inCOMPLETO escrita por Lorenzo


Capítulo 12
Vultos


Notas iniciais do capítulo

Bem, eis aqui outro capítulo! Espero que gostem e que este possa responder algumas perguntas que já me foram feitas! (:



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Ter. 19.06.2012

Faz tempo que não vejo Emilly. Confesso que muitas vezes pensei em perguntar o que aconteceu com ela para que perdesse a perna. Sei que é um assunto muito delicado pra ela assim como é pra mim. Nunca mais visitei minha antiga casa depois do acidente e da morte dos meus pais. Lembro do meu quarto, da escada em que caí diversas vezes quando ainda era capaz de andar, lembro das dificuldades que meus pais tinham para cuidar dos meus braços naturalmente atrofiados. De todas as coisas que eu me lembro a mais turva das minhas memórias é o período durante e pré-acidente. Tudo o que há antes do acidente se confunde com diversas outras ocasiões da minha vida. É difícil lembrar dos meus pais. Sei que eu os reconheceria se os visse em fotos antigas, mas não consigo me recordar com perfeição de suas feições.

Puxo – com dificuldade – o cordão em meu pescoço e admiro o pingente por um tempo. Me lembro de Emily e seu cabelo ruivo esvoaçante. Me lembro de suas sarnas delicadas e sua boca perfeitamente desenhada. Seu sorriso e sua estranha mania de se trancar em si mesma. Eu não sei o que sinto por ela, o que sei é apenas que há algo. Duvido que seja amor ou paixão, ou qualquer coisa similar. Duvido que seja apenas um sentimento forte de amizade ou irmandade. Quase nunca nos falamos para que haja amizade entre nós. Talvez tudo não passe de uma necessidade de carinho, atenção, afeto. Talvez tudo não passe de atração. UMA NOTA MENTAL: PRECISO ME LEMBRAR QUE AINDA SOU HUMANO. QUEIRA EU OU NÃO.

Abaixo a cabeça para que seja mais fácil tirar o cordão e poder ter o pingente em minhas mãos, não apenas admirá-lo sobre meu peito magrelo. Tia Jaque está no jardim há algum tempo, não duvido que esteja fumando ou algo assim – suspeito que ela goste de se torturar –, então sequer cogito chamá-la para pedir ajuda para algo tão fútil como tirar meu cordão. Sei que posso dar conta. Preciso apenas me esforçar e...

Arrebento a porcaria do cordão e o pingente cai no chão, bem próximo a Mandie. Sei que posso dar conta. Preciso apenas apoiar meu tórax em minhas pernas e esticar – o quando eu puder e conseguir – meu braço para alcança-lo.
Então perco o equilíbrio. Minha cabeça atinge o chão com força, sei disso pois o barulho que ela faz me assusta mais que o próprio ato de cair da cadeira. Perco minhas forças e sentido aos poucos, vejo apenas dois pares de pés entre o fluído viscoso e ruge que escorre dificultando a minha visão. Consigo apenas observar que o segundo sapado – que é masculino – está completamente sujo de lama. Vejo as unhas de tia Jaque perto do meu rosto, tentando me levantar. ... ... Vejo seu rosto muito expressivo e sinto um enorme alívio nas costas quando tiram a cadeira de cima de mim. ... ... De relance percebo as feições estranhas e quase conhecidas daquele homem. ... ... Sinto o movimento afetado do carro e a textura do couro onde tia Jaque e eu estamos. Ela me sussurra algo. ... Me lembro do rosto de Emilly e imagino que, ao invés de tia Jaque, é ela quem acaricia meu rosto.

. . .

Qui. 21.06.2012

O calor é quase insuportável. O ambiente lúgubre o bipe constante me dão vontade de desconectar todos aqueles equipamentos de mim e sair dali. Um ventilador tenta – em vão – trazer algum conforto mas seu ranger me faz apenas sentir ainda mais nojo daquele lugar. Estranhamente me recordo de sentir frio em algum momento do último dia, porém creio que esse ventilador não consiga me fazer sentir nada além de nojo.

– Olá, meu bem. – tia Jaque parece um pouco sem graça.

– Oi tia. – tento levantar meu braço para tocar minha cabeça e descobrir o que realmente aconteceu percebo que estou ainda mais fraco que o comum.

– Foi bastante feio... – ela termina de fechar a porta e me ajuda a levantar meu braço para que eu toque os curativos – Eles tiveram bastante trabalho para tirar o vidro da região.

Fico um pouco confuso. Não sei como haveria vidro na minha cabeça.

– Vidro?

– Meu bem, um simples tombo de cabeça no chão não te faria ficar três dias no hospital.

TRÊS DIAS? – repito mentalmente, indignado. Aquilo não fazia sentido. Minha expressão com certeza acompanha meus pensamentos.

– Acho que você ainda está um pouco confuso. Quer descansar um pouco?

– O pingente! – grito – O que aconteceu com o pingente? – eu imagino a resposta que virá a seguir, porém preciso perguntar.

– Oh meu amor... Depois a gente conversa melhor sobre isso. Você precisa descansar e eu ainda tenho algumas pendências para resolver.

Ela entrou na defensiva. Sei que não é só o pingente. Sei bem quando tia Jaque tenta me esconder algo.

– Tia... – digo quando ela está quase atravessando a porta – Preciso de perguntar algo.

Ela para e me encara, como se me inquirisse algo.

– Quem era aquele homem que estava com a senhora? – noto que sua expressão muda radicalmente.

– Homem? – pergunta incrédula. Creio que ela pense que eu não me recordaria nada daquilo. Mas, para sua surpresa e azar, eu ainda me lembro.

– Sim. O do sapato social sujo. Que ajudou a senhora... Sabe? Quando tudo aconteceu.

Ela entra em estado de negação.

– Não havia homem algum, meu bem. Isso deve ser coisa da sua cabeça. – ela fecha a porta e sai do quarto. Ouço o som dos seus passos se distanciando.

Para a minha infelicidade o ventilador para.

Sei bem que havia alguém lá. Se ela quis que eu tirasse isso da minha cabeça, acaba de conseguir exatamente o oposto.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Algumas revelações estão por vir... (:



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