O mistério dos alunos transferidos escrita por Jel Cavalcante


Capítulo 3
André


Notas iniciais do capítulo

Bom, esqueci de avisar que os vizinhos também vão estar presentes na história. Quanto àqueles que estão esperando casais, só peço que tenham calma.



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Na saída da escola, André esperava seus amigos para voltarem todos juntos para o condomínio onde moravam. Janu foi a primeira a aparecer e estranhou ver André sozinho. Geralmente Janjão está com ele, já que estudam na mesma classe.

"E aí André, qual foi? Por que você ta aí sozinho?"

Havia um certo desapontamento na cara do garoto, mas logo foi sumindo ao ver que ao menos não estava mais sozinho.

"O janjão ta com aquele amigo novo dele. Os dois só andam juntos agora. E pra falar a verdade, eu nem tô ligando muito pra isso. Até o Tatu ele abandonou."

Nesse momento, Tatu vinha chegando com uma animação não muito diferente da de André. Janjão era seu amigo desde a época do primeiro video-game, quando tinha uns oito anos. A falta que ele fazia já estava lhe doendo mais do que achava que iria suportar.

“Nada do Janjão?”

"Ainda ta lá com o babaca do aluno novato. E o pior é que esse garoto é um pé no saco. Não faço questão de me aproximar daquele idiota."

André parecia agora mais zangado que de costume. Mesmo quando os garotos maiores pegavam no seu pé, não deixava transparecer sua raiva. Quando pequeno, André se mudou bastante de bairro e nunca pôde ter muitos amigos. Com isso, aprendeu a não se importar quando alguém implicava com ele. Mas agora, ao se mudar para o condomínio onde conheceu seus amigos, passou a compreender um pouco mais o que significa ter pessoas com quem contar. Por um momento, sua imaginação revisitou alguns dos bons momentos que passou ao lado de Janjão. Seus favoritos eram aqueles em que venciam juntos as guerras que travavam contra o pessoal do orfanato Raio de Luz. De repente, uma voz feminina interrompeu sua viagem extratemporal.

"Só tem a gente, então. Vamo indo?"

Foi a vez de Tatu estranhar alguma coisa.

"Ué, cadê a Bel?"

"Ela saiu toda apressada da sala hoje. Não entendi muito bem. Ouvi ela falando alguma coisa sobre ir no médio. Algo assim."

Já fazia um tempo que Janu desconfiava que Bel estava escondendo alguma coisa. Quando não saía correndo da sala, desconversava sempre que era questionada sobre o que iria fazer depois da aula. Dessa vez, até os garotos estranharam. Aparentemente o grupo dos vizinhos estava se desfazendo.

Ao chegarem no condomínio, cada um foi para sua casa. André estava com medo de chegar atrasado para almoçar com sua família. Uma das coisas que mais gostava, era de ter um momento com seus pais e sua irmã menor na mesa. Sempre que pensava nas crianças do orfanato, ficava um pouco triste, apesar de nunca ter comentado isso com ninguém. Ele não conseguia imaginar como alguém podia crescer sem os pais por perto. E isso fazia dele um garoto cada vez mais agradecido pela família que tinha. Mesmo quando era proibido de fazer o que queria.

Tomou banho, almoçou na companhia de seus familiares e se trancou no quarto, como de costume. "Será que continuo God of War hoje?", pensou. Mas então se deu conta de que não era a mesma coisa jogar sem o Janjão. Os dois tinha criado uma gravação juntos na casa do André e formaram um pacto de nunca jogarem sem o outro. Agora que o amigo não estava mais por perto, o jogo não tinha mais graça.

Subiu de joelhos na cama e foi em direção à janela. Adorava ficar espreitando a vida dos outros. Lá embaixo dava para ver as crianças que estudavam de tarde indo para escola carregando suas mochilas pesadas. Perto da piscina, avistou Tatu brincando com seu cachorro Goe. Ele achava muito engraçado o jeito que Tatu apostava corridas com o cachorro. O problema de ter só o Tatu para brincar era que eles não tinham tanta coisa em comum. Era fato que, se Janjão tivesse que decidir qual amigo ele gostava mais, André perderia fácil. Janjão era daqueles meninos que adoravam competir em tudo. E nada melhor para alguém assim que ter um melhor amigo perdedor. Era assim que André enxergava Tatu. Mas como sempre, ficava de boca fechada.

"O que será que eles estão fazendo? Será que o Janjão foi passar a tarde na casa daquele Maurício?"

Não foi preciso se perguntar por muito tempo. Da escada que dava para o bloco do apartamento de Janjão, Maurício vinha descendo lentamente, devido à sua perna engessada. Caminhou até a saída e seguiu até o fim da rua com muita dificuldade. De onde estava, André observava calmamente os passos do menino. Viu inclusive que, ao atravessar a rua, o garoto olhou para trás, como alguém desconfiado de que está sendo seguido, e em seguida passou a andar normalmente, ignorando a perna supostamente quebrada.

André arregalou os olhos, sem acreditar no que estava vendo. Quando pensou em procurar seu celular para gravar a cena, o garoto dobrou a esquina e sumiu de vista. Quis contar na mesma hora para todo mundo que aquele menino era um mentiroso, mas se deu conta de que não tinha nenhuma prova. Resolveu ligar para Bel, que dentre os seus amigos era em quem mais confiava, mas não obteve resposta. Decidiu então juntar Janu e Tatu em seu quarto para espalhar a notícia.

Tatu estava impaciente devido ao atraso de Janu. Depois da aula era a hora sagrada para ele brincar com Goe, e aquela espera toda estava deixando ele muito enfurecido. Minutos mais tarde, Janu aparece e a reunião começa. André foi direto ao assunto:

"Seguinte, galera. Eu tava aqui de boa, brisando na janela, quando vi aquele moleque amigo novo do Janjão saindo do condomínio. Vocês se ligam que ele ta com a perna engessada, né?"

Os outros fizeram que sim com a cabeça, olhando atentamente para o que o amigo tinha a dizer.

"Então. Eu vi quando ele já estava bem longe. Ele olhou pra trás, pra se certificar de que não tinha ninguém olhando, e saiu andando normalmente. Ou seja, ele ta enganando todo mundo com aquela perna quebrada fake! A gente precisa fazer alguma coisa."

Janu foi a primeira a se manifestar.

"Mas você tem certeza de que era ele mesmo? Ou se ele não tava só descansando a perna, ou coisa do tipo?"

"Claro que era ele Janu! E eu vi perfeitamente quando ele começou a andar normalmente na rua, achando que ninguém tava vendo. Pena que não deu tempo de filmar."

Tatu tinha se acalmado um pouco mais quando percebeu que aquela reunião poderia trazer Janjão de volta. Começou a socar a mão esquerda com a direita, como sempre fazia quando estava com raiva, e tentou partir para o ataque.

"A gente precisa dar uma surra nesse moleque. O Janjão é meu amigo e eu não permito que ele seja feito de idiota por esse mané."

Antes que Janu se empolgasse e fosse tarde demais, André se apressou para conter os ânimos.

"Calma aí Tatu. A gente não pode agir assim sem pensar. Além do mais, esse menino pode dizer que a gente ta com ciúmes e ficar por isso mesmo. O que a gente precisa fazer é bolar um plano pra desmascarar esse trouxa."

Com isso, foi decidido que ninguém abriria a boca até chegar a hora certa. Até lá, cada um iria pensar em formas de desmascarar o garoto na frente de Janjão. Tatu saiu correndo para aproveitar o resto da tarde com seu cachorro e Janu foi atrás de Bel para contar sobre a reunião. André resolveu descansar antes de começar a lição de casa. "É sempre bom tirar uma soneca antes dessa baboseira toda de lição."

No dia seguinte, mais uma manhã chuvosa decorava o pátio da escola. André ainda não sabia o que fazer quanto ao plano de desmascarar Maurício, mas decidiu ficar por perto para ver se via algo que pudesse ajudá-lo na missão. Janjão e Maurício passaram a aula toda cochichando, um no ouvido do outro, e rindo bem alto, sem se importar com as broncas da professora. Quando André tentou saber do que os dois estavam rindo, eles fingiram que não estava acontecendo nada.

"Deixa de ser paranóico André. Ninguém aqui ta rindo de você não. Pode ficar tranquilo"

Janjão falou tudo sem nem ao menos olhar nos olhos do amigo. Era como se eles nem ao menos se conhecessem. Maurício era ainda pior. Fingia que André não estava ali, e que aquela voz tinha saído de algum buraco no chão. Quando Janjão se virou para frente, Maurício sussurrou algo no ouvido dele e os dois continuaram rindo bastante.

Sem saber o que fazer, André passou a observar atentamente o garoto novato. Não parecia ser CDF, mas alguma coisa nele fazia crer que suas notas eram boas. Talvez a forma como conseguia tirar a atenção de Janjão e ainda assim se concentrar em tudo que a professora estava falando. Isso fazia com que ele nunca levasse bronca nenhuma. Às vezes, parecia que Janjão estava falando e rindo sozinho.

"Esse garoto é muito estranho. Ele finge muito bem que está prestando atenção na aula. Ou será que ele consegue fazer duas coisas ao mesmo tempo? E o pior é a cara de satisfação dele quando faz Janjão rir de alguém. Qual é a desse cara?"

Após uma série de especulações sobre de onde o garoto teria sido transferido e os motivos que o fizeram se aproximar de Janjão daquela forma, André percebeu que havia alguma coisa escrita no gesso da “perna quebrada fake” de Maurício. Se ajustou um pouco mais para frente na cadeira, para que pudesse enxergar melhor. Uma letra feia e torta, muito parecida com a de Janjão dava forma a uma frase bastante curiosa:

"juro ser seu amigo acima de tudo"

Ao lado da frase, havia uma assinatura muito confusa, mas André sabia muito bem de quem se tratava. Tudo que conseguiu pensar foi:

"Janjão, o que esse cara fez com você?"


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Notas finais do capítulo

Então, galera. O que acharam dos vizinhos na história? Vocês gostam do André, ou acham que falta um pouco de personalidade nele? Vocês tem algum vizinho favorito? Qual e por quê?