Entramos no carro de Alexander, e ele imediatamente começa a conversar com Jhon sobre assuntos que eu não entendo.

Durante o caminho vou tentando me lembrar de tudo. Ligar alguns nomes a rostos, anotar mentalmente o “esconderijo”... Tudo o que seja importante. Leo tinha falado alguma coisa sobre tráfico ilegal de armas, mas parece que deve haver mais, e isso é só a parte que Luigi Montanari comanda.

Alex estaciona em uma garagem. A casa fica no centro, observo. É uma linda casinha de tijolos brancos com várias janelas, telhas de barro, uma varanda em volta e um quintal na parte de trás, onde um balanço descansa. A porta é de madeira clara. Alex abre a porta, ainda conversando com Jhonatan, mas assim que a atravessa sorri.

– Bel? Cheguei! Trouxe uma visita!

Uma voz suave vem de algum lugar à direita, provavelmente a cozinha.

– Jhonatan morreria de fome se não viesse almoçar aqui todo dia, ele não é considerado visita!

– Estou falando da outra pessoa que veio com o Jhon!

Um barulho de panelas caindo veio da cozinha, e um “Ops” foi ouvido.

– Vão andando para a sala! Eu só vou colocar o frango no forno!

Nós fomos, e eu sorri ao ver como a sala era bonita. Em tons de branco e verde. As paredes brancas com várias fotos emolduradas, cortinas verde-seco amarradas para que a luz entrasse pela janela. Os sofás eram da cor das cortinas, e os móveis eram de madeira escura. Um pouco mais afastado, uma mesa para seis pessoas.

Jhon se esparramou no sofá, e Alex disse que ia ver se Belona precisava de ajuda. Eu limitei-me a ver as fotos em uma parede.

Alex estava em um monte. Às vezes sozinho, às vezes com pessoas que eu não conheço. Uma delas me chamou a atenção. No cantinho estava escrito “Alexander (16 anos) e Jhonatan (14 anos)”. Dois garotos pousavam para a foto, um de costas para o outro, de braços cruzados e olhando com superioridade para a câmera. Usavam roupa social preta e chapéus Fedora na mesma cor. Apesar de mais novo, Jhonatan era mais alto.

Voltei a olhar para as outras fotos. Jhonatan está em várias. Uma mulher se destaca, aparecendo tanto sozinha como ao lado de Alex. Minha atenção se prende a uma foto em especial. Ela está sentada em um balanço, aparentemente gargalhando.

– Ah que saudades da época em que eu não tinha que ir ao banheiro de cinco em cinco minutos. - Diz a voz suave que vinha da cozinha, dessa vez do meu lado, em um tom divertido.

A mulher ao meu lado é da minha altura. A pele é branca, a boca é naturalmente rosada e ela tem algumas sardas no nariz. Tem olhos azuis cristalinos, e o cabelo castanho claro está preso em um rabo-de-cavalo. Ela tem uma expressão divertida, mas ao mesmo tempo cansada. Mas o que mais chama a atenção é o barrigão de oito meses, escondido sobre o vestido azul celeste, feito de várias camadas de musselina sobre outro tecido que eu não reconheço. Ela tem uma das mãos nas costas, e a outra apoiada delicadamente sobre a barriga.

– Meu nome é Belona Adams.

– Ísis Nightblade.

– Prazer em conhecê-la, querida. - Ela me abraça. - Adorei seu cabelo!

– E eu, seu vestido. - Nós duas rimos.

– Sinta-se em casa, Ísis. Eu vou terminar de fazer o almoço, qualquer coisa pode me chamar, tudo bem? Alex, amor, você poderia por a mesa? Obrigada! - Então ela repara no Jhonatan esparramado no sofá, e revira os olhos. Eu sorrio.

– Quer ajuda na cozinha?

– Seria ótimo. Venha!

***

– Jhon, vem almoçar! - Belona fala, colocando o frango assado na mesa. Eu coloco a salada do lado. Em poucos minutos, todos estamos a mesa, almoçando.

– O que fez enquanto nós estávamos na reunião, Bel?

– Ah, nada demais. Só fiz almoço e dei uma geral na casa.

Alex parece reprovar.

– Você está grávida de oito meses. Você tem que descansar!

– Se eu descansar vocês dois morrem de fome e você não tem cuecas lavadas!

Jhon, eu e Belona começamos a rir, e até Alex dá um sorriso.

– Leo me ligou agora a pouco, ele sugeriu Claire para a bebê. Eu não sei... Jhon, diga um nome.

– Ah... não sei... Está perguntando para o cara mais sem criatividade do mundo. Lucy?

Belona sorri e revira os olhos.

– Lucy não. E você Ísis?

– Ah... ahn... Também não sei... Eu gosto de Luna.

– Luna é lindo!

– Lindsay? - Diz Alex.

– Lindsay é horrível, amor.

– Alice? - Digo.

– Eu gostei. - Diz Alex, mas Belona balança a cabeça.

– Me lembra a Alice Springs, e você sabe como eu a odeio desde o ensino médio.

– Que tal Laura? - Jhon fala por fim.

– Laura! Ótimo! Até porque eu sou fã de Laura Pausini!- Belona diz, os olhos brilhando. Concordo, sorrindo.

– Então vai ser a minha Laurinha. - Alex fala para a barriga da esposa.

– Acho que ela aprovou, pelo chute. De qualquer forma, tenho que ir no banheiro agora ou vou explodir! - Ela ri, e se levanta, voltando alguns minutos depois.

Continuamos comendo, conversando, entre outros assuntos, sobre a pequena Laura.

Depois do almoço, eu ajudo Belona a lavar a louça, e os homens vão para a sala fazer coisa de homens (que Belona acaba por me dizer que é jogar vídeo game). Eu e ela vamos para a varanda do lado de trás da casa, onde dois bancos de madeira com almofadas confortáveis nos aguardam. Eu me sento em um e ela se deita em outro, a mão descansando na barriga como sempre. Daqui dá para ver o bonito jardim, com uma árvore alta, o balanço a sombra balançando no vento.

– Você e o Jhonatan estão juntos? - Ela pergunta.

– Não! - Respondo rapidamente. - Não.

– Não? Tem certeza? - ela diz, divertida.

– Tenho... Porque diz isso?

– Bem, acho que ele não sai por ai levando qualquer garota para almoçar na casa do melhor-amigo-desde-o-dia-em-que-ele-salvou-o-Alex-da-cueca-suicida. - Ela ri, e eu começo a rir, mais por causa do nome, já que não sei essa história.

– Ele meio que não tinha escolha, sabe? - Digo, escolhendo com cuidado as palavras.

– Ah, ele tinha. Podia ter ido a um restaurante, ou comprado algo e vocês comiam no apartamento. Você não é uma refém afinal, é uma convidada.

Encaro-a por um minuto. Ela parece entender.

– Alexander me contou. E sim, eu sei sobre a máfia.

– Sabe? - Eu a encaro. Meu deus, ela sabe afinal! - E nunca pensou em contar para a polícia?! Isso é ilegal... e eles matam pessoas!

Ela suspira, e começa a acariciar a barriga, olhando calmamente para o balanço.

– Pensei nos primeiros dez minutos. Então Alex se ajoelhou e tirou um lindo anel de ouro branco, com três diamantes de tamanhos diferentes. Ele me pediu em casamento, fez uma declaração linda, e colocou o anel no meu dedo, olhando para os diamantes. Ele disse que o maior era ele e o médio era eu. Quando perguntei sobre o menor ele disse “Belona, eu não quero te dividir com mais ninguém, mas se isso acontecer um dia, eu quero que o diamante na outra ponta seja nosso filho”. Ele sabia que o maior sonho da minha vida era ter uma família. - Ela sorriu, ainda olhando para o balanço. - Eu amo tanto aquele homem...

Fico em silêncio, sem saber o que falar.

– Ele é bom. Pode não parecer quando nós dizemos “Ele é da máfia”. Mas você o viu. Não o conhece bem como eu ou o Jhon, mas você viu que ele não é um monstro. Todos se tratam como uma família lá, daí o nome famiglia. Estão juntos para o que der e vier... Todos são como melhores amigos. Não te tiro a razão, não concordo com o que eles fazem... mas tem tanta gente fazendo coisas horríveis no mundo bem debaixo do nariz da sociedade. Políticos, donos de multinacionais... Odeio quando eles matam gente, mas veja Jacob Peterson por exemplo. Ele fazia tráfico ilegal de bebês, além de ter vários estupros no currículo. Alguém, provavelmente um pai desesperado, entrou em contato com a máfia, e então o mataram. Isso é terrível, mas diga a verdade... um homem assim merecia estar vivo? Nenhuma pessoa que eles mataram até agora era inocente.

– Mas... - Tento, mas ela me interrompe.

– Além disso... Imagina se todos forem presos? Mary deu a luz gêmeos a pouco tempo. São garotos lindos e fortes. Não seria terrível viverem sem pai? Fred tem um garoto também. Ele lhe deu uma bicicleta no aniversário de sete anos dele. Walt e Sabrina se casaram a cerca de um mês. A maioria ali tem família, Ísis, pessoas que se importam com eles. Eu não consigo me imaginar vivendo sem o sorriso do Alex... Como eu poderia sequer pensar em denunciar essa gente à polícia? - Ela enfim quebra o contato visual com o balanço e olha para mim, e a intensidade dos olhos azuis me atinge em cheio. - Você entende agora?

Eu balanço a cabeça e encaro o balanço. É hipnotizante.

– Entendo.

Ela sorri, e é um daqueles sorrisos contagiantes, que me faz sorrir de volta.

– Então... tem certeza que vocês não estão juntos?

– Tenho. - Eu rio.

– Por enquanto. - Ela pisca o olho. - Então, me fale sobre você.

– Bem... Meu nome é Ísis Nightblade, tenho 23 anos, trabalho como garçonete no Walker’s... acho que só. - Eu sorrio.

– Meu nome é Belona Adams, tenho 26 anos, sou dona de casa e fotógrafa nas horas vagas. Sou casada com Alexander Adams, 27 anos, há exatos cinco anos, e só agora consegui engravidar. Aliás, estou de oito meses, o nome da menina é Laura Adams, e ela é forte pra caramba, ou parece pelos chutes que ela dá. Jhonatan, 25 anos, é padrinho do meu casamento junto com a irmã dele, Lucy, que tem sua idade, e que atualmente mora no Dubai, mas vem nos visitar de vez em quando, e vai ser padrinho da Laurinha também.

Continuamos conversando. Belona é uma ótima pessoa, e faço amizade com ela rápido.

Quando ela se levanta para ir ao banheiro pela segunda vez, Jhonatan aparece a porta.

Ele está pálido como se tivesse visto um fantasma. Belona o olha, preocupada.

– Jhonatan... aconteceu alguma coisa? - Pergunto, hesitante.