Transgressões escrita por Lucas C


Capítulo 12
Nova Luz




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NOVA LUZ

— O que está acontecendo de errado com essa cidade? – Kennedy perguntava para si mesmo enquanto olhava as notícias locais na internet. — Em menos de um mês, três mortes violentas que aconteceram e embora dois deles sejam tecnicamente acompanhado de roubos me parecem muito suspeitos.

Kennedy olhou para as suas diversas anotações espalhadas pela escrivaninha e para o site de notícias aberto na tela de seu laptop. Três mortes tão violentas não poderiam ser apenas coincidência, mesmo tendo sido causadas de modos bem diferentes. Carlota foi morta a facadas, Serena por estupro e asfixia enquanto Elvis foi morto por tiros. Ainda assim... A cidade era pequena demais para ter tantos assassinos em potencial.

E se por algum motivo, elas tivessem algo de comum? A única coisa que parecia liga-las é que ocorreram à noite e ninguém tinha suspeitos para os criminosos. Kennedy precisava investigar melhor como elas ocorreram e esboçar possíveis suspeitos.

Decidiu começar por Elvis. Ainda estava tudo muito recente, mas ele não queria perder nenhum detalhe. Kennedy trocou o short de tactel por uma calça jeans, calçou seus tênis e saiu para a rua tentando arrumar o ninho de passarinho que estava seu cabelo com as mãos.

— Onde você está indo, Kennedy? – ele ouviu sua mãe perguntar da cozinha.

— Vou dar uma caminhada e volto logo. Preciso espairecer minha mente. – ele informou dando um beijo na bochecha da mãe que lavava os pratos.

— Cuidado. A cidade anda muito violenta. – ela aconselhou.

— Eu vou ser cuidadoso. Não se preocupe.

Ele saiu de casa e deparou-se com Jessika no portão da casa dela. Ela parecia que ia sair naquele momento. Kennedy fez o máximo de esforço para não pensar nela. O rapaz tinha uma missão a cumprir e não poderia se deixar distrair por causa de sua bela vizinha que andava mentindo para ele. Pelo menos era assim que ele encarava os fatos.

O bar Caveirão estava obviamente fechado com longos tecidos negros cobrindo as portas de metal. Kennedy nunca ouvir falar de qualquer parente de Elvis, então provavelmente os funcionários o tinham feito.

Ele sempre ouvia dizer que um criminoso sempre volta ao local do crime. Será que ele estaria ali agora disfarçado no meio das pessoas que passavam assustadas pela rua não muito movimentada de um sábado à tarde? Muitos que passavam ali olhavam para o estabelecimento com os olhos arregalados, alguns chegavam a fazer o sinal da cruz. Outros mudavam instantaneamente de lado da calçada como se o prédio tivesse ficado amaldiçoado. Kennedy se sentou num banco situado debaixo de uma árvore e pegou seu livro de bolso do Pequeno Príncipe. Um pouco infantil demais para alguém da sua idade, mas definitivamente um clássico. Ele quase não olhava para as pequenas folhas coloridas. Seu olhar estava mais interessado no movimento ao redor dele. Ele fazia o possível para não chamar muita atenção ou ser discreto. Não sabia se estava se saindo bem, mas ninguém lançou olhares muito estranhos a ele.

Até que uma pessoa tão observadora quanto ele lhe chamou atenção. Há vinte metros do bar, sentada à sombra de uma jaqueira, estava uma pessoa com silhueta razoavelmente feminina, mas ele não poderia afirmar com certeza, já que o rosto estava encoberto pelo capuz de um casaco de moletom.

Como se aquela pessoa soubesse que estava sendo observada, o rosto virou-se na direção de Kennedy e o encarou com intensidade. Seus olhos não passavam raiva, fúria, estranhamento ou felicidade. Era uma expressão completamente neutra, mas ainda assim intensa, se é que isso era possível. O rosto parecia familiar para o rapaz, mas ele não conseguia se lembrar de onde conhecia aqueles traços delicados.

Com um mísero aceno de cabeça, parecia que a pessoa estava chamando Kennedy. Ele não sabia se aquilo tinha acontecido de verdade ou era apenas sua imaginação fértil fluindo além do normal. Decidiu seguir sua intuição e levantou-se na direção a misteriosa moça de casaco, mesmo que o clima não estivesse ameno.

Ao aproximar-se, ele notou que ela tinha uma tez bem clara, olhos castanho-esverdeados e cabelos escuros com mechas vermelhas escondidas pelo capuz. O rosto pareceu mais familiar. Quando olhou novamente para o bar, ocorreu-lhe uma epifania e lembrou-se que aquela era uma das garçonetes do bar. Ele não achava que ela poderia ser a assassina.

As pessoas no local haviam claramente dito que era um homem que havia invadido o local. Mas, ela também não tinha um corpo tão feminino assim. Os seios eram pequenos e as pernas pareciam fortes. Resolveu dar um voto de confiança à moça e sentou ao lado dela. Era uma manobra arriscada, mas talvez ajudasse a fazer com que ela falasse com mais facilidade.

— Parece que não sou a única a observar o bar – ela disse sem olhar para o rapaz ao seu lado.

— Eu digo o mesmo. – Kennedy disse sem virar o rosto também. Ambos tinham um alvo fixo. O bar — O que a traz aqui?

— Eu poderia lhe fazer a mesma pergunta.

— Uma hora alguém vai ter que começar a falar de verdade – ele disse entediado.

— Primeiro as damas, não é? – ela falou com um mínimo sorriso. — Eu estou aqui tentando entender tudo o que aconteceu na morte de Elvis. Eu estava presente, mas ainda assim não compreendo.

— Eu também estou aqui buscando respostas. Talvez eu consiga com você. Talvez até te ajude a entender o que está acontecendo aqui.

— Seria ótimo. Não consigo entender porque alguém mataria Elvis. Ele podia ter uma pose séria, aquela coisa de motoqueiro maluco, mas tinha um coração de ouro.

— Você o conhecia bem? – Kennedy perguntou avaliando o terreno.

— Bem o suficiente para dizer que ele não parecia capaz de ferir alguém.

— Você não entende porque o matariam... Disseram que foi um assalto. Você discorda?

— Eu não estava dentro do bar no momento. Estava aqui do lado de fora. Neste exato lugar, só que em pé. Estava tendo uns sonhos estranhos e tive um envolvendo Elvis. Eu tive um péssimo sentimento e vim avisá-lo, mas parece que era tarde demais. Vi tudo acontecer sem poder interferir em nada. Como eu seria capaz de fazer algo contra um bandido forte e armado? Ele discutiu com Elvis e falou algo estranho. Meu chefe pegou sua arma debaixo do balcão e apontou para ele, mas o assassino não se incomodou. Na verdade, desafiou Elvis a atirar. No duelo, o chefe acabou levando um tiro na cabeça caindo morto lá. Ele levou o dinheiro do caixa, mas foi bem negligente. Dava para pegar o celular de muita gente naquele crime. Ele só pegou alguns e deixou para lá. Como se aquele não fosse o motivo dele estar lá. Aquilo era só um bônus. Alguma coisa não está certa...

— Você disse que eles falaram coisas estranhas... Você consegue se lembrar de alguma coisa?

— Claro. Com os gritos que eles deram um contra o outro, fica difícil não lembrar. Ele disse que o Elvis bancava de machão, mas não passava de um grande covarde.

— Hum... – Kennedy pensava enquanto coçava o queixo onde a barba começava a nascer novamente.

— O mais esquisito foi a entonação dele. Parecia que ele já conhecia o Elvis. Como se soubesse algo sobre ele.

— Talvez seja isso... O assassino pode ser alguém do passado de Elvis que se disfarçou de bandido para parecer que não foi algo premeditado! – o rapaz disse animado.

— Eu não sei. Para mim, parece um tiro no escuro. Mesmo que tenha sido realmente isso que aconteceu, quem é essa pessoa do passado do Elvis?

— É isso que eu tenho que descobrir, Sofia.

— Eu não te falei o meu nome... – ela comentou desconfiada.

— Eu sei, mas eu me lembro de você. – Kennedy falou com um sorriso no rosto.

Ele se levantou e bateu na calça para tirar a poeira do tecido. Guardou o livro quase intocado no bolso e ajeitou a blusa amarrotada. Começou a sair, mas Sofia o chamou. Ele se virou esperando com curiosidade o que ela diria.

— Se eu fosse pesquisar o passado de alguém, eu iria atrás da Senhora Salomé. Ela conhece praticamente todo mundo da cidade e é uma das pessoas mais velhas daqui também.

— Obrigado pela dica, Sofia.

— Não há de quê, Kennedy.

***

Parecia até estranho que em poucos momentos, Kennedy tenha conseguido uma luz tão rápida para algo que estava empacado há muito tempo. Se a garota das mechas rubras estivesse correta, Salomé seria a chave para a resposta de muitas perguntas de Kennedy. Ela provavelmente não só conheceria Elvis, como também Carlota e com sorte até Elena.

Ele já tinha ouvido algumas vezes da famosa Senhora Salomé. Ela era uma mulher muito importante para a sociedade e a família era muito influente na região. Ela estava sempre à frente da maioria dos eventos da igreja. Ele não sabia onde ela morava, mas provavelmente saberiam informa-lo na igreja.

A tarde estava se aproximando de seu fim e Kennedy seguiu em direção à Igreja Matriz da Vila dos Ajustados. A igreja possuía influência do barroco e do neocolonialismo. Branca, com detalhes dourados, mas bem simples. Kennedy achava a construção bem bonita, mas quando era pequeno achava o local estranho sem saber exatamente por que.

Adentrou o prédio e viu que algumas pessoas estavam espalhadas pelo banco orando. Ele andou pela nave olhando rapidamente pelos bancos para ver se a Senhora Salomé estava em algum deles. Não viu nada. Resolveu pedir ajuda a uma freira que passava por ali. Ele a reconhecia do colégio. Provavelmente levaria uma bronca por nunca mais ter vindo à missa, mas colocou seu melhor sorriso no rosto e foi pedir informação.

Ela foi mais solícita do que ele imaginava. Não perguntou por que ele queria saber onde a senhora morava, já que muitos procuravam por tal informação. Era até irônico Kennedy não saber onde morava alguém tão influente na cidade.

O rapaz ia se preparar para sair, quando ouviu o som suave do piano começar a ecoar por todo o ambiente. Ele se virou automaticamente na direção do piano e viu longos cabelos negros caindo em cascatas de cachos. A mulher se virou e ele percebeu que aquele rosto era muito familiar, mesmo estando sem maquiagem, o nariz um pouco avermelhado, olheiras fundas e os olhos vermelhos e inchados. Era a irmã mais velha de Serena, Ariane. Ele se surpreendeu por ela estar lá. Provavelmente estava ensaiando para tocar no dia seguinte, como fazia quase todas as semanas.

Kennedy sentiu um peso no peito e decidiu ir falar com ela.

— Oi – ele falou e se sentou ao lado dela no banco sem nem pedir permissão. Ela não reclamou, mas também não parecia gostar. A moça estava bem apática.

— Oi.

— Eu não vou perguntar se está tudo bem, porque eu sei que não está. Nem vai ficar...

Ariane estava surpresa com o que ele disse.

— É a primeira pessoa a falar a verdade para mim em um bom tempo...

—Eu imagino como deve ser. Só quero te dizer que a dor não vai passar. Ela não vai sumir de você. Ela sempre estará aí, mas com o tempo você passa a se acostumar com a dor. Por isso, parece que vai sumir, mas não vai. Talvez ela diminua, porém ela continua. Além do mais, é a sua irmã, não dá pra esquecer com facilidade. Contudo, é necessário se apegar as boas lembranças existentes entre vocês, que devem ser muitas, para assim só lembrar os bons momentos sempre que alguém falar o nome dela.

— Obrigada – ela disse abraçando o rapaz rapidamente. — Espero que eu me acostume com a dor, como você diz. Porque é muito ruim ter esse sentimento tão escuro e forte dentro de si.

Eles ficaram em silêncio por um tempo e ela voltou a tocar no piano. Agora mais intensidade. Kennedy apenas ouviu, sem atrapalhar. Quando ela terminou a canção, ele resolveu fazer uma pergunta:

— Como era a Serena? Não a conhecia muito bem, mas cheguei a dançar com ela uma vez em uma festa.

— Serena era a coisa mais fofa que existia. – Ariane disse com um pequeno sorriso no rosto — Ela era meiga, gentil, educada, gostava de ajudar os próximos, era linda e adorava dançar. Um pouco vaidosa e teimosa, mas era maravilhosa.

— Será que ela seria capaz de causar a raiva de alguém? – ele perguntou como quem não quer nada.

— Raiva? Talvez os caras que ela dispensou ou algumas garotas que tinham inveja dela, mas ninguém com raiva o suficiente para fazer aquilo com ela.

Ariane já sabia qual era a intenção de Kennedy com aquela pergunta e ele ficou surpreso. Não imaginou que alguém o desmascararia tão rápido.

— Eu sei o que você anda fazendo, Kennedy Aguilar. Não só sou eu. Cuidado. A curiosidade matou o gato – ela disse e deu uma piscadinha e saiu deixando o garoto sozinho no banco sem reação.


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Notas finais do capítulo

"Surprise, bitch
I bet you thought you'd seen the last of me"

Parafraseando Maddison Montgomery, venho avisar que eu não morri: Aeee!!! A universidade suga minhas energias e criatividade e o meu notebook capenga também não ajuda muito. Percebi que eu estava enrolando demais e resolvi dar uma avançadinha na história.
Se ainda houver alguém que leia essa história, eu gostaria muito de saber o que acharam.

Beijos na alma