obrigada! :D)



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*Narrativa em Terceira Pessoa*

Todos ainda estavam em pé formando um meio círculo desorganizado envolta de Peregrina e trocavam olhares preocupados entre si.

_Vejo que você fez uma longa jornada, Peregrina... Hoje você é minha convidada, coma e descanse, então mais tarde poderá nos contar mais sobre você e seu mundo. - Elrond disse isso em um tom de voz límpido e claro, além de ser possível perceber algumas notas de autoridade na sua voz. E estava bem claro que o “nós” que ele se referia era ele e Gandalf e não o resto da Sociedade, Elrond já estava farto de ouvir discussões daquele grupo.

Peregrina não tinha opção, não era como se ela pudesse recusar a oferta, embora esse fosse o desejo do seu coração. Ela realmente não queria passar mais tempo que o necessário com aqueles seres. Ela mais do que ninguém, sabia como é ruim e doloroso se apegar a alguém... Começava assim, com coisas simples, pequenas conversas, depois ia crescendo e crescendo, até você perceber como aquela pessoa era importante para você, como era fundamental você esta perto de quem gostava, então essa pessoa ia embora e deixava uma trilha amarga no seu coração, dai era só ladeira abaixo. A melhor forma de evitar sentir essa dor era não se aproximar demais de ninguém porque quando essas pessoas fossem embora da sua vida não passariam de lembranças doces. E as pessoas sempre iam embora da vida de Peregrina.

Mas por outro lado ela estaria livre de todos aqueles olhares de desconfiança e raiva, podia sentir o olhar de cada um daqueles homens sobre si. Quase como se fossem capazes de perfurar sua carne. E ela bem que sabia que se esses homens tivessem a chance, tentariam perfurar sua carne, não com olhares de desconfiança, mas sim com afiadas espadas, flechas, machados...

_Claro. Nada me dá mais felicidade que acompanha-los e explicar tudo. - Peregrina murmurou essas palavras carregadas de uma ironia mal disfarçada.

Gesto que não passou despercebido pelos elfos presentes ali, principalmente de Legolas... Ele que fitava tão intensamente essa misteriosa garota. O elfo loiro tentava de todas as formas entender quem ela era de verdade e se era uma inimiga que precisaria matar em um futuro próximo. Preferia não ter que fazer isso. Por algum motivo que estava além da sua compreensão, Legolas sentiu-se fascinado por ela, estava fascinado como uma pessoa podia ter movimentos tão rápidos e ser tão boa manejando uma espada, nem mesmo alguns dos melhores guerreiros elfos eram tão bons, era mais do que isso, Legolas sentiu-se ligado a ela, mesmo sem ter nenhum motivo para isso. Sentiu que Peregrina sempre fora o fio que puxava seu destino até aquele dia. Ele não compreendia nada.

Enquanto analisava os gestos de Peregrina e tentava ver algo que pudesse dar mais alguma informação sobre quem ela era, embora o corpo dela fosse quase que completamente coberto pelo seu traje negro... Ele acabou mirando diretamente na única parte exposta do corpo dela, seus olhos.

Nesse momento, como se sentisse que o olhar do elfo era mais intenso que o dos outros, Peregrina também olhou diretamente para os olhos de Legolas. Como se o desafiasse a manter o olhar, dizer mais alguma palavra ou mata-la, talvez tudo isso ao mesmo tempo. Eles ficaram se encarando por segundos, horas ou eras, não se sabe. Nenhum dos dois saberia dizer quanto tempo passou ou se o tempo simplesmente parou para aqueles dois, como se eles fossem transportados para um mundo fora do mundo, um tempo fora do tempo, um lugar que era o inicio e o fim, que era tudo e nada. Eles estavam presos sob o olhar um do outro.

Legolas nunca tinha visto olhos mais intensos que o daquela garota, nem mesmo ao longo dos seus anos nunca vira ninguém com olhos parecidos, aqueles olhos pertenciam somente a Peregrina, como se por um capricho do destino eles tivessem sido feitos exclusivamente pra ela e depois a forma foi jogada fora para que ninguém ousasse ser parecida com ela. A cor deles era verde, não um verde qualquer e sem graça, quando olhou dentro deles Legolas lembrou-se da cor que um dia fora sua floresta natal antes de virar a Floresta das Trevas. Não, era mais do que isso. Os olhos de Peregrina eram tão verdes e límpidos como o brilhante e exuberante mar da Terra-Média. Legolas podia jurar que aqueles olhos tinham a profundidade de um oceano inteiro ou talvez mais do que isso. Além de não duvidar nem por um segundo que como o oceano os olhos daquela estranha podiam ser calmos e suaves, como o mar no fim de uma tarde, mas com a mesma imprevisibilidade que só o mar tinha, eles poderiam se tornar uma tempestade terrível que arrastaria para suas profundezas tudo que estivesse em seu caminho. Legolas se perguntou se seria arrastado por aquele olhar um dia...

Para Peregrina olhar dentro daqueles incríveis olhos azuis era como olhar para o céu no verão. O céu azul e tranquilo que às vezes podia ver em seu mundo. Era como ver a grandeza de todo o firmamento em um tom de azul ofuscante. Era lembrar-se de um tempo a muito esquecido, de outra vida. De uma vida mais feliz onde uma pequena menina se deitava na grama e passava horas olhando o céu azul. Tudo podia mudar, ser incerto, muitos podiam partir e nunca mais voltar, podia existir dor e tristeza, mas o azul daquele céu de tempos atrás era um porto seguro para aquela menina, era uma das poucas certezas da sua vida, ele não mudava. Pena que aquela menina não exista mais. Olhar naqueles olhos azuis era como ver toda a vastidão do céu, eles eram firmes, seguros e determinados. Peregrina sentia que podia voar por eles, flutuar sem nunca cair ou cansar, ser livre no azul dos olhos de Legolas...

Talvez o mais surpreendente nessa troca de olhares foi que tanto Legolas quanto Peregrina puderam ver um no outro os olhos carregados de uma tristeza antiga, do tipo que só quem já viveu muito pode entender. Os dois tinham olhos com pontos de melancolia.

_O resto da Sociedade pode ficar aqui ou ir para suas acomodações. - Quando Elrond acabou de falar tanto Peregrina quanto Legolas já tinham parado de se fitarem. Às vezes a eternidade tem o tempo de um segundo.

Mestre Elrond, Gandalf e a viajante se retiram do local e logo depois sumiram de vista. Peregrina não olhou para trás nenhuma vez, e Legolas, mesmo sem entender, desejou que ela virasse e olhasse novamente pra ele.

As outras pessoas que não formavam a Sociedade também se retiraram, apenas sobrando oito membros. Um silêncio constrangedor tomou conta do espaço... Até que o pequeno Peregrin Tûk, o Pippin, fez uma pergunta.

_Você conseguiu ver se ela era bonita, Merry?

Sua pergunta foi seguida de suspiros e olhos revirando tamanha idiotice.

_Eu não acredito que vão deixar essa estranha ir conosco! Isso é um absurdo! - A voz naturalmente alta de Gimli ecoou claramente ignorando o comentário de Pippin, como os demais fizeram.

_Concordo com o mestre anão. Isso é loucura! Ela não pode vir conosco. - Boromir praticamente espumava de raiva e mesmo não querendo admitir, sentia-se em completa vergonha por ter perdido pra uma mulher. Ainda mais nem ter sido capaz de ver os movimentos da sua oponente.

_Eu acho que ela é feia, por isso esconde-se atrás daquela máscara. - Pippin falou baixinho para Merry, mas claro que todos puderam ouvir. Em troca Merry deu uma cotovelada nas costelas do Tûk, tentando fazer o outro ficar quieto e não falar mais besteiras. A beleza ou feiura de Peregrina era a ultima das preocupações daquele grupo.

_Eu acho que Frodo deve dar sua opinião. - Aragorn que até então permanecia fora da discussão resolveu se pronunciar e todos na mesma hora olharam para o Portador do Anel.

_Eu... Eu acho que está tudo bem ela nos acompanhar. Será mais uma ajuda. - Frodo ficou nervoso de ter todos olhando para si e rapidamente terminou de falar. - Talvez seja bom...

_Talvez? Talvez?! Estamos lidando com o futuro da Terra-Média! Não temos espaço para "talvez", seu pequeno tolo! Ela é uma inimiga disfarçada! - Gritou Boromir para Frodo. De uma forma nada gentil e fazendo o hobbit se encolher brevemente.

_Mais respeito! Você está se dirigindo ao Portador do Anel! - Legolas disse isso enquanto se colocava em frente de Boromir, pronto para desferir algum golpe se necessário. Não podia tolerar aquele tipo de falta de respeito com os pequenos. Era um absurdo.

_Isso mesmo! - Sam agitou os braços enquanto falava, como se estivesse tentando entrar em uma posição de luta, sem sucesso. - Não pode falar com o senhor Frodo assim, seu grandalhão!

_Respeito?! Um elfo não tem moral nenhuma para pedir respeito! Ninguém devia respeitar um elfo! Vocês são traiçoeiros! - Brandiu Gimli enquanto apontava um dedo para Legolas e avançava em sua direção. Ao que parecia a discussão se concentrava em Boromir, Gimli e Legolas. Os três não estavam mais discutindo sobre o Anel, Frodo ou sobre respeito, isso havia se transformado em uma discursão sobre suas raças e seus orgulhos feridos.

_Basta! Não estamos aqui para brigar! - Aragorn falou mais alto que todas as vozes ali e todos se calaram, alguns por respeito a ele e outros pelo susto do seu grito. - Se Lady Galadriel previu isso, se Gandalf e Mestre Elrond concordaram então devemos confiar neles e seguir com o plano! É como Frodo disse, ela seria mais uma ajuda e toda ajuda é bem vida! - Aragorn se dirigia para a saída do salão quando parou e disse com uma voz mais controlada. - Aconselho vocês a irem descansar, pois nossa jornada será muito longa e perigosa, companheiros. - Dito isso ele se virou e foi embora, sumindo pelo interior de Valfenda.

Logo depois Boromir saiu pisando forte no chão e com as mãos cerradas em punho, estava mais do que insatisfeito com aquela situação toda.

Os quatros hobbits saíram depois, um pouco nervosos com o rumo que a conversa tinha tomado, mas logo se alegram quando lembraram que estavam em um reino élfico e podia conhecer mais da vida de um elfo, criaturas que eles sempre admiraram.

Gimli e Legolas ainda trocavam olhares raivosos quando o anão finalmente decidiu retirar-se resmungando algo sobre um elfo não ser digno de confiança.

O último a sair foi Legolas.

Ele olhou para cima e suspirou. Como conseguiremos ter sucesso naquela missão com um grupo desses? E ainda mais levando uma estranha de olhos e ações imprevisíveis? Ele pensou sozinho.

Pelo resto da noite Peregrina não foi mais vista. Ela ainda estava com Gandalf e Elrond, contando sobre seu mundo e um pouco da sua própria história. Era inevitável os olhares de surpresa e uma tímida admiração que podiam ser vistos nos rostos daqueles dois homens ao escutar tudo que lhes era dito, mas quando enfim o relato da história chegou ao fim, era possível ver a tristeza por ela estampada nos olhos daqueles dois. Eles não entendiam como Peregrina que cresceu cercada por tanta maldade e crueldade podia conservar um coração tão puro. Era uma flor que cresceu cercada de espinhos. Espinhos venenosos. E tudo o que foi dito naquela conversa ficou entre os três.

Peregrina foi levada até o quarto onde passaria noite, deitando sua cabeça no macio travesseiro e apagando quase que imediatamente...

O resto da sociedade continuava sem saber nada sobre Peregrina. E ela preferia que continuasse assim. A garota não tinha o menor desejo de ter que contar mais nada para ninguém, era sempre complicado e doloroso contar sua historia, além de ser quase insuportável ver o olhar de pena no rosto das pessoas. Pena dela.

Mas nem sempre o que se deseja é o que acontece.

Peregrina voltaria a contar mais da sua historia e isso seria mais em breve do que ela imaginava.


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Notas finais do capítulo

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