Eu sou o Título escrita por HA HA HA 22


Capítulo 4
O Capítulo Bebê


Notas iniciais do capítulo

Bom ou ruim. Errado! Os dois estão corretos. Casos.



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Está tudo dourado. A relva alta. Rabos-de-gato. Ou trigo. Ou bambus. Bem perto, mas, ao mesmo tempo, distante de se pegar. Corre. Corre tentando escapar. A coisa. Cinza. Branca. Está embaçada. Não identificado. A única coisa visível e discernida são duas mãos. Tentando agarrar. A visão melhora. Algo felpudo a frente. Cinza. Branco. O cérebro decodifica como um: Gato. De novo. Se afasta. Tudo dourado.

Os olhos da Madame foram se abrindo devagar. Sonolentamente. Vestia uma camisola marcante. O seu esqueleto de formas sedentárias e corpulentas se mexia. As pernas tentando alcançar o chão. Dessa vez, seus dedos escolheram, ao invés da pantufa roxa, o chinelo. Levantou a coluna e ficou. Sentada na beira da cama. Apoiou na cama com a mão e se levantou sem, dessa vez, gemer. Passou direto pelo banheiro e se dirigiu à sala. Sentou- se na poltrona. Pegou, na mesinha de centro, o controle. Ligou a televisão.

A sala da Senhora era respeitável. Aconchegante. Velha. Um sofá, de três lugares, lilás. Ocupando uma só parede da sala. Duas poltronas de chintz, turquesa claro, com estampa de flores amenas e estrutura de mogno. Uma mesinha de centro com o tampo de vidro e borda marrom- avermelhada, por cima de um tapete vinho mofado, cheio de fiapos pelas bordas. A sala era cheia de vasos, espalhados. Alguns com plantas. Outros vazios. Por fim, em cima da estante, o maior orgulho da sala. Uma TV novinha. Última geração. Toda a tecnologia convertia para ela.

A Velha tentava apagar aquelas imagens que apareciam em sua mente. Por um breve instante, tão reais. Queria se concentrar nas imagens da TV. Mas ainda tão marcantes em sua memória. Tão perturbantes. O que significa? Um gato. Cinza. Dourado. Um gato. “Estamos, agora, em frente ao Edifício, na Avenida, que acorreu o suicídio... Tenente, por que exatamente ele estava sendo perseguido? ”. Todas as informações se apagaram. A atenção foi voltada para a tela. Ainda era cedo, 7:15. Hora perfeita para um café. Mas o que estava acontecendo no centro da cidade. A velha não entendia. Só sabia que um homem tinha se matado. Que informação. Que notícia. Uma bela repórter. A Madame se recorda de ter sido muito mais bela que ela. Muito mais fina.

Os jovens de hoje em dia começaram a decair. Se perderam em sonhos. Desviaram do caminho. Não tinham mais respeito pelas regras que haviam construído aquele belo estado. A Velha observou mais um pouco a imagem. Sim. A autoridade estava certa. O homem devia ter parado e se rendido, assim poderia viver mais alguns anos. Roubar, ali. Algo inimaginável. Sentiu dó. Sentiu cansaço. Veio o intervalo. A Senhora foi para a cozinha. Iniciar seus deveres diários. Depois para o banheiro. Quarto. Corredor. Por fim, terminou na varanda da frente. Sentou-se no banco. De frente para a rua.

Tudo estava calmo. O verde com muitos tons enchia os olhos. O sol já esquentava em poucos minutos. Ouviu uma mangueira. Esguicho. Um cachorro. Mas nenhum carro. Riu mentalmente. Era segunda-feira. Estava calma. Tudo estava calmo. Seu bairro era calmo. Uma voz gritou seu nome. Voz roufenha. Velha. Doce. Sua vizinha. Ao longo dos anos, virou sua amiga. Conversas. Olhou. A brusca mudança de cor a fez piscar. Amarelo. Rosa choque. Azul anil. Desespero repentino. A Vizinha tinha cara de choque. Quase chorava.

“ Que há? O que aconteceu com você? ”

“ Triste, muito triste. Aquele caso do homem que se suicidou. Estava vendo no canal 3. ”

“ Pois é. Também vi. Um assombro. Essa juventude está perdida mesmo. ”

“ Eu sempre o via no Mercado. Ele já me comprou uma melancia. ”

“ Louco. Perigoso. Burro. ”

Essa voz veio do outro lado. Outra amiga. A Outra vizinha. Era aí que acabava o trio de conversas. A Senhora começou a se animar.

“ Calma, ele teve culpa sim, mas talvez não fosse perigoso. Deve ser um daqueles doidos que querem ser amados. ”

“ Que idiota. ”

“ Ele realmente precisava da atenção. Não se pode mais viver no anonimato? ”

“ Cada vez mais desesperados pela fama. Lembra do cantor de jazz que passou jogando dinheiro. Querendo criar moda esses jovens. ”

“ Bem que eu queria ter pego um pouco. Se esquecem que nós não podemos fazer o mesmo serviço de antes. Cretinos! ”

“ Isso me lembra de uns pequenos que passaram por aqui e começaram a correr, quase quebraram tudo. ”

“ Não deviam deixar essas cadelas terem quantos filhos quisessem. E devia ser permitido o porte de espingardas, como antes. ”

“ Apoiado, apoiado. Nós os abateríamos se nos perturbassem. ”

“ Ei, veja como fala. Nós somos damas. Não podemos usar essa expressão. ”

“ É verdade, você devia de ter se contido. ”

“ Perdoem-me, perdoem-me, não vou mais falar: cadelas ou vadias. ”

As velhas conversavam mais animadamente. A Madame reviveu todos os bons momentos de seu tempo. As regras eram o que prevalecia. Tudo era separado conforme devido. Agora o mundo ficou mais confuso e misturado. Agora, todos os preciosos que ela havia herdado já não faziam mais diferença. Agora, somente os jovens eram priorizados. Somente os loucos. Os esquisitos. Aqueles que sempre se comportaram estavam esquecidos. Os que sempre trabalharam. Os que nunca descansavam. Foram rebaixados.

“ Estou com saudade dos infelizes. Para nós podermos falar sobre eles. ”

Gostosas gargalhadas. Elas desprezavam os loucos.

“ O homem que se suicidou deveria ser enterrado bem longe de nossos entes queridos. ”

“ Apoiado, apoiado. ”

A Velha ouviu um estrondo. Uma pancada. Um baque. Na parte de trás de sua casa. Do outro lado do portão. Era agora que ela pegava aqueles pestinhas. Saiu correndo da frente da casa. Foi para o fundo da casa. O portão do fundo. Gritou. Escutou. Abriu. Nada. Ninguém. Ela se virou. Revelou-se a razão do barulho. Derrubada. Do alto do armário de ferramentas. A pá de jardinagem. Bateu no latão de lixo.

Pelo canto do olho viu. Com um ligeiro pulo. Felpudo. Viu. Cinza e branco. Um gato. Pulando para casa ao lado. O sol surgiu. Atrás de uma nuvem. Iluminou. Tudo ficou dourado. A Velha retirou-se para dentro.


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Notas finais do capítulo

Voltei com a história depois de muito tempo....
Ela continua a mesma não se preocupem.
Sdds, até me esqueci de se acostumar.



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