Destinados escrita por Tsuki Dias


Capítulo 5
4 - Iniciando




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– Bem, por qual nome devo chamá-los? – Kira perguntou quando pararam às margens de um riacho, longe demais para se preocuparem, por hora, com perseguidores. – Drake e Lilá? Muito sugestivos.

– Não foi ideia nossa. – Leo justificou-se, passando o cantil para Lissa.

– Prefere Mickey e Minnie? – Damon retrucou ao acender uma fogueira para cozinhar.

– Piadinhas, Tio? Não é do seu feitio. – Kira comentou e todos riram.

– Kira é mesmo o seu nome? – Lissa perguntou e recebeu uma negativa em resposta. – Por que não usá-lo? Duvido que eu vá querer amizade com alguém daqui.

– Que frieza, prima! – a moça sorriu resignada. – Pessoas comuns não precisam se preocupar em esconder sua identidade, mas quando estamos sob os holofotes, a coisa muda de figura. Magos podem fazer feitiços terríveis usando nossos nomes, e há assassinos em todo o lugar. Uma informação valiosa dessa seria seu pior pesadelo.

– Por isso não dei seus nomes a Dante e em nenhum momento ele disse o meu. – Damon explicou. – Em épocas de guerra, máscaras são necessárias.

– Como te chamam aqui, Tio? – Leo perguntou. – Digo... Além de Hunter.

– Você sabe que meu nome não é Damon, não sabe? – Leo afirmou. – Me deram esse título por causa do protetor de Durga, a deusa guerreira hindu. Foi uma piada interna que ficou séria. Quando parei de caçar, adotei o nome Damon, pois, bem... Digamos que também sou o protetor de uma deusa... Ou era antes de falhar. Aqui seu pai adotava o título de Crawl e Ceci é Ceci desde que herdou o poder da família.

– Esses... Títulos representam o que, exatamente? – Lissa perguntou. – Digo, além de proteção, claro.

– Por que você adota apelidos normalmente? – Kira perguntou.

– Por N razões. – ela respondeu. – No meu caso é porque não me sinto à vontade com o meu nome... É estranho e sem significado.

– Aqui, Lysvrill significa “luz que brilha na noite”. – Damon respondeu. – Naquela época, uma tristeza imensa assolava a todos, tínhamos perdido amigos valiosos. Então você nasceu e foi como uma luz no fim do túnel. É por isso que te deram esse nome.

O silêncio da menina se seguiu por um tempo. Lissa nunca tinha gostado de seu nome, por achá-lo feio e de mau gosto, já que em nenhuma língua ele tinha significado. Então, quando teve idade o suficiente para entender isso, sempre pediu para ser chamada de Liz e com o tempo, acabou adotando Lissa, pois gostava do som. Agora, saber a verdade sobre seu nome abalou suas estruturas internas. Sentiu-se tão insensível que teve vergonha de si mesma. Às vezes era uma idiota completa.

– Nomes são subjetivos. – Kira começou, acabando com o clima tenso que se formara. – Não há regras para adotá-los. Como o meu, que não tem nada a ver com meu título.

– Como escolheu o seu, Kira?

– Para mim foi meio que imposto, já que eu era criança quando o escolheram. Mas a técnica que usaram dá certo na maioria dos casos. – ela sorriu, abrindo um bolso dimensional. – Vou mostrar para vocês.

Kira pôs a mão dentro da fenda e esperou alguns momentos, mexendo o braço como se procurasse alguma coisa em um baú lotado. A brisa quente de verão começava a esfriar, enquanto as folhas amarelavam ao passo do que a esperavam. E com um “achei” sonoro, ela puxou um comprido e estreito cristal verde da fenda. Era a joia mais bonita que já viram na vida.

– É uma Joia Astral? – Damon perguntou curioso. – Pensei que estavam acabadas! Não vejo uma desde meu... Trabalho.

– Trabalho? – Lissa perguntou.

– Ceifador de almas. – ele respondeu com naturalidade. – Meio que conheci Anami assim.

– O senhor matava gente? – o choque em Lissa era palpável.

– Não se mata o que já está morto. – Damon e Kira recitaram juntos. – Pelo menos não fora desse plano.

– Quer dizer que estamos no Céu?

– Não, ainda estamos no Tempo. – Damon respondeu humorado, apontando com o polegar para alguma direção. – Paraísos cristãos estão além da Grande Floresta ao noroeste. Os islâmicos ficam ao lado depois do nirvana no meio.

– Aqui é o meio entre os mundos. – Kira explicou. – Um tipo de vida pós-morte. Algumas almas ficam por aqui, outras vão para os “destinos” que as religiões prometem, tem as que voltam e reencarnam... Mas as que ficam presas no outro lado precisam ser caçadas, e era aí que os ceifeiros entravam: caçar e conduzir almas para cá.

– Ok... Vamos deixar a teologia para uma próxima vez. – Leo cortou, envolvendo os ouvidos de Lissa com as mãos e virando-lhe a cabeça. – Ateia fanática. – ele murmurou em aviso.

– Ah... Peguei todas as joias que estavam no cofre do Vovô. Tinha mais objetos poderosos lá, mas tive que guardá-los em outro lugar. – Kira continuou, aceitando o aviso do primo para mudar de assunto. – Trouxe muita coisa de lá, tudo que achei necessário. Essa joia, por exemplo, serve para fazer magias com o astral e espírito. Vou te ensinar a mexer com ela, Lissa, não se preocupe.

– Tenho escolha? – murmurou a moçoila mal-humorada, enquanto olhava séria para o primo.

– O que vou fazer agora é revelar a essência de vocês, e dela formar um título. – Kira explicou, ignorando aquela frase. – Que começar, Lissa?

– Não.

– Ok... Mas esse tipo de atitude vai dificultar meu trabalho. – ela comentou desgostosa. – Leo, quer me ajudar aqui?

Leo encarou a prima com desconfiança e, depois de olhar para o tio e receber um dar de ombros em resposta, se aproximou da prima com um suspiro. Kira estendeu-lhe o cristal e posicionou as mãos paralelas às dele, murmurando desconexa.

A joia cintilou e depois abriu um leque de luz em frente aos seus olhos, que brilhou algumas vezes antes de se focar e tornar a imagem nítida. Silhuetas em luta se mostraram primeiro, combinando diversas artes marciais com o manuseio de armas, seguidas por uma batalha de cavaleiros, cujo escudo tinha a marca do Dragão, e então o majestoso animal se ergueu rugindo aos céus no meio da batalha, exibindo suas escamas luzidias e corpo esguio antes de sumir no meio das nuvens de tempestade.

– Incrível! – ele balbuciou, encarando a joia apagada. – Isso sou eu...

– Você é um guerreiro, em vários âmbitos. Você protege o que é seu e o que estima, e tenho certeza de que cumprirá bem a missão de cuidar de Lissa. – ela falou, explicando o significado das imagens que viram. – Seu totem é o dragão, símbolo de poder. Nesse mundo, ter o título de Dragão que dizer que atingiu o mais alto grau de controle possível, que a magia e a força física estão em harmonia. E por destino, as tem dentro de você.

– Qual o seu nome, Garoto? – Damon incitou.

– Dgrov. – Leo murmurou confuso. – Não faço ideia do que significa.

– “Garra que protege”. – Kira respondeu.

– Como fizeram isso? – Lissa perguntou fascinada, olhando o cristal nas mãos de Leo. – Isso que é magia?

– Com tantas demonstrações que teve, me admira ainda ter dúvidas. – Kira murmurou, pensando um pouco. – Essa mágica que fizemos agora é o meu tipo, um dos poucos que posso fazer. Há inúmeros meios de produzir magia e isso varia de mago para mago. Magia em si é um conjunto de ações e pensamentos que tomam forma, projetados diretamente do cérebro. Se utilizar seus princípios científicos, dá para entender um pouco se pegarmos de exemplo esse feitiço que fiz. Formei uma imagem a partir da energia canalizada desse objeto. O que vimos foi a frequência gerada pelas sinapses do cérebro dele. Fazer magia não é muito diferente da sua ciência, mas o que os separa são as limitações. Não precisamos de tecnologia, basta o pensamento e, em muitos casos, um objeto condutor ou catalizador. É sua veia mágica, ou círculo, que te permite romper as barreiras físicas.

– Está dizendo que mágica é física sem barreiras, instrumentos ou fórmulas?

– Boa definição! – Kira sorriu aprovando. – Defina o fogo.

– É o aquecimento resultante da vibração molecular.

– Isso. Na magia fazemos o mesmo processo, mas com a mente. Não precisamos de intermediários. É apenas as moléculas e o que você quer delas. Isso é magia direta. – ela estendeu a mão e dela uma pequena chama flutuou rente à palma. – Entende isso?

– S-sim... – Lissa balbuciou admirada.

Sempre achara que tais coisas fugiam da racionalidade, que não teriam nexo. Nunca acreditara em nada que não pudesse ser provado pela ciência, mas vendo a coisa ali, em primeira mão, e tendo uma explicação racional para a insensatez que presenciara, talvez, só talvez, aquilo pudesse ser real.

– Toda magia é assim?

– A maioria. É mais fácil com feitiços básicos, que envolvam os elementos, outros são um pouco mais complicados, mas seguem esse princípio. Claro que há sempre as exceções e esses... Estão inalcançáveis, no momento. Mas você vai ver com o tempo quais feitiços conseguirá ou não fazer. Um dia você poderá fazer uma viagem subatômica se tiver bastante experiência.

– Verdade? – os olhos da menina brilharam em expectativa.

– Sim. – Kira sorriu, apontando para a joia em mãos com a cabeça. – Podemos?

Lissa se aproximou ansiosa e se sentou em frente a prima, com as pernas cruzadas, estendendo a mão para pegar o cristal. Kira olhou discretamente para o mentor que os reunira e sorriu satisfeita ao ganhar um aceno de aprovação. Colocou as mãos sobre as da prima e executou novamente o feitiço. Montanhas de livros empilhados na escuridão; uma vela acesa que acendia centenas de outras; um campo noturno onde uma coruja voava rasante; e vagalumes, milhares deles voando para o céu, confundindo-se com estrelas.

– Conhecimento, visão iluminada, clareza, magia... – Kira balbuciou. – Seu totem é a coruja, símbolo da sabedoria, parceira e imagem de bruxas e mau agouro... Pode ver mais que os olhos normais. Você é o que é, Lys... Não se negue agora.

– Chamem-me de... Rany... – ela falou. – Rany... O que significa?

– Luz, pura e simples. – Damon respondeu com um sorriso. – Comam um pouco e vamos andando. Ficar mais tempo aqui não vai ser bom. Kira, prepare um encanto de encobrimento, não quero batedores em nossos calcanhares.

– Sim, senhor!

– E Kira... – ele chamou baixo pegando-a pelo braço, parando-a quando passou perto dele. – Lembre-se, você é parte disso. Uma parte fundamental, eu diria. Nunca seja superada, nunca pense que seus ensinamentos podem ser obsoletos. Não deixe seu nível cair. Nunca.

– Sim, senhor.

– Ótimo. Agora coma e recupere as forças. Você se esforça demais.

–-**--

A cidade não era tão grande quanto a Capital, mas era igualmente animada. Aparentemente, aquele era um dos polos mercantes mais procurados depois da capital, então era normal que todas aquelas pessoas singulares estivesse ali para o comércio de itens, desde peças mágicas a engrenagens futuristas.

– O que vamos fazer aqui, Tio? – Lissa perguntou admirada.

– Vamos equipar vocês. – ele respondeu. – Não querem entrar numa guerra sem proteção, querem?

– Vão gostar disso! Garanto! – Kira sorriu animada.

– Kira, vá com Rany, já sabe o que comprar. Dgrov, sua conversa é comigo. Fique por perto. Quero sair daqui logo. Estaremos nas armas, meninas.

– Sim, senhor. – Leo suspirou curvado, seguindo o tio de perto pelas ruas.

– Vem, Rany. Vamos escolher algo adequado para você. – Kira falou, pegando-a pela mão e conduziu-a pelas ruas, parando numa loja de vestuário mágico.

A fachada era simples, com uma vitrine adornada com o logo da loja, mostrava para os clientes parte do que veriam se entrassem, duas colunas enfeitavam a entrada, recuando a porta e abrigando um pequeno toldo que servia de abrigo tanto para o sol quanto para a chuva. O interior era em tons marrons, com araras e prateleiras de madeira sustentando as peças, monocromáticas ou coloridas. Kira conduziu Lissa pela loja, observando a mercadoria com atenção, precisava de algo bom para a prima. Ela merecia isso.

– Você precisa de roupas que permitam que sua energia flua, mas que lhe ofereça proteção enquanto não dominar sua mágica. – ela falava enquanto analisava as araras. – Por isso acho que vou ter que limitar seu fluxo um pouco, pelo menos até você pegar o jeito. Que cor prefere?

– Azul.

– Boa escolha. – ela sorriu, migrando para as araras de roupas azuis. – Azul traz paz e calma, vai te ajudar a se concentrar.

– Tem isso também?

– Claro! Princípio básico da magia.

– Pensei que fossem pretas e afins as cores de feiticeiros.

– Bruxas e feiticeiros usam bastante, mas não é regra. Magos costumam ser mais coloridos. – ela falou, puxando uma túnica de mangas curtas e gola padre. Era curta e aberta nos lados, revelando-lhe as pernas, mas uma saia de couro marrom a velava. Além das luvas azuis com recortes em couro de diferentes tamanhos, uma faixa preta fazia vezes de bolsa. Se soubesse usá-la, teria um arsenal inteiro atado à cintura, literalmente. – Eu tenho a parte de cima de um peitoral de couro, vai limitar sua magia, mas vai salvar sua vida. Mas eu acho que treinar limitada libertará melhor seus poderes. Vai poder sentir a magia fluindo gradativamente.

– Entendo... Gostei do corte.

– Que bom!

– Imagino se o Le... Hã... Dgrov, vai achar ruim de me ver com algo tão... Curto.

– Quer experimentar um vestido longo? Mas acho que vai atrapalhar se caso precisarmos... Você sabe, sair depressa.

– Esse está bom. Vou experimentar.

– Vá ao provador, vou preparar a proteção. – Kira sorriu, entregado a roupa para a prima e apontando para as cortinas ao fundo.

– Kira, por que está fazendo isso? – Lissa perguntou detrás das cortinas. – Digo... Você não tinha uma boa vida? Mesmo com tudo o que tinha... Por que entrar de sola nessa loucura?

– Poderia dizer que meus motivos são nobres e tal, mas estaria mentindo. Quero sim minha família de volta, mas... Não é a maior razão.

– E qual é? – Lissa perguntou, depois de sair do provador, trajando a roupa que Kira escolhera. – Qual é, tem que ser uma razão muito boa para aceitar me ensinar.

– Acredito que terei o que quero se fizer o que estou destinada a fazer. – Kira confessou, passando o peitoral curto pela cabeça de Lissa e amarrando-o às suas costas. – Mas o destino é mesmo estranho. O temos na mão, mas só podemos ler um capitulo por vez. Só no fim poderemos entender toda a história.

– Mas a questão que paira aí é: você está fazendo isso porque tem que fazer ou por que se fizer diferente as coisas serão... Caóticas?

– Também. – ela sorriu, passando um cordão com uma grande pedra azul escura pelo pescoço da prima. – É uma Joia Aprendiz. Ela vai indicar seu nível de aprendizagem, quanto mais você evoluir, mais clara ela vai ficar. E quando ela ficar totalmente branca, não vai mais precisar de mim.

– Ainda não te entendo, Kira.

– Espere mais um pouco para tentar. – ela riu. – Escolha um calçado ali e um adereço aqui. Vão ajudar a canalizar sua magia.

– Vai se equipar também? – Lissa perguntou, escolhendo botas de cano longo de amarrar e um par de braceletes grossos, cujas pedras ovais eram de um azul profundo.

– Se o Tio achar necessário... Não queria me desfazer delas... Foram de uma guerreira excepcional que foi morta nos protegendo...

Lissa não respondeu. Observou Kira negociar a compra e seguiu-a para fora, atravessando a multidão consumista enquanto procuravam o rastro de Damon e Leo.

– Posso perguntar uma coisa? – Lissa pediu baixo, se esforçando para ficar ao lado da prima.

– Seja vaga. – Kira consentiu em aviso.

– Você não sabe quem são seus pais, certo? – Lissa viu-a concordar com um aceno mínimo da cabeça prateada. – E eu também não sei de onde vim. Eu queria que me respondesse com sinceridade uma coisa.

– O quê?

– Você acha que é ele o seu pai? – Kira parou em choque, olhando a prima com olhos arregalados. – Eu não pude deixar de notar... Ele... Vocês se parecem, bastante. Ele me perguntou isso quando nos conhecemos e já que vocês querem me despertar, resolvi dar ouvidos à minha “Voz Interior”. O que você acha?

Kira demorou um pouco para responder. A praça em que pararam tinha uma árvore grande, que projetava sombra até às barracas depois da rua. Lissa observou os feixes de sol atravessarem as folhas verdes e pousarem sobre o cabelo prateado de Kira, fazendo-o brilhar mais que o de costume. Era realmente lindo, ainda mais com o brilho que os olhos dela adquiriam com a luz. Igual a Damon, apesar de ele não estar em melhor forma. Naquela noite depois de fugirem do castelo, percebera a semelhança entre os dois quando se sentaram juntos ao redor da fogueira. Eram tão parecidos! E o modo como ele a tratava... Por Deus! Como alguém ainda podia ter dúvida?

– Não sei. – Kira respondeu por fim, elevando o olhar para a copa acima de suas cabeças.

– Como não? Céus, Kira! Como pode ter...

– Não podemos ter certeza, porque não sabemos que raio de feitiço protetor Você-Sabe-Quem lançou em nós. Pelo que sei, podemos nem ter a idade que aparentamos... Então... – ela suspirou triste, baixando o olhar para a prima. – Seria maravilhoso se fosse verdade.

Ficaram alguns segundos se olhando antes de Kira recobrar a força e retomar a procura pelos companheiros. Seguiram em silêncio pelas ruas, evitando espalhar informações ao ar livre. Acharam a loja com facilidade, era a única que emanava uma energia verdadeiramente assassina. As armas que estavam ali eram poderosas e não podiam ser manuseadas por fracos.

Uma sineta anunciou quando entraram, dando de cara com um espaço um tanto claustrofóbico para o volume de armamento que era exibido ali. Só armas brancas, nada de armamento bélico. Lanças, espadas, maças e martelos se amontoavam pelos cantos e em toda a extensão da parede avermelhada. Leques de batalha, dardos e chicotes estavam empilhados em prateleiras em meio ao caos das armas maiores. O brilho do aço reluzia como um cortejo, queriam um mestre para domá-los, e somente um.

– Se apresse, garoto. Nosso tempo é escasso. – ouviram a voz de Damon soar enfadonha, antes de perceberem Leo andar de um lado a outro, parando por alguns momentos em frente às armas e soltar um suspiro derrotado.

A proteção de Leo era simples, mas poderosa. Sobre a camisa solta de mangas longas (que se abria em V até o tórax), prendia-se um peitoral de placas luzidias, dispostas como escamas prateadas, e adornado com cordões vermelhos. Os punhos da camisa se colavam à pele sob as amarrações das proteções dos braços – que se assemelhavam às de Kira, mas feitas com o mesmo material da carapaça – que se seguia em intervalos até as costas das mãos. A calça também era folgada e a barra desaparecia atrás das caneleiras (do mesmo material do resto da proteção), logo acima dos calçados estilo shaolin.

– Wow! Acharam algo à altura! – Kira exclamou.

– Não é que combinou com você, mano? – Lissa comentou com um sorriso.

– Você também está ótima. – ele comentou, mesmo torcendo o nariz para a saia de Lissa.

– Ainda se vende essas coisas? – Kira perguntou para Damon, parando ao lado do tio. – Pensei que nunca veria uma dessas.

– A questão é saber onde procurar. – Damon sorriu.

– Essas cores combinam com você, Primo. Preto, vermelho e prata... Combinam mesmo. Agora parece um Guerreiro Dragão.

– Se ele escolher uma arma, quem sabe? – Damon bufou impaciente. – Caratecas...

– Tio, não é tão fácil assim! Sempre lutei de mãos nuas. Não consigo manejar lâminas tão longas. Já tentei, acredite.

– Já tentou sentir a arma? – Damon perguntou mais ameno, mas não menos firme. – Não é só de espadas que se fazem guerreiros. Escolha de acordo com sua essência.

– E se eu não manejar armas?

– Armas de combate corpo a corpo também são armas. O problema é a proximidade. – Kira interpôs. – Feche os olhos e sinta. Isole cada zumbido e tente achar o que te chama.

– Armas também têm alma. – Damon explicou, observando o sobrinho se concentrar. – Elas procuram alguém com a mesma essência, a mão perfeita que poderá brandi-las e dominar sua sede de sangue. Uma lâmina forte nas mãos de um mestre fraco se torna um monstro. Igual a uma fraca em mãos fortes, se quebra.

Leo ouvia tudo com os olhos fechados. Toda aquela explicação servira para lembrar-se das palavras que seu pai, Lupe, lhe dissera quando parara com os treinos de esgrima e kendô:

Há lâminas certas para cada tipo de guerreiro. – ele dissera, puxando da parede sua companheira de eras. – Pode-se dizer que são como mulheres, emotivas, certeiras e te deixam em pedaços. Talvez a sua parceira ainda não tenha chegado. Um dia vai aparecer uma que vai te fazer poderoso, e quando isso acontecer, será o casamento perfeito.

Seu pai estava certo e teria a chance de encontrar sua parceira ali. Podia senti-las, podia ouvi-las chamando-o, convidando-o. Todas aquelas armas eram erradas, não tinham a frequência que o fazia suspirar... Eram fracas. Precisava de algo mais, algo...

– Forte... – balbuciou, procurando em volta. – Está aqui, mas onde?

– Do que está falando, rapaz? – o dono da loja perguntou intrigado.

Leo não respondeu, vagou pelo local, procurando aquelas que o chamavam com todas as suas forças. Eram lindas, maciças e aconchegantes. “O Casamento Perfeito” seu pai dissera. Talvez fosse a hora de conhecer sua alma gêmea.

– Senhor! – chamou no balcão, apoiando-se na madeira quase com desespero. Elas não estavam à vista. – Há alguma arma que não esteja aqui? Que não esteja à mostra? Uma... Especial?

– São todas especiais, filho. Todas forjadas boas e fortes.

– A que eu procuro não é boa. – Leo se aproximou, flutuando as mãos pela madeira. – É perversa, maciça e ardente... Como essa que se esconde aqui.

O homem ficou lívido, a cor fugira de seu rosto moreno e seus olhos saltaram. Obviamente ele sabia do que o garoto estava falando e pior ainda, sabia que tipo de destino o portador daquele... Monstro teria.

– Não posso vender essa coisa! Vai acabar com sua vida assim como fez com os outros nos últimos vinte anos!

– Mostre. – Leo pediu decidido, olhando fundo nos olhos do homem. – Por favor.

O homem engoliu em seco e, tremendo, tirou de baixo do balcão uma grande caixa negra, lacrada com um selo de papel. A energia da lâmina brotava através da madeira, grande e poderosa, chamando-o quase apaixonada.

Vou libertá-la. – sussurrou fascinado enquanto rasgava o selo.

Com um ultimo momento de tensão, Leo abriu a tampa e revelou suas prisioneiras. Eram adagas grandes, de lâmina larga e prateada. Seu fio de corte era meio serrado e curvado, fazendo uma barriga na ponta, antes de subir a crista afiada. O cabo vermelho e preto era enlaçado por cordames grossos, já soltando seus primeiros fios, indicando sua idade avançada de uso prolongado, e uma longa corrente ligava uma lâmina à sua gêmea. Seu brilho vermelho era a indicação de todo o sangue que já beberam nos anos que estiveram ativas. Eram lindas, poderosas, maciças e perversas.

Realmente malignas.

– São Garras do Inferno? – Kira perguntou animada. – Pensei que eram lendas!

– Viraram há trinta anos. A guerreira que as usou era realmente temível.

– Quem?

– A mãe da Destino, a antiga Imperatriz. – Damon revelou. – Teste-as.

Leo fechou os olhos e, com um giro do punho, lançou-as para cima, descrevendo círculos no ar enquanto subiam. Ele puxou as correntes e as armas desceram rápidas, com as pontas voltadas para suas mãos. A aflição de quem olhava era palpável e interminável, parecia que aqueles momentos não acabariam nunca e a expectativa de ver se Leo continuaria com as mãos era aterradora. E então, com um último giro no último segundo, as adagas se ajeitaram nas mãos dele, com os cabos pousados perfeitamente nas palmas grandes do rapaz.

Era o casamento perfeito.

– Perfeitas! – ele balbuciou maravilhado. – Vou levar!

– Ótimo! – Damon sorriu. – Kira, acha que Rany vai precisar de uma?

– Tenho uma especial para ela.

– Então pegue uma você.

– Já tenho armas. – ela falou, sacando os sabres e exibindo-os com maestria.

– São fracas. – Damon tirou as espadas das mãos dela e puxou-a delicadamente para o meio da loja. – Assim como sua armadura. Não lhe disse, Kira? Não decaia. Você precisa ser forte e poderosa. Se limitar desse jeito pode matá-la.

– Não tenho controle.

– É o que você acha, pois não teve chances de testar. Confio em você, Kira, sei que vai conseguir. – o sorriso naquela face a desestabilizou. Naquele instante algo dentro dela a impelia a corresponder àquela expectativa que ele tinha. - Agora escolha.

– Eu... Eu posso usar qualquer arma daqui e provocar um estrago realmente grande. Qualquer uma se daria bem em minhas mãos e elas sabem disso, mas... – Kira se dirigiu aos fundos e parou diante de uma colossal espada de folha dupla e larga. Diante dela, Kira não parecia mais que uma criança em frente a uma muralha. – É essa aqui.

– Essa espada é muito pesada para uma moça delicada como a senhorita. – o homem falou do balcão, com um sorriso quase debochado. – Não prefere algo mais delicado? Como um leque, adaga ou dardos?

– Para seu bem, espero que não seja deboche. – o olhar gélido de Damon fez o homem recuar. – Teste, Kira.

– Com licença. – ela pediu à espada, antes de chutar-lhe a base e fazê-la cair em sua direção.

– Vai esmagá-la! – o homem gritou alarmado.

Kira não se mexeu e nenhum dos outros tentou ajudá-la. Num rápido movimento, ela amparou o peso da espada com os ombros estreitos e, fazendo-a deslizar, segurou-a pelo punho grosso, mal conseguindo fechar a mão pequena na empunhadura, enquanto a outra mão sustentava o resto do peso pelo meio da folha com facilidade. E foi quando ela tiniu e reluziu, a mágica aconteceu. Aconchegando-se suavemente nas costas de Kira, a espada diminuiu de tamanho e se adequou maravilhosamente à estatura da moça. Mas ainda era uma arma imensa.

– Também gostei de você... – sussurrou satisfeita, tocando a lâmina com carinho. – Zeela.

– C-como? – o homem perguntou atônito. – Q-quem são vocês? Como conseguem domar armas que ninguém mais conseguiu?

– Somos viajantes, nada mais. – Damon se adiantou, pousando algumas joias na frente do homem. – Tenha um bom dia.

Com uma pequena reverência, os quatro saíram da loja.

– Só eu que me sinto deslocada? – Lissa perguntou, observando as novas aquisições dos primos. – Não devia ser ao contrário?

– É a arma que escolhe o guerreiro, Rany, não o contrário. – Damon retrucou. – Não se esqueça de pegar a sua com Kira depois.

– Sim, sim... Temos tempo.

– Tempo é relativo. O que me lembra: Kira. – ele chamou. – Vá trocar sua proteção. Você está vulnerável.

– Nunca me trouxe problemas.

– Não é um pedido, é uma ordem. – ele apontou para uma loja do outro lado de onde estavam. – Foi ali que consegui a de Dgrov. Te esperaremos no acampamento.

– Tudo bem... – num piscar de olhos ela fez a espada sumir e saiu pela rua, indo em direção à loja com passos duros.

Aquilo não cheirava nada bem.

–-**--

– Ela está atrasada, não está? – Lissa perguntou folheando um livro, enquanto Damon e Leo testavam as armas do rapaz. – Digo... Considerando tudo...

– Ela está, mais do que devia. – Damon comentou, defendendo um ataque inesperado. – Domine sua arma, garoto. Ouça o que ela sabe, mas não a deixe no controle. Quase arrancou minha cabeça agora.

– São poderosas, Tio, querem provar seu valor. – Leo se justificou arfando. – Vou levar um tempo para me adaptar e sincronizá-las.

– Faça-o rápido se quiser sobreviver aqui. – ele parou um momento, ouvindo além da respiração ruidosa do sobrinho e do barulho das folhas de Lissa. – Levantem acampamento, agora! D., proteja Rany!

Damon se pôs em guarda, escoltando os jovens enquanto eles realizavam a tarefa dada. Quando Lissa pegou o último livro e o colocou na bolsa, um pesado machado fincou no chão aos seus pés. Ela gritou e num movimento rápido, Leo interceptou uma chuva de lanças que a matariam. Um bando de soldados pulou das moitas e avançaram contra o casal, brandindo suas armas e rugindo ao léu.

Damon agiu rápido, sacou sua espada do bolso dimensional e, numa rajada verde venenosa, incapacitou boa parte daquele bando. Lutou rápido e preciso, abatendo quantos podia, enquanto Leo protegia Lissa e o ajudava vez ou outra.

– Corram! – foi a ordem que os jovens mais esperavam ouvir.

Os três corriam ao máximo que suas pernas conseguiam entre os obstáculos que a floresta dispunha. Logo atrás, o barulho que a tropa fazia ao persegui-los era ensurdecedor. O grito de guerra da turba devastadora se fazia ecoar pela floresta, assim como as flechas e lanças que eram lançadas e os tiros precisos demais que atingiam as árvores ao redor, forçando o trio a mudar de caminho. Estavam acuados.

Damon nunca tinha visto tamanho poder em simples fantoches. Tantos batedores de uma vez, em uma perseguição daquele nível, não era comum. Além do mais, de acordo com o que Kira sabia, teriam um pouco mais de três semanas até que a guerra chegasse para aqueles lados. Aquela cidade era a ultima antes da divisa com os reinos lineares, estavam perto da fronteira então eles não deviam estar naquela situação tão já. A menos...

Dante. – concebeu com amargura. Era a única explicação possível.

– Para onde? – Leo perguntou, puxando Lissa pela mão.

– Só corre!

Mas pararam. Na verdade, foram obrigados a parar. Logo à frente, uma tropa estava à espera, parada pacientemente como peões de xadrez. O batalhão que os perseguia parou alguns metros atrás, rugindo e batendo no chão de modo brutal.

Foi aí que o líder se revelou, caminhando lentamente com sua capa esvoaçando ao vento, abrindo caminho pela turba voraz.

Era alto, com músculos que podiam ser percebidos mesmo através da armadura. O rosto desnudo ostentava o mal, mesmo com sua beleza sobrenatural de ser místico. Tinha o cabelo curto louro-esverdeado, deixando as orelhas pontudas aparentes. Os olhos cor de gelo eram igualmente frios e refletiam a maldade que abrigava em seu corpo.

– Bravo, Damon! Performance impressionante! Vejo que não perdeu o jeito.

– Erischen... – o homem pronunciou aquele nome com desprezo, posicionando-se em frente aos jovens.

– Não achou que não me veria tão cedo, achou? Fiquei desapontado quando não te encontrei na casa do seu irmão. Aqueles dois foram tão... Grosseiros.

– O que fez com meus pais? – Leo gritou raivoso, pronto para sacar suas armas.

– Relaxe, garoto. Ele não pode matar ninguém, caso contrário não faria todo esse estardalhaço. – Damon sorriu zombeteiro e desafiante, desfrutando da visão da expressão desgostosa do Tirano.

– Infelizmente eu não cometerei o mesmo erro duas vezes. Mas não se preocupe, logo verão seus pais. – o tom persuasivo do elfo atingiu os ouvidos dos jovens com alarmante convicção. – Tudo que peço é que se entreguem pacificamente e que Damon me dê a parte que guarda. Se resistir, vou começar pelo garoto e...

Ele parou de falar quando seus olhos gelados encontraram com os de Lissa. Os olhos maléficos passeavam pelo rosto da menina, se permitindo por aquele instante registrar na mente o quanto ela era bonita para a idade. Memorizou desejoso a aparência fina e luminosa da cabeleira cor de âmbar com aquele fundo vermelho charmoso que a deixava quase laranja; o brilho dos olhos ainda cinzentos e a aparência aveludada da pele rosada... Somente por aquele momento que se permitiu sentir, permitiu-se liberar por aquele segundo o que vinha reprimindo há anos.

– Enfim... Vou melhorar a oferta: entreguem-se e me dê o que eu quero, e garantirei que ninguém se machuque. Nem mesmo a Princesa.

– O que fez a ela? – Damon se exaltou.

– Nada, ainda. Só vai depender de você. – ele parou em frente ao homem, olhando-o de perto. – O que me diz, Se-bas-ti-an?

– Vá para o inferno. – foi o que saiu do ex-ceifeiro, antes de acertar um gancho de direita no queixo do Tirano, lançando-o para trás e enterrando-o de costas no chão.

– MATEM! – Erischen rugiu do chão, pondo-se de pé em um salto e sacando sua longa espada.

E antes que alguém pudesse dar o primeiro passo, uma nuvem de poeira e folhas se ergueu em volta do trio acuado, enquanto um vulto cintilante, pequeno e rápido, surgiu do chão aos pés do inimigo, saltando no ar brandindo uma imensa espada de folha larga e pontuda.

Erischen se defendeu como pôde, confuso com a confusão de cabelos tricolores que parecia ter tanto poder. Ela saltou uma ultima vez e, nessa investida, pararam no tempo numa métrica impressionante de força. Foi somente nesse momento que ele teve um vislumbre dos olhos dourados da inimiga.

Kira saltou para trás e caiu dentro do vórtice de poeira, descreveu um círculo com o corpo e bateu o pé com força na terra, provocando tremores no chão.

– Detenham-nos! – o elfo gritou raivoso, entendendo de antemão a intenção dela.

Outra chuva de armas arremeteu sobre eles. Antes que Leo pudesse dar mais um pouco de ação para suas novas companheiras, Kira levantou as mãos e uma redoma de energia se fechou sobre eles, desintegrando tudo que tocou nela.

– Onde esteve, menina? – Damon perguntou preocupado.

– Sem importância! – ela gritou de volta. – Pulem!

E ao obedecer a ordem, o chão sob seus pés se iluminou e um vórtice azul e marrom sugou-os para algum lugar. As investidas dos soldados eram rápidas e poderosas, e Kira ainda se demorou um pouco antes de desfazer o campo de força e pular para dentro do vórtice quase fechado, antes que uma chuva de dardos a apanhasse.

– Maldição! – Erischen rugiu, fincando a espada no local onde o vórtice se fechou. – Não vão fugir assim!

Lissa ainda gritava quando aterrissou nos braços de Leo. Estavam numa colina descampada e muito aberta, visível demais para fazerem de esconderijo, se fosse essa a intenção.

– E agora, Tio? – ela perguntou alarmada.

– Se acalme, Lys. – Leo pediu, tentando controlar a própria voz. – Vamos ficar bem.

De repente, saída de sabe-lá-de-onde, Kira caiu sobre a grama e rolou colina abaixo, deixando um fino rastro vermelho sobre o verde.

– Caramba! – ela exclamou quando parou numa pedra. – Droga!

– Kira! Você está bem? – Leo a ajudou a se firmar em seus próprios pés, enquanto Damon observava a cena, com Lissa agarrada em seu braço. – Está sangrando!

– Um cara me acertou de raspão. Nada grave. – ela gemeu, verificando o corte na perna. – Temos pouco tempo, não estamos longe. Já devem ter pegado nossa trilha. Vou abrir uma porta pouco antes da divisa, mas não vou mantê-la muito... Tio?

Damon olhava com melancolia algum ponto entre o verde da grama e o prateado de seus cabelos. Tristeza, desamparo e desespero estampavam seu olhar, dando a entender que ele percebera algo que ainda escapava à concepção dos jovens. Ele sabia no que aquela aventura ia dar.

– Tio? – Lissa chamou, ainda agarrada ao seu braço, como se fosse um salva-vidas no naufrágio da sanidade no mar de loucura.

– Prossiga com isso, Kira. Eles estão vindo. – disse por fim, empunhando sua espada e dando um pequeno empurrão em Lissa, que caiu nos braços de Leo.

Kira ainda o olhou uma última vez e fez o que foi mandado. Estrondos foram ouvidos mais próximos do que deviam, Lissa se agarrava a Leo com pânico e o rapaz reprimiu o medo enquanto ouvia a prima murmurar o encantamento. Um vórtice instável foi aberto diante dos jovens, revelando ao fundo uma floresta tropical. Leo e Lissa não esperaram a ordem, rumaram para dentro e sumiram de vista.

– Venha, Tio! – Kira chamou, vendo-o dar-lhe as costas. – Tio!

– Vá você, Kira.

– Não! Não pode enfrentá-los sozinho! Precisamos de você! Por favor, venha logo!

– Você dará conta, Querida. – ele se virou com um sorriso e estendeu-lhe a mão. – Confie!

Deixando as lágrimas rolarem, aceitou a mão estendida e afundou naquele abraço carinhoso que só sentira nos braços temerosos do avô.

– Escute com atenção... – Damon sussurrou em seu ouvido. Foi aí que ela soube o seu papel naquela história. – Entendeu?

– Sim... – ela choramingou, segurando os ombros trêmulos. – Mas...

– Vá logo, Kira. Estou contando com você. – e com aquele belo sorriso, ele a empurrou para o portal quase fechado, desaparecendo em meio ao vórtice.

Os primeiros a chegar foram facilmente abatidos. Um a um, Damon acabava com eles sem o mínimo esforço ou sacar a espada da bainha. Mas bem sabia que não podia manter aquele ritmo por muito tempo, só o necessário para o rastro de Kira ser dispersado.

Matou o último soldado e esperou. Erischen logo apareceria e seria obrigado a usar toda sua força para retardá-lo. Era difícil admitir, mas sabia que não tinha chances de vencer, soubera desde que fora capturado tantos anos atrás. O rapaz era uma força da natureza, um tornado formado por duas polaridades opostas dentro de seu ser. Por si só já era forte, combinado era quase invencível.

Quase.

Uma dor aguda tomou-lhe as costas e não suportou o próprio peso, Damon se viu caído de joelhos ofegante, sentindo o sangue jorrar. Outro golpe baixo... O mesmo que derrubara Bhirn. Esquecera que o lado que o dominava era traiçoeiro.

– Olhe só! Pelo visto velhos truques sempre funcionam. – o elfo riu com desprezo, derrubando o homem de costas sobre a relva. – Diga onde estão.

– Não sei. – o sorriso satisfeito que estampou aquela face arrancou uma expressão de confusão de seu captor.

– Irei logo atrás deles, garanto, mas antes cuidarei de vocês.

– Nós quem? - Damon sorriu vitorioso, deixando-se sugar para a inconsciência. Seu trabalho acabara. Estava feito.

– MALDIÇÃO! – Erischen vociferou, liberando parte de sua raiva em forma de energia. – MALDITA! Vou te pegar, Anami! Juro que vou!

–-**--

Kira chegou ao local sem forças para se mexer. Deixou-se desfalecer no chão argiloso e ali ficou, chorando amarga e exteriorizando toda sua tristeza. Estavam sozinhos, não havia mais ninguém com quem contar, agora era ela quem devia assumir a liderança e proteger os primos até que pudessem fazer eles mesmos. Não importava como, mas tinha que mantê-los a salvo... Vivos...

– Kira! – ouviu das árvores, quando Lissa se fez notar. – Ainda bem! Leo, aqui!

O rapaz apareceu logo depois, mostrando-se aliviado. Ajudou Lissa a levantá-la e deu-lhe apoio quando suas pernas bambearam. Kira estava fraca, verdade, mas não era isso que o preocupava.

– O que houve? – perguntou preocupado. – Cadê o Tio?

Silêncio. Viu a prima respirar fundo e se afastar cambaleante, olhando firmemente o vazio.

– Vamos precisar ser fortes e sistemáticos. A partir de agora, vou ensiná-los e protegê-los em nossa jornada. – ela virou-se e encarou-os com olhos marejados, mas mostrava determinação. – Vamos ficar bem.

– Tio Damon vai nos alcançar? – Lissa perguntou.

– Não. – falou por fim, arrancando lágrimas da prima. – Vamos resgatá-lo, junto com todos os outros, mas precisamos evoluir e ganhar força. Vou ensinar tudo o que eu sei, mas peço que me obedeçam. Vocês precisam ficar inteiros.

– E se não conseguirmos? E se... – Lissa chorou, sendo embalada por Leo.

– Agora é uma boa hora para se ter fé. – Leo suspirou pesaroso. – Vamos confiar no destino, ele sabe o que faz.

Kira assentiu uma vez e se pôs a andar, seguida dos jovens que, para que chegassem aos braços de suas famílias, ela daria sua vida.

Ou melhor, todas as suas vidas.


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Notas finais do capítulo

Edição feita em 25/04
Espero que tenham gostado! ;)



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